RELATÓRIO ANUAL 1996


RELATÓRIO Nº 31/96
CASO 10.526
GUATEMALA
16 de outubro de 1996
 

1. A peticionária, Dianna Ortiz, cidadã norte-americana e freira da ordem religiosa das Ursulinas, alega que em novembro de 1989 foi seqüestrada, conduzida a um centro de detenção clandestino e torturada na Guatemala por agentes do Governo. Alega que foram violados vários artigos da Convenção Americana sobre Direitos Humanos (a "Convenção"). A Comissão Interamericana de Direitos Humanos (a "Comissão"), baseando-se nas informações apresentadas e em sua investigação e análise do caso, conclui que o Governo da Guatemala violou as disposições dos artigos 1, 5, 7, 8, 11, 12, 16 e 25 da Convenção.

 

I. ANTECEDENTES

 

2. As alegações dos fatos considerados neste caso, descritos a seguir, constam das declarações da Irmã Ortiz, que serão acompanhadas de um relato sucinto do procedimento perante a Comissão. Na Seção II, expõe-se a análise feita pela Comissão sobre a admissibilidade e os méritos do caso.

 

A. Alegações de fatos que constam nas declarações de Dianna Ortiz

3. Em 18 de abril de 1990, a Comissão abriu o caso nº 10.526, baseando-se nas declarações apresentadas pela peticionária Dianna Ortiz de que tinha sido seqüestrada e torturada por agentes do Governo da Guatemala. De acordo com as declarações da Irmã Ortiz, em setembro de 1987 ela viajou pela primeira vez para a Guatemala, a fim de reunir-se a várias religiosas que há um ano se encontravam no país, trabalhando nas povoações indígenas de San Miguel Acatán e em outras pequenas aldeias do departamento de Huehuetenango.

 

4. No final de 1988, o Bispo de Huehuetenango recebeu uma carta anônima escrita a máquina acusando a Irmã Ortiz e as demais religiosas que trabalhavam em San Miguel de planejar juntar-se a elementos "subversivos". No início de 1989, a Irmã Ortiz começou a receber diretamente ameaças anônimas escritas. Entre janeiro e março de 1989, recebeu três cartas contendo ameaça. Uma delas foi enfiada por baixo de sua porta, outra chegou pelo correio e a terceira ela encontrou sob o limpador de pára-brisa de seu carro. Duas das cartas eram dirigidas à "Madre Dianna". Essas cartas a advertiam de que corria perigo e que devia sair do país.

 

5. Em julho de 1989, a Irmã Ortiz foi para a Cidade da Guatemala para estudar espanhol. Durante o mês em que freqüentou aulas na escola de idiomas, aconteceu uma greve de professores na Guatemala. Em certa ocasião, enquanto caminhava para a escola localizada perto da praça principal, onde se realizavam as demonstrações em frente ao Palácio de Governo, encontrou várias pessoas que conhecia e se deteve para conversar com elas. Alguns dias depois, foi abordada por um desconhecido na rua próxima à casa em que estava hospedada. O homem dirigiu-se a ela nestes termos: "Sabemos quem você é. Você está trabalhando em Huehuetenango." O homem disse à Irmã Ortiz que saísse do país.

 

6. Depois desse fato, em 15 de julho de 1989 a Irmã Ortiz saiu da Guatemala de férias não planejadas, só regressando em 18 de setembro de 1989. Em 13 de outubro de 1989, na Cidade da Guatemala, recebeu outra ameaça de morte em uma carta colocada na caixa de correio da casa em que estava hospedada. As palavras tinham sido formadas por letras recortadas de revistas e jornais. A carta dizia: "Eliminar a Dianna, assassinar, degolar, violentar. Sair do país". Depois de receber a carta, a Irmã Ortiz regressou a San Miguel. Em 17 de outubro de 1989, recebeu outra carta em San Miguel, que dizia: "Isto aqui é perigoso para você, o exército sabe que você está aqui. Saia do país." A Irmã Ortiz decidiu refugiar-se na Pousada de Belém, um centro religioso situado em Antígua.

 

7. Segundo suas declarações, a Irmã Ortiz foi seqüestrada no jardim da Pousada de Belém em 2 de novembro de 1989. Antes de sua chegada, outra carta com ameaças fora enviada à pousada de Belém, que ela não recebeu.

 

8. De acordo com sua narração, em 2 de novembro a Irmã Ortiz pediu a um porteiro que lhe abrisse o portão do jardim, que era murado. Depois de permanecer sozinha no jardim por cerca de 10 minutos, sentiu que um homem lhe pousava a mão no ombro. "Olá, querida", lhe disse, e ela reconheceu a voz do homem que a tinha abordado na rua quatro meses atrás. A Irmã Ortiz tentou afastar-se, mas o homem a segurou pelo braço. Nesse momento, ela percebeu que eram dois os homens no jardim. O primeiro, a quem ela reconhecera e que parecia estar no comando, insistiu em que os acompanhasse. Depois de breve luta, o primeiro homem lhe mostrou um revólver escondido na jaqueta.

 

9. Os dois homens obrigaram à Irmã Ortiz a caminhar com eles até o fundo do jardim da Pousada de Belém, onde havia uma abertura no muro que o cercava. Os dois homens saíram do jardim com a Irmã Ortiz e caminharam pelo leito seco de um rio até a rua que leva para fora de Antígua.

 

10. Os dois homens obrigaram a Irmã Ortiz a subir em um ônibus público. O primeiro lhe mostrou uma granada que tinha no bolso da jaqueta, advertindo-a de que, se tentasse escapar, haveria muitas vítimas inocentes. Os dois homens e a Irmã Ortiz desceram do ônibus nas proximidades de uma placa que indicava a direção para Mixco, povoado próximo à Cidade da Guatemala.

 

11. Segundo as declarações da Irmã Ortiz, caminharam por uma estrada de terra até chegar a um carro branco de patrulha da Polícia Nacional. O primeiro homem adiantou-se e conversou com o motorista do veículo, um policial fardado. Eles vendaram os olhos da Irmã Ortiz e a fizeram-na sentar-se no banco de trás. Os dois homens também entraram no carro. O policial comentou com os homens: "Pelo que vejo, o passeio foi proveitoso."

 

12. A Irmã Ortiz foi conduzida no carro até um edifício com aspecto de depósito, onde escutou os gritos de uma mulher e os gemidos de um homem. Foi escoltada até um quarto e sentada em uma cadeira. O policial e os dois homens que a tinham seqüestrado saíram do quarto e, depois de várias horas, o segundo homem que participara de seu seqüestro no jardim entrou e lhe vendou novamente os olhos. Outros dois homens entraram no quarto, e a Irmã Ortiz reconheceu as vozes do policial e do primeiro homem que a seqüestrara no jardim. Segundo suas declarações, os homens lhe tiraram algumas peças de roupa e começaram a tocá-la.

 

13. Então, o homem que primeiro a abordara, falou: "Vamos deixar isso para depois; primeiro, temos que terminar os negócios." Disse-lhe que iam participar de um jogo. Se respondesse de maneira satisfatória para eles, lhe deixariam fumar; em troca, a queimariam com um cigarro se as respostas não fossem de seu gosto.

 

14. Os homens lhe perguntaram seu nome, onde vivia, em que trabalhava e se conhecia elementos subversivos. Depois de cada pergunta, independentemente de sua resposta, a queimavam com um cigarro. Fizeram-lhe as mesmas perguntas de forma repetida e a queimaram diversas vezes.

 

15. Em dado momento, suspenderam o interrogatório e lhe tiraram a venda. Mostraram-lhe algumas fotografias suas tiradas em diversas partes do país e de outras de pessoas indígenas. Em uma das fotografias havia um homem com uma arma e em outra, uma mulher de cabelo preto comprido, que também portava uma arma nas mãos. Insistiram em dizer que a Irmã Ortiz era a mulher indígena que aparecia na fotografia e que os indígenas eram elementos subversivos.

 

16. Um dos homens tornou a colocar a venda na Irmã Ortiz e alguém lhe desfechou um golpe tão forte no rosto que ela foi parar no chão. Dois dos homens a levantaram, sentando-a, e lhe tiraram o resto das roupas. Segundo as declarações da Irmã Ortiz, os homens começaram a abusar dela sexualmente e a violentaram várias vezes. Disseram-lhe que parariam se ela informasse os nomes das pessoas que apareciam nas fotografias e de seus contatos. A Irmã Ortiz desmaiou.

 

17. A Irmã Ortiz declara que, no momento em que voltou a si, percebeu que estava presa pelos pulsos a uma sustentação acima de sua cabeça. Pareceu-lhe que estava em um pátio. O policial fardado tornou a fazer perguntas sobre as pessoas que apareciam nas fotos e a violentou. Ela sentiu então que várias pessoas levantavam um bloco pesado do assoalho. Desceram-na a um fosso cheio de corpos e ratazanas, e a Irmã Ortiz desmaiou de novo. Quando despertou, estava no chão e os homens tinham recomeçado a abusar dela sexualmente.

 

18. Mais tarde, a Irmã Ortiz foi levada de novo ao quarto, onde se reiniciou o interrogatório. Seus seqüestradores a dominaram no chão e voltaram a violentá-la. Então, alguém disse: "Alejandro, venha se divertir". O homem que acabara de entrar no quarto respondeu com uma imprecação em inglês e depois começou a falar em espanhol, dizendo aos demais que a Irmã Ortiz era uma cidadã americana e que deveriam tê-la deixada em paz. Comunicou que a imprensa já tinha publicado o caso. Ordenou aos homens que saíssem do quarto e ajudou a Irmã Ortiz a vestir-se.

 

19. "Alejandro" levou a Irmã Ortiz para fora do edifício e saiu com ela de carro de uma garagem anexa. Enquanto saíam, pediu-lhe desculpas várias vezes e lhe disse que tudo não passara de um equívoco, que a tinham confundido com outra pessoa. Também lhe disse que tinham tentado evitar o desfecho da situação por meio das cartas. Embora "Alejandro" continuasse falando em espanhol, entendia o que a Irmã Ortiz lhe dizia em inglês e seu espanhol tinha um sotaque inglês. A Irmã Ortiz afirma em suas declarações que o homem lhe pareceu ser norte-americano.

 

20. Quando o automóvel em que iam a Irmã Ortiz e "Alejandro" parou no trânsito, ela pôde ver placas indicando que se encontravam na zona 5 da Cidade da Guatemala. Saltou do carro e fugiu.

 

21. Correu até que uma mulher se ofereceu para levá-la a sua casa. Ficou ali durante algumas horas e depois conseguiu chegar à Agência de Viagens Hayter na Zona 1 da cidade. Fez contato com membros de sua comunidade religiosa, que foram buscá-la. Quarenta e oito horas depois de ter escapado, encontrava-se a caminho dos Estados Unidos.

 

B. Procedimento na Comissão

 

22. Em conformidade com o artigo 34 do Regulamento da Comissão, em 18 de abril de 1990 a Comissão enviou ao Governo da Guatemala as partes pertinentes de uma declaração datada de 3 de janeiro de 1990 assinada pela Irmã Ortiz, além de farto material publicado na imprensa que tinha recebido. No espaço de tempo transcorrido desde então, a Comissão recebeu várias comunicações relacionadas com o caso dos advogados do Governo e da peticionária, Irmã Dianna Ortiz./58 Além disso, em 3 de fevereiro de 1995 realizou-se uma audiência perante a Comissão.

 

23. As comunicações do Governo têm sido acompanhadas por relatórios preparados pelas autoridades, recortes de jornais, comunicados da imprensa e outros documentos, com atualizações sobre a investigação e a tramitação do caso da Irmã Ortiz nos tribunais guatemaltecos. Começando por sua resposta de 30 de abril de 1990, o Governo argumentou que não tinham sido esgotados os recursos internos neste caso, conforme o enunciado no artigo 47, a, da Convenção. O Governo também argumentou que não foram comprovados os atos criminosos alegados pela Irmã Ortiz e que seus responsáveis não tinham sido identificados. O Governo afirmou, além disso, que a Irmã Ortiz criou obstáculos aos procedimentos internos, não colaborando com a investigação e tramitação do caso na Guatemala.

 

24. Os advogados da peticionária apresentaram um volume considerável de provas documentadas, inclusive declarações juradas, atas dos tribunais da Guatemala, recortes da imprensa, etc., em respaldo às acusações da peticionária. Eles argumentaram também que, neste caso, cabia uma exceção ao requisito do esgotamento de recursos da jurisdição interna. Além disso, apresentaram atualizações dos procedimentos internos e afirmaram que a Irmã Ortiz tinha colaborado com as autoridades competentes.

 

25. Em 23 de outubro de 1995, a Comissão enviou ao Governo da Guatemala uma carta solicitando cópias dos depoimentos das testemunhas, relatórios da polícia e outra informações relacionadas com o processo conduzido internamente. O Governo respondeu em 27 de novembro de 1995, afirmando que solicitara informações ao Ministério Público e que este órgão decidiria quanto ao pedido da Comissão.

