80.     Apesar da decisão no  caso Neville Lewis, não existe informação no  presente caso que indique que o Estado estendeu aos condenados os requisitos jurídicos articulados nessa decisão.  Consequentemente e com base na informação disponível, a Comissão conclui que o procedimento ao qual teve acesso o Sr. Lallion para buscar a anistia, o indulto ou a comutação da pena, não lhe garantiu uma oportunidade efetiva e adequada de participar destes processos.

81.     A Comissão também conclui que o Estado violou os direitos do Sr. Lallion em virtude do artigo 4(6) da  Convenção Americana ao não garantir um direito efetivo de solicitar a anistia,  indulto ou comutação da  sentença, apresentar argumentos, pessoalmente ou através de um representante, perante o Comitê Assessor sobre a Prerrogativa de Clemência, e a receber uma decisão deste Comitê Assessor dentro de um prazo razoável  antes de sua execução.

        82.     Tendo em consideração as conclusões anteriore acerca da  legalidade da  sentença de morte imposta ao  Sr. Lallion em virtude dos  artigos 4, 5 e 8 da  Convenção, a Comissão não considera necessário determinar se a sentença do Sr. Lallion a uma pena de morte obrigatória é violatoria de seus direitos à igualdade perante a  Lei, consagrados no  artigo 24 da  Convenção.

          4.       Artigos 4 e 5 – Condições de detenção

83.     Os peticionários alegam que as condições de detenção do Sr. Lallion pelo  Estado constituem uma violação dos  direitos consagrados no artigo 5(1) da  Convenção a que seja respeitada a sua integridade física, mental e moral, e o artigo 5(2) da mesma, a não ser submetido a um castigo ou tratamento cruel, desumano ou degradante. Argumentaram também  que estas condições tornam ilegítima a execução do Sr. Lallion, conforme o disposto pelo  artigo 4 da  Convenção.

        84.     Em respaldo as suas alegações, os peticionários encaminharam à Comissão detalhes das condições de detenção do Sr. Lallion a espera de execução na  Penitenciária de Richmond Hill, Granada, depois de sua condenação  por homicídio, e alegam o seguinte:

O condenado está atualmente recluido a espera de execução numa unidade constituida por uma série de celas que contêm cada uma um recluso.  As celas dos  condenados a morte estão localizadas no nível inferior do edifício principal da  penitenciária, numa zona denominada "Jonestown" (assim chamada pela  matança de Jonestown, na Guiana, América do Sul, ocorrida  há alguns anos).

Sua cela tem aproximadamente 3 x 2 metros e permanece nela sozinho cerca de 23 horas por dia.  O condenado tem uma cama e um colchão, mas não há nenhum outro móvel em sua cela.  Ele também tem um balde que deve usar para suas necessidades fisiológicas e lhe permitem esvaziá-lo uma vez ao dia.  Depois de utilizado o balde, se vê obrigado a suportar o odor e as condições anti-higiênicas até a hora de esvaziá-lo.

A iluminação de sua cela é insuficiente, não há janelas nem iluminação natural , motivo pelo qual não tem ventilação.  A única luz de sua cela é a de uma lâmpada elétrica situada no  corredor, em frente a sua cela.

O condenado tem direito a três refeições por dia.  As vezes lhe é trazida a comida até a sua cela, onde tem que comer sozinho.  A alimentação em geral é de má qualidade. Ele tem acesso à água potável.

O condenado tem direito a uma hora de exercício por dia, mas como não existe equipamento para o exercício, geralemente gasta sua hora de pé no  pátio.

O condenado tem direito a uma visita por mês durante 15 minutos e a escrever e receber uma  carta por mês.

Como recluso a espera de execução, não lhe é perimitido o acesso aos serviços da  penitenciária, não pode utilizar a biblioteca nem tem acesso à capela ou a serviços religiosos.

O condenado recebe uma atenção médica inadequada. As visitas do médico não são periódicas e nem sempre está claro se poderá vâ-lo quando seja necessário.

Não existe um mecanismo de queixas adequado para as denúncias.

          85.     Como descrito na  Parte III deste Relatório, os peticionários também baeiam-se em fontes gerais  de informação relacionadas com as condições carcerárias de Granada e de outros países do Caribe.  Estas fontes incluem relatórios preparados em 1990 e 1991 pela  organização não governamental "Caribbean Rights".  Embora tenham sido elaborados há alguns anos, os relatórios tendem a respaldar as alegações do Sr. Lallion a respeito das condições em que esteve encarcerado desde sua detenção.

          86.     A Comissão considera que as opiniões dos  peticionários devem ser avaliadas à luz das normas mínimas articuladas pelas autoridades internacionais para o tratamento dos  reclusos, incluindo as estabelecidas pelas Nações Unidas.  Em especial as Regras 10, 11A, 11B, 12, 13, 15, 19, 21, 22(1), 22(2), 22(3), 24, 25(1), 25(2), 26(1), 26(2), 35(1), 36(1), 36(2), 36)3), 36(4) 40, 41, 57, 71(2), 72(3), e  77 das Regras Mínimas das Nações Unidas para o Tratamento de Reclusos65  (Regras Mínimas da  ONU) dispõem normas básicas mínimas a respeito de alojamento, higiene, exercício, tratamento médico, serviços religiosos e serviços de biblioteca para os reclusos, nos  seguintes termos:

10.          Os locais destinados aos reclusos e especialmente aqueles que se destinan ao alojamento dos  reclusos durante a noite, deverão satisfazer as exigências de higiene, tendo em conta o clima, particularmente no que concerne o volume de ar, superfície mínima, iluminação, aquecimento e ventilação.

11.          Em todos os locais onde os presos tenham que viver ou trabalhar:

a)                   As janelas terão que ser suficientemente grandes para que o preso possa ler e trabalhar com a luz natural; e deverão estar dispostas de maneira que possa entrar ar fresco, haja ou não ventilação artificial;

b)                   A luz artificial terá que ser suficiente para que o preso possa ler e trabalhar sem prejudicar a sua visão.

12.          As instalações sanitárias deverão ser adequadas para que o preso possa satisfazer suas necessidades naturais no momento oportuno, de forma asseada e decente.

15.          Se exigirá dos presos asseio pessoal e para tal terão água e os artigos de asseio indispensáveis para sua saúde e limpeza.

21.          (1)            O preso que não tenha um trabalho ao ar livre deverá dispor, se o tempo lhe permite, de uma hora pelo menos por dia de exercício físico adequado ao ar livre.

(2)           Os presos jovens e outros cuja idade e condição física o permitam, receberão exercício, educação física e recreativa durante um período reservado. Para isto, terão ao seu dispor o terreno, as instalações e o equipamento necessário.

24.        O médico deverá examinar  cada recluso tão pronto seja possível depois de seu ingresso e posteriormente tantas vezes seja necessário, a fim de determinar a existência de uma doença física ou mental, e tomar as medidas necessárias; assegurar o isolamento dos  reclusos suspeitos de sofrer doenças infecciosas ou contagiosas; assinalar as deficiências físicas e mentais que possam constituir um obstáculo para a readaptação, e determinar a capacidade física de cada recluso para o trabalho.

25.        (1)         O médico estará encarregado de velar pela  saúde física e mental dos  reclusos, e deverá visitar diariamente todos os reclusos doentes, todos os que se queixem de estar doentes e todos aqueles que chame a sua atenção por algum motivo.

(2)         O médico apresentará um relatório ao diretor cada vez que estime que a saúde física ou mental de um recluso tenha sido ou possa ser afetada por qualquer modalidade de reclusão.

40.        Cada estabelecimento deverá ter uma biblioteca para o uso de todas as categorias de reclusos, emparelhada de livros instrutivos e recreativos. Dever-se-á incentivar os reclusos para utilizarem a biblioteca frequentemente.

