RELATÓRIO Nº 56/02
CASO 12.158
MÉRITO
BENEDICT JACOB
GRANADA
21 de outubro de 2002
RESUMO
1.
O presente relatório refere-se a uma petição apresentada perante a Comissão
Interamericana de Direitos Humanos (doravante denominada “a Comissão”) por
Saul Lehfreund Esq., advogado do escritório jurídico Simons, Muirhead &
Burton, de Londres, Reino Unido (doravante denominado “os peticionários”),
por carta de 21 de maio de 1999, em nome de Benedict Jacob (doravante
denominado “o Sr. Jacob"). Na petição se alega que o Estado de Granada
(doravante denominado “o Estado”) violou os direitos do Sr. Jacob
consagrados na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (doravante
denominada “a Convenção”).
2. Os
peticionários afirmam que o Sr. Jacob, cidadão de Granada, foi julgado e
condenado pelo Estado pelo delito de homicídio, em virtude do
Código Penal de Granada, em 30 de junho de 1997, e que lhe foi imposta uma
pena de morte obrigatória na forca, de conformidade com a legislação interna
de Granada.[1] De acordo
com os peticionários, o Sr. Jacob apelou da sua sentença perante o Tribunal
de Apelações do Caribe oriental, mas sua apelação foi desacolhida por esse
tribunal em 8 de dezembro de 1997. Os peticionários informam que o Sr. Jacob
interpôs uma petição perante o Comitê Judicial do Conselho Privado,
solicitando uma autorização especial para apelar como indigente, e que o
Conselho Privado a indeferiu em 16 de dezembro de 1998.
3.
Os peticionários argumentam que a petição é admissível porque satisfaz
os requisitos do artigo 46 da Convenção. Também alegam que o Estado
violou os direitos do Sr. Jacob consagrados nos artigos 4(1), 4(6),
5(1), 5(2), 5(6), 8 e 24 da Convenção.
4.
Em sua petição, os peticionários solicitaram que a Comissão ordenasse
medidas cautelares de acordo com o artigo 25(1) de seu Regulamento e que
solicitasse ao Estado que suspendesse a execução do Sr. Jacob para
evitar um dano irreparável, enquanto o seu caso estivesse pendente de
decisão da Comissão. Os peticionários também pediram que a Comissão
recomendasse ao Estado que revogasse a sentença de morte contra o Sr. Jacob
e o colocasse em liberdade.
5.
No presente relatório, a Comissão conclui que as denúncias dos
peticionários em relação à violação dos direitos do Sr. Jacob consagrados na
Convenção satisfazem os requisitos do artigo 46 da Convenção e são,
portanto, admissíveis.
6. Com
base na informação apresentada e da cuidadosa análise de conformidade
com a Convenção Americana, a Comissão conclui que o Estado de Granada é
responsável pelo seguinte :
1.
O Estado é responsável pela violação dos direitos do Sr. Jacob
consagrados nos artigos 4(1), 5(1), 5(2) e 8(1), conjuntamente com a
violação do artigo 1(1) da Convenção Americana, por sentenciá-lo a uma
pena de morte obrigatória.
2.
O Estado é responsável pela violação dos direitos do Sr. Jacob
consagrados no artigo 4(6) da Convenção, conjuntamente com a
violação do artigo 1(1) da mesma, por não outorgar-lhe um direito
efetivo a solicitar a anistia, o indulto ou a comutação da pena.
3.
O Estado é responsável pela violação dos direitos do Sr. Jacob
consagrados no artigo 5(1) da Convenção Americana, conjuntamente
com a violação do artigo 1(1) da mesma, por não respeitar os direitos
do Sr. Jacob a sua integridade física, mental e moral, ao mantê-lo em
detenção em condições desumanas.
4.
O Estado é responsável pela violação dos direitos do Sr. Jacob
consagrados nos artigos 8 e 25 da Convenção, conjuntamente com a
violação do artigo 1(1) da mesma, por não brindar-lhe assistência
jurídica para propor uma ação constitucional.
II.
TRÂMITE PERANTE A COMISSÃO
7.
Em 21 de maio de 1999, os peticionários apresentaram a petição do Sr. Jacob
perante a Comissão. Em 9 de junho de 1999, a Comissão iniciou o trâmite do
Caso 12.158 e remeteu ao Estado as partes pertinentes da petição e os
argumentos complementares dos peticionários, solicitando-lhes suas
observações dentro de um prazo de 90 dias, a respeito das denúncias
formuladas na petição, bem como toda outra informação adicional em relação
ao esgotamento dos recursos internos. A Comissão também
solicitou ao Estado que suspendesse a execução do Sr. Jacob enquanto
estivesse pendente sua investigação dos fatos alegados.
8.
Em 25 de setembro de 2000, a Comissão reiterou seu pedido de informação ao
Estado a respeito da admissibilidade da petição e das denúncias
nela apresentadas.
9 Em
20 de agosto de 2001, a Comissão dirigiu-se ao Estado e aos peticionários
informando-lhes que se colocava à disposição a fim de procurar uma solução
amistosa no caso do Sr. Jacob.
10.
Em 30
de agosto de 2001, os peticionários responderam à Comissão indicando que:
"Desejamos informar-lhe que não podemos chegar a uma solução amistosa tendo
em vista o fato de que o Estado Parte não demonstrou estar disposto a
participar de forma ativa neste assunto”.
11.
Até a data deste relatório, o Estado não havia respondido a nenhuma das
comunicações da Comissão, não remeteu informação alguma em relação à
admissibilidade ou o mérito da petição, nem havia respondido à oferta
da Comissão de facilitar a busca de uma solução amistosa entre as partes.
III.
POSIÇÃO DAS PARTES SOBRE A ADMISSIBILIDADE
A.
Posição dos
peticionários
1.
Antecedentes do caso do Sr. Jacob
12. Os peticionários informam que em 30 de junho de
1997, o Sr. Jacob foi julgado, condenado e sentenciado à morte na forca pelo
homicídio de Evadney Bowen, em virtude da Seção 234 do Código Penal
das leis revisadas de Granada de 1958 (fato que ocorreu em 23 de abril de
1995). Os peticionários indicam que, segundo a promotoria, a falecida e o
Sr. Jacob mantinham relações de amizade e viveram juntos durante algum
tempo, mas que haviam se separado aproximadamente 6 ou 7 meses antes da
morte dela ocorrida em 23 de abril de 1995. Os peticionários informam
que, de acordo com a promotoria, em 23 de abril de 1995, o Sr. Jacob estava
dentro de seu caminhão estacionado quando avistou a falecida; que o Sr.
Jacob a convidou a sair com ele, mas tendo esta recusado, ele a matou.
13. Os peticionários informam que o Sr. Jacob não
depôs perante o tribunal, mas o Dr. Olubahkle Obikaya, psiquiatra, o fez em
seu nome. O Dr. Obikaya atestou que examinou o Sr. Jacob em 23 de junho de
1997, e este lhe disse que se tinha a impressão desagradável de que a
falecida, com a ajuda de outra pessoa, “lhe havia feito uma bruxaria e
acreditava realmente que sofreria algum dano ou corria algum perigo." O Dr.