 

II. ANÁLISE

 

26. A análise deste caso por parte da Comissão começa com a determinação de sua admissibilidade. A seguir, apresentam-se as conclusões da Comissão sobre os méritos do caso.

 

A. Admissibilidade

 

27. A demanda atende aos requisitos formais de admissibilidade enunciados na Convenção Americana sobre Direitos Humanos e no Regulamento da Comissão. Em conformidade com o artigo 47, b, da Convenção, a Comissão é competente para examinar este caso porque nele são apresentados fatos que violam os direitos e as liberdades protegidas pela Convenção. De acordo com o disposto nos artigos 46, c e 47, d, respectivamente, o tema da petição não depende de decisão em outro processo internacional, nem constitui repetição de petições examinadas anteriormente pela Comissão.

 

28. Conforme o enunciado no artigo 48.1, f, da Convenção, em carta de 7 de fevereiro de 1995 dirigida às partes a Comissão se colocou à sua disposição para se buscar uma solução amistosa. Em 17 de fevereiro de 1995, o advogado da Irmã Ortiz indicou que ela estava disposta a participar de conversações para se chegar a um acerto negociado. Em 27 de março de 1995, o Governo da Guatemala comunicou à Comissão que decidira, neste caso, não participar de conversações para uma solução amistosa.

 

29. Em conformidade com o artigo 46.2 da Convenção Americana, não se aplica a este caso o requisito de esgotamento dos recursos de jurisdição interna, segundo o disposto no artigo 46.1, a. No artigo 46.1, a, especifica-se que, para se admitir uma petição, requer-se "que hajam sido interpostos e esgotados os recursos da jurisdição interna, de acordo com os princípios de direito internacional geralmente reconhecidos". Não obstante, com relação ao disposto no artigo 46.2, b, o esgotamento não constituirá requisito quando "não se houver permitido ao presumido prejudicado em seus direitos o acesso aos recursos da jurisdição interna ou ele houver sido ele impedido de esgotá-los". De acordo com o artigo 46.2, c, não se aplicará o esgotamento quando "houver demora injustificada na decisão sobre os mencionados recursos". As disposições do artigo 46.2, b e c eliminam a causa atual do requisito de esgotamento, dado que a Irmã Ortiz tem reclamado de forma repetida por meio dos mecanismos da jurisdição interna, sem que se tenham conseguido resultados nem se chegado a uma decisão em seu caso, apesar de já serem decorridos seis anos desde o início do processo judicial na jurisdição interna.

 

30. Em 2 de novembro de 1989, Darleem Chmielewski informou à Polícia Nacional em Antígua, Guatemala, que a Irmã Ortiz tinha desaparecido. Em 4 de novembro de 1989, teve início um processo criminal perante o Juiz de Paz do Departamento de Sacatepéquez. Passados seis anos, não há como negar um atraso injustificado e irracional na solução do caso. A Irmã Ortiz não logrou êxito nas gestões feitas pelos canais judiciais, diplomáticos e políticos, e o caso permanece ainda no estágio de investigação inicial ("fase de sumário"). Nem os tribunais nem o fiscal iniciaram ações contra qualquer acusado nem se ordenou a detenção de pessoa alguma envolvida no caso. Na Guatemala, ninguém foi levado ao tribunal como responsável pelo acontecido.

 

31. A Irmã Ortiz, apesar de ter partido da Guatemala e fugido para os Estados Unidos pouco depois de ter-se libertado de seus seqüestradores, tentou de diversas maneiras fazer o caso avançar na jurisdição interna, apresentando informações e oferecendo assistência ao Governo da Guatemala na investigação. Suas ações esbarraram na resistência sistemática do Governo, e em muitas ocasiões acarretaram críticas contra ela por parte de funcionários governamentais. Como resultado, tem-lhe sido negado o acesso efetivo a recursos adequados na jurisdição interna, não lhe sendo dada a oportunidade de esgotá-los. Os dados disponíveis não respaldam a afirmação feita pelo Governo em seu relatório de 27 de março de 1995 ("Relatório de 27 de março") de que os recursos da jurisdição interna não foram esgotados porque Dianna Ortiz não regressou a Guatemala para cooperar com a investigação do caso. Os antecedentes indicam que, não obstante os esforços realizados pela Irmã Ortiz, o caso não avançou na jurisdição interna.

 

32. Em 7 de novembro de 1989, a imprensa guatemalteca informou que a Irmã Ortiz fizera uma declaração em que descrevia os fatos relacionados com o seqüestro, a tortura e a liberação final. Como resposta, os funcionários do Governo se apressaram em informar à imprensa que, em sua investigação do caso, não utilizariam as declarações da Irmã Ortiz porque suas alegações podiam ter sido preparadas por pessoas cujo objetivo era colocar a Guatemala em má situação perante a opinião pública./59

 

33. Em 1º de fevereiro de 1990, a Corte Suprema da Guatemala expediu cartas rogatórias ao Ministério das Relações Exteriores do país, as quais, tramitando pelas vias diplomáticas, deveriam ser respondidas pela Irmã Ortiz nos Estados Unidos. Em razão de delongas diplomáticas, a Irmã Ortiz só as recebeu em fevereiro de 1991. Não obstante, ela as respondeu assim que chegaram às suas mãos, expondo os fatos e oferecendo as provas pertinentes ao caso./60

 

34. Em março de 1990, o General Carlos Morales Villatoro, então Ministro do Interior, arquivou oficialmente a investigação do Governo, alegando tratar-se de um caso de "auto-seqüestro". Na ocasião, as cartas rogatórias tinham acabado de ser expedidas pela Corte Suprema da Guatemala, e o gesto do Governo de encerrar o caso significava frustrar no nascedouro o único esforço realizado no sentido de obter uma declaração oficial da Irmã Ortiz. O caso foi reaberto quando delegações internacionais organizadas pelas Irmãs Ursulinas se reuniram com o então Presidente Vinicio Cerezo Arévalo e solicitaram a abrisse ação posterior./61

 

35. Por solicitação da Irmã Ortiz, das Irmãs Ursulinas e de outros membros da comunidade internacional, em junho de 1990 o Presidente Cerezo nomeou uma comissão especial que ficou encarregada da investigação do caso da Irmã Ortiz./62 O Presidente Jorge Serrano Elias, depois de assumir o poder, dissolveu a comissão em abril de 1991./63 Não existe indicação de que a comissão tenha se reunido alguma vez ou de que tenha iniciado qualquer investigação durante sua existência, apesar dos esforços insistentes realizados pelos advogados da Irmã Ortiz e por outros para colocá-la em funcionamento./64

 

36. Segundo o expediente, em dezembro de 1990 o advogado da Irmã Ortiz convidou o Gabinete do Procurador de Direitos Humanos da Guatemala a entrevistar a Irmã Ortiz nos Estados Unidos. O convite não foi aceito. Apesar disso, em outubro de 1991, funcionários do Gabinete do Procurador de Direitos Humanos se reuniram com ela nos Estados Unidos. Posteriormente, prepararam um relatório no qual afirmavam que a entrevista não fora satisfatória porque a Irmã Ortiz tinha estado muito nervosa, o que acabou levando as partes a acertos especiais./65 O Gabinete do Procurador enfatizou essas críticas, apesar de ser compreensível a necessidade de se tomar determinadas providências ao se entrevistar uma suposta vítima de interrogatório por tortura e de a Irmã Ortiz ter apresentado detalhes novos e importantes durante a entrevista./66

 

37. Em julho de 1991, o Governo anunciou o nomeação de um fiscal especial independente para o caso, Fernando Linares Beltranena, e de um investigador privado, Carl West./67 Várias cartas trocadas no final de 1991 entre o advogado da Irmã Ortiz e o Fiscal Especial Linares indicam que este foi convidado em diversas ocasiões a entrevistar-se com a Irmã Ortiz, mas que não aceitou, perdendo uma oportunidade que teria sido fundamental para a investigação. O fiscal insistiu em que a Irmã Ortiz se reunisse com West, mas essa entrevista tampouco se realizou, embora ela tenha aceito, malgrado seus receios, reunir-se com West sem a presença do Fiscal Especial Linares./68

 

38. Em abril de 1992, a Irmã Ortiz viajou para a Guatemala para depor perante os tribunais e participar da investigação do caso. Em 7 de abril de 1992, a Irmã Ortiz depôs durante cerca de 12 horas perante a Juíza Leticia Stella Secaira Pinto do Quinto Juizado de Instrução Criminal./69 No dia seguinte, o Capitão Yon Rivera, porta-voz do Exército guatemalteco, declarou à imprensa que as atividades da Irmã Ortiz para suscitar o caso "poderiam resultar em um processo por difamação."/70

 

39. Durante o tempo em que permaneceu na Guatemala, a Irmã Ortiz manifestou novamente que estava disposta a reunir-se com o investigador West desde que se permitisse a gravação da reunião ou a presença de uma testemunha da Missão Especial do Congresso dos Estados Unidos./71 O Fiscal Especial Linares e West não aceitaram a realização dessa entrevista.

 

40. Desde então, a Irmã Ortiz retornou à Guatemala três vezes — em março de 1993, janeiro de 1994 e novembro de 1994 — para promover a investigação do caso e participar do processo judicial interno. Durante suas estadas na Guatemala, a Irmã Ortiz respondeu a perguntas do fiscal, apresentou descrições detalhadas das pessoas que participaram dos delitos para a elaboração de retratos eletrônicos e participou de vários procedimentos judiciais de reconhecimento. Em um deles, reconheceu a Antiga Escola Politécnica, uma instalação militar, como o lugar de sua detenção./72

 

41. Dianna Ortiz continuou ainda pressionando diversos funcionários guatemaltecos para se chegar à solução do caso. Em novembro de 1994, reuniu-se com o Procurador Geral da Guatemala, Ramsés Cuestas Gómez. O Senhor Cuestas ofereceu-lhe o envio periódico de relatórios sobre a situação de seu caso, promessa que não cumpriu, embora a Irmã Ortiz tenha tentado obtê-los./73

 

42. Pouco depois da abertura do caso e antes de se poder realizar qualquer investigação importante, funcionários do Governo da Guatemala começaram a declarar que as alegações da Irmã Ortiz não eram verídicas ou que não houvera participação de agentes do Governo. Em 9 e 10 de novembro de 1989, a imprensa divulgou que o Presidente Cerezo declarara ter dificuldade em acreditar na história narrada pela Irmã Ortiz e que, no caso de ter havido algum seqüestro, a responsabilidade não era das forças do Governo./74 Em 12 de novembro de 1989, o então porta-voz da Polícia Nacional, Guillermo Mollinedo, anunciou que a Polícia Nacional não participara do seqüestro da Irmã Ortiz./75 A Polícia Nacional descreveu as ações da Irmã Ortiz como tentativas de colocar o país em situação difícil e como manobra política para conseguir recursos para suas atividades./76

 

43. Em novembro de 1989 e janeiro de 1990, o General Alejandro Gramajo, então Ministro de Defesa, fez várias declarações indicando que não houve feridas no caso da Irmã Ortiz ou que ela mesma as tinha causado. A primeira declaração foi feita a uma delegação de representantes religiosos e a segunda ao Americas Watch. O General Gramajo também afirmou que a Irmã Ortiz inventara a história para encobrir sua participação em "um encontro de lésbicas". Sugeriu que as feridas em seu rosto eram resultado de uma aventura amorosa. O General Gramajo retratou-se formalmente e admitiu que as investigações não tinham produzido informações para apoiar suas manifestações./77 Não obstante, continuou fazendo declarações do mesmo teor./78

 

44. Outros funcionários do Governo continuaram manifestando opiniões desabonadoras contra a Irmã Ortiz como represália por sua diligência no caso. Em janeiro de 1994, um porta-voz do Exército, Edith Vargas de Marroquín, manifestou a opinião de que a Irmã Ortiz era portadora de problemas mentais e tinha o vício de mentir./79 Essas declarações foram feitas imediatamente após a Irmã Ortiz ter reconhecido a instalação militar em que presumivelmente esteve detida. Em novembro de 1994, outro porta-voz do Exército, Maurice De León, acusou a Irmã Ortiz na televisão e na imprensa de ser a principal porta-voz das forças da guerrilha na Guatemala./80

 

45. Do que se viu até aqui se conclui que, desde o início, foram postos obstáculos aos esforços conduzidos pela Irmã Ortiz para conseguir na jurisdição interna uma solução para o caso. O Governo dificultou suas ações para agilizar o caso e a atacou pessoalmente para evitar seu acesso aos recursos internos. O Governo não pode afirmar a existência de recursos na jurisdição interna com a simples alegação de que o caso ainda está aberto formalmente, pois, se tivesse havido empenho, ele já estaria resolvido há muito tempo.