41.        (1)         Se o estabelecimento contém um número suficiente de reclusos que pertençam a uma mesma religião, será nomeado ou admitido um representante autorizado desse culto. Quando o número de reclusos o justifique, e as circunstâncias o permitam, este representante deverá prestar serviço em caráter contínuo.

(2)         O representante autorizado nomeado ou admitido conforme o parágrafo 1 deverá ser autorizado para organizar periodicamente serviços religiosos e efetuar, cada vez que corresponda, visitas pastorais particulares aos reclusos de sua religião.

(3)         Nunca será negado ao recluso o direito de comunicar-se com o representante autorizado de uma religião e quando um recluso se oponha a ser visitado pelo  representante de uma religião, sua vontade deverá ser respeitada.

42.       Dentro do possível, todo recluso será autorizado a cumprir os preceitos de sua religião, permitindo-se participar nos  serviços organizados no  establecimento e ter em seu poder livros de instrução religiosa de sua crença.

         87.     Com base nas alegações dos  peticionários,  é evidente que o Estado não satisfez essas normas mínimas de um tratamento adequado ao Sr. Lallion.  O efeito acumulativo dessas condições, somado ao tempo prolongado em que o Sr. Lallion esteve recluido em relação ao seu processo penal, não pode ser considerado compatível com o direito a um tratamento humano consagrado no  artigo 5 da  Convenção.66 Segundo a informação proporcionada pelos  peticionários, as condições de detenção do Sr. Lallion não cumprem com várias das normas mínimas  para o tratamento dos  reclusos em áreas como a higiene, o exercício e a atenção médica.

          88.     Por exemplo, o Sr. Lallion denuncia que sua cela não tem janelas, não tem iluminação natural nem ventilação, e que a iluminação artificial da  cela é insuficiente.  Alega também que lhe deram um balde que deve usar para suas necessidades fisiológicas e que lhe é permitido esvaziá-lo somente um vez por dia, de modo que se vê obrigado a suportar odores desagradáveis e condições anti-higiênicas depois que o balde é utilizado.  O Sr. Lallion afirma que não pode usar a biblioteca da  penitenciária, nem tem acesso a um capela ou a serviços religiosos.  Ademais, o Sr. Lallion afirma que recebeu atenção médica inadequada porque as visitas do médico não são periódicas e nunca está claro se poderá vê-lo se necessário.  Finalmente, o Sr. Lallion arguementa que não existem mecanismos nem procedimentos adequados na  penitenciária para tramitar suas denúncias.

89.     O Estado não contestou a petição do Sr. Lallion em relação as condições de detenção em geral em Granada nem aquelas específicas ao Sr. Lallion.  O Estado, no  penúltimo parágrafo de sua contestação à petição, aborda a questão da  detenção prolongada a espera de execução, e declara o seguinte: "Também concordo que os reclusos condenados a espera de execução em princípio não devem ser submetidos a um período prolongado de encarceramento pois sem dúvida padecem uma grande angústia e uma agonia mental nessas condições.  Entretanto, essa angústia é uma consequência inevitável de sua detenção e não constitui uma violação independente de seus direitos constitucionais".

          90.     Sendo assim, a Comissão conclui que as condições de detenção do Sr. Lallion não respeitam sua integridade física, mental e moral, como requerido pelo  artigo 5(1) da  Convenção, de modo que a Comissão entende que o Estado é responsável pela  violação deste dispositivo da  Convenção no que se refere ao Sr. Lallion, conjuntamente com o cumprimento das obrigações impostas ao Estado pelo artigo 1(1) desse instrumento.

5.       Artigos 8 e 25 – Indisponibilidade de assistência jurídica para ações constitucionais

91.     Os peticionários argumentam que nãoo existe uma assistência juridícia efetiva para ações constitucionais perante os tribunais de Granada e que isto constitui uma violação do direito do Sr. Lallion a um julgamento imparcial consagrado no  artigo 8 da  Convenção.  Embora os peticionários não se refiram especificamente ao artigo 25 da  Convenção Americana, isto é, o direito a uma reparação efetiva, a Comissão considera que suas alegações implicam na denegação de um recurso efetivo por lei, o que também  compreende o artigo 25 da  Convenção.  Portanto, a Comissão também analisou indisponibilidade de assistência jurídica para ações constitucionais ao amparo do artigo 25 da  Convenção, de conformidade com o artigo 28(f) do Regulamento da  Comissão.[43]

          92.     Os peticionários afirmam que o fato de que o Estado não proporcione assistência jurídica nega ao Sr. Lallion o acesso a um tribunal, de fato e de direito. Os peticionários argumentam que a interposição de ações constitucionais perante os tribunais internos implica em tratar de questões sofisticadas e complexas de direito que requerem assistência de um advogado.  Ademais, os peticionários afirmam que o Sr. Lallion é indigente e que na  prática não conta com assistência jurídica efetiva para propor ações constitucionais nos  tribunais de Granada.  Os peticionários também afirmam que existe uma grande escassez de advogados em Granada dispostos a representar o Sr. Lallion gratuitamente.

          93.     Com base na informação contida no expediente, a Comissão entende que uma ação constitucional que envolva questões legais da  natureza daquelas formuladas pelo Sr. Lallion em sua petição, como o direito ao devido processo e a adequação de suas condições carcerárias, são processual e substantivamente complexas e não podem ser apresentadas efetivamente pelo  recluso sem a ajuda de uma representação jurídica . A Comissão concluiu em casos anteriores da Granada -  Rudolph Baptiste[44] e Donnason Knights [45] - que o Estado não oferece assistência jurídica aos reclusos para que estes possam propor ações constitucionais e que o Sr. Lallion é indigente e, portanto, não pode obter representação jurídica para propor ações constitucionais por outros meios.

        94.     A Comissão considera que presente caso, as obrigações do Estado com relação à assistência jurídica para propor  ações constitucionais derivam dos  artigos 8 e 25 da  Convenção.  Em especial, a determinação dos  direitos através de uma ação constitucional perante um tribunal superior deve ser elaborada de acordo com os requisitos de um julgamento imparcial, conforme disposto no artigo 8(1) da  Convenção.  Nas circunstâncias do caso do Sr. Lallion, o Tribunal Superior de Granada teria que determinar se a condenação do Sr. Lallion no julgamento da ação penal violou seus direitos constitucionais.  Nesse caso, a aplicação do requisito de uma audiência imparcial no Tribunal Superior deve ser compatível com os princípios do artigo 8(2) da  Convenção.[46] Em consequência, quando um condenado procura uma revisão constitucional de irregularidades no julgamento  penal e carece de meios para obter assistência jurídica para efeitos de propor uma ação constitucional, e quando os interesses da  justiça assim o requeiram, o Estado deve outorgar assistência jurídica.

         95.     A indisponibilidade de assistência jurídica de fato negou ao Sr. Lallion a oportunidade de impugnar num julgamento da imparcial as circunstâncias de sua condenação em virtude da  Constituição de Granada.  Isto, a sua vez, constitui uma violação do direito disposto no artigo 8(1) da  Convenção Americana.[47]

          96.     Ademais, o artigo 25 da  Convenção outorga as pessoas o direito a um recurso simples e rápido perante um tribunal competente, para proteger-se contra atos que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pelas constituições ou leis do Estado ou pela  Convenção.  A Comissão decarou que  direito a um recurso consagrado na  Seção 25, lido conjuntamente con a obrigação que impõe o artigo 1(1) e as disposições do artigo 8(1), deve ser entendido como o direito de toda pessoa a dirigir-se a um tribunal quando algum de seus direitos for violado (seja um direito protegido pela  Convenção, a Constituição ou a legislação interna do Estado afetado), a fim de obter uma investigação judicial a cargo de um tribunal competente, imparcial e independente que estabelecerá se houve o não uma violação e fixará, se for o caso, uma compensação adequada.[48]

          97.     A Corte Interamericana entendeu que são necessários os serviços legais, como questão de direito ou de fato, para que um direito garantido pela  Convenção seja reconhecido, e caso a pessoa não possa obter esses serviços devido a falta de recursos financeiros, esta pessoa ficaria isenta do requisito da  Convenção de esgotar os recursos internos.71  Embora a Corte tenha prolatado esta decisão no contexto das disposições sobre admissibilidade da  Convenção, a Comissão considera que os comentários da  Corte também são aplicáveis no contexto do artigo 25 da  Convenção, nas circunstâncias do presente caso.