Obikaya atestou também que o Sr. Jacob lhe informou que a relação com a
falecida era mantida em segredo porque a mãe dela não concordava com a
relação de ambos. O Dr. Obikaya declarou que o Sr. Jacob lhe havia informado
que em 23 de abril de 1995, data em que ocorreu a morte da Sra. Bowen esta e
ele mantinham uma relação amistosa mas que o última coisa que recordava que
ela havia dito era: “Dennis, você vai morrer."[2]
14. Os peticionários indicam que o Dr. Obikaya
atestou que a essa altura ocorreu uma alteração repentina no estado mental
do Sr. Jacob, talvez uma descarga elétrica cerebral anormal, e que é
possível que o Sr. Jacob estivesse nesse estado no dia do crime. O Dr.
Obikaya declarou que, na realidade, esse é “um estado em que a pessoa afirma
uma série de ações das que é totalmente inconsciente e das que não
pode responsabilizar-se depois”, e que alguém nesse estado não poderia dizer
se a ação é correta ou não. Os peticionários alegam que o Dr. Obikaya
atestou na etapa da réplica que era possível que o Sr. Jacob estivesse
neste estado na manhã de 23 de abril de 1995, e em resposta aos jurados, o
Dr. Obikaya declarou estar convencido de que o Sr. Jacob estava dizendo a
verdade.[3]
2.
Posição dos peticionários sobre a admissibilidade
15.
Os peticionários argumentam que o Sr. Jacob cumpriu com os requisitos do
artigo 46(1)(a) da Convenção de que todos os recursos internos
disponíveis e efetivos foram esgotados e que a petição é admissível. Os
peticionários argumentam que o Sr. Jacob deve ser eximido de esgotar os
recursos internos segundo o artigo 46(2) (b) da Convenção Americana
porque o Estado não lhe ofereceu assistência jurídica para iniciar uma ação
constitucional em face da sentença de morte obrigatória.
16.
Os peticionários indicam que o Sr. Jacob apelou de sua sentença perante o
Tribunal de Apelações do Caribe oriental em Granada, e que sua apelação foi
desacolhida por este tribunal em 8 de dezembro de 1997. De acordo com os
peticionários, o Sr. Jacob apresentou perante o Comitê Judicial do Conselho
Privado solicitando autorização para apelar como indigente, mas que o
Conselho Privado indeferiu sua petição em 16 de dezembro de 1998.
17.
Os peticionários argumentam que o Sr. Jacob não é capaz de propor uma ação
constitucional perante a Suprema Corte de Granada para impugnar sua sentença
de morte obrigatória como castigo ou tratamento desumano ou degradante por
ser indigente e porque o Estado não outorga verbas nem assistência a
indigentes para estes possam iniciar essas ações. Os peticionários
argumentam que a Constituição é um documento legal complexo e que, portanto,
requer uma representação jurídica especializada para que a ação tenha
perspectivas razoáveis de tramitação. Alegam que a falta de recursos
financeiros do Sr. Jacob e a não disponibilidade de assistência jurídica lhe
impedem propor uma ação constitucional, razão pela qual o recurso resulta
ilusório. O peticionário também afirma que existe grande escassez de
advogados de Granada dispostos a representar gratuitamente o Sr. Jacob.
18.
Os peticionários argumentam que a ausência de assistência jurídica para
indigentes é suficiente para estabelecer a inexistência de recursos internos
para efeitos do seu esgotamento. A fim de respaldar a sua posição, os
peticionários baseiam-se na decisão do Comitê de Direitos Humanos das
Nações Unidas (doravante denominado “o CDH”) em Champagnie, Palmer &
Chisolm contra Jamaica,[4] em
que o Comitê afirmou o seguinte:
Com
respeito à possibilidade de os autores interporem uma ação constitucional, o
Comitê considera que, na ausência de assistência jurídica, a ação
constitucional não é um recurso disponível no caso. Em tal
sentido, o Comitê conclui que não está impedido pelo artigo 5(2)(b) do
Protocolo Opcional de examinar a comunicação.[5]
19.
Os peticionários também indicam que o artigo 5(2) da Constituição de
Granada está redatado de modo de imunizar contra impugnação leis e castigos
que eram legais antes da independência do país. Os peticionários
afirmam que essas disposições tem efeito de congelar na época colonial
uma legislação que, sem exceções, autoriza a pena de morte obrigatória na
forca. Ademais indicam que não é possível argumentar perante nenhum
tribunal de Granada que a pena de morte é inconstitucional, por seu caráter
obrigatório ou porque a execução da sentença de morte na forca é
cruel, a menos que a maneira em que é administrada fosse ilegítima
antes da independência do país. Os peticionários assinalam que
somente pode-se argumentar sobre a legalidade ou não da pena de morte
obrigatória na forca perante esta Comissão, sob o amparo da
Convenção.
3.
Argumentos do Sr. Jacob sobre o mérito de seu caso
Artigos 4, 5, 8 e 24 da Convenção – O
caráter obrigatório da pena de morte e a prerrogativa de clemência
a.
Caráter obrigatório da pena de morte
20. Os peticionários
afirmam que a imposição de uma sentença de morte obrigatória contra o Sr.
Jacob depois de sua condenação por homicídio constitui uma violação de seus
direitos, amparados nos artigos 4(1), 4(6), 5(1), 5(2), 5(6), 8 e 24
da Convenção.
21.
Os peticionários referem-se aos antecedentes legislativos da pena de
morte em Granada e informam que, até 1974, Granada era uma colônia británica
cuja legislação penal consistia no direito comum (common law) e
nos códigos penais locais que foram desenvolvidos na Inglaterra e
Gales, e que, de acordo com a Lei (britânica) de delitos contra a pessoa,
de 1861, o castigo pelo homicídio era a morte. Os peticionários
afirman que no Reino Unido a Seção 7 da Lei de homicídios de
1957 restringia a pena de morte ao delito de homicídio punível com pena
capital, segundo a Seção 5 , ou o de homicídio reiterado, segundo a Seção 6.
Os peticionários também indicam que a Seção 5 da Lei de homicídios
classificava o homicídio punível com pena capital como o cometido mediante
disparo ou explosão, o cometido no curso ou fomento de um roubo, o
cometido com o fim de resistir ou evitar uma detenção ou de escapar à
custódia estatal, e o cometido contra policiais ou funcionários carcerários
durante o cumprimento de seus deveres.