 

46. Não se aplica a este caso o disposto no artigo 46, b, da Convenção, que requer que se apresente uma petição no prazo de seis meses a partir da data da decisão definitiva, porque houve isenção da disposição de esgotamento de recursos na jurisdição interna. Em conformidade com o disposto no artigo 38.2 de seu Regulamento, a Comissão conclui que, dadas as circunstâncias, a petição foi apresentada dentro de "um período de tempo razoável... a partir da data em que houver ocorrido a presumida violação dos direitos". Em 18 de abril de 1990, a Comissão fez tramitar a petição, apenas quatro meses depois da data da ocorrência da presumida violação das disposições da Convenção. Por outro lado, a petição foi apresentada um mês depois de o Governo ter anunciado sua decisão inicial de arquivar o caso. Portanto, a Comissão preocupou-se em exercer sua jurisdição em um espaço breve de tempo a partir das ações iniciais do Governo em um caso em que havia indícios de que se colocariam impedimentos ao esgotamento de recursos na jurisdição interna.

 

B. Méritos

 

47. A Comissão conclui que a Irmã Ortiz foi vigiada e ameaçada, e depois seqüestrada e torturada. A análise das provas que sustentam essa conclusão da Comissão é acompanhada por uma exposição em separado relacionada com a conclusão adicional da Comissão de que os responsáveis pelos delitos no caso da Irmã Ortiz foram funcionários do Governo da Guatemala. A Comissão, depois de expor suas observações quanto às violações fundamentais, estende sua opinião a questões de fato relacionadas com a tramitação do caso da Irmã Ortiz no sistema judicial interno da Guatemala. Por último, este relatório da Comissão aplica aos fatos estabelecidos pela Comissão para o presente caso as disposições consagradas na Convenção Americana.

 

1. Decisão sobre questões de fato

a) Decisão da Comissão de que houve violações

48. A Comissão é de opinião que a Irmã Ortiz foi vigiada enquanto realizava seu trabalho na Guatemala e que foi alvo de ameaças. A peticionária Ortiz apresentou cópias de várias das cartas de ameaça que recebeu. Segundo suas declarações, que não foram impugnadas, ela recebeu as cartas em várias cidades da Guatemala, o que demonstra que durante algum tempo foi observada de maneira geral e sistemática. Segundo suas declarações, foi abordada em uma rua da Cidade da Guatemala por um desconhecido que a ameaçou. O Governo não apresentou prova alguma que contradiga essa declaração. O Governo, em sua resposta datada de 15 de fevereiro de 1995 ("Resposta de 15 de fevereiro") e em seu relatório de 15 de maio de 1995 ("Relatório de 15 de maio") observa que não se apresentou queixa contra as ameaças à Polícia Nacional ou aos tribunais da Guatemala. Isso não constitui, porém, prova de que a Irmã Ortiz não tenha recebido ameaças, especialmente tendo-se em vista que nos antecedentes constam cópias das cartas de ameaça.

 

49. A Comissão também é da opinião que a Irmã Dianna Ortiz foi seqüestrada e torturada na Guatemala no início do mês de novembro de 1989. A Comissão analisou as declarações escritas e orais em que a Irmã Ortiz detalha o seqüestro e a tortura. A Comissão opina que a Irmã Ortiz é uma testemunha fidedigna e que suas declarações consistentes apóiam a conclusão de que foi seqüestrada e conduzida a um centro de detenção clandestino onde foi torturada. As declarações da Irmã Ortiz se respaldam em sua capacidade de confirmar seu relato pela via judicial. Na reconstrução judicial de 24 de março de 1993, por exemplo, a Irmã Ortiz pôde reconhecer parte do caminho que "Alejandro" e ela percorreram quando saíram de automóvel do local da detenção. Pôde indicar sinais e placas que reconheceu, alguns dos quais já tinha mencionado em declarações anteriores nos Estados Unidos. Por exemplo, em sua entrevista com o Gabinete do Procurador de Direitos Humanos, a Irmã Ortiz mencionou que acreditava ter visto uma placa indicadora do Banco da Guatemala durante o percurso de automóvel com "Alejandro"./81 No processo judicial de reconhecimento de 24 de março de 1993, identificou a placa sinalizadora do Banco da Guatemala que antes mencionara./82

 

50. Por outro lado, imediatamente após seu reaparecimento, a Irmã Ortiz foi examinada pelo médico David Alcare na Guatemala, que observou feridas em suas costas, da cintura até os ombros, de características simétricas. Concluiu que se tratava de queimaduras de primeiro e segundo graus ocorridas nas 24 horas anteriores./83 Nos Estados Unidos, a Irmã Ortiz foi examinada em 8 de novembro de 1989 pelo Doutor G. R. Gutiérrez, M.D., que atestou a presença de 111 queimaduras circulares de segundo grau nas costas e duas irritações na face esquerda./84

 

51. O Governo, em sua Resposta de 15 de fevereiro e em seu Relatório de 15 de maio, afirmou que a Irmã Ortiz não procurou atendimento médico depois de ter escapado de sua detenção. Os antecedentes que demonstram que ela foi examinada por dois médicos contradizem essas afirmações.

 

52. As alegações de tortura formuladas pela Irmã Ortiz estão apoiadas, além disso, por uma declaração de 1989 do Embaixador dos Estados Unidos na Guatemala, Thomas F. Stroock, que a viu imediatamente após seu reaparecimento. Ele escreveu depois uma carta em que manifesta que sua "observação pessoal [da Irmã Ortiz] indica que tinha sido vítima de espancamentos e maus tratos"./85

 

53. A Comissão considera que existe uma grande probabilidade de que a Irmã Ortiz tenha sido violentada durante o tempo em que esteve detida. As declarações da Irmã Ortiz contêm provas importantes que indicam que ocorreu violação e que esta guarda relação com as provas físicas de que foi brutalmente torturada. Todavia, baseando-se no exame cuidadoso do expediente, a Comissão não se sente em condições de confirmar com a certeza necessária a alegação de violação./86 De todo modo, a Comissão concluiu que a Irmã Ortiz foi objeto de tortura; qualquer violência ou abuso sexual que tenha sofrido faz parte da tortura.

 

54. O Governo admitiu em documentos preparados por seus funcionários que a Irmã Ortiz foi seqüestrada e torturada, embora tenha também manifestado que os responsáveis pelos fatos não foram identificados. O Relatório Valdéz Gutiérrez indica que, posteriormente à investigação realizada pela Polícia Nacional, "se estabeleceu" que a Irmã Ortiz foi seqüestrada e torturada./87 A juíza responsável pelo caso, Irma Leticia Lam Nakakawa de Rojas, em carta dirigida à Corte Suprema da Guatemala, assinalou que os elementos importantes a serem esclarecidos são o lugar em que a Irmã Ortiz foi detida e a identidade das pessoas que perpetraram os delitos./88 A juíza deu por assentada a ocorrência dos delitos alegados.

 

55. Todavia, em sua Resposta de 15 de fevereiro, o Governo argumentou que os fatos aduzidos pela Irmã Ortiz não tinham sido provados, como tampouco fora provada a responsabilidade das pessoas que tinham cometido o presumidos delitos. Em seu Relatório de 15 de maio, o Governo continua apresentando argumentos em apoio à teoria de que não se provaram nem o seqüestro nem a tortura. Os argumentos do Governo não são convincentes à luz das provas competentes que figuram em documentos, relatórios médicos e depoimentos que respaldam as alegações da Irmã Ortiz.

 

56. O Governo apóia sua afirmação de que não se provaram os fatos relacionados com o seqüestro e a tortura da Irmã Ortiz com base no testemunho de duas pessoas que supostamente teriam visto a Irmã Ortiz sair sozinha da Pousada de Belém em 2 de novembro de 1989. A Comissão não dispõe em seus antecedentes das declarações dessas duas testemunhas. As comunicações do Governo que fazem referência a essas declarações se referem a relatórios policiais em que estariam incluídas as citadas declarações. Os relatórios policiais a que as comunicações do Governo fazem referência não foram fornecidos à Comissão./89 Os relatórios da polícia que a Comissão tem em seu poder e que fazem referência às declarações das testemunhas descrevem depoimentos muito menos detalhados do que os indicados nas comunicações do Governo./90 Portanto, deve-se proceder com cautela na avaliação das informações sobre as declarações constantes nas comunicações do Governo. Os relatórios do Governo repetem as observações de relatórios policiais, que não figuram entre os antecedentes da Comissão, os quais, por sua vez, repetem depoimentos de segunda mão das testemunhas.

 

57. A aceitação do depoimento dessas testemunhas apoiaria a teoria de que o seqüestro foi auto-infligido ou montado. Mas essa teoria não respeita as provas médicas que indicam que a Irmã Ortiz sofreu feridas de certa gravidade, entre as quais 111 queimaduras nas costas.

 

58. Existem outras razões pelas quais a Comissão não dá valor às declarações das duas testemunhas. Uma das testemunhas, José Diéguez Castañeda, presumivelmente declarou que trabalhava na Pousada de Belém e que a Irmã Ortiz lhe tinha pedido que abrisse os portões do jardim. Declarou que a viu caminhar para o fundo do jardim, em busca de uma saída para a rua.

 

59. Existe coincidência entre as declarações do Senhor Diéguez e as da Irmã Ortiz no sentido de que ele abriu o portão e de que a Irmã Ortiz caminhou para o fundo do jardim. No entanto, todas as descrições do jardim indicam que sua extensão é grande. O Senhor Diéguez pode ter visto a Irmã Ortiz deslocando-se para a parte de trás do jardim, mas nada indica que ele estivesse em condições de visualizar os fundos do jardim, e provavelmente se trata de uma conjetura a afirmação de que ela procurava uma saída para a rua. O Governo também faz notar que o Senhor Diéguez afirmou que não viu pessoas estranhas esperando no jardim. Também a Irmã Ortiz deixa claro que durante cerca de dez minutos ela esteve sozinha no jardim escutando música, antes da aproximação dos homens que a raptaram. Segundo suas declarações, não havia estranhos visíveis quando o portão foi aberto e ela entrou no jardim.

 

60. Outro fato que coloca em dúvida as afirmações do Senhor Diéguez é que ele não fez mais nenhuma manifestação posterior à de novembro de 1989, descrita pela Polícia Nacional. Não existe qualquer indicação de que o Senhor Diéguez tenha deposto sob juramento ou perante um tribunal, embora o Relatório Valdéz Gutiérrez indique que o fiscal do caso solicitou em 1989 que ele fosse citado para testemunhar. O investigador West tampouco pôde encontrar essa testemunha quando a procurou em outubro de 1991.

 

61. A Comissão observa que há várias incongruências nas descrições apresentadas pela outra testemunha, Carlos Astún Asturias. Segundo as informações que a Comissão tem em sua poder, Carlos Astún Asturias fez várias descrições da Irmã Ortiz e da roupa que vestia no dia 2 de novembro, incorrendo em algumas contradições./91 No entanto, em nenhuma de suas descrições o Senhor Astún Asturias afirma que a Irmã Ortiz estava com uma blusa azul de ginástica, que ela declarou que vestia quando foi seqüestrada. Segundo o Relatório West, os funcionários da Agência de Viagens Hayter confirmaram que ela estava com uma camisa de ginástica quando apareceu em sua loja depois de ter escapado da detenção. Portanto, a descrição que o Senhor Astún Asturias fez da roupa não coincide com aquela que a Irmã Ortiz vestia quando foi seqüestrada e quando reapareceu.

 

62. A descrição do Senhor Astún Asturias concorda com a da Irmã Darleem Chmielewski à Polícia Nacional imediatamente após o desaparecimento da Irmã Ortiz./92 A descrição da Irmã Chmielewski não menciona a blusa de ginástica provavelmente porque ela desconhecia que a Irmã Ortiz a vestira depois de tê-la visto. A Polícia Nacional obteve a declaração do Senhor Astún Asturias antes do reaparecimento da Irmã Ortiz, no mesmo dia em que a Irmã Chmielewski descreveu à Polícia a Irmã Ortiz e a roupa que acreditava que ela estivesse vestindo. Portanto, há razões para se inferir que a Polícia instruiu o Senhor Asturias antes de ele fazer sua declaração.

 

63. Além disso, a Polícia Nacional informou à imprensa guatemalteca que Astún Asturias declarara que a Irmã Ortiz estava com um "chaleco de lona" (colete de lona)/.93 Em nenhuma outra descrição da roupa que a Irmã Ortiz usava se menciona que ela endossasse um colete de lona no dia de seu seqüestro. Mas a descrição da Irmã Chmielewski à Polícia revela que a Irmã Ortiz colocara um "chale de lã"/94. Quando se examina as declarações, constata-se que o depoimento do Senhor Astún Asturias coincide mais de perto com a descrição em poder da Polícia do que com a roupa verdadeira da Irmã Ortiz. A Comissão é de opinião que as declarações do Senhor Astún Asturias se basearam na descrição feita pela Irmã Chmielewski à Polícia, e não no registro de um fato que ele tenha presenciado.