          98.     Ao não outorgar assistência jurídica ao Sr. Lallion para que esse pudesse propor uma ação constitucional no processo penal, o Estado impediu que ele utilizasse um recurso a uma corte ou tribunal competente em Granada para proteger-se contra atos que pudessem violar seus direitos fundamentais amparados na Constituição da Granada e na  Convenção. Ademais, em casos de pena capital, em que as ações constitucionais vinculam-se a procedimentos e condições que impõem a pena de morte e, desta forma, vinculam-se  diretamente ao direito à vida e a um  tratamento humano do acusado, a Comissão opina que uma proteção efetiva desses direitos não pode ficar a mercê da perspectiva aleatória de que um advogado esteja disposto para representar o réu gratuitamente.  O direito a uma proteção judicial destes direitos mais fundamentais deve estar garantido através da  prestação efetiva de assistência jurídica para propor ações constitucionais.72  Não se pode dizer que o Estado outorgou essa proteção ao Sr. Lallion.  Consequentemente, o Estado não cumpriu com as obrigações impostas pelo artigo 25 da  Convenção Americana em relação ao Sr. Lallion.

        99.     Por conseguinte, a Comissão conclui que o Estado não respeitou os direitos do Sr. Lallion consagrados no  artigo 8(1) da  Convenção por negar-lhe uma oportunidade de impugnar as circunstâncias de sua condenação num julgamento imparcial sob o amparo da  Constituição de Granada.  A Comissão também conclui que o Estado não ofereceu ao Sr. Lallion um recurso simples e rápido perante um tribunal competente para proteger-se contra atos que violem seus direitos fundamentais reconhecidos pela  Constituição ou a legislação de Granada, ou pela  Convenção e, portanto, violou os direitos do Sr. Lallion à proteção judicial, consagrados no  artigo 25 da  Convenção.

1.         Artigo 7 – O direito à liberdade pessoal e a ser levado sem demora perante um juiz

100.   Os peticionários alegam a violação dos  artigos 7(2), 7(4) e 7(5) da  Convenção, porque o Sr. Lallion foi detido sob custódia policial por mais de 48 horas e não foi notificado sem  demora das acusações que lhe forma imputadas nem foi levado sem demora perante um juiz ou outro funcionário judicial.  Os peticionários alegam que o Sr. Lallion foi detido das 4:15 p.m. do dia  29 de setembro de 1993 até as 1:15 de 1 de outubro de 1993, o que supera as 48 horas estabelecidas pela  legislação interna de Granada.  O Sr. Lallion foi formalmente acusado em 2 de outubro de 1993 e não foi levado perante um juiz antes do dia 4 de outubro de 1993.[49]  O peticionário indica que a Seção 22(3) da  Lei da  Polícia de Granada dispõe: "Será legítimo que um agente de polícia detenha a qualquer pessoa para um interrogatório, durante um período que não exceda as 48 horas, quando acreditar que há suspeitas razoáveis de que cometeu ou está a ponto de cometer um delito penal". 

101.   Os peticionários afirmam que quando o Sr. Lallion negou a responsabilidade pela  morte do falecido, o Sr. Joseph, Superintendente Assistente da  Polícia, declarou que iria ajudá-lo e o oficial Mason escreveu uma declaração num papel, e pediu ao Sr. Lallion que a a assinara. Depois foi levado ao local onde jazia o falecido, e o policial pediu-lhe que descobrisse o cadáver, ordem que foi cumprida por ele. Os peticionários argumentam que o Sr. Lallion foi levado ao destacamento de polícia, onde voltou a ser interrrogado, intimidado e posteriormente obrigadao  assinar uma confissão.

102.   Ao abordar a questão do artigo 7(5) a respeito da necessidade de ser levado sem  demora perante um juiz, a Comissão alegou que é fundamental que uma pessoa seja levada sem demora perante um juiz depois de sua detenção para garantir seu bem-estar e evitar qualquer infração de seus outros direitos.[50]  No  Relatório N° 2/97, no  caso Jorge Luis Bernstein e outros, a Comissão declarou que "o direito à presunção da  inocência exige que a duração da  detenção preventiva não supere o prazo razoável citado no  artigo 7(5)".[51]  Ademais, a Comissão observou que

A fim de garantir uma supervisão judicial efetiva da  detenção, o tribunal competente deve tomar conhecimento rapidamente das pessoas que são mantidas em detenção.  Um dos  propósitos desta medida é proteger o bem-estar das pessoas detidas e evitar toda violação de seus direitos.  A Comissão determinou que, se essa detenção não é comunicada ao tribunal, ou se o tribunal não é  informado dela num prazo razoável a partir da  privação de liberdade, os direitos das pessoas em custódia não serão protegidos e a detenção violará os direitos da  pessoa ao devido processo.[52]

        103.   A Comissão entendeu que, quando que um Estado oferece uma justificação para a detenção preventiva, a Comissão deve determinar se as autoridades do Estado exerceram a diligência devida no  cumprimento de suas obrigações respectivas a fim de garantir que a duração da  detenção não seja irrazoável. [53] Na opinião da  Comissão, essas justificações podem  incluir a presunção de que o acusado tenha cometido um delito, o perigo de que possa fugir, o risco de cometer novos delitos, a necessidade de investigar, a possibilidade de conspiração, o risco de que pressione as testemunhas, e a preservação da ordem pública.[54]

          104.   Outras instâncias internacionais de direitos humanos empenharam-se em definir com mais precisão a expressão  "sem  demoras" dos  detidos perante um juiz.  O Comitê de Direitos Humanos da  ONU, no  caso Peter Grant contra  Jamaica,[55] chegou a conclusão de que um período de uma semana entre a detenção e o dia em que o acusado seja levado perante um juiz constitui uma violação do artigo 9(3) do PIDCP[56] [equivalente ao artigo 7(5) da  Convenção].  Ademais, na  decisão do Comitê no  caso Paul Kelly contra Jamaica[57]  a opinão individual apresentada pelo  Sr. Bertil Wennergren indicou que a expressão "sem  demora" não permite uma demora de mais de dois ou três dias.

          105.   Ademais, a Corte Européia de Direitos Humanos enfatizou a importância da  "celeridade" no  contexto do artigo 5(3) da  Convenção Européia, conforme descrito a seguir:[58]

…Consagra um direito humano fundamental, a saber, a proteção do individuo contra interferências arbitrárias do Estado no seu direito à liberdade (cita omitida).  O controle judicial das interferências do executivo com o direito individual à liberdade é uma característica essencial da  garantia consagrada no artigo 5(3) [da  Convenção Européia sobre Direitos Humanos] que procura minimizar o risco de arbitrariedade.  O controle judicial está implícito no  regime de direito, "um dos  princípios fundamentais de uma sociedade democrática".[59]

          106.   No  caso de Brogan e outros, a Corte Européia de Direitos Humanos entendeu que um período de detenção de quatro dias não cumpria com o requisito de comparecimento "sem demora" perante uma autoridade judicial.[60]  Da mesma forma, no  caso de Koster contra Países Bajos,  a Corte Européia chegou a conclusão de que uma demora de cinco dias superava o significado de "sem demora" em levar a um detido perante uma autoridade judicial, motivo pelo qual era violatório do artigo 5(3) da  Convenção Européia.[61]

          107.   A Comissão considera que é essencial que o detido seja levado perante uma autoridade judicial a fim de que seja revisada a legalidade de sua detenção, não somente para cumprir com os requisitos estabelecidos no  artigo 7(5), mas também para garantir a proteção dos  demais direitos do recluso enquanto está em detenção e reduzir ao mínimo o risco de arbitrariedade.[62] Ademais, a Comissão observa que a legislação doméstica de Granada proibe a polícia de deter um suspeito para interrogatório  por mais de 48 hs. O dispositivo da Seção 22(3) da Lei da Polícia dispõe que: “O policial pode deter qualquer indivíduo que ele acredite seja suspeito de ter cometido ou esta por cometer um delito para interrogatório por um período que não ultrapasse 48 hs”. Entretanto, o Estado fracassou em cumprir com a sua própria legislação interna no caso do Sr. Lallion, e manteve detido por mais tempo que aquele estipulado  na Seção 22(3) da Lei de Polícia.