22. Ademais, os
peticionários afirmam que a Seção 2 da Lei de homicídios contém
disposições para reduzir o delito de homicídio ao de homicídio culposo
quando seja cometido por uma pessoa que, no momento de cometer o delito,
encontre-se num estado mental anormal que anule substancialmente sua
responsabilidade mental pelos atos e lhe impeça de admití-los, ou quando
seja parte de um homicídio (restrição da responsabilidade). Os
peticionários indicam que a Seção 3 da Lei de homicídios de 1957
estendeu a defesa devido ao direito comum, e que se pode reduzir o homicídio
a homicídio culposo quando exista provocação por fatos ou dizeres que façam
com que a pessoa perda seu controle. Ademais, os peticionários informam que
a Lei de homicídios de 1957 não era aplicada em Granada antes da
independência do país e que não foi estabelecida nenhuma disposição para o
homicídio não punível com pena capital nem para a defesa por restrição da
responsabilidade.
23. Segundo os
peticionários, Granada tornou-se independente como Estado em 7 de fevereiro
de 1974, quando aprovou sua Constituição, e que o Capítulo I da mesma
versa sobre a proteção dos direitos e liberdades fundamentais do
indivíduo, cujo artigo 5 dispõe:
(1)
Ninguém será submetido a
tortura ou a um castigo ou tratamento desumano ou degradante.
(2)
Nada do disposto por uma Lei ou
fato sob a autoridade de um a Lei será considerado incompatível ou
violatório deste artigo na medida em que a Lei em questão autorize a
aplicação de alguma descrição de castigo que fosse legal em Granada
imediatamente antes de entrar em vigor a presente Constituição.
24. À luz do disposto
no artigo 5 da Constituição, os peticionários indicam que
aceitam que a sentença de morte por homicídio não viole a Constituição de
Granada e que o artigo 5(2) da mesma impeça que os tribunais de
Granada ou o Conselho Privado interpretem o direito a não ser submetido a
um castigo desumano ou degradante no sentido de que proibe a administração
da pena de morte em todos os casos de condenação por homicídio.[6]
Ao mesmo tempo, os peticionários argumentam que impor uma pena de morte
obrigatória contra o Sr. Jacob, sem dar-lhe a oportunidade de apresentar
provas de circunstâncias atenuantes em relação a sua pessoa ou com o delito
cometido, constitui uma violação de seus direitos consagrados nos
artigos 4, 5, 8 e 24 da Convenção.
25. Em respaldo a sua
posição, os peticionários referem-se à prática de outros Estados e citam,
por exemplo, o caso Woodson contra Carolina del Norte[7]
no qual a Corte Suprema de Estados Unidos entendeu que a imposição
automática da sentença de morte contra todos os condenados por um
delito específico é incompatível com “a evolução das normas de decência que
são um sinal de maturidade de uma sociedade”. Os peticionários argumentam
que a Corte Suprema deixou claro que a aplicação de uma sentença de morte
obrigatória em todos os casos de homicídio, sem critérios objetivos para sua
aplicação nos casos particulares, depois de uma audiência imparcial, é
inconstitucional. Ademais, os peticionários indicam que a Corte Suprema
entendeu também que:
nos casos de pena capital, o respeito
fundamental pela humanidade que orienta a oitava emenda requer a
consideração do caráter e os antecedentes do réu e das circunstâncias do
delito, como parte constitucionalmente indispensável do processo de
aplicação da pena de morte.[8]
26. Os peticionários
entendem que o Tribunal Constitucional de África do Sul foi além e seguiu o
Tribunal Constitucional da Hungria, declarando que a pena de morte é
inconstitucional per se, na Decisão 23/1990(X.31). No caso
Bachan Singh contra Estado de Punjab, a Corte Suprema da Índia
determinou que a pena de morte não é inconstitucional per se,[9]
em parte porque existia discricionariedade judicial para sua aplicação. Com
base nestas autoridades nacionais, os peticionários argumentam que os
Estados que mantém a pena de morte devem estabelecer uma distinção entre
homicídio punível com pena capital e o homicídio não punível com pena
capital, e devem estabelecer um procedimento adequado para o pronunciamento
das sentenças que permita examinar se deve impor-se ou não a pena de morte
nos casos puníveis com pena capital.
27. A este respeito,
os peticionários fazem referência a uma emenda de 1992 à Lei de delitos
contra a pessoa de 1861 da Jamaica, que distingue entre o homicídio
punível com pena capital e o homicídio não punível com pena capital. Alegam
que, se o Sr. Jacob tivesse sido julgado no Reino Unido ou na Jamaica,
teria sido submetido à acusação de “homicídio não punível com pena capital”,
pois seu delito não foi um homicídio de caráter horrendo que justifique a
pena de morte. Por último, os peticionários afirmam que a legislação de
Belize incorporou a discricionariedade judicial na aplicação da
pena de morte.
28. Os peticionários
argumentam que a Convenção Americana é um instrumento vivo, que respira e
evoluciona, refletindo as normas contemporâneas de justiça moral e decência,
e que comparte esta qualidade com outros instrumentos internacionais como o
Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (doravante denominado “o
PIDCP”) e a Convenção Européia para a Proteção dos Direitos e
Liberdades Fundamentais (doravante denominada “a Convenção Européia”).[10]
Os peticionários indicam que aceitam que o artigo 4 da Convenção
Americana não qualifica a pena de morte como ilegítima per se, porém,
de acordo com os comentaristas,[11]
o artigo 4 da Convenção é mais restritivo das circunstâncias em que se
pode impor a pena de morte, em comparação com as disposições pertinentes do
PIDCP e da Convenção Européia.
29. Segundo os
peticionários, o artigo 4 da Convenção é expressamente abolicionista
em sua orientação e aspiração, e prescreve condições para a implementação da
pena de morte. Por exemplo, a pena de morte não pode ser aplicada para
menores de 18 anos ou maiores de 70 anos, nem a réus primários. Os
peticionários alegam que a aplicação da pena de morte obrigatória
contra o Sr. Jacob pode tornar-se violatória do artigo 4 em duas situações.
Em primeiro lugar, não se pode considerar que esta pena esteja reservada
exclusivamente para os delitos mais graves, como estipulado pelo artigo
4(2). Ademais, não se distingue entre os distintos casos de homicídio, nem
garante que casos iguais sejam tratados igualmente, motivo pelo qual resulta
arbitrária e pode causar discriminação injusta.
30. Os peticionários
afirmam que os redatores da Convenção Americana, após considerar
devidamente as tendências abolicionistas nos Estados hispânicos e as
tendências restricionistas nos Estados Unidos, pretenderam que a restrição
aos casos mais graves do artigo 4(2) fosse mais que um mero rótulo legal e
exigisse certa classificação ou a oportunidade de apresentar argumentos
sobre se uma determinada alegação de homicídio merece a morte. Ademais, os
peticionários argumentam que a maneira em que se administra a pena na
Granada torna a privação da vida arbitrária e contraria o artigo 4(1)
da Convenção Americana, e que o fato de que certas sentenças de morte
serem legítimas em virtude do artigo 4(2) da Convenção Americana não
significa que não possam ser consideradas arbitrárias em virtude do artigo
4(1), ou cruéis, desumanas ou degradantes, em vioação do artigo 5 da
Convenção Americana.