 

64. Além disso, segundo o Relatório Valdéz Gutiérrez, em 1989 o Senhor Astún Asturias foi citado para depor, mas não compareceu. A Polícia não conseguiu encontrar a testemunha. Segundo o Relatório West, várias pessoas teriam dito que o Senhor Astún Asturias era um vagabundo. O investigador West não conseguiu localizá-lo para entrevistá-lo na busca que realizou em outubro de 1991. Em sua Resposta de 15 de fevereiro, o Governo indica que Astún Asturias compareceu em 8 de abril de 1992 ao procedimento judicial de reconstituição, mas a ata desse procedimento não foi fornecida à Comissão./95

 

65. O Governo, em sua Resposta de 15 de fevereiro, alega em apoio à sua afirmação de não-comprovação do seqüestro e da tortura que as declarações da Irmã Ortiz demonstram que não houve violência nem uso de força no presumido seqüestro. Neste sentido, o Governo lança dúvida quanto ao achado posterior de alguns objetos pessoais da vítima no jardim. O Governo sugeriu, por meio da imprensa guatemalteca, que os objetos encontrados poderiam ter sido colocados lá de forma intencional para dar maior realismo ao relato do seqüestro./96 O Governo, em seu Relatório de 15 de maio de 1995, reitera o argumento de que as declarações da Irmã Ortiz levam à conclusão de que não houve violência ou uso de força no presumido seqüestro. É possível que o argumento do Governo se baseie no fato de que a Irmã Ortiz não foi arrancada à força da Pousada de Belém.

 

66. Na declaração da Irmã Ortiz citada pelo Governo, ela menciona que seus seqüestradores lhe mostraram uma arma e ameaçaram machucar seus amigos caso se recusasse a segui-los. A Comissão é de opinião que houve seqüestro, independentemente de ter havido contato físico ou violência, porque a Irmã Ortiz foi conduzida para fora da Pousada de Belém contra sua vontade e sob ameaça de violência a sua pessoa e a outros. De qualquer forma, as declarações citadas pelo Governo indicam que se utilizou força física no seqüestro. A Irmã Ortiz explicou que o primeiro homem, que ela vira em uma rua da Cidade da Guatemala, a pegou pelo braço. Quando o homem insistiu que ela os acompanhasse, a Irmã Ortiz se negou e tentou escapar. Então, o homem lhe mostrou a arma e ela parou de lutar.

 

67. As notícias da imprensa e o Relatório West indicam que as religiosas da Pousada de Belém encontraram o chale usado pela Irmã Ortiz e que a Irmã Chmielewski descreveu à Polícia Nacional poucas horas depois de seu desaparecimento./97 Mais tarde, os jornalistas do jornal Prensa Livre encontraram um relógio no jardim./98 Também se achou no jardim a Bíblia da Irmã Ortiz./99 A luta física entre a Irmã Ortiz e seu seqüestrador teria sido suficiente para que seu relógio se soltasse do pulso. No contexto do seqüestro, é igualmente coerente com a declaração da Irmã Ortiz o fato de terem ficado no jardim o chale e a Bíblia quando a conduziram para fora do recinto. O Governo fala ainda que os jornalistas do Prensa Livre encontraram um anel, mas a Comissão não dispõe de informações que corroborem esse achado. O artigo publicado no Prensa Livre que informa que um jornalista encontrou o relógio não faz referência ao anel./100

 

b) Decisão da Comissão de que agentes do Governo foram responsáveis pelas violações

68. Na opinião da Comissão, os atos do caso da Irmã Ortiz foram perpetrados por agentes do Governo da Guatemala, que atuaram na qualidade de representantes do Estado. Essa conclusão se baseia em provas que constam do expediente que indicam claramente que um policial fardado participou das ações contra a Irmã Ortiz e que ela ficou detida em uma instalação militar. Da mesma forma, a documentação comprova que, antes do seqüestro, a Irmã Ortiz foi objeto de vigilância que, por sua natureza, somente poderia ter sido executada pelo Governo da Guatemala. Por último, o seqüestro e a tortura da Irmã Ortiz se enquadram no rol das atividades cometidas pelo Governo da Guatemala em violação aos direitos humanos.

 

69. As declarações fidedignas da Irmã Ortiz indicam que foi levada ao centro de detenção em um automóvel da polícia dirigido por um policial uniformizado, que também participou de sua tortura. No curso de um procedimento judicial de reconhecimento, a Irmã Ortiz reconheceu o tipo de automóvel utilizado para conduzi-la ao local da detenção./101 Também durante um procedimento judicial de reconhecimento, a Irmã Ortiz reconheceu o lugar em que esteve detida e foi torturada. A Irmã Ortiz reconheceu o edifício da Antiga Escola Politécnica, uma instalação militar da Cidade da Guatemala, como o lugar de sua detenção e tortura./102

 

70. O Governo contestou a alegação da Irmã Ortiz de que a Polícia Nacional tenha participado dos delitos de que foi vítima. A Comissão não julga as provas apresentadas pelo Governo para respaldar este argumento convincentes.

 

71. Em primeiro lugar, em sua Resposta de 15 de fevereiro e em seu Relatório de 15 de maio, o Governo afirma que nenhum dos carros de patrulha da Polícia Nacional tem o número que a Irmã Ortiz menciona em suas declarações. O Governo afirma que a Irmã Ortiz declarou que no meio do número de identificação do automóvel de patrulha que a levou figurava o "7". Segundo relatórios da Polícia Nacional mencionados pelo Governo, nenhum automóvel de patrulha da Polícia Nacional na Guatemala tem o número "7" entre os três números que habitualmente os identificam. Esta contradição poderia constituir uma prova, ainda que por si só não suficiente, contra a alegação formulada pela Irmã Ortiz de que foi conduzida ao centro de detenção em um automóvel de patrulha da Polícia Nacional. Entretanto, a contradição que o Governo assinala não é clara.

 

72. Nas traduções para o espanhol de declarações da Irmã Ortiz em vários processos perante os tribunais da Guatemala, diz-se que ela afirmou que o número "7" figurava no meio dos números que identificavam o carro de patrulha em que foi transportada./103 No entanto, em outras declarações em inglês que prestou na mesma época, ela afirmou que um dos números do automóvel era o "7"./104 Esta confusão nas declarações da Irmã Ortiz podem ser atribuídas a dificuldades de tradução de seus depoimentos em inglês no tribunal da Guatemala. Embora a Irmã Ortiz tenha sobrenome espanhol, o espanhol não é o seu idioma nativo e ela não fala bem essa língua. Em sua declaração de 25 de março de 1995 perante o tribunal guatemalteco, a Irmã Ortiz esclareceu que não podia indicar a casa que ocupava o "7" entre os números de identificação do automóvel de patrulha./105 A Comissão observou que alguns dos carros de patrulha da Cidade da Guatemala e zonas circunjacentes têm o número "7" entre os seus três números.

 

73. Em segundo lugar, o Governo também procura demonstrar que não houve participação de agentes da Polícia Nacional no seqüestro e tortura da Irmã Ortiz com base em um relatório da Polícia Nacional que indica que, no dia do seqüestro, nenhum patrulheiro foi designado para cobrir a estrada entre Antígua e a Cidade da Guatemala./106 A Irmã Ortiz alegou, e a Comissão concluiu, que ela foi seqüestrada e torturada. Na opinião da Comissão, seria muito improvável que a Polícia Nacional tivesse designado formalmente um automóvel de patrulha para participar do seqüestro da Irmã Ortiz e que deixasse isso documentado nos registros oficiais.

 

74. O Governo argumentou, além disso, que a Irmã Ortiz não pôde comprovar que foi detida no interior da Antiga Escola Politécnica porque ela não teria podido completar o reconhecimento judicial naquele lugar. O documento do tribunal em que consta o procedimento judicial de reconhecimento assinala que a Irmã Ortiz não pôde concluí-lo porque sofreu um ataque nervoso ao entrar no edifício e reconhecê-lo como o lugar em que esteve detida./107 Sua reação só faz confirmar a conclusão de que seu reconhecimento do lugar de detenção é fidedigno. O reconhecimento da Irmã Ortiz está respaldado, além disso, no fato de que, em uma ocasião anterior, em outro procedimento judicial de reconhecimento, ela já tinha identificado a fachada da Escola Politécnica como possível lugar de sua detenção./108

 

75. O Governo observou que a Juíza Lamnakakawa de Rojas, à frente do processo, não pôde localizar lugares de detenção clandestina no edifício. Isso não constitui prova adequada de que a Escola Politécnica não tenha sido o local em que a Irmã Ortiz esteve detida. O documento que contém os detalhes do processo indica especificamente que a juíza inspecionou somente os quartos em uso, e não todo o edifício./109

 

76. A opinião da Comissão de que os responsáveis pelos atos contra a Irmã Ortiz foram agentes do Governo apóia-se também nas provas contidas no expediente de que durante um longo período ela foi mantida sob vigilância estrita. Os agentes das forças de segurança da Guatemala são provavelmente os únicos que contavam com os recursos necessários para manter uma vigilância tão prolongada.

 

77. A Irmã Ortiz recebeu cartas de ameaça em várias partes do país por onde andou. Poucos dias depois de seu regresso a Guatemala, procedente dos Estados Unidos, em setembro de 1989, recebeu por escrito uma ameaça de morte. Isso demonstra que as pessoas que a vigiavam e ameaçavam tiveram conhecimento, quase que de imediato, de que voltara a entrar no país. Além disso, em suas declarações, a Irmã Ortiz afirmou que durante o interrogatório e a tortura lhe mostraram fotos em que ela aparecia em diversas partes do país. A primeira fotografia fora tirada em setembro de 1987, poucas semanas depois de sua chegada à Guatemala. Uma das fotografias era da Irmã Ortiz e suas companheiras no centro de retiro de Antígua, tirada poucos dias antes de seu seqüestro. A participação das forças de segurança do Governo também é corroborada pelas declarações da Irmã Ortiz de que havia efetivo militar do Exército guatemalteco em vários dos povoados em que as fotografias foram tiradas. O Governo não desmentiu essas declarações.

 

78. O fato de os seqüestradores terem apresentado à Irmã Ortiz durante o interrogatório fotografias tiradas no período em que esteve vigiada demonstra que existe uma conexão entre essas fotos e a vigilância sistemática e as ameaças de que foi objeto. A prova dessa conexão também surge das declarações da Irmã Ortiz sobre sua conversa com "Alejandro", o homem que a tirou do centro de detenção. "Alejandro" admitiu a relação entre os seqüestradores e as cartas de ameaça quando lhe deu a entender que tinham tentado alertá-la e que ela deveria ter prestado mais atenção às ameaças.

 

79. A confirmação da participação do Estado é reforçada pela documentação que comprova que os ataques à Irmã Ortiz concordam com o modelo de tratamento repressivo do Governo. No sistema interamericano de direitos humanos, é possível comprovar a participação do Governo nos abusos perpetrados contra uma vítima quando se demonstra que o Governo seguiu uma prática de violação de direitos humanos, ou a tolerou, desde que seja possível estabelecer um vínculo entre o caso da vítima e a prática do Governo/.110

 

80. O Governo empreendeu uma modalidade de repressão que afeta representantes da Igreja e outros que trabalham em favor dos pobres e dos grupos indígenas./111 Phillip Berryman, especialista em história da Igreja na América Central, chegou à conclusão de que as Forças Armadas da Guatemala responsabilizam a Igreja pelo não-conformismo ou pela oposição. Sua opinião apóia-se em uma publicação do Departamento de Relações Públicas do Exército que afirma que "alguns ativistas religiosos — tanto de igrejas católicas como protestantes — doutrinaram os camponeses para que estes, imbuídos de novas idéias e princípios religiosos avalizados pela autoridade daqueles que as propunham, deslegitimassem as bases do sistema democrático"./112 A Comissão também observou que os grupos rurais indígenas e as pessoas que trabalham com eles são com freqüência considerados injustamente pelo Governo como seus inimigos ou cúmplices do movimento subversivo armado./113

 

81. Dianna Ortiz estava na Guatemala como representante de uma igreja que trabalhava com grupos de indígenas pobres de Huehuetenango. As provas evidenciam que, pelo menos em parte, Dianna Ortiz foi atacada por seu trabalho e sua participação. Segundo suas declarações, o homem que a abordou na rua na Cidade da Guatemala lhe disse que sabiam quem ela era e que estava trabalhando em Huehuetenango. O mesmo homem a seqüestrou depois com a ajuda de outras pessoas.