          108.   A Comissão considera que o que ocorreu durante a demora  no  caso  do Sr. Lallion antes de ser levado perante um juiz é precisamente o que a Convenção Americana e os tribunais internacionais de direitos humanos que aplicam os tratados e a jurisprudência  procuram evitar.  O Sr. Lallion foi detido para ser interrogado cerca das 4:15 p.m. do dia 29 de setembro de 1993, e foi mantido sob detenção até as 4 p.m. do dia 1 de outubro de 1993, período em que foi  obrigado a assinar uma confissão.[63] O depoimento do Sr. Lallion perante o Tribunal de Primeira Instância revela que durante o período de sua detenção foi interrogado durante tempo prolongado acerca de sua participação na  morte do falecido.  O ex-Superintendente Assistente de Polícia, Sr. Joseph, o tomou pela  camisa e depois o agente Mason lhe desferiu um golpe no  estômago.  O Sr. Lallion foi levado até o cadáver, e cumpriu a ordem dada pelo policial para que descobrisse o corpo.

          109.   A Comissão conclui que a demora de 3 dias no  caso do Sr. Lallion superou as 48 horas dispostas no  Código Penal de Granada e, embora não se trate da mesma demora considerada violação pelo Comitê de Direitos Humanos da  ONU e a Corte Européia de Direitos Humanos em outros casos, a Comissão observa que as disposições do PIDCP[64] e da Convenção Européia[65] examinadas por estes tribunais são praticamente idênticas as do artigo 7(5) da  Convenção Americana, motivo pelo qual a Comissão não vê razão para que a Convenção esteja sujeita a uma norma menos rigorosa no que se refere ao direito do detido a ser levado sem demora perante um juiz.  Ademais, o Estado não respondeu a nenhuma das alegações sobre a questão da  demora, nem explicou ou justificou adequadamente a demora no  caso do Sr. Lallion.

          110.   Ao abordar a totalidade das circunstâncias da detenção do Sr. Lallion, a Comissão conclui que, ao longo da  detenção do Sr. Lallion, ele não foi informado sem demora das acusações que lhe foram imputadas, em violação ao artigo 7(4).  A Comissão também conclui que, dado que o Sr. Lallion não foi levado sem  demora perante um juiz, o Estado violou seu direito garantido no  artigo 7(4) da  Convenção e no  Código Penal do Estado, que estabelece as 48 horas.  Ademais, a Comissão conclui que a detenção do Sr. Lallion pelo  Estado foi violatória do artigo 7(4) e 7(5) e que isto constitui uma  privação arbitrária do direito do Sr. Lallion à liberdade pessoal em virtude do artigo 7(2) da  Convenção.  Portanto, a Comissão conclui que o Estado violou o direito do Sr. Lallion à liberdade pessoal garantido pelo  artigo 7(2), 7(4) e 7(5) da  Convenção.         

V.                PROCEDIMENTOS POSTERIORES AO RELATÓRIO Nº 97/01

          111.   Em 11 de outubro de 2001, durante o seu 113º período ordinário de sessões, a CIDH aprovou o Relatório Nº 97/01 deste caso com base no artigo 50 da  Convenção.

          112.   Em 23 de outubro de 2001 a Comissão remeteu ao Estado o Relatório Nº 97/01 solicitando-lhe que informara, dentro de dois meses, as medidas que tivesse  adotado para cumprir com as recomendações formuladas para resolver a situação denunciada.

          113.   Em 31 de dezembro de 2001, data de vencimento do prazo de dois meses, a Comissão não havia recebido resposta do Estado de Granada ao Relatório Nº 97/01.

VI.      CONCLUSÕES FINAIS

114.   Com base na  informação apresentada e na análise feita conforme a Convenção Americana, a Comissão reitera suas conclusões de que o Estado de Granada é responsável pelo seguinte:

          115.   O Estado é responsável pela violação dos  direitos do Sr. Lallion consagrados nos  artigos 4(1), 5(1) 5(2) e 8(1), conjuntamente com a violação do artigo 1(1) da  Convenção Americana, por sentenciar o Sr. Lallion a uma pena de morte obrigatória.

          116.   O Estado é responsável pela violação dos  direitos do Sr. Lallion consagrados no  artigo 4(6) da  Convenção, conjuntamente com a violação do artigo 1(1) da  mesma, por não providenciar ao Sr. Lallion o direito efetivo de solicitar a anistia, o indulto ou a comutação da pena.

          117.   O Estado é responsável pela violação dos  direitos do Sr. Lallion consagrados no  artigo 5(1) da  Convenção Americana, conjuntamente com a violação do artigo 1(1) da  mesma, por não respeitar o direito do Sr. Lallion à integridade física, mental e moral, por confiná-lo em condições de detenção desumanas.

          118.   O Estado é responsável pela violação dos  direitos do Sr. Lallion consagrados nos  artigos 8 e 25 da  Convenção, conjuntamente com a violação do artigo 1(1) da  mesma, por não outorgar-lhe assistência jurídica para propor uma ação constitucional.

          119.   O Estado é responsável pela violação do direito do Sr. Lallion à liberdade pessoal, disposto no  artigo 7(2), 7(4) e 7(5) da  Convenção, conjuntamente com a violação do artigo 1(1) da  mesma, por não proteger seu direito à liberdade pessoal e por não ser levado sem  demora perante um juiz.

          VII.     RECOMENDAÇÕES

          Com base na análise e nas conclusões que constam do presente relatório,

A COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS RECOMENDA AS SEGUINTES  RECOMENDAÇÕES AO ESTADO DE GRANADA:

1.       Outorgue ao Sr. Lallion uma reparação efetiva que inclua a comutação da  pena e uma indenização.

2.       Adote as medidas legislativas e de outra índole necessárias para garantir que não seja imposta a pena de morte em violação dos  direitos e liberdades consagrados nos artigos 4,5 e 8 da Convenção e garanta que nenhuma pessoa seja sentenciada à pena de morte por sentença obrigatória em Granada.

3.       Adote as medidas legislativas e de outra índole necessárias para garantir a efetividade em Granada do direito de solicitar a anistia, o indulto ou a comutação da  pena, consagrado no  artigo 4(6) da  Convenção.

4.       Adote as medidas legislativas e de outra índole necessárias para garantir a efetividade em Granada do direito a uma audiência imparcial, consagrado no  artigo 8(1) da  Convenção, e do direito à proteção judicial, consagrado no  artigo 25 da  mesma, em relação às ações constitucionais.

5.       Adote as medidas legislativas e de outra índole necessárias para garantir em Granada que as condições de detenção do Sr. Lallion cumpram com as normas de tratamento humano recomendadas pelo  artigo  5(1) da  Convenção.          

6.       Adote as medidas legislativas e de outra índole necessárias para garantir a efetividade na Granada do  direito à liberdade pessoal a respeito do Sr. Lallion e consagrado no  artigo 7(2), 7(4) e 7(5) da  Convenção Americana.

VIII.     PUBLICAÇÃO         

          118.   Em 22 de março de 2002, de conformidade com os artigos 51(1) e 51(2) da  Convenção Americana, a Comissão enviou ao Estado de Granada o Relatório Nº 28/02, aprovado em 12 de março de 2002, concedendo-lhe um prazo de um mês para adotar as medidas encaminhadas a dar cumprimento as recomendações indicadas e resolver a situação objeto de análise.