31. Os peticionários
argumentam que se pode chegar a conclusões similares em relação ao artigo 5
da Convenção Americana. Segundo os peticionários, foi reconhecido há
muito tempo pelas autoridades judiciais que a pena de morte tem
características que a descrevem como cruel e desumana, mas isto não a torna
ilegítima quando aplicada em conformidade coma as obrigações internacionais
dos Estados.[12] Ao mesmo
tempo, os peticionários argumentam que a pena de morte pode ser considerada
ilegal pela maneira em que é imposta e que certos fatores vinculados à
maneira em que foi imposta a sentença de pena morte contra o Sr. Jacob
podem ser considerados violatórios do artigo 5 da Convenção e
determinarem a ilegitimidade da execução em virtude do artigo 4 da
Convenção. Esses fatores incluem o período transcorrido desde a imposição da
sentença, as condições de detenção do Sr. Jacob em espera de execução e a
crueldade de sentenciar à morte quando existe na Granada uma moratória na
aplicação das sentenças de morte há 20 anos.
32. Os peticionários
argumentam que a sentença de morte obrigatória imposta ao Sr. Jacob viola os
artigos 8 e 24 da Convenção visto que a Constituição da Granada não
permite alegar que sua execução é inconstitucional por ser desumana,
degradante ou cruel, nem outorga ao Sr. Jacob o direito a uma audiência ou
um julgamento sobre a questão se a pena de morte deve ser imposta ou
executada. Os peticionários afirmam também que o Estado violou os direitos
do Sr. Jacob à igual proteção da Lei ao impor-lhe uma sentença de
morte obrigatória sem nenhum processo judicial para estabelecer se a pena
deve ser imposta ou executada nas circunstâncias de seu caso.
33. Os peticionários
afirmam que a sentença de morte obrigatória é um castigo arbitrário e
desproporcionado a menos que exista margem para circunstâncias atenuantes
individuais, e que sequer se pode impor uma sentença de custódia breve sem
outorgar essa oportunidade de apresentar atenuantes perante a autoridade
judicial que pronuncia a sentença. De acordo com os peticionários, é
necessário que existam critérios imparciais e objetivos para determinar se
um condenado de homicídio deve realmente ser executado e, caso se execute a
todos os homicidas, a pena de morte seria cruel por não admitir nenhuma
discricionariedade. Os peticionários também argumentam que uma Lei que é
obrigatória na etapa da sentença e comporta uma
discricionariedade pessoal ilimitada na etapa de comutação rompe com
os princípios definidos pela Corte Suprema dos Estados Unidos e viola
o princípio da igualdade perante a Lei. Os peticionários argumentam
que em Granada nem todos os sentenciados a morte são executados e que opera
a prerrogativa de clemência para comutar uma série de penas.
34. Por último, os
peticionários sugerem que o Estado considere a conversão da moratória
das execuções que existe em Granada desde 1978 em uma abolição legislativa.
A este respeito, os peticionários indicam que aceitam que o Estado não tenha
abolido a pena de morte em sua legislação e não a tenha aplicado desde 1978.
Os peticionários argumentam que nos últimos vinte anos várias pessoas
foram sentenciadas à pena de morte pelo delito de homicídio e que elas
vem sofrendo os horrores da expectativa de morrer na forca e estão
confinadas à espera de execução nas celas da penitenciária de
Richmond, sem nenhuma intenção real das autoridades de executar o castigo.
Os peticionários assinalam que respeitam as tendências humanitárias do
Governo de Granada que deram lugar à moratória, mas sugerem que esta
moratória de facto deveria ser transformada em abolição legislativa.
Os peticionários afirmam que, se o Estado derroga a pena de morte mediante
legislação, a sentença de morte contra o Sr. Jacob deve ser comutada
rapidamente por prisão perpétua, para que ele não sofra anos a agonia da
incerteza acerca de sua possível execução.
(2) A
perrogativa de clemência
35. Os peticionários
argumentam que, na medida em que os rigores da pena de morte
obrigatória são mitigados pela faculdade de indulto e comutação da
sentença exercida pelo Comitê Assessor sobre a prerrogativa de
clemência, de acordo com o disposto nos artigos 72, 73 e 74[13]
da Constituição de Granada, não existem critérios para o exercício
dessa discricionariedade, nem informação sobre se esta discricionariedade é
exercida tendo em conta as provas admissíveis quanto aos fatos vinculados às
circunstâncias do delito. Também indicam que o réu não tem direito a
apresentar comentários orais ou escritos sobre a questão do indulto, não tem
direito a ver ou comentar o relatório do juiz de primeira instância que o
Comitê Assessor deve examinar de acordo com o artigo 74(1) da
Constituição de Granada, nem comentar alguma das razões identificadas por
este juiz ou por outros com relação a se deve ou não executar a pena de
morte .
36. Os peticionários
indicam que no caso ReckLei contra O Ministro de Segurança Pública
N° 2,[14] o Conselho
Privado entendeu que o condenado não tem direito a apresentar argumentos nem
a assistir a audiência perante o Comitê Assessor sobre a Prerrogativa de
Clemência estabelecido conforme os artigos 73 e 74 da Constituição de
Granada. Aliás, o Conselho Privado decidiu que a faculdade de indulto é
pessoal do ministro responsável e não está sujeita a revisão judicial,
declarando o seguinte:
O exercício real, por este Ministro
designado, de sua discricionariedade no caso de pena de morte é
diferente. Este relaciona-se com um regime automaticamente aplicável
de acordo com o ministro designado, depois que este consulta o Comitê
Assessor, que decide, em exercício de sua discricionariedade pessoal, se
recomenda ou não o Governador Geral a seguir o curso da Lei. Por
sua própria natureza, a discricionariedade do Ministro, se exercida em favor
do condenado, implicará num afastamento da Lei. Essa decisão é
adotada como ato de clemência e, como se dizia antes, como ato de graça.[15]
37. Os peticionários
também afirmam que a violação dos direitos do Sr. Jacob à igualdade
perante a Lei em razão da pena de morte obrigatória está ainda mais agravada
pelo fato de que não tem o direito a ser ouvido perante o Comitê
Assessor sobre a prerrogativa de clemência, o que, de por si só, é
violatório do artigo 4(6) da Convenção Americana. A este respeito, os
peticionários argumentam que é possível que os cidadãos mais pobres de
Granada tenham menos possibilidades que os ricos de receber uma comutação ou
outras formas de tratamento discriminatório de acordo com a situação vigente,
embora se desconheca a existências de estudos empíricos sobre esta questão.
Os peticionários referem-se a decisões da Corte Suprema dos Estados
Unidos e ao Tribunal Constitucional de África do Sul, as quais identificaram
uma tendência à discriminação na aplicação da prerrogativa de
clemência. Ademais, os peticionários afirmam que compete à parte que priva a
vida do Sr. Jacob estabelecer a inexistência de desigualdade e discriminação
na sua legislação penal.
c.