 

82. Além disso, a Irmã Ortiz foi abordada pela primeira vez nas ruas da Cidade da Guatemala depois de ter sido vista conversando com pessoas que participavam de uma greve de professores na Cidade da Guatemala. Na mesma época, a Irmã Ortiz freqüentava uma escola de idiomas que combinava a instrução com a experiência de viver no lar de uma família guatemalteca. Ela estava hospedado com a família de Rosa Pu e Miguel Pajarito, cujos membros pertenciam ao Grupo de Apoio Mutuo ("GAM"). Segundo as declarações da Irmã Ortiz, Miguel Pajarito desapareceu depois e não foi mais encontrado desde seu seqüestro em 1990.

 

83. A Comissão e outros peritos analisaram o modelo de violência do Governo da Guatemala dirigida contra professores e grupos de direitos humanos, incluindo o GAM./114 Dos fatos deste caso e da trajetória de violência na Guatemala pode deduzir-se que a Irmã Ortiz foi atacada por elementos do Governo que a associaram a grupos e pessoas que ele queria controlar e intimidar.

 

84. Finalmente, de acordo com o depoimento pericial que figura nos antecedentes em poder da Comissão, a maneira como a Irmã Ortiz foi vigiada e seu seqüestro e torturas posteriores concordam com os métodos utilizados pelo Governo na época em que se cometeram esses delitos contra ela. Em uma declaração que figura no expediente, Alham Nairn, especialista em forças armadas e de segurança e nos problemas de abuso dos direitos humanos na Guatemala, afirma que as forças do serviço de inteligência militar da Guatemala seguiam habitualmente a prática de enviar ameaças escritas e tirar fotos durante procedimentos de vigilância na época em que a Irmã Ortiz foi alvo de atividades dessa natureza./115 Nairn também revela que a inteligência guatemalteca, as forças G-2, costumavam usar agentes da polícia para seqüestrar e torturar suas vítimas./116

 

c) Decisão da Comissão com relação aos processos judiciais internos

85. O Governo não contesta que o processo judicial do caso de Dianna Ortiz na jurisdição interna se encontra ainda na etapa inicial de investigação e que não foram feitas prisões nem formuladas acusações. O Governo argumentou, na Resposta de 15 de fevereiro, no Relatório de 15 de maio e no Relatório de 27 de março, bem como por meio da imprensa guatemalteca, que o processo interno não avançou devido à falta de cooperação por parte da Irmã Ortiz na investigação. Como se descreve na seção acima sobre admissibilidade, a Irmã Ortiz fez numerosos esforços para colaborar com a investigação do caso, tanto no âmbito dos processos judiciais como fora dele. O Governo tampouco explicou de que informações necessitava e a que não pôde ter acesso devido à presumida falta de colaboração da Irmã Ortiz.

 

86. Em seu Relatório de 27 de março, o Governo da Guatemala afirmou que Dianna Ortiz "não regressou à Guatemala" para apresentar provas no processo. A verdade é que a Irmã Ortiz esteve na Guatemala em quatro ocasiões para participar de procedimentos perante os tribunais e das ações de investigação. Apresentou depoimento nos tribunais guatemaltecos, participou dos procedimentos judiciais de reconhecimento e ofereceu descrições detalhadas das pessoas que ela acusa como responsáveis pelos delitos para a preparação de retratos eletrônicos.

 

87. O Governo, em sua Resposta de 15 de fevereiro, aduziu vários fatos para apoiar sua afirmação de que a Irmã Ortiz não ofereceu colaboração. Em primeiro lugar, o Governo indicou que a Irmã Ortiz só depôs sobre o caso depois de decorridos dois anos e cinco meses da data da agressão. O Governo refere-se à declaração que a Irmã Ortiz prestou em 7 de abril de 1992 na Cidade da Guatemala no Juízo de Instrução Criminal de Primeira Instância.

 

88. Não é correta a afirmação do Governo de que a declaração de 7 de abril de 1992 foi a primeira que a Irmã Ortiz prestou. Os artigos publicados na imprensa guatemalteca demonstram que os funcionários do Governo tinham em seu poder uma declaração que ela fez poucos dias depois de seu reaparecimento. Por outro lado, a Irmã Ortiz fez uma declaração formal aos tribunais guatemaltecos assim que recebeu uma solicitação neste sentido por meio das cartas rogatórias emitidas nos Estados Unidos em fevereiro de 1991./117

 

89. Depois, o juiz do tribunal com jurisdição no caso e o fiscal especial designado para o caso afirmaram que, devido a uma questão de jurisdição, a resposta da Irmã Ortiz às cartas rogatórias não eram válidas perante os tribunais da Guatemala./118 No entanto, as cartas rogatórias foram expedidas pela Corte Suprema da Guatemala e claramente não teriam sido enviadas se a resposta a elas não tivesse validade perante os tribunais. De todo modo, independentemente da legitimidade formal da declaração da Irmã Ortiz, os funcionários guatemaltecos tiveram acesso a ela e poderiam tê-la utilizado para iniciar ou fazer avançar a investigação do caso.

 

90. O Governo também afirmou em sua Resposta de 15 de fevereiro que a declaração da Irmã Ortiz de 8 de abril de 1992 careceu de espontaneidade por fazer referência a sua declaração original nos Estados Unidos. Em seu comentário, o Governo cita os documentos do tribunal sobre o processo. No entanto, o Governo omite a citação da parte do documento em que o Fiscal Especial Linares indica que a Irmã Ortiz atuou no exercício pleno de seus direitos ao referir-se a sua declaração anterior./119 O Governo também não cita quais disposições da legislação guatemalteca impedem que a Irmã Ortiz faça referência ao documento e não existe qualquer indicação de que ela tenha sido instruída a esse respeito.

 

91. Em sua Resposta de 15 de fevereiro, o Governo afirma que a Irmã Ortiz deixou de participar dos procedimentos judiciais de reconhecimento que tiveram lugar na Pousada de Belém e na Antiga Escola Politécnica. O Governo observa que os procedimentos não foram levados a cabo porque a Irmã Ortiz desmaiou e se indispôs. Na opinião da Comissão, a técnica de investigação utilizada na Guatemala, o reconhecimento judicial, é um procedimento sumamente difícil para uma vítima que alega ter sido seqüestrada, torturada e violentada. As ações da Irmã Ortiz demonstram, ao contrário, a vontade de passar por cima de seu temor e desconforto pessoal para colaborar plenamente na investigação de seu caso, e não falta de cooperação de sua parte.

 

92. Em seguida, o Governo afirma que não existe atestado médico das feridas e queimaduras da Irmã Ortiz no expediente do caso na jurisdição interna. O Relatório Valdéz Gutiérrez contradiz esta afirmação do Governo. Esse Relatório revela que o expediente do caso na jurisdição interna contém os atestados dos exames médicos realizados pelos médicos David Alcare e Gutiérrez, que afirmam que a Irmã Ortiz sofreu lesões. A carta do Doutor Gutiérrez foi enviada junto com a resposta da Irmã Ortiz às cartas rogatórias no início de 1991. A Irmã Ortiz não se apresentou a um exame que deveria ter ocorrido em 23 de março de 1993 na Guatemala. Todavia, este fato não invalida o valor probatório dos exames médicos anteriores, realizados em datas mais próximas dos fatos.

 

93. Por último, em sua Resposta de 15 de fevereiro o Governo afirma que a Irmã Ortiz não colaborou quando o fiscal lhe fez 10 perguntas relacionadas com sua declaração no curso do contra-interrogatório. O Governo não esclarece em que procedimento aconteceu a presumida falta de colaboração nem apresenta documentos ou provas que apóiem seu argumento.

 

94. A peticionária Ortiz afirmou que, depois de sua declaração de 7 de abril de 1992, o Fiscal Especial Linares lhe fez uma série de perguntas irrelevantes e degradantes, e que ela se recusou a submeter-se a ataques pessoais. Em 25 de março de 1993, a Irmã Ortiz participou de um procedimento de interrogatório judicial perante o tribunal, durante o qual o gabinete do fiscal formulou perguntas. A Irmã Ortiz recusou-se a responder a algumas delas. Os fiscais tentaram fazer a Irmã Ortiz responder a perguntas sobre a cor da tinta empregada nas cartas de ameaça, e outras parecidas, que não contribuíam para esclarecer os fatos do caso. Em algumas das perguntas lhe foram solicitadas informações que ela já tinha fornecido nas declarações orais e escritas perante o tribunal. A Comissão dispõe do documento em que constam as perguntas e respostas e é de opinião que as perguntas, em tom repetitivo, tinham o objetivo de atormentar a depoente./120 As respostas da Irmã Ortiz não demonstraram falta de colaboração.

 

95. A Comissão conclui que o Governo, e não a Irmã Ortiz, é o responsável pelo fato de não se ter avançado na resolução do caso na jurisdição interna. Embora tenham sido abertos vários processos judiciais e de investigação relacionados com o caso da Irmã Ortiz, o Governo omitiu a realização das investigações que teriam sido adequadas para esclarecer os fatos. Não há indicação alguma no expediente de que as Forças Armadas guatemaltecas tenham investigado as acusações contra elas, o mesmo acontecendo com relação a outras forças de segurança do Governo. O Governo, em seu Relatório de 15 de maio de 1995, revelou que o Grupo Especial de Investigação da Polícia Nacional designado para averigaur o caso nunca apresentou relatório aos tribunais./121

 

96. No expediente não há indícios de que as Forças Armadas e a Polícia Nacional tenham realizado as investigações básicas que teriam sido apropriadas neste caso. Não há, por exemplo, nenhuma prova de que se tenha investigado a acusação da existência de um centro de detenção clandestino em uma instalação militar na Cidade da Guatemala nem de que se tenha verificado quais as unidades militares que se encontravam nas zonas em que foram tiradas as fotografias da Irmã Ortiz. O tribunal com jurisdição no caso enviou uma solicitação a vários departamentos das forças de segurança da Guatemala, pedindo a lista dos norte-americanos que tinham trabalhado com essas agências. No entanto, não há indicação alguma de que as Forças Armadas ou a Polícia Nacional tenham realizado investigações independentes para determinar se algum norte-americano de traços semelhantes à descrição de "Alejandro" trabalhou com as forças de segurança da Guatemala, de maneira aberta ou disfarçada. A Polícia Nacional, depois de informar que nenhum dos automóveis de patrulha tinha um "7" situado no centro de seus números de identificação, não procedeu à realização de investigações posteriores, como entrevistar os policiais designados para os carros de patrulha que têm um número "7" em algum dos dígitos do número de identificação.

 

97. O Procurador Geral da Guatemala, Ramsés Cuestas Gómez, confirmou que as forças de segurança da Guatemala não realizaram as investigações devidas. Dianna Ortiz, em uma declaração jurada, relatou as declarações de Ramsés Cuestas durante uma entrevista que mantiveram./122 O Procurador Geral afirmou que o caso não avançara porque as Forças Armadas da Guatemala não tinham a vontade política de realizar uma investigação exaustiva para estabelecer se havia militares envolvidos no incidente. Também notou que tinham surgido dificuldades para se conseguir acesso às instalações militares e investigar as ações do pessoal militar. O Procurador Geral observou que o juiz encarregado do caso não obtivera êxito ao solicitar informações às Forças Armadas.

 

98. O Gabinete do Ombudsmam de Direitos Humanos realizou algumas investigações sobre o caso. No entanto, segundo as declarações da Irmã Ortiz na audiência perante a Comissão em 3 de fevereiro de 1995, ela fora informada de que seu expediente se perdera no Gabinete do Ombudsmam ou que o Presidente Ramiro de León Carpio o retirara quando se afastou desse gabinete e assumiu a Presidência da Guatemala.

 

99. A Comissão observou que o processo judicial do caso na jurisdição interna esteve a cargo de seis juízes diferentes — dois em Antígua e quatro na Cidade da Guatemala. O Relatório Valdéz Gutiérrez e o de outro fiscal, Luis Fernando Mérida, indicam que houve pelo menos quatro fiscais distintos que trabalharam no caso./123

 

100. Na opinião da Comissão, o Fiscal Especial Linares não cumpriu devidamente seus deveres de fiscal imparcial./124 Embora se tenha alegado que sua nomeação, com a assistência do investigador West, aceleraria o processo de investigação e a resolução do caso, nada disso aconteceu. Linares só foi investido da faculdade para realizar as ações necessárias no caso em 2 de fevereiro de 1992, ou seja, seis meses depois de sua nomeação.

 

101. As ações do fiscal se orientaram mais no sentido de desacreditar a Irmã Ortiz do que no de fazer o caso avançar. Uma declaração do Fiscal Especial Linares à imprensa em 3 de abril de 1992 demonstra sua falta de interesse em desempenhar a responsabilidade de investigar e fazer o caso andar de maneira imparcial. Linares declarou que a Irmã Ortiz deveria "provar a veracidade dos fatos de ameaça, seqüestro, violação e tortura, e de nenhuma maneira permitir que seu advogado ... procure dar um cunho político a um caso que deveria ser estritamente judicial"./125 O teor das ações e declarações de Linares transferiu do Governo para a Irmã Ortiz o ônus de prosseguir e provar o caso. Ao mesmo tempo, deu a entender que o interesse da Irmã Ortiz em fazer o caso andar podia ter origem em motivos de índole política.