          119.   O prazo de um mes venceu sem que a Comissão tivesse recebido resposta do Estado de Granada a respeito das recomendações neste caso.

IX.              ANÁLISE FINAL E CONCLUSÕES

          120.   Por estas razões, a Comissão decide que o Estado não adotou as medidas pertinentes para dar cumprimento as recomendações estabelecidas no  presente Relatório.

          121.   Com base no exposto anteriormente e de acordo com o artigo 51(3) da  Convenção Americana e 48 de seu Reglamento, a Comissão decide reiterar as conclusões e recomendações contidas no  Relatório No. 28/02, publicá-lo e incluí-lo no seu Relatório Anual à Assembléia Geral da  Organização dos  Estados Americanos.

Dado e assinado na cidade de Washington, D.C., aos 27 dias de mês de fevereiro de 2002. (Assinado): Juan E. Méndez, Presidente; Marta Altolaguirre, Primeira Vice-Presidenta; José Zalaquett, Segundo Vice-Presidente; Robert K. Goldman, Julio Prado Vallejo, e Clare K. Roberts, Membros da Comissão.

 

OPINÃO CONCORRENTE DO MEMBRO DA COMISSÃO HÉLIO BICUDO[66]

1. Embora apóie as conclusões, fundamento e motivos de meus companheiros  membros da Comissão neste relatório, gostaria de analisar o assunto mais a mérito e expressar minha opinião com respeito a legitimidade da pena de morte no sistema interamericano.  

2. A Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem, aprovada na 9a. Conferência Internacional Americana, realizada em Santa Fé de Bogotá em maio/ junho de 1948, afirmou que “todo ser humano tem direito à vida, à liberdade e à segurança de sua pessoa” (Artigo 1°), e mais, que “todas as pessoas são iguais perante a lei e têm os direitos e deveres consagrados nesta declaração, sem distinção de raça, sexo, idioma, credo religioso, ou qualquer outro que seja” (artigo 2°).

3.                  Em 1969, a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, proclamada em 22 de novembro desse mesmo ano em São José da Costa Rica, dispõe em seu artigo 4°, que “toda pessoa tem direito a que se respeite sua vida” e que “esse direito estará protegido pela lei, em geral, a partir do momento da concepção”. E mais, que "ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente”.

4.       Ainda a Convenção Americana, ao incluir no âmbito dos direitos civis e políticos o direito a integridade pessoal, estabelece que “ninguém deve ser submetido a torturas nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes”.

5.      Entretanto, a pena de morte e consentida pela Convenção Americana, na sua versão original. Nesse sentido, o seu artigo 4°, inciso 2°, admite a pena capital naqueles Estados partes que não a tenham abolido até o momento de sua edição e, naturalmente, posterior ratificação, e, assim mesmo, de forma excepcional: para os delitos de maior gravidade.

6.      Trata-se, sem dúvida, de uma contradição, relativamente aos dispositivos citados, que repelem a tortura, penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

7.      Realmente, a Declaração Americana resguarda a vida como um direito primordial e a seguir, a Convenção Americana repudia, como vimos, a tortura ou a imposição de penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Ora, tenha-se, desde logo, que a eliminação de uma vida e o que se poderia qualificar como o ponto culminante da tortura ou de tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.

8.      Tem-se, assim, a impressão de que a tolerância expressa no inciso 2°, do artigo 4° da Convenção Americana, revela, tão somente a adoção de uma posição política de conciliação entre as Partes contratantes, para aprovar-se o dispositivo mais geral, relativo ao direito a vida.

9.      Antes, entretanto, de aprofundarmos uma reflexão sobre o verdadeiro alcance da aludida permissão para a permanência da pena capital naqueles países que já continham em suas leis penas, no momento de sua aprovação aos termos da Convenção, convêm notar que a Convenção Interamericana para prevenir e sancionar a Tortura, subscrita em Cartágena de Índias, Colômbia, a 9 de dezembro de 1985, define o que se deve entender por tortura: “é todo ato realizado intencionalmente pelo qual se inflijam a uma pessoa penas ou sofrimentos físicos ou mentais, com fins de investigação criminal, como meio intimidatório, como castigo pessoal, como medida preventiva, como pena ou qualquer outro fim” (artigo 2°).

10.  Veja-se que esse dispositivo fala em tortura como pena ou castigo pessoal, segundo qualquer finalidade.

11.  Pois bem, a condenação à morte, por si só, impõe ao condenado um sofrimento que não é, sequer, mensurável. Já se imaginou a angustia a que se sujeita um condenado a morte, ao ouvir a sentença, ao depois, ao aguardar o momento da execução? Seria, sequer, possível avaliar o sofrimento de pessoas que esperam, nos chamados “corredores da morte”, pela sua execução, por vezes postergada por vários anos? Nos Estados Unidos da América, menores de 15, 16, 17 anos, que praticaram homicídio e foram condenados a morte, aguardam, por vezes, quinze anos ou mais anos, pela sua execução. Pode-se considerar maior sofrimento? Entre a esperança e a desesperança, até o encontro final com o carrasco?

12.  Acrescente-se que os Estados Membros da OEA, ao adotarem a Convenção Americana sobre desaparecimento forçado de pessoas, reafirmaram que “o sentido da solidariedade americana e de boa vizinhança não pode ser outro que o de consolidar neste Hemisfério, dentro do espírito das instituições democráticas, um regime de liberdade individual e da justiça social, fundado no respeito aos direitos essenciais do homem”.

13.  Caberia recordar que nos anos de 1998 e 1999, os Estados Unidos da América foram o único país do mundo conhecido por executar jovens menores de 18 anos. A esse propósito vale observar que os Estados Unidos da América são parte do Pacto Internacional de Direitos Civis e políticos desde setembro de 1992 e que o inciso 5° do artigo 6°desse Pacto estipula que a pena de morte não será imposta a menores de 18 anos nem a mulheres grávidas. Embora ao ratificar o aludido Pacto o Senado norte-americano tenha emitido reserva relativamente a esse dispositivo, existe hoje um consenso internacional quanto à nulidade dessa reserva a luz do disposto na alínea “c”, do artigo 19 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. Esta, em suma, delega ao Estado a faculdade de formular reservas, desde porém, que não sejam incompatíveis com o objeto e propósito do Tratado.

14.  Em junho deste ano (2000), no Estado do Texas (USA), foi executado Shaka Sankofa, antes conhecido como Gary Graham, condenado por um crime que teria cometido quando contava 17 anos de idade. Foi executado depois de 19 anos de espera no corredor da morte, apesar das solicitações formalmente apresentadas pela Comissão Interamericana de Direitos Humanos, ao Governo Americano, com o fim de que se suspendesse o ato extremo, até que se decidisse sobre queixa apresentada em seu nome à aludida Comissão, pois havia sérias dúvidas sobre a autoria do delito atribuído ao paciente. O não atendimento por parte do Governo Americano, que não poderia escapar à competência da CIDH, no âmbito da proteção dos Direitos Humanos no hemisfério, segundo a Declaração Americana, provocou um comunicado a imprensa, estranhando e profligando esse procedimento, em tudo contrário ao funcionamento do sistema interamericano de proteção dos Direitos Humanos. [67](ver em nota de rodapé o inteiro teor do comunicado de imprensa da CIDH).