Artigo 5 – Condições de detenção e método de execução
(i) Condições de detenção
38. Os peticionários
argumentam que o Estado violou os direitos do Sr. Jacob consagrados nos
artigos 5(1) e 5(2) da Convenção, em razão de suas condições de
detenção. De acordo com os peticionários, desde a reclusão do Sr.
Jacob na penitenciária de Richmond Hill ele vem sendo mantido em
condições consideradas por organizações internacionais de direitos humanos
como violatórias de normas internacionalmente reconhecidas. Os peticionários
argumentam que as organizações não governamentais concluiram que o Estado
violou uma série de instrumentos internacionais destinados a dar aos
reclusos um nível mínimo de proteção, em razão de condições insuficientes de
alojamento, higiene, alimentação e atenção médica.
39.
A fim de respaldar as suas alegações, os peticionários recorrem à informação
relacionada com as condições carcerárias no Caribe em geral. A
respeito, os peticionários informam que todos os reclusos a espera de
execução em Granada estão confinados na penitenciária de Richmond
Hill, que foi construida no século XIX; que esta penitenciária foi
desenhada para alojar 130 reclusos, mas em outubro de 1996 tinha uma
população de 330 reclusos. Os peticionários referem-se a vários relatórios
da organização não governamental "Caribbean Rights", que no
relatório de 1990, "Deprived of their Liberty," a organização
formulou as seguintes observações sobre as condições carcerárias no Caribe
em geral, incluindo Granada:
Na
maioría das prisões visitadas no Caribe, os reclusos tem que usar um balde
em frente dos demais e permanecem na cela com esse balde durante
muitas horas, com frequência 15 ou 16 horas por dia. Este era o caso
na prisão para homens de San Vincente, Granada, Trinidad e South
Camp Rehabilitation Centre, bem como na penitenciária do Distrito
de St. Catherine, na Jamaica.[16]
Tanto em San
Vincente como em Granada, o uniforme da penitenciária para homens
consistia numa camiseta e calças curtas azuis, decentes mas não muito
dignos.
Em Granada, não
havia celas de castigo separadas. Os reclusos castigados eram
divididos em blocos de segurança especial. Não existia castigo
corporal, mas o castigo era de dois tipos, alimentação restringida e perda
das saídas das celas por até 90 dias, embora
soube-se que eram raros os casos de reclusos que perderam as saídas por
tanto tempo. Não existem mecanismos de apelação contra a imposição de
castigos.[17]
40. O
relatório de 1990 do Caribbean Rights também indica que nesse ano
havia 20 reclusos sentenciados a morte em Granada, e descreve as condições
da reclusão a espera de execução em Granada nos seguintes termos:
Os
reclusos sentenciados a morte eram mantidos em unidades de segurança
especial atendidas por funcionários carcerários que usavam um uniforme
diferente dos funcionários da penitenciária no resto das
instalações, um uniforme verde do tipo de combate. Havia três unidades
deste tipo, cada uma com um corredor no meio e oito ou dez celas de
cada lado da porta. As portas da cela eram maciças, com
uma abertura retangular na altura da vista. Os reclusos destas
unidades usavam a mesma roupa que os demais reclusos, que consiste numa
camiseta e uma calça curta azul. Quando uma visita chegava, os
funcionários carcerários nas unidades de segurança especial abriam a porta
exterior, cumprimentavam o funcionário superior presente e recitavam uma
declaração de estilo militar que incluia os números dos
recluidos e a menção de que tudo estava em ordem. Logo, o oficial
recorria a fila gritando o nome de cada recluso a medida que passava.
O recluso punha-se em posição de atenção em meio da cela, com as mãos
nas costas e respondia "Senhor"… Os reclusos da unidade de segurança
especial dispunham de uma hora para exercícios por dia, caso fosse possível,
e as vezes um pouco mais.[18]
41. Baseada nestas
observações, a Caribbean Rights formulou diversas recomendações a
respeito das condições de detenção dos condenados no Caribe,
incluindo aquelas descritas a seguir:
O
tratamento dos reclusos a espera de execução exacerba um castigo que já é
totalmente inaceitável. A excepcional desumanidade das condições
físicas denunciadas na Guiana e Trinidad e Tobgo observadas em San Vicente e
Granada constituem uma imposição intolerável de crueldade. É
compreensível que se imponha uma grande medida de segurança e é necessário
certo controle, mas manter os reclusos sentenciados a morte, a vezes durante
anos, em condições equivalentes ou piores que as celas de castigo, é
intolerável.[19]
A manutenção dos reclusos sentenciados a
morte nas condições que atualmente imperam nos blocos de segurança
especial de Granada é inapropriada e deve cessar de imediato.
Obrigar os prisioneiros sentenciados a morte a
viver com luz 24 horas por dia deve cessar de imediato.
Restringir o
programa de atividades dos reclusos a espera de sentença de morte a
uma hora de exercício por dia deve cessar de imediato.
Os reclusos sentenciados a morte devem ter
direito a um número substancial e um tempo substancial de visitas com seus
familiares.
42.
Da mesma forma, num relatório de dezembro de 1991 entitulado "Improving
Prison Conditions in the Caribbean," a Caribbean Rights assinalou
várias preocupações formuladas por Vivien Stern, Secretária Geral do
Penal Reform International, em relação aos direitos de visita dos
reclusos e sua possibilidade de intercambiar correspondência:
Em
Granada, a visita oficial permitida é de 15 minutos por mês para os reclusos
condenados e de 15 minutos por semana para os reclusos não condenados.
Um contato normal civilizado era impossível. A visita era realizada através
de grades, com uma separação entre as duas grades de umas 18 polegadas,
através das quais o visitante e o recluso podiam comunicar-se.
Provavelmente, a única coisa a se fazer nestas circunstâncias era gritar um
ao outro. Escrever correspondência é outra manera de manter contato.
Também neste aspecto existiam severas restrições. Em Granada, os
reclusos podem escrever e receber uma carta por mês. Toda a
correspondência que entra e sai era lida por censores, inclusive as cartas
escritas por aqueles que haviam cometido delitos menores.[20]
43.
Em respaldo as suas alegações sobre as condições de detenção do Sr. Jacob
violatórias do artigo 5(1) e 5(2) da Convenção, os peticionários
referem-se a várias decisões do Comitê de Direitos Humanos da ONU (doravante
denominado "Comitê da ONU"), que determinou que as condições de
detenção violavam os artigos 7[21]
e 10(1)[22] do Pacto
Internacional de Direitos Civis e Políticos (PIDCP). Estes casos
incluem Antonaccio contra Uruguay,[23]
no qual o Comitê entendeu que a detenção em confinamento solitário durante
três meses e a denegação de tratamento médico constituiam uma violação do
Pacto, e De Voituret contra Uruguay,[24]
no qual o Comitê entendeu que o confinamento solitário por três meses numa
cela praticamente sem luz natural violava os direitos do detido em virtude
do Pacto. Os peticionários também referiram-se à decisão de Mukong
contra Camerún,[25] em que
o Comitê da ONU sugeriu que as condições de detenção que não cumpriam
com as Regras Mínimas da ONU para o Tratamento de Reclusos violava os
artigos 7 e 19(1) do PIDCP, e que as normas mínimas para o tratamento humano
dos reclusos são aplicáveis independentemente do nível de desenvolvimento do
Estado.