 

102. Em três ocasiões diferentes, a imprensa guatemalteca publicou declarações do Fiscal Especial Linares indicando que a Irmã Ortiz não participara da investigação do caso e que não depusera perante os tribunais da Guatemala. Essas declarações foram publicadas em 1º de março de 1992, 20 de fevereiro de 1992 e 8 de abril de 1992 (no mesmo dia em que a Irmã Ortiz apresentou depoimento perante o tribunal). Essas declarações foram publicadas depois de a Irmã Ortiz ter enviado uma declaração formal aos tribunais na forma de resposta às cartas rogatórias.

 

103. O Fiscal Especial Linares também informou nas declarações publicadas que a Irmã Ortiz não tinha permitido ao investigador West que a entrevistasse nos Estados Unidos, apesar do convite que ela fez a ambos para uma entrevista naquele país. Essa entrevista nunca se realizou pela falta de vontade do fiscal e do investigador de aceitar o convite ampliado./126

 

104. O Fiscal Especial Linares mencionou reiteradamente em entrevistas à imprensa que a Irmã Ortiz não tinha se submetido a um exame ginecológico./127 As declarações de Linares se concentraram limitadamente na alegação de que fora violentada, tema sensível e de alto conteúdo moral, e não no caso geral de seqüestro e tortura que estava bem documentado. Por outro lado, Linares continuou exigindo que a Irmã Ortiz se submetesse a um exame ginecológico anos depois das presumidas torturas e violações. A essa altura, o exame teria sido inútil, prestando-se mais a intentos vexatórios do que ao andamento do processo em si./128

 

105. Embora ambos afirmem que investigaram o caso da melhor maneira possível, nem Beltranena nem West chegaram a qualquer conclusão sobre o caso. Em 1993, Linares foi designado para o Congresso guatemalteco e deixou seu cargo de Fiscal Especial, e o Governo não nomeou ninguém para ocupar seu lugar. Tampouco os outros fiscais nomeados que trabalharam no caso conseguiram fazê-lo avançar.

 

2. Conclusões de direito

 

a) Artigo 5. Direito à Integridade Pessoal e a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura

106. O artigo 5.1 da Convenção estipula que toda pessoa tem direito a que "se respeite sua integridade física, psíquica e moral". Os agentes do Governo da Guatemala atacaram a integridade física, moral e psíquica de Dianna Ortiz quando a ameaçaram por meio de cartas e do confronto pessoal, veiculando mensagens de que ela seria o alvo de uma agressão e que deveria sair do país.

 

107. O artigo 5.2 enuncia especificamente que "ninguém deve ser submetido a torturas nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada da liberdade deve ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano. "Os agentes do Governo que seqüestraram, prenderam e torturaram a Dianna Ortiz praticaram ações de flagrante violação do artigo 5.2 da Convenção.

 

108. A Comissão observa também que o Governo da Guatemala ratificou a Convenção Interamericana para Prevenir e Punir a Tortura ("a Convenção sobre Tortura") em 29 de janeiro de 1987. O artigo 2 desta Convenção define a tortura como:

 

todo ato pelo qual são infligidos intencionalmente a uma pessoa penas ou sofrimentos físicos ou mentais, com fins de investigação criminal, como meio de intimidação, como castigo pessoal, como medida preventiva, como pena ou com qualquer outro fim. Entender-se-á também como tortura a aplicação sobre uma pessoa, de métodos tendentes a anular a personalidade da vítima, ou a diminuir sua capacidade física ou mental, embora não causem dor física ou angústia psíquica.

109. O trato desumano que a Irmã Ortiz sofreu nas mãos de agentes do Governo da Guatemala se enquadra nessa definição de tortura. Os agentes do Governo infligiram sofrimento físico e mental a Dianna Ortiz, presumivelmente para castigá-la e intimidá-la por sua participação em certas atividades e por sua associação com certas pessoas e grupos. A tortura aplicada a Dianna Ortiz assemelha-se muito à descrição de métodos utilizados para "anular a personalidade da vítima". A Irmã Ortiz foi seqüestrada de um retiro religioso, separada de sua vida de trabalhadora religiosa e escondida em um centro de detenção, no qual foi torturada. A Irmã Ortiz afirmou que a experiência da tortura destruiu sua personalidade e explicou que suas conseqüências mentais e sociais a impediram de participar das atividades cotidianas e retomar sua vida normal.

 

b) Artigo 7. Direito à Liberdade Pessoal

 

110. O artigo 7 da Convenção Americana dispõe que não se pode privar ninguém da liberdade, a não ser por causas e em condições fixadas previamente pela lei. O artigo 7.3 dispõe especificamente que "[n]inguém pode ser submetido a detenção ou encarceramento arbitrários". Os agentes do Governo da Guatemala violaram o artigo 7 da Convenção Americana.

 

111. O Governo nunca admitiu que a Irmã Ortiz foi detida e mantida como prisioneira por agentes do Estado. A Irmã Ortiz identificou a Antiga Escola Politécnica, uma instalação militar, como o lugar de sua detenção. Apesar disso, o Governo continuou negando que ela tenha estado detida na Escola Politécnica e que nesse edifício funcionasse um centro de detenção. Entretanto, a Comissão já manifestou em outras ocasiões sua opinião de que agentes do Governo da Guatemala seqüestraram pessoas e as mantiveram em prisões clandestinas localizadas em instalações militares, embora esses fatos tenham sido sempre negados./129 No presente caso, a Comissão conclui que a Irmã Ortiz esteve detida em um desses centros de detenção militares clandestinos.

 

112. Como os agentes do Estado têm insistentemente negado o fato da detenção e a existência de prisões clandestinas, a detenção foi necessariamente secreta e fora dos limites da lei, violando o artigo 7 da Convenção. A Comissão é de opinião que a existência de centros de detenção clandestinos na Guatemala constitui motivo de séria preocupação.

 

113. A detenção em prisões clandestinas é uma forma especialmente grave de privação arbitrária da liberdade. As ações dos agentes do Governo que participam de atividades dessa natureza transcendem as fronteiras da lei e, por serem secretas, não estão sujeitas a exame. Eles têm que negar o seqüestro ou a existência do lugar da detenção para proteger-se e manter o segredo de toda a operação. Em geral, a vítima consegue perceber poucos detalhes relacionados com o lugar da detenção, ou com seus seqüestradores, e não está em condições de fazer identificações. Para a vítima, além de ser impossível exercer seus direitos legais durante a detenção, será muito difícil enfrentar as autoridades se conseguir ser posta em liberdade com vida.

 

114. Quando uma vítima é seqüestrada por agentes públicos, o Estado também viola o direito da vítima de ser levada, sem demora, perante um juiz e de interpor os recursos adequados para verificar a legalidade de sua prisão, que infringe o artigo 7 da Convenção Americana./130

 

c) Artigo 11. Proteção da Honra e da Dignidade

 

115. O artigo 11.1 da Convenção Americana afirma que "[t]oda pessoa tem direito ao respeito de sua honra e ao reconhecimento de sua dignidade". O artigo 11.2 dispõe que "[n]inguém pode ser objeto de ingerências arbitrárias ou abusivas em sua vida privada, na de sua família, em seu domicílio ou em sua correspondência, nem de ofensas ilegais à sua honra ou reputação".

 

116. Os agentes do Governo interferiram arbitrária e abusivamente na vida privada da Irmã Ortiz, em violação do disposto no artigo 11.2, quando a mantiveram sob vigilância, enviando-lhe cartas de ameaça para onde quer que ela viajasse na Guatemala. Os agentes do Governo atacaram a honra e dignidade da Irmã Ortiz, infringindo o consagrado no artigo 11.1, quando a seqüestraram violentamente e a torturaram.

 

117. Além disso, altos funcionários do Governo violaram as disposições do artigo 11.1 atacando a honra e a reputação da Irmã Ortiz de maneira reiterada e arbitrária, ao declarar que suas alegações eram uma história preparada, que forjara seu próprio seqüestro e que trabalhava com grupos que tinham como objetivo colocar a Guatemala em má situação. São especialmente graves as declarações de funcionários do Governo que afirmam que as feridas da Irmã Ortiz resultaram de um encontro amoroso, provavelmente de lésbicas. Essas declarações constituíram uma ofensa grave à honra e à reputação da Irmã Ortiz, baseada em grande parte em seu trabalho como religiosa católica dedicada a melhorar as condições de vida de grupos indígenas pobres na Guatemala.

 

d) Artigos 12 e 16. Liberdade de Consciência e de Religião e Liberdade de Associação

118. O artigo 12 da Convenção Americana consagra o direito à liberdade de consciência e de religião. O artigo 16 afirma que "(t)odas as pessoas têm o direito de associar-se livremente com fins ideológicos, religiosos, políticos, econômicos, trabalhistas, sociais, culturais, desportivos ou de qualquer outra natureza".

 

119. Os agentes do Governo infringiram os artigos 12 e 16. É provável que os ataques contra a Irmã Ortiz tenham tido como objetivo castigá-la e interromper suas atividades religiosas como missionária da Igreja e seu trabalho com os grupos indígenas de Huehuetenango, assim como sua associação com membros do GAM. Além disso, devido à vigilância, às ameaças, ao seqüestro, à tortura e à violação de que foi objeto, regressou aos Estados Unidos para escapar dos seqüestradores e de sua violência, e não conseguiu retornar à Guatemala de tão aterrorizada que ficou. O resultado foi a privação do direito de exercer seu direito à liberdade de consciência e de religião, desempenhando as funções de missionária estrangeira da Igreja Católica na Guatemala. Também foi privada do direito de associar-se com os habitantes de Huehuetenango, a Igreja da Guatemala e o GAM.

 

e) Artigos 8 e 25. Garantias Judiciais e Proteção Judicial

120. Os artigos 8 e 25 da Convenção Americana concedem às pessoas o direito ao acesso a tribunais, o direito a interpor recursos e ser ouvidas em processos judiciais e o direito a uma decisão por parte da autoridade legal competente. O artigo 25.1 da Convenção Americana dispõe que:

 

Toda pessoa tem direito a um recurso simples e rápido ou a qualquer outro recurso efetivo, perante os juízes ou tribunais competentes, que a proteja contra atos que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pela constituição, pela lei ou pela presente Convenção.

O artigo 8.1 da Convenção Americana estabelece que toda pessoa tem direito a ser ouvida, "com as devidas garantias", por um juiz ou tribunal competente. O artigo 25.2 dispõe que os Governos assegurem que, diante de recursos legais interpostos por qualquer pessoa, a autoridade competente decida sobre os direitos da pessoa.

 

121. No caso em questão, o Governo da Guatemala não cumpriu sua obrigação de oferecer um recurso legal simples, rápido e efetivo à Irmã Ortiz. Suas tentativas de ser ouvida por tribunais competentes e imparciais na Guatemala e de conseguir a solução de seu caso nos tribunais guatemaltecos vêm sendo sistematicamente obstaculizados e têm produzido críticas reiteradas e desabonadoras sobre sua pessoa. O Governo, em vez de investigar corretamente e de acompanhar nos tribunais competentes os recursos apresentados pela Irmã Ortiz, procurou transferir para ela o ônus de investigar e provar suas alegações contra seus próprios agentes e atribuiu-lhe a responsabilidade pela ausência de resultados.

 

122. Transcorreram mais de seis anos desde que a Irmã Ortiz foi seqüestrada e torturada, e seu caso nos tribunais da jurisdição interna da Guatemala não avançou o suficiente para fazer comparecer perante a justiça os responsáveis pelas ações de que foi vítima. O Governo, apesar de não ter chegado a qualquer solução no processo judicial interno e de não ter obtido resultados concretos, indicou em sua Resposta de 15 de fevereiro que tinha intenção de encerrar o caso. Essa ação eliminaria definitivamente a possibilidade de a Irmã Ortiz conseguir uma solução para seu caso na jurisdição interna.

 

f) Artigo 1.1 Obrigação de respeitar os Direitos

123. As violações em debate no caso presente demonstram que o Estado da Guatemala não cumpriu o compromisso consagrado no artigo 1.1 da Convenção Americana de "respeitar os direitos e liberdades nela reconhecidos e [de] garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa que esteja sujeita à sua jurisdição".

 

124. A primeira obrigação de um Estado parte da Convenção Americana é respeitar os direitos e liberdades nela consagrados.