15.  Por outro lado, a Convenção Americana para prevenir, sancionar e erradicar a violência contra a mulher, proclamada em Belém do Pará, em 9 de junho de 1994, impede a submissão da mulher à pena de morte. É o que se deduz do disposto em seu artigo 3°, ao afirmar “que toda mulher tem direito a uma vida livre de violência, tanto no 6ambito público, como privado”, e repete no artigo seguinte que dentre seus direitos compreende-se o “direito a que se respeite sua vida”. Entre os deveres do Estado, dispõe, ainda, a Convenção de Belém do Pará, inclui-se a de “abster-se de qualquer ação ou prática de violência contra a mulher e velar para que as autoridades, seus funcionários, pessoal, agentes ou instituições se comportem na conformidade com esta obrigação”. Ora, com a afirmativa de que toda a mulher tem direito à vida, e uma vida livre de violência, negando-se ao Estado qualquer ação ou prática contra a mulher, parece evidente que a Convenção de Belém do Pará proíbe a aplicação da pena de morte à mulher. Não se pode ver nos dispositivos citados uma discriminação com relação aos homens ou às crianças e jovens. E nem se argumente com a chamada discriminação positiva, pois esta existe para preservar direitos inerentes à qualificação de uma pessoa, para preservar direitos que só a ela pertencem. Por exemplo: a mulher grávida ou com filhos tem direitos próprios a sua condição de gestante e de mãe e que não se estendem, por evidente, aos homens. Além disso, uma medida de discriminação positiva tem que visar realizar a igualdade entre grupos de pessoas entre as quais persistem desigualdades de fato, de modo temporário e proporcional. Não existe uma desigualdade entre homens e mulheres no que diz respeito ao direito à vida. E em qualquer caso, a imposição da pena de morte não é uma medida proporcional, como veremos adiante. Quando se trata de direitos comuns – como direito à vida – não se pode falar em discriminação positiva. Nesse caso, todos são iguais perante a lei. Naturalmente, ao se proibir a imposição da pena de morte, às mulheres, teve-se em atenção não apenas sua condição feminina, mas, sobretudo, sua qualificação enquanto pessoa humana.

16.  Nesse sentido, o artigo 24, da Convenção Americana, enuncia que “todas as pessoas são iguais perante a lei”. E, em conseqüência, "têm direito, sem discriminação, à igual proteção da lei”. Não obstante essa norma defina o termo discriminação, a CIDH considera que essa expressão inclui toda distinção, exclusão, restrição ou preferência baseada em algum motivo que tenha por objeto ou por resultado anular ou menoscabar o reconhecimento, gozo ou exercício, em condições de igualdade, dos direitos humanos e liberdades fundamentais nas esferas política, econômica, social, cultural, ou em qualquer outra esfera da vida pública”. (cf., Manual de Preparações de Informes sobre os Direitos Humanos, Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos, artigo 26).

17.  Convém anotar, ademais, que a Convenção sobre os direitos da criança proíbe a imposição da pena de morte a menores de 18 anos de idade, nos termos de seu artigo 37, letra “a”,

18.  Trata-se de instrumento jurídico dotado de significativa universalidade no campo dos direitos humanos (apenas os Estados Unidos da América e a Somália não o ratificaram).

19.  O citado artigo 37 da aludida Convenção dispõe que “nenhuma criança deve ser submetida à tortura ou outras formas cruéis, desumanas ou degradantes de tratamento ou punição. Nem a pena de morte, nem a prisão perpétua serão impostas nos casos de delitos cometidos por pessoas menores de 18 anos”.

20.  Observe-se, entretanto, que embora os Estados Unidos da América não tenham ratificado a Convenção sobre os direitos da criança, o simples fato de haverem assinado aquele instrumento em fevereiro de 1995 gera obrigações no plano jurídico. O artigo 18 da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados estabelece que os países signatários de um tratado, mesmo que não o tenham ratificado, devem abster-se de qualquer ato contrário a seu objeto e propósito, até que tenham decidido anunciar sua intenção de não tornar-se parte do tratado. No caso, apesar de os Estados Unidos da América não serem parte da Convenção de Viena, o Departamento de Estado Americano já reconhece como texto básico na área de tratados e atos processuais. Segundo a premissa de que a reserva é incompatível com o objeto e a finalidade de um tratado e que os Estados Unidos da América não são parte da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, o Departamento de Estado desse País entende que as normas da Convenção de Viena se constituem numa declaração do direito internacional costumeiro. E nesse caso, devem ser reconhecidas. Isto porque, segundo, ainda a Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados, deve-se reconhecer a importância progressiva dos tratados como fonte do direito internacional e como meio do desenvolvimento pacífico e cooperativo entre as nações, qualquer que sejam sua Constituição e sistema social.

21.  Ora, da mesma forma, como se anotou na hipótese da imposição de pena de morte a mulheres, não se pode ver no dispositivo em questão uma discriminação a afastar homens e mulheres, pois, como se afirmou, não se trata, ainda neste caso, de uma discriminação positiva, uma vez que o artigo 37, letra “a”, da Convenção sobre os direitos da criança, objetiva preservar direitos que não são próprios, apenas, das crianças ou jovens, mas de todo ser humano.

22.  Se isto é verdade, como sem dúvida o é, o disposto no artigo 4° da Convenção Americana perdeu seu significado anterior, de sorte que os Estados que a subscreveram e a ratificaram, bem como a instrumentos internacionais posteriores não podem impor a pena de morte a qualquer pessoa, independentemente de seu sexo, ou outra qualquer condição.

23.  Examinaremos a matéria tendo em vista princípios de hermenêutica consagrados no direito positivo. O direito internacional pressupõe disposições que estão acima do Estado. Conforme acentua o ilustre jurista italiano Norberto Bobbio, o universalismo – que o direito internacional pretende normatizar – ressurge hoje, em especial depois da segunda guerra mundial e da criação da Organização das Nações Unidas (ONU), não mais como crença num eterno direito natural, como vontade de constituir um direito positivo único do desenvolvimento social e histórico (como o direito natural e o estado de natureza), mas no fim. E pondera que a idéia do Estado mundial único e a idéia-limite do universalismo jurídico contemporâneo, isto é, a constituição de um direito positivo universal (cf. Teoria do Ordenamento Jurídico. Universidade de Brasília, 1991, p. 164).

24.  No caso, não se pode permitir a prevalência de norma anterior, do mesmo conteúdo da posterior que pretende ilidir a esta última. Trata-se do que os juristas denominam antinomia e como tal precisa ser encarada e solucionada. Qual das regras deve prevalecer? Que elas são incompatíveis não há dúvida. Mas como resolver o problema?

25.  Segundo, ainda, Noberto Bobbio, as regras fundamentais para a solução das antinomias são três: a) o critério cronológico; b) o critério hierárquico; e c) o critério da especialidade (op. Cit., p.92).

26.  No primeiro caso, prevalece a norma posterior – lex posterior derogat priori. No segundo, a natural prevalência do direito internacional sobre o direito nacional. Finalmente, enquadra-se, ainda, a hipótese, no último critério, pois se trata de uma regra especial, com especial destinação.

27.  Nem se alegue, entretanto, que a aceitação da pena de morte no parágrafo 2, do artigo 4°, da Convenção Americana, é uma disposição especial com relação ao direito “Geral”à vida. E, muito menos, que ao aceitar a pena de morte, foi ela considerada como um caso particular de pena a não alcançar uma violação do direito à vida ou à proibição da tortura ou de outro tratamento cruel ou desumano.

28.  A Corte Interamericana de Direitos humanos, em sua opinião consultiva OC-3/83, de 8 de setembro de 1983, assinalou que em se tratando de restrições à pena de morte, não se deveria contornar o problema, senão, pôr-lhe um limite definitivo, mediante um processo progressivo e irreversível destinado a cumprir-se tanto nos países que não tenham ainda resolvido aboli-la, como naqueles que já tomaram essa determinação.

29.  Nesta matéria, continua a Corte, a Convenção expressa uma clara tendência de progressividade, consistente em que, sem chegar a decidir a abolição da pena de morte, adota as disposições requeridas para limitar definitivamente sua aplicação e seu âmbito, de modo tal a que estes se vão reduzindo até sua supressão final.