Quanto às
condições de detenção em geral, o Comitê observa que devem ser cumpridas
certas normas mínimas em relação com as condições de detenção,
independentemente do nível de desenvolvimento do Estado parte. (Por exemplo,
as Regras Mínimas da ONU para o Tratamento do Recluso). Cabe
ressaltar que estes são requisitos mínimos que o Comitê considera que devem
ser observados sempre, embora as condições econômicas ou orçamentárias
dificultem o cumprimento destas obrigações.[26]
44.
Os peticionários argumentan que a jurisprudência da Corte Européia sobre o artigo
3[27] da Convenção
Européia respalda suas alegações de que as condições de detenção do Sr.
Jacob são violatórias de seus direitos consagrados no artigo 5 da Convenção
Americana. Os peticionários baseiam-se no Caso Grego,[28]
en que a Corte conclui que as condições de detenção podem equivaler a
tratamento desumano quando levam ao confinamento, falta de artefatos para
dormir, elementos insuficientes de higiene, alimentos e recreação
insuficientes e a detenção sem comunicação. Da mesma forma, em Chipre
contra Turquía,[29] a Corte
concluiu que as condições em que o alimento era racionado a água potável e o
tratamento médico oferecidos aos detidos constituiam um tratamento desumano.
Os peticionários também argumentam que esses casos reconheciam que a falta
de prestação de atenção médica adequada poderia configurar um tratamento
desumano, ainda que não houvesse maus tratos.
45
Além disso, os peticionários argumentam que as condições em que está detido
o Sr. Jacob na penitenciária de Richmond Hill constituem violações
das Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos, a saber:
as regras 10, 11ª, 11B, 12, 13, 15, 19, 22(1), 22(2), 22(3), 24, 25(1),
25(2), 26(1), 26(2), 35(1), 36(1), 36(2), 36(3), 36(4), 57, 71(2), 72(3) e
77.
46.
Com relação ao artigo 4 da Convenção, os peticionários argumentam que
o Sr. Jacob está detido em condições desumanas e degradantes, que tornam
ilegítima a execução da sentença e que executá-lo em tais
circunstâncias constituiria uma violação dos direitos consagrados nos
artigos 4 e 5 da Convenção Americana. A fim de apoiar a sua
petição, os peticionários referem-se ao caso de Pratt e Morgan contra o
Procurador Geral da Jamaica[30]
em que o Conselho Privado entendeu que a detenção prolongada a espera da
pena de morte violaria o direito consagrado na Constituição da Jamaica
a não ser submetido a um tratamento desumano e degradante. Os peticionários
argumentam também que a ilegitimidade da execução do Sr. Jacob não
pode ser considerada separadamente da detenção que a precedeu e que
deve ser considerada que as condições de detenção a que está submetido
tornam ilegítima sua execução, da mesma maneira que a detenção
prolongada a espera de execução.
(ii)
Método de execução em Granada
47.
Os peticionários argumentam que a execução da sentença de morte na forca,
como previsto na legislação da Jamaica, constitui um tratamento ou castigo
cruel e desumano per se, violatório dos artigos 5(1) e 5(2) da
Convenção. A este respeito, os peticionários alegam que, ainda que o
artigo 4(2) da Convenção admita a imposição da pena de morte em
certas circunstâncias limitadas, todo método de execução previsto por lei
deve estar desenhado de modo de evitar um conflito com o artigo 5 da
Convenção.[31]
48. Em respaldo a seus argumentos, os peticionários
anexaram relatos detalhados dos efeitos físicos, fisiológicos e
psicológicos do enforcamento de um recluso condenado, descritos no
depoimento do Dr. Harold Hillman de 28 de abril de 1999, o Dr. Albert Hunt,
de 1º de julho de 1997 e do Dr. Francis Smith, de 24 de março de1996.
Com base nestas evidências, os peticionários defendem que a execução da
sentença de morte do Sr. Jacob na forca violaria o artigo 5(2) da
Convenção posto que:
(a)
a morte por enforcamento constitui um tratamento desumano e degradante, já
que não causa a morte instantânea e existe um alto risco inadmissível
de que o Sr. Jacob sofra uma morte desnecessariamente dolorosa e torturante
por estrangulação;
(b)
a pressão no cérebro aumentará e isto vem normalmente acompanhado de graves
dores de cabeça. A maior pressão pode ser vista pelo inchaço do rosto,
olhos e língua;
(c)
a obstrução da traquéia eleva a concentração de dióxido de carbono no
sange, o que leva a que a pessoa queira respirar mas não pode fazê-lo devido
à obstrução. Isto causa grande ansiedade como ocorre durante a estrangulação.
A pessoa não pode gritar nem reacionar normalmente à ansiedade e a dor, pois
tem os membros atados;
(d)
a pele da área onde está a corda é rasgada com a caída do corpo e isto
provoca imensa dor; e
(e)
os
efeitos humilhantes do enforcamento no corpo equivalem claramente a um
tratamento e castigo degradante.
49. Na opinião dos peticionários, a execução do Sr.
Jacob por enforcamento nestas circunstâncias não satisfaria a prova do
“menor sofrimento físico e mental possível”, motivo pelo qual é um
tratamento cruel e desumano, violatório do artigo 5 da Convenção.
(d) Artigo 8 –
Indisponibilidade de assistência jurídica para ações constitucionais
50.
Os peticionários afirmam que o Estado violou os direitos do Sr. Jacob
consagrados no artigo 8 da Convenção porque ele não teve acesso
à assistência jurídica para iniciar uma ação constitucional perante os
tribunais de Granada. Os peticionários alegam que o Sr. Jacob é indigente
e, portanto, não possui recursos privados para iniciar uma ação
constitucional a fim de impugnar a violação de seus direitos constitucionais.
Os peticionários também alegam que em Granada existe grande escassez de
advogados dispostos a representar o Sr. Jacob gratuitamente. Os
peticionários afirmam que o fato de o Estado não proporcionar assistência
jurídica ao Sr. Jacob para propor uma ação constitucional lhe nega um
recurso efetivo, que inclui o acesso de fato e de direito aos tribunais. A
fim de respaldar suas alegações, os peticionários recorrem as decisões da
Corte Européia de Direitos Humanos nos casos Golder contra Reino
Unido,[32] e Airey
contra Irlanda,[33] em que
a Corte Européia entendeu que o artigo 6 da Convenção Européia[34]
impõe obrigações positivas aos Estados em proporcionar assistência jurídica
no interesse da justiça.
51. Os peticionários
argumentam que trata-se de uma interpretação similar do artigo 8 da
Convenção Americana. Sendo assim, a ação constitucional nas circunstâncias
do caso do Sr. Jacob deve ser considerada como uma ação penal para efeitos
do artigo 8(2) da Convenção, posto que deriva de um processo penal
anterior e poderia servir para revogar sua sentença de pena de morte.