 

Em toda circunstância em que um órgão ou funcionário do Estado ou de uma instituição de caráter público lesione indevidamente ... direitos (enunciados na Convenção), está-se diante de uma suposição de inobservância do dever de respeito consagrado na Convenção ... o Estado é responsável pelos atos de seus agentes praticados sob a égide de seu caráter oficial e pelas suas omissões, mesmo quando atuam fora dos limites de sua competência ou em violação do direito interno./131

125. No caso presente, agentes do Governo, sob a égide de sua autoridade oficial, vigiaram e ameaçaram a Irmã Ortiz. Agentes do Governo, inclusive um policial fardado, posteriormente seqüestraram a Irmã Ortiz, conduziram-na a um centro de detenção em uma instalação militar e a torturaram. Essas ações constituem violações claras da Convenção Americana imputáveis ao Governo da Guatemala. Outros agentes do Estado cometeram violações com a recusa de realizar uma investigação adequada e proceder judicialmente para esclarecer os delitos e punir os culpados. Daí se infere que o Governo da Guatemala é responsável pela violação do artigo 1.1 da Convenção Americana.

 

126. A segunda obrigação do Estado é a de "garantir" o livre e pleno exercício dos direitos reconhecidos na Convenção. A Comissão reitera a obrigação dos Estados partes de

 

organizar todo o aparelho governamental, e em geral todas as estruturas por meio das quais se manifesta o exercício do poder público, de maneira que se tornem capazes de assegurar juridicamente o livre e pleno exercício dos direitos humanos. Como conseqüência dessa obrigação, os Estados devem prevenir, investigar e punir toda violação dos direitos reconhecidos pela Convenção e procurar, além disso, quando possível, o restabelecimento do direito conculcado e, quando for o caso, a reparação dos danos produzidos pela violação dos direitos humanos./132

127. O Governo não cumpriu sua obrigação de garantir os direitos humanos da Irmã Ortiz. Na década de 80, as estruturas do poder público e do Governo permitiram que ocorressem os ataques contra a Irmã Ortiz. Desde aquela época, as autoridades vêm negando de maneira sistemática que a Irmã Ortiz tenha sido ameaçada, seguida, seqüestrada, detida e torturada, bem como que caiba alguma responsabilidade a agentes do Governo da Guatemala caso tenha ocorrido alguma ação dessa natureza. O Estado não assumiu sua responsabilidade de conduzir uma investigação adequada dos delitos, tem retardado os processos judiciais para impedir que os culpáveis respondam por seus delitos e não ofereceu compensação alguma à Irmã Ortiz. O resultado final das investigações e processos judiciais do Governo foi a negação de justiça a Dianna Ortiz e a impunidade dos violadores de seus direitos.

 

128. Na causa atual, revestem-se de especial gravidade as infrações do artigo 1.1 por parte do Governo. No que se refere ao artigo 1.1, a Corte Interamericana de Direitos Humanos afirmou com clareza o dever de investigar:

 

Em certas circunstâncias, pode resultar difícil a investigação de fatos que atentem contra direitos da pessoa. A obrigação de investigar, como a de prevenir, é uma obrigação de meio ou comportamento que não pode deixar de ser cumprida pelo simples fato de não produzir resultados satisfatórios. No entanto, deve ser empreendida com seriedade e não como uma simples formalidade condenada de antemão a ser infrutífera. Deve ter um sentido e ser assumida pelo Estado como um dever jurídico próprio e não como uma simples gestão de interesses particulares, que dependa da iniciativa processual da vítima ou de seus familiares ou do aporte privado de elementos probatórios, sem que a autoridade pública busque efetivamente a verdade./133

129. O Governo não cumpriu essas exigências da Corte. Pouco tempo depois do reaparecimento da Irmã Ortiz, pôde-se observar claramente que o Governo estava determinado a negar os fatos alegados por ela e refutar sua participação. As investigações posteriores, quando realizadas, visavam unicamente apoiar essas negações. O Governo nunca manifestou vontade de realizar uma investigação efetiva.

 

130. O fiscal especial designado para o caso não fez uma investigação imparcial e objetiva, mas culpou a Irmã Ortiz por não se conseguir avançar no processo. Ele procurou concentrar a atenção na alegação de violação, tentando dessa maneira encobrir a importância da obrigação do Governo de investigar os delitos. Os ataques do Governo à vítima e às provas que ela apresentou por meio do fiscal especial não o exoneram da responsabilidade de prosseguir com o caso em sua totalidade, porque a obrigação de investigar é irrenunciável e indelegável.

 

131. O Governo tem argumentado reiteradamente, por meio de vários funcionários, que a Irmã Ortiz não cooperou com os procedimentos, procurando dessa maneira desviar a atenção do fato de que falhou no cumprimento de suas responsabilidades, omitindo-se na investigação devida do caso para ministrar justiça. Este argumento do Governo peca por duas razões. Em primeiro lugar, as decisões da Comissão sobre questões de fato demonstram que as acusações contra a Irmã Ortiz carecem de fundamento. Em segundo lugar, no caso Velásquez Rodríguez a Corte determinou com clareza que cabe ao Estado a responsabilidade de investigar as violações de direitos humanos e de iniciar um processo judicial efetivo contra os responsáveis das violações./134 O Estado da Guatemala continua tendo a obrigação de investigar e de esclarecer a totalidade das circunstâncias que rodearam o seqüestro e a tortura da Irmã Ortiz e de levar aos tribunais os responsáveis, independentemente da contribuição ou colaboração da vítima.

 

 

III. PROCESSO APÓS A ADOÇÃO DO RELATÓRIO ARTIGO 50 DA COMISSÃO

 

132. A Comissão, em seu 91º Período Ordinário de Sessões, aprovou, em conformidade com o artigo 50 da Convenção, o Relatório nº 9/96 referente ao presente caso e o transmitiu ao Governo da Guatemala por meio da comunicação de 11 de abril de 1996, com as recomendações da Comissão, solicitando ao Governo que, no prazo de 60 dias, informasse à Comissão sobre as medidas que viesse a adotar para cumprir essas recomendações e resolver a situação examinada. O relatório artigo 50 incluiu a decisão da Comissão de apresentar o caso à Corte Interamericana de Direitos Humanos se o Governo não implementar as recomendações da Comissão no prazo de 60 dias.

 

133. Em 31 de maio de 1996, o Governo dirigiu uma comunicação à Comissão solicitando que suspendesse a tramitação do presente caso. Em 3 de junho de 1996, o Governo enviou uma comunicação adicional esclarecendo sua solicitação. Ele pediu especificamente que lhe fosse concedido um prazo adicional de dois meses para responder ao Relatório 9/96 e uma suspensão do prazo de três meses para submeter o caso à Corte, conforme previsto no artigo 51 da Convenção.

 

134. Em 10 de junho de 1996, a Comissão decidiu conceder a prorrogação de dois meses e aceitar a solicitação de suspender o prazo de três meses para submissão do caso à Corte. Esta decisão foi comunicada por escrito ao Governo no dia 14 de junho de 1996. Na comunicação, a Comissão esclareceu que o prazo para responder ao relatório artigo 50 venceria em 10 de agosto de 1996.

 

135. Em 26 de julho de 1996, o Governo dirigiu uma comunicação à Comissão pedindo uma prorrogação adicional de 60 dias para responder ao relatório artigo 50 da Comissão. O Governo baseou esta petição no fato de o fiscal designado para o caso na Guatemala ter solicitado uma entrevista com a Irmã Dianna Ortiz para poder investigar o caso em cumprimento das recomendações da Comissão incluídas no relatório artigo 50.

 

136. Em 2 de agosto de 1996, a Irmã Dianna Ortiz comunicou à Comissão, por meio de seu representante legal, que não aceitaria a realização da entrevista oral. A carta enviada pela advogada da Irmã Ortiz afirmava: "O Governo tem toda as informações que a Irmã Ortiz pode fornecer sobre o que ela sofreu na Guatemala em 2 de novembro de 1989 ... No entanto, se legitimamente o Governo tem novas perguntas que não foram respondidas nos depoimentos anteriores da Irmã Ortiz, ele está convidado a submeter essas perguntas à Irmã Ortiz por escrito." Com base nessa decisão da Irmã Ortiz de não aceitar a possibilidade de uma entrevista oral com o fiscal, a Comissão comunicou ao Governo em 6 de agosto de 1996 que entendia não ser necessário conceder a ampliação solicitada para o prazo.

 

137. O Governo não respondeu ao Relatório 9/96 e, portanto, não demonstrou ter cumprido as recomendações da Comissão. Em conseqüência, esta se viu na obrigação de decidir como proceder com relação ao assunto, em base a uma decisão sobre qual seria "a alternativa ... mais favorável à tutela dos direitos estabelecidos na Convenção"./135

 

138. A Irmã Dianna Ortiz, por meio de sua advogada, comunicou à Comissão em correspondência de 27 de agosto de 1996 seu desejo de que o caso não fosse apresentado à Corte. Posteriormente, Dianna Ortiz assinou uma carta confirmando que as declarações de sua advogada tinham sido autorizadas por ela e que representavam corretamente sua decisão. Especificamente, a carta do 27 de agosto observava:

 

a Irmã Ortiz deseja, como sempre disse, que se declare a responsabilidade do Governo da Guatemala e que o Governo seja punido. Por outro lado, os esforços necessários despendidos em busca da justiça neste caso representaram e continuam representando um custo pessoal enorme para a Irmã Ortiz. Como a Irmã Ortiz explicou anteriormente ... o ato de depor sobre o seqüestro e a tortura que sofreu lhe causa dor e até mesmo terror. Houve ocasiões em que ela sentiu que os danos emocionais e psicológicos sofridos começavam a ser curados, mas em seguida parecia que o processo de cicatrização era destruído pelo trauma de ter que viver novamente seu seqüestro e tortura no ato de prestar depoimento.

A comunicação concluía que, por essas razões, a Irmã Ortiz preferia que seu caso não fosse enviado à Corte.

 

139. De acordo com a Convenção, a decisão da Comissão de submeter um caso à jurisdição da Corte compete exclusivamente a ela./136 Em 6 de setembro de 1996, a Comissão decidiu que a alternativa mais favorável para a proteção dos direitos humanos era não enviar o presente caso à Corte, não porque sua importância não o merecesse, mas com base na análise da petição da vítima, Irmã Dianna Ortiz, e das conseqüências para ela do envio do caso à Corte e das circunstâncias especiais de que ele se revestia. A Comissão decidiu, em vez disso, continuar tomando conhecimento do assunto e preparar este relatório, em conformidade com o artigo 51 da Convenção, para sua transmissão ao Governo com vistas a sua publicação se o Governo uma vez mais não demonstrar que cumpriu as recomendações efetuadas pela Comissão.

 

Com base no anterior,

 

A COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS

 

CONCLUI:

 

140. À luz da informações e das observações acima apresentadas, que o Estado da Guatemala é responsável pelas violações dos direitos humanos de Dianna Ortiz à integridade pessoal, à liberdade pessoal, às garantias judiciais, a gozar de proteção quanto à sua honra e dignidade, à liberdade de consciência e religião, à liberdade de associação e à proteção judicial, todos eles consagrados nos artigos 5, 7, 8, 11, 12, 16 e 25 da Convenção Americana, e que ele se omitiu no cumprimento da obrigação estabelecida no artigo 1.

 

RECOMENDA:

 

141. A Comissão recomenda ao Estado da Guatemala que:

 

a) realize uma investigação rápida, imparcial e efetiva dos fatos denunciados, para poder fazer constar de maneira detalhada em um relatório oficial, devidamente aceito, os detalhes das circunstâncias em que ocorreram os delitos contra a Irmã Ortiz e a responsabilidade pelas violações cometidas;

b) tome as medidas necessárias para submeter a um processo judicial competente os responsáveis pelas violações no caso presente;

c) repare as conseqüências da violação dos direitos enunciados, incluindo o pagamento de uma compensação adequada e justa pelos danos causados à Irmã Ortiz.

142. Publicar o presente relatório no Relatório Anual a ser submetido à Assembléia Geral da OEA, em virtude dos artigos 48 do Regulamento da Comissão e 51.3 da Convenção, uma vez que o Governo da Guatemala não tomou as medidas necessárias para solucionar a situação denunciada dentro dos prazos concedidos.

 

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58 . O Governo enviou comunicações à Comissão nas seguintes datas:

30 de abril de 1990 17 de novembro de 1992
10 de julho de 1990 15 de fevereiro de 1995
18 de julho de 1991 27 de março de 1995
8 de abril de 1992 15 de maio de 1995
5 de outubro de 1992 27 de novembro de 1995

A peticionária enviou comunicações à Comissão, por meio de seus advogados, nas seguintes datas:

30 de outubro de 1992 7 de março de 1995
19 de julho de 1994 17 de maio de 1995
3 de outubro de 1994 30 de agosto de 1995
5 de janeiro de 1995 25 de outubro de 1995
17 de fevereiro de 1995 1º de dezembro de 1995

59 . "Gobierno rechaza existencia de cárceles secretas", Nacional, 7 de novembro de 1989.