30.  A esse propósito, vale a pena recordar os trabalhos preparatórios da Convenção Americana que confirmam o sentido resultante da interpretação textual de seu artigo 4°. Com efeito, a proposta de várias delegações para que proscrevesse a pena de morte de modo absoluto, ainda quando não tivesse alcançado a maioria regulamentar de votos afirmativos, não teve um só voto contrário. A atitude geral e a tendência amplamente majoritária da Conferência foram registradas na seguinte declaração apresentada ante a Sessão Plenária de Clausura, por quatorze das dezenove delegações participantes (Costa Rica, Uruguai, Colômbia, Equador, El Salvador, Panamá, Honduras, República Dominicana, Guatemala, México, Venezuela, Nicarágua, Argentina e Paraguai):

“As delegações, que assinam abaixo, participantes da Conferência Especializada Interamericana de Direitos Humanos, tendo em vista o sentimento altamente majoritário, expressado no curso de debates sobre a proibição da pena de morte, concorde com as mais puras tradições humanistas de nossos povos, declaramos solenemente nossa firme aspiração de ver desde logo erradicada do âmbito americano a aplicação da pena de morte e nosso indeclinável propósito de realizar todos os esforços possíveis para que, a curto prazo, se possa subscrever um Protocolo adicional à Convenção Americana de Direitos humanos “Pacto de São José, Costa Rica”, que consagre a definitiva abolição da pena de morte e coloque uma vez mais a América na vanguarda da defesa dos direitos fundamentais do homem” (atas e documentos, OEA-serv.K-XVI-12, Washington, D.C., 1973; adiante Atas e Documentos (repr.1978, esp.p. 161, 195, 296 e 449/441).

31.  Coincide, ademais, com tais afirmativas o que foi assinalado pelo Relator da Comissão, no sentido de que a Comissão fez notar, nesse artigo, sua firme tendência à supressão da pena de morte. (atas e documentos, supra n° 296).

32.  Por demais, o Estado de Direito implica, quando da imposição de uma pena, no conhecimento do que essa pena realmente importa. Quando se aplica uma pena que tem pó objetivo, além da punição, a recuperação do detento, este o que vai acontecer com sua pessoa no futuro. Se lhe é imposta uma pena somente punitiva, no caso da prisão perpétua, o réu visualiza, ainda nesta hipótese, o se futuro. Mas, se a pena é de morte, o Estado não aponta ao condenado o que lhe vai suceder com sua eliminação enquanto pessoa humana. É que a ciência, com todo o seu desenvolvimento, não chegou, até hoje, a desvendar o pós-morte; vida futura, com castigo ou prêmio? Pura e simples eliminação?

33.  Assim, ao Estado de Direito é defeso aplicar uma pena cujas conseqüências, não pode desvendar.

34.  Na verdade, todas as penas de que lança mão o legislador, constituem espécies de sanções, distribuindo-se elas segundo uma graduação racional que procura levar em conta uma série de fatores peculiares a cada hipótese de ilicitude.

35.  O pode-dever de punir, que compete ao Estado, abre-se, desse modo, em um leque de figuras ou medidas, segundo soluções escalonadas, mensuráveis em dinheiro ou em quantidade de tempo. Essa ordenação gradativa é da essência mesma da Justiça penal, pois esta não se realizaria se um critério superior de igualdade ou de proporção não presidisse a distribuição das penas, dando a cada infrator mais do que ele merece.

36.  Pois bem, quando se decreta a pena de morte, rompe-se abrupta e violentamente a apontada harmonia serial; dá-se um salto do plano temporal para o não-tempo da morte.

37.  Com que critério objetivo ou com que medida racional (pois ratio significa razão e medida) se passa de uma pena de 30 anos ou de prisão perpétua para a pena de morte? Onde e como se configura a proporcionalidade? Qual a escala asseguradora da proporcionalidade?

38.  Dir-se-á que também há uma diferença qualitativa entre a pena de multa e a de reclusão, mas o cálculo daquela é redutível a critérios cronológicos, podendo ser fixada, por exemplo segundo o que representara em termos de jornadas de trabalho perdido, par que possa significar privação e sofrimento à pessoa do infrator, em função de sua situação patrimonial. De qualquer modo, são critérios racionais de conveniência, suscetíveis de contraste na experiência, que governam a passagem de um para outro tipo de pena, enquanto a idéia de “proporcionalidade”submerge-se na perspectiva da morte.

39.  Em suma, a opção pela pena de morte, é de tal ordem que, como afirma Simmel, matiza todos os conteúdos da vida humana, podendo-se dizer que ela é inseparável de um halo de enigma e de mistério, de sombras que à luz da razão não é dado dissipar: querer enquadrá-la em soluções penais equivale a despojá-la de seu significado essencial para reduzi-la à violenta desagregação física de um corpo (apud Miguel Reale, in O Direito como Experiência).

40.  Daí a conclusão do eminente filósofo jurista Miguel Reale: analisada à luz de seus valores semânticos, o conceito de pena e o conceito de morte são entre si lógica e ontologicamente irreconciliáveis e que, assim sendo, “pena de morte” é uma “contradictio in terminis” {cf. O direito como experiência, Saraiva, 2a ed., São Paulo, Brasil).

41.  O jurista Héctor Fáundez Ledesma escreve, a propósito: “quanto aos direitos consagrados na Convenção, estes são direitos mínimos, ela não pode limitar o exercício desses direitos numa medida maior que a permitida por outros instrumentos internacionais. Por conseguinte, qualquer outra obrigação internacional assumida pelo Estado em outros instrumentos internacionais de diretos humanos é da maior relevância, e sua coexistência com as obrigações derivadas da Convenção deve ser tida em conta em  todo aquele que resulte mais favorável ao  indivíduo”.

42.  “O mesmo entendimento, prossegue o jurista, se faz extensivo a qualquer outra disposição convencional que proteja o indivíduo de uma maneira mais favorável, quando esta esteja contida num tratado bilateral ou multilateral, e independentemente de qual seja seu objeto principal” (O sistema interamericano de proteção dos direitos humanos, 1996, pg. 92 e 93).

43.  Acresce que o artigo 29, “b”, da Convenção Americana estabelece, nessa mesma linha de pensamento, que nenhuma disposição da Convenção pode ser interpretada no sentido de “limitar o gozo e exercício de qualquer direito ou liberdade que possa estar reconhecido de acordo com as leis de qualquer dos Estados partes”. E oportuno, a propósito, ler o informe da CIDH sobre Suriname e a consulta OC-8/87 à Corte Interamericana de Direitos Humanos.

44.  Nessa oportunidade, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos afirmava que a proibição de impor a pena capital por delitos cometidos por menores de 18 anos, era um princípio emergente do direito internacional. Doze anos mais tarde não há dúvida alguma de que este princípio está hoje totalmente consolidado. A ratificação por 192 Estados, da Convenção dos Direitos da Criança das Nações Unidas, que proíbe a imposição da pena capital àqueles que cometeram delitos quando menores de idade, e, dentre outras, uma prova irrefragável da consolidação desse princípio (cf. Relatório da Anistia Internacional apresentado à CIDH, Washington, 5 de março de 1999).

45.  É certo que a Declaração Universal de Direitos humanos não se refere especificamente à proibição da pena de morte, mas consagra em seu artigo 3° o direito de cada um à vida, liberdade e segurança (o mesmo preceito figura no artigo 1°da Declaração Americana dos Direitos e Deveres dos Homem). Adotada pela Assembléia Geral da ONU, em 1948, sob a forma de mera resolução/recomendação, a Declaração Universal é hoje considerada por insignes doutrinadores como parte do Direito Internacional Costumeiro e como norma obrigatória (jus cogens) – artigo 53, da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados. Mutatis mutandi, seria lícito afirmar que a Convenção sobre os direitos da criança, por sua abrangência e caráter obrigatório, deva também ser observada pelos dois únicos Estados que não a ratificaram, como, aliás, já se salientou e observa o próprio Departamento de Estado, dos Estados Unidos da América.