Cosequentemente, os peticionários argumentam que o artigo 8(2) da
Convenção obriga ao Estado a oferecer assistência jurídica ao Sr. Jacob para
iniciar una ação constitucional relacionada ao seu proceso penal. Os
peticionários argumentam também que o fato de que o Sr. Jacob será executado
se não prosperar sua impugnação constitucional, também pesa em favor desta
interpretação.
B.
Posição do Estado
52.
Até a data do presente relatório, o Estado não havia respondido a nenhuma
das comunicações da Comissão, datadas de 9 de junho de 1999 e 25 de
setembro de 2000, nem proporcionado informação alguma à Comissão em relação
com a admissibilidade e os méritos da petição, e tampouco havia
respondido a oferta da Comissão de facilitar uma solução amistosa
entre as partes.
IV.
ANÁLISE
A.
Competência da
Comissão
53.
A Convenção entrou em vigor para o Estado de Granada em 18 de julho de 1978
quando este depositou seu instrumento de ratificação. Os peticionários
alegam a violação dos artigos 4, 5, 7, 8 e 24 da Convenção com
respeito a atos ou omissões ocorridos em Granada depois que a Convenção
entrou em vigor para o Estado. Ademais, a petição neste caso foi
interposta pelos peticionários, advogados de Londres, Reino Unido, em
nome de Benedict Jacob, cidadão do Estado de Granada. Por conseguinte, a
Comissão tem jurisdição ratione temporis, ratione materiae, e
ratione pessoae para examinar as denúncias deste caso.
B.
Outros fundamentos da Admissibilidade
1.
Esgotamento dos recursos internos
54.
Os peticionários argumentam que o Sr. Jacob esgotou os recursos internos de
Granada depois do desacolhimento de sua apelação contra sua sentença por
parte do Tribunal de Apelações do Caribe Oriental de Granada, em 8 de
dezembro de 1997. O Estado não encaminhou à Comissão observações
a respeito da admissiblidade, incluindo o esgotamento dos
recursos internos, nem sobre o mérito da petição, apesar das
comunicações da Comissão ao Estado datadas de 9 de junho de 1999 e 25
de setembro de 2000. Com base nos antecedentes e de conformidade com
os princípios de direito internacional geralmente reconhecidos e nas
decisões anteriores da Comissão,[35]
esta conclui que o Estado renunciou tacitamente ao direito a objetar a
admissibilidade da petição em virtude da regra do esgotamento dos
recursos internos, motivo pelo qual decide que a petição é admissível, de
acordo com o artigo 46(1)(a) da Convenção.
2.
Apresentação da petição no prazo regulamentar
55. Os peticionários
indican que esta petição foi apresentada no prazo, de acordo com o artigo
46(1)(b) da Convenção. Os peticionários alegam que o Sr. Jacob foi condenado
por homicídio e sentenciado a morte em 30 de junho de 1997, apelou da sua
sentença perante o Tribunal de Apelações do Caribe oriental de Granada, mas
a mesma foi desacolhida em 8 de dezembro de 1997. Os peticionários
indicam que o Sr. Jacob presentou-se ao Comitê Judicial do Conselho Privado
a fim de solicitar uma autorização para apelar como indigente, mas que o
Conselho Privado indeferiu seu pedido em 16 de dezembro de 1998. O Estado
não contestou a admissibilidade da petição por estar fora de prazo nem
demonstrou por outra via que a petição não tenha sido apresentada no prazo.[36]
Portanto, a Comissão conclui, de acordo com sua jurisprudência,
[37] que esta petição é
admissível conforme o artigo 46(1)(b) da Convenção Americana.
3.
Duplicação de procedimentos
56. Os peticionários
indicaram que a matéria da petição do Sr. Jacob não foi submetida a
exame de nenhuma outra instância de investigação internacional, e o Estado
não refutou a questão da duplicação de procedimentos, motivo pelo qual a
Comissão conclui que a petição é admissível de conformidade com os
artigos 46(1)(c) e 47(d) da Convenção.
4. Caráter
razoável das reivindicações
57. Os peticionários
alegaram que o Estado violou os direitos do Sr. Jacob consagrados nos
artigos 4, 5, 8 e 24 da Convenção, e apresentaram alegações de fato
que tendem a estabelecer que as supostas violações poderiam ser verdadeiras.
Portanto, a Comissão conclui, sem prejulgar o mérito do caso, que os
peticionários apresentaram denúncias razoáveis referentes a violação
dos direitos do Sr. Jacob e que a petição não é inadmissível por
virtude do disposto nos artigos 47(b) e 47(c) da Convenção.
5.
Conclusão sobre a admissibilidade
58. De acordo com a
análise exposta anteriormente a respeito do requisitos da Convenção e
das disposições aplicáveis do Regulamento da Comissão, e sem prejulgar o
mérito da petição, a Comissão declara que as denúncias apresentadas na
petição do Sr. Jacob são admissíveis, de conformidade com o artigo 46 da
Convenção.
B.
Mérito da petição
1.
Norma de exame
59.
Embora as partes tenham sugerido diversas normas a fim de orientar a
Comissão na determinação das questões sob seu exame, esta esclarece
que empreenderá a análise do mérito da denúncia dos peticionários
através de um escrutínio riguroso da prova. Conforme esta norma de exame, a
Comissão submeterá as alegações das partes a um exame mais rigoroso para
assegurar que toda privação da vida por parte do Estado em virtude de
uma pena de morte cumpra estritamente com os artigos 4, 5 e 8 da Convenção.[38]
Esta prova de um escrutínio mais rigoroso, como reconhecido
previamente pela Comissão, é compatível com o enfoque restritivo das
disposições dos tratados de direitos humanos sobre pena de morte
adotado pela Comissão e outras autoridades internacionais para com as
disposições sobre pena de morte dos tratados de direitos humanos[39].
A prova de un escrutinio mais rigoroso tampouco impede que a Comissão
aplique a fórmula da quarta instância, conforme a qual, em princípio,
não examinará a sentença prolatada por tribunais internos que atuaram
dentro de sua competência e com as devidas garantias judiciais, a menos que
as alegações do peticionário impliquem numa possível violação de alguns dos
direitos consagrados na Convenção.
Portanto, a Comissão aplicará o escrutínio mais rigoroso na determinação das
denúncias do presente caso.
2. Artigos
4, 5 e 8 da Convenção – Caráter obrigatório da pena de morte
a. O Sr.
Jacob foi sentenciado a uma pena de morte obrigatória
60. Como relatado
anteriormente, os peticionários alegam: i) a violação dos artigos 4,
5, 8 e 24 da Convenção em relação ao caráter obrigatório da pena
de morte e o processo para a concessão de uma anistia, indulto ou
comutação da sentença em Granada; ii) a violação do artigo 5 da
Convenção em relação as condições de detenção do Sr. Jacob, e iii) a
violação do artigo 8 da Convenção em relação a indisponibilidade de
assistência jurídica para iniciar ações constitucionais em Granada.