60 . Ver a resposta de 1º de maio de 1991 às cartas rogatórias do Embaixador da Guatemala autenticada pelo Tribunal Federal de Primeira Instância do distrito ocidental de Kentucky (inclusos os depoimentos da Irmã Ortiz de 31 de janeiro e de 18 de março de 1991, e outros documentos).

61 . Ver a carta de 6 de abril de 1990 do Presidente Vinicio Cerezo Arévalo a Paul Soreff.

62 . 6 de junho de 1990, carta de Rita C. Sciolli, Encarregada de Negócios, a Paul Soreff.

63 . 11 de abril de 1991, carta do Presidente Jorge Serrano Elías a Thomas F. Stroock, Embaixador dos Estados Unidos.

64 . Ver, por exemplo, 29 de abril de 1991, carta de Paul Soreff ao Presidente Serrano; 5 de abril de 1991, carta de Thomas F. Stroock, Embaixador dos Estados Unidos, ao Presidente Serrano; 20 de julho de 1990, carta de Paul Soreff ao Presidente Cerezo.

65 . Relatório de María Eugenia de la Sierra, Procuradora Adjunta de Direitos Humanos, ao Presidente Ramiro de León Carpio, de outubro de 1991, sobre a entrevista com a Irmã Ortiz.

66 . Ver a transcrição da entrevista com a Irmã Ortiz, realizada por María Eugenia de la Sierra, Procuradora Adjunta de Direitos Humanos, outubro de 1991.

67 . 5 de agosto de 1991, cartas de Asisclo Valladares Molina, Procurador Geral da Guatemala, a Fernando Linares Beltranena e Carl West.

68 . Ver 23 de setembro de 1991, carta de Paul Soreff ao Fiscal Especial Beltranena; 26 de setembro de 1991, carta do Fiscal Especial Beltranena a Paul Soreff; 4 de outubro, 31 de outubro e dezembro de 1991, cartas de Paul Soreff ao Fiscal Especial Beltranena.

69 . "Interrogatorio a monja duró cerca de 12 horas", Prensa Libre, 8 de abril de 1992.

70 . "American Nun Testifies to Abduction, Torture by Guatemalan Security Forces", Washington Post, 8 de abril de 1992.

71 . 10 de fevereiro de 1992, carta de Paul Soreff ao Fiscal Especial Beltranena.

72 . Ver depoimento da Irmã Ortiz de 7 de abril de 1992; procedimento para a identificação de fotografias e preparação de retratos eletrônicos, de 22 de março de 1993; procedimento para a preparação de retratos eletrônicos e processo judicial de reconhecimento, de 23 de março de 1993; processo judicial de reconhecimento, de 24 de março de 1993; procedimento de interrogatório, de 25 de março de 1993; processo judicial de reconhecimento, de 26 de janeiro de 1994.

73 . Ver 4 de janeiro de 1995, carta de Michelle Arington ao Fiscal Geral Ramsés Cuestas.

74 . "¿Es cierto lo de la monja Dianna Mea Ortiz?", Nacional, 9 de novembro de 1989; "Cerezo duda de lo dicho por la monja", Prensa Libre, 10 de novembro de 1989.

75 . "Reconstruyeron supuesta huida de monja en Antigua", Prensa Libre, 13 de novembro de 1989; "Policía no participó en secuestro", 13 de novembro de 1989.

76 . "La Policía descarta secuestro en caso de monja", Nacional, 13 de novembro de 1989.

77 . 6 de abril de 1990, carta do General Gramajo.

78 . Ver declaração de Allan Nairn, página 23.

79 . "La Politécnica no tiene calabozos", Gráfico, 29 de janeiro de 1994.

80 . Ver declaração de Dianna Ortiz, 4 de janeiro de 1995, pág. 3.

81 . Transcrição da entrevista com a Irmã Ortiz realizada por María Eugenia de la Sierra, Procuradora Adjunta de Direitos Humanos, outubro de 1991.

82 . Ver Processo judicial de reconhecimento de 24 de março de 1993.

83 . Ver relatório preparado por Annabella Valdéz Gutiérrez, fiscal designada para o caso na Guatemala, 18 de março de 1994 (que faz referência ao exame do Doutor Alcare) [daqui por diante, "Relatório Valdéz Gutiérrez]; relatório preparado pelo investigador West, 4 de fevereiro de 1994 (também referente ao exame do Doutor Alcare) [daqui por diante, "Relatório West"]. Em 23 de outubro de 1995, a Comissão solicitou ao Governo o relatório do Doutor Alcare sobre o exame que ele fez na Irmã Ortiz antes de sua saída da Guatemala e de seu depoimento no processo do caso na jurisdição interna. O Governo não apresentou as informações, apesar da disposição do artigo 48(1)(e) da Convenção de que a Comissão pode pedir aos Estados interessados qualquer informação pertinente aos casos sob sua consideração.

84 . 8 de novembro de 1989, relatório do Doutor G. R. Gutiérrez.

85 . 10 de abril de 1990, carta do Embaixador Thomas F. Stroock.

86 . A Comissão observa que o expediente inclui uma carta da psiquiatra da Irmã Ortiz que detalha sua reação à tortura e à violação, e que explica as razões que dificultam a apresentação de provas ou informações adicionais sobre a violação. Carta de 28 de novembro de 1995 de Mary R. Fabri, Psy.D., a Michele Arington.

87 . Relatório Valdéz Gutiérrez, página 1.

88 . 14 de janeiro de 1994, carta de Irma Leticia Lam Nakakawa de Rojas a Víctor Manuel Rivera Woltke, Secretário da Corte Suprema da Guatemala.

89 . A Comissão, em sua comunicação de 23 de outubro de 1995, solicitou ao Governo que lhe fornecesse cópia dos relatórios policiais preparados sobre o caso. O Governo não enviou essas informações.

90 . Ver os relatórios policiais de 2, 3 e 13 de novembro de 1989.

91 . Ver, por exemplo, "La Policía descarta secuestro en caso de monja", Nacional, 13 de novembro de 1989; "Reconstruyeron supuesta huida de monja en Antigua", Prensa Libre, 13 de dezembro de 1989.

92 . 2 de novembro de 1989, carta da Polícia Nacional ao Juiz de Paz.

93 . "La Policía descarta secuestro de monja", Nacional, 13 de novembro de 1989.

94 . 2 de novembro de 1989, carta da Policía Nacional ao Juiz de Paz.

95 . Em sua comunicação de 23 de outubro de 1995, a Comissão solicitou cópia de todos os depoimentos apresentados pelo Senhor Astún Asturias, mas o Governo não lhe enviou as informações.

96 . Ver "La Policía descarta secuestro en caso de monja", Nacional, 13 de novembro de 1989.

97 . Ver "Liberaron a Religiosa", Prensa Libre, 4 de novembro de 1989; Relatório West.

98 . Ver "Liberaron a Religiosa", Prensa Libre, 4 de novembro de 1989.

99 . Ver Relatório West.

100 . "Liberaron a Religiosa", Prensa Libre, 4 de novembro de 1989.

101 . Ata do Processo Judicial de Reconhecimento de 23 de março de 1993.

102. Ata do Processo Judicial de Reconhecimento de 26 de janeiro de 1994.

103 . Ver declaração da Irmã Ortiz de 7 de abril de 1992; Processo Judicial de Reconhecimento de 23 de março de 1993.

104 . Ver declaração da Irmã Ortiz de 10 de junho de 1992 (prestada nos Estados Unidos no processo civil contra o General Gramajo).

105 . Ver Ata do Procedimento do interrogatório de 25 de março de 1995.

106 . Segundo o Governo, este relatório datado de 8 de julho de 1991 foi preparado pela administração da Polícia Nacional do Departamento de Sacatepéquez. No entanto, o Governo não forneceu cópia do relatório à Comissão, apesar da solicitação de que lhe fossem enviados todos os relatórios policiais relacionados com o caso.

107 . Idem.

108 . Ata do Processo Judicial de Reconhecimento de 24 de março de 1993.

109 . Ata do Processo Judicial de Reconhecimento de 24 de março de 1993.

110 . Ver Corte Interamericana de Direitos Humanos, Caso Velásquez Rodríguez, Sentença de 29 de julho de 1988, parágrafo 126, Série C, Nº 4.

111 . Ver Relatório Anual de 1991 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, parágrafo 221, OEA/Ser.L/V/II.81, doc.6 rev. 1, 14 de fevereiro de 1992 (daqui por diante "Relatório Anual 1991"); declaração de Phillip Berryman, página 7; Declaração de Allan Nairn, páginas 21-23.

112 . Departamento de Relações Públicas do Exército, Las Patrullas de Autodefesa Civil: La respuesta popular al proceso de integração socio-económico-político de Guatemala actual, Guatemala, maio de 1984.

113 . Ver Quarto Relatório da Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre a Situação dos Direitos Humanos na Guatemala, páginas 36-38, OEA/Ser.L/V/II.83, doc.16 rev., 1º de junho de 1993 (daqui por diante, "Quarto Relatório").

114 . Ver Relatório Anual da Comissão Interamericana de Direitos Humanos 1990-1991, página 449, OEA/Ser. L/V/II.79, doc.12 rev. 1, 22 de fevereiro de 1991; Relatório 1991, página 210, OEA/Ser.L/V/II.81, doc.6 rev. 1, 14 de fevereiro de 1992; Quarto Relatório, páginas. 44, 46, 92-94; Declaração de Allan Nairn, páginas 16-17; Declaração de Anne Manuel, Diretora Adjunta de Human Rights Watch, página 19.

115 . Ver Declaração de Nairn, página 21.

116 . Idem.

117 . Ver a resposta de 1º de maio de 1991 às cartas rogatórias do Embaixador da Guatemala autenticada pelo Tribunal Federal de Primeira Instância do distrito ocidental de Kentucky (inclusos os depoimentos da Irmã Ortiz de 31 de janeiro e de 18 de março de 1991, e outros documentos).

118 . "Secaira: Reconocimiento legal en la posada Belén", Siglo Veintiuno, 8 de abril de 1992; Avisos publicados por Fernando Linares Beltranena, 20 de fevereiro de 1992, 1º de março de 1992, 7 de abril de 1992.

119 . Ver Declaração da vítima, 7 de abril de 1992, página 22.

120 . Ver Procedimento do interrogatório de 25 de março de 1993.

121 . Segundo informação do Governo, os membros do Grupo Especial de Investigação teriam se apresentado para depor em 16 de maio de 1995. Em sua comunicação de 23 de outubro de 1995, a Comissão solicitou cópia desse depoimento, mas o Governo não enviou as informações pedidas.

122 . Declaração jurada suplementar de 4 de janeiro de 1995.

123 . A Comissão, em sua comunicação de 23 de outubro de 1995, solicitou ao Governo o envio de informações específicas sobre os diversos fiscais que trabalharam no caso, mas não as recebeu.

124 . A Comissão, em sua comunicação de 23 de outubro de 1995, solicitou ao Governo que fornecesse cópia do relatório preparado pelo Fiscal Especial Linares, mas não recebeu resposta.

125 . "Monja Dianna Ortiz declarará en juzgado el próximo martes", Siglo Veintiuno, 3 de abril de 1992.

126 . Ver 19 de dezembro de 1991, carta de Paul Soreff ao Fiscal Especial Beltranena.

127 . Ver "American Nun Testifies to Abduction, Torture by Guatemalan Security Forces", Washington Post, 8 de abril de 1992; "Monja Dianna Ortiz declarará en juzgado el próximo martes", Siglo Veintiuno, 3 de abril de 1992; "Comenta la próxima visita de Diana Ortiz", Prensa Libre, 5 de abril de 1992; Declarações publicadas de Linares de 1º de março de 1992, 20 de fevereiro de 1992 e 8 de abril de 1992.

128 . A Comissão observa ainda que as declarações do Fiscal Especial Linares infringiram a disposição do Código Processual Penal da Guatemala aplicável no momento, que estabelece que nenhum funcionário ou particular pode revelar "a reserva ou sigilo do sumário". Ver Código Processual Penal da Guatemala, artigo 309. O Governo da Guatemala argumentou com base nessa reserva do sumário em casos em tramitação perante esta Comissão.

129 . Ver Caso 10.508, Relatório Nº 25/94, Relatório Anual 1994 da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, páginas 51-55, OEA/Ser.L/V/II.88, doc.9 rev., 17 de fevereiro de 1995.

130 . Ver Caso Velásquez Rodríguez, Sentença de 29 de julho de 1988, supra, parágrafo 155.

131 . Velásquez Rodríguez, supra, parágrafos 166, 170.

132 . Idem.

133 . Idem, parágrafo 177.

134 . Idem.

135 . Parecer Consultivo OC-13/93, de 16 de julho de 1993, Certas atribuições da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (artigos 41, 42, 46, 47, 50 e 51 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos), parágrafo 50.

136 . Ver Convenção, artigo 61; ver também Convenção, artigo 57.