46.  Convém, ademais, assinalar que a Corte Européia de Direitos Humanos, ao decidir o caso Soering - Jens Soering, nascido na Alemanha, em detenção na Inglaterra e submetido a um pedido de extradição pelos Estados Unidos da América para responder a uma acusação de homicídio praticado no Estado de Virgínia, que pune esse crime com pena de morte - fez oportunos comentários ao artigo 3°, da Convenção Européia, onde se diz que ninguém pode ser submetido a tortura, nem a penas ou tratamento desumano, cruel ou degradante. Considerou a Corte que o pedido não poderia ser atendido a não ser que se tivesse a certeza de que o extraditando seria beneficiado, pelo menos, pelas garantias do aludido dispositivo do artigo 3°, da Convenção (cf. Jurisprudence de la Cour Européenne des Droits de l’homme, 1998, 6a ed., Sirey, os. 18 e seguintes).

47.  Quer dizer, a Corte concluiu que a extradição a um país que conhece a pena de morte não constituiria uma violação do direito à vida ou do direito à integridade pessoal, pois a pena de morte em si não é, explicitamente, proibida pela Convenção Européia. Todavia, a possibilidade de que o réu passasse anos em detenção à espera do momento – aliás, totalmente imprevisível – da execução da pena, a chamada “síndrome do corredor da morte” foi considerada pela Corte como constituindo um tratamento cruel e, de conseguinte, uma violação do direito a integridade pessoal.

48.  Trata-se, sem dúvida, de uma ambigüidade: se há espera, viola-se o direito; se a imposição da pena for imediata, a atuação do Estado não seria considerada uma violação do direito fundamental `vida.

49.  Essa decisão permite, a conclusão de que abandona-se, pouco a pouco, a visão tradicional, positivista, na aplicação do direito. Ao invés de uma interpretação literal dos textos em questão, busca-se uma hermenêutica teleológica, no caso, da Convenção Européia, para chegar-se à conclusão maior, de não se permitir a aplicação da pena de morte em qualquer hipótese.

50.  Assim, a proibição absoluta, pela Convenção Européia, da tortura e das penas ou tratamentos desumanos ou degradantes mostra que o artigo 3°, em referência, consagra um dos valores fundamentais das sociedades democráticas. Salienta o julgado que no mesmo sentido dispõem o pacto Internacional de 1966 relativo aos direitos civis e políticos e a Convenção Americana dos Direitos do Homem, de 1969, ao proteger, em toda sua extensão e profundidade, os direitos da pessoa humana. Trata-se, conclui, de uma norma internacionalmente aprovada.

51.  É bem verdade que o conceito de penas ou tratamentos desumanos ou degradantes depende de todo um conjunto de circunstâncias. Não é por outro motivo que se deve ter todo o cuidado para que se assegure um justo equilíbrio entre as exigências de interesse geral da comunidade e os imperativos maiores da salvaguarda dos direitos fundamentais do indivíduo, na forma dos princípios inerentes ao conjunto da Convenção Européia.

52.  A Anistia Internacional vem afirmando que a evolução das normas na Europa Ocidental quanto à existência e ao uso da pena capital leva à consideração de que se trata de uma pena desumana, no sentido apontado pelo artigo 3°, da Convenção Européia. É nesse sentido que deve-se entender a decisão da Corte no caso Soering.

53.  Por sua vez, a Corte Interamericana de Direitos Humanos já afirmou que “o  direito à vida e sua garantia e respeito pelos Estados não pode ser concebido de modo restritivo. O mesmo não somente  supõe que ninguém deve ser privado arbitrariamente da vida (obrigação negativa). Exige dos Estados, ainda mais, tomar todas as providências apropriadas para postergá-la e preservá-la (obrigação positiva)” (cf. Repertório de jurisprudência do Sistema Interamericano de Direitos Humanos, 1998, Washington College of Law, American University, 1/ 102).

54.  Não foi por outro motivo que a Corte Européia, na decisão apontada, ponderou que “la Convention est sans conteste “un instrument vivant à interpreter (...) à lumière des conditions de vie actuelle [pour déterminer s’il lui faut considérer un traitment ou une peine donné comme inhumains ou dégradants auxfins de l’article 3° la Cour ne peut pás ne pás être influencée par l’évolution et lês normes communément acceptées de la politique pénale des Etats membres du Conseil de l’Europe dans ce domaine”.

55.  Realmente, para saber se a pena de morte, em razão de alterações atuais, tanto do direito nacional, como do direito internacional, constitui um tratamento proibido pelo artigo 3° , é preciso tomar em conta os princípios que regem a interpretação da Convenção. Neste caso, tanto da Convenção Européia, como da Convenção Americana: “ninguém pode ser submetido a tortura nem a penas ou tratamentos desumanos ou degradantes (artigo 3°, da Convenção Européia); “ninguém pode ser submetido a torturas nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes”(artigo 5°, inciso 2°, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos).

56.  Na mesma linha de pensamento, ao apreciar o caso Irlanda versus Reino Unido, a Corte Européia, já decidira que “a Convenção proíbe em termos absolutos a tortura e as penas ou tratamentos desumanos ou degradantes, quaisquer que sejam as incriminações à vítima. O artigo 3° não prevê restrições: “... seule entrent en ligne de compte lês notions de “torture”et de “traitements inhumain ou dégradants”, à l’exclusionde celle de “peine inhumaine ou degradante”.

57.  Mais recentemente, na opinião consultiva OC – 16/99, de 1° de outubro de 1999, solicitada pelos Estados Mexicanos à Corte Interamericana de Direitos Humanos, sobre o direito à informação a respeito da assistência consular, no conjunto das garantias do devido processo legal, estimou útil “recordar que no exame realizado, em sua oportunidade, sobre o artículo 4°, da Convenção Americana, advertiu que a aplicação e imposição da pena capital esta limitada em termos absolutos pelo princípio segundo o qual “[ninguém] poderá ser privado da vida arbitrariamente”. Tanto o artigo 6° do Pacto Internacional de Diretos Civis e Políticos, como o artigo 4° da Convenção, ordenam a restrita observância do procedimento legal e limitam a aplicação desta pena a “aos mais graves delitos”. Em ambos instrumentos existe, pos, uma clara tendência restritiva à aplicação da pena de morte até a sua supressão final”.

58.  O que falta, pergunta-se, para chegar-se à eliminação universal da pena capital? Tão somente o pleno reconhecimento dos direitos emanados dos tratados.

59.  Vem, justamente, apelo, na linha da posição do jurista e do aplicador da lei sobre a matéria, o voto concorrente, na aludida opinião consultiva – solicitada pelo Estado Mexicano, do juiz Cançado Trindade, ao fazer considerações relevantes, a propósito da hermenêutica do direito frente a novas necessidades de proteção.

60.  O ilustre internacionalista e atual presidente da Corte Interamericana de Direitos Humanos (1999/2001) nesse voto concorrente assinala que “as próprias emergências e consolidação do corpus juris do Direito Internacional dos Direitos Humanos devem-se à reação da consciência jurídica universal perante os recorrentes abusos cometidos contra os seres humanos, frequentemente convalidados pela lei positiva: com isto, o Direito veio ao encontro do ser humano, destinatário último de suas normas de proteção”.

61.  No mesmo sentido, adverte o autor do voto concorrente, “indica a jurisprudência dos tribunais internacionais de diretos humanos até esta data, portanto, os tratados de diretos humanos são, efetivamente, instrumentos vivos, que acompanham a evolução dos tempos e do meio social em que se exercem os direitos protegidos”.

62.  A esse propósito, a Corte Européia de Direitos Humanos, no caso Tyrer versus Reino Unido (1978), ao determinar a ilicitude de castigos corporais aplicados a adolescentes na Ilha de Mana, afirmou que a Convenção Européia de Direitos Humanos “é um instrumento vivo a ser interpretado à luz das condições da