61.
Como assinalado anteriormente, o Estado não respondeu as comunicações da
Comissão de 9 de junho de 1999 e 25 de setembro de 2000, solicitando que
enviasse a informação que considerasse pertinente em relação ao esgotamento
dos recursos internos e as denúncias formuladas na petição do
Sr. Jacob, nem respondeu a comunicação da Comissão em relação a
possibilidade de uma solução amistosa no caso do Sr. Jacob. Em
consequência, ao determinar o mérito das alegações que constam na
petição em relação com o Sr. Jacob, a Comissão presumirá que os fatos
contidos nela são verdadeiros, sempre que as provas não levem a conclusão
diferente, de conformidade com o artigo 38 do Regulamento da Comissão.
62.
O Sr. Jacob foi condenado por homicídio em virtude da Seção 234 do
Código Penal de Granada, que dispõe que "qualquer pessoa que cometa um
homicídio será sujeita a sofrer a morte e de ser sentenciado a pena de morte".
O delito de homicídio em Granada pode, assim, ser considerado passível de "pena
de morte obrigatória", a saber, uma sentença de morte que a Lei obriga a
autoridade a impor com base exclusivamente na categoria do delito do qual o
réu é considerado culpado. Uma vez que o réu é considerado culpado do
delito de homicídio, a pena de morte deve ser imposta obrigatoriamente.
O Tribunal não pode ter em conta as circunstâncias atenuantes ao impor a
pena de morte e, portanto, uma vez que o Sr. Jacob foi considerado
culpado por homicídio punível com pena capital, a pena de morte era o único
castigo disponível. O Estado não negou o carácter obrigatório da
sentença de morte contra o Sr. Jacob:
Em Granada, a sentença de morte é a sentença obrigatória por homicídio em
virtude da Seção 230 do Código Penal, em seu Capítulo 1, que desde sua
promulgação não foi emendada em nenhum aspecto material para a questão em
estudo. A maneira da execução da sentença autorizada pela
Lei é a forca e o pronunciamento da sentença também estabelece a autoridade
legítima para a detenção do condenado em prisão até que seja executada a
sentença. A continua validade constitucional da sentença de
morte está além de toda dúvida em virtude da Seção 2(1), que
estabelece:
Ninguém será
privado de sua vida intencionalmente exceto em execução da sentença de
um tribunal a respeito de um delito penal conforme a legislação de
Granada.
63. Conforme determinado pela Comissão em casos
anteriores,
se pode considerar que os delitos de homicídio puníveis com pena capital em
Granada estão sujeitos a "uma pena de morte obrigatória", a saber, uma
sentença de morte que a lei obriga a autoridade que pronuncia a sentença
esclusivamente a impor com base na categoria do delito do qual o réu foi
considerado culpado. Uma vez que o réu é considerado culpado pelo
delito de homicídio punível com pena capital, deve ser imposta a pena de
morte. Consequentemente, uma vez decretada a condenação de homicídio
punível com pena capital, o Tribunal não pode ter em conta as circunstâncias
atenuantes ao sentenciar a morte a uma pessoa.
64. Como indicado na parte III deste Relatório,
o Sr. Jacob alega que o Estado violou seus direitos em virtude dos
artigos 4(1), 4(2), 4(6), 5(1), 5(2), 8 e 24 da Convenção Americana,
porque foi sentenciado a uma pena de morte obrigatória pelo delito de
homicídio. O Sr. Jacob também argumenta que o processo de concessão da
anistia, indulto ou a comutação da sentença em Granada não
oferece uma oportunidade adequada para considerar as circunstâncias
individuais e é, per se, violatório do artigo 4(6) da Convenção.
[
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72(1) O
Governador Geral pode, em nome de Sua Majestade,
(a)
outorgar o indulto, com
liberdade total ou sujeito a condições legais, a toda pessoa
condenada por un delito;
(b)
outorgar a toda pessoa a
suspensão indefinida ou por um prazo específico da execução de todo
castigo que lhe foi imposto por um delito;
(c)
comutar a pena imposta contra uma pessoa por
um delito, por outra forma de castigo menos severa, ou
(d)
revogar total ou parcialmente
todo castigo imposto a uma pessoa por um delito ou toda multa ou pena a
favor da Coroa por um delito.
(2) As faculdades
do Governador Geral de acordo com a subseção (1) da presente seção
serão exercidas por ele de acordo com o assessoramento do Ministro
que possa ser transitoriamente designado pelo Governador Geral, atuando em
conformidade com o assessoramento do Primeiro Ministro.
73(1) Haverá um Comitê
Assessor sobre a prerrogativa de clemência que estará integrado por:
(a)
o Ministro transitoriamente
designado em virtude da seção 72(2) desta Constituição, que o
presidirá;
(b)
o Procurador Geral;
(c)
o funcionário médico chefe do Governo de
Granada, e
(d)
outros três membros designados
pelo Governador Geral, por instrumento escrito de punho.
(2)
Um membro do Comitê designado
para ele em virtude da subseção (1)(d) desta seção ocupará o cargo
pelo período especiificado no instrumento de designação: exceto que
seu cargo fique vacante.
(a)
no
caso em que uma pessoa que, na data de sua designação, for
Ministro, se aposenta no cargo de Ministro; ou
(b)
se o Governador Geral por instrumento
escrito assim o instrui.
(3) O Comitê pode atuar não obstante
esteja vacante o cargo ou ausente um membro e suas atuações não serão
invalidadas pela presença ou participação de pessoa alguma que não
tenha direito a estar presente ou a participar destas atuações.
(4) O Comitê pode regular suas
próprias atuações.
(5) No exercício de suas
funções em virtude desta seção, o Governador Geral atuará de acordo com o
assessoramento do Primeiro Ministro.
74(1) Nos casos em
que uma pessoa tenha sido sentenciada à pena de morte (exceto por corte
marcial) por um delito, o Ministro designado transitoriamente em virtude
da seção 72(2) da presente Constituição instruirá o juiz que
atuou no julgamento para que elabore um relatório do caso (ou, se não se
pode obter um relatório do juiz , um relatório sobre o caso,
preparado pelo Presidente da Corte Suprema), conjuntamente com
toda outra informação que surja do expediente do caso ou de outra origem
que possa requerer, a que será submetida à consideração do Comitê Assessor
sobre a Prerrogativa de Clemência; e uma vez obtido o assessoramento do
Comitê, decidirá se apoiará o Governador Geral para que este exerça alguma
das faculdades consagradas na seção 72(1) da presente Constituição.
(2) O Ministro designado
transitoriamente em virtude do artigo 72(2) desta Constituição pode
consultar o Comitê Assessor sobre a Prerrogativa de Clemência antes
de oferecer seu assessoramento ao Governador Geral em virtude da
seção 72(1) desta Constituição em, qualquer caso que não esteja
compreendido na subseção (1) da presente seção mas não estará
obrigado a atuar de acordo com as recomendações do Comitê.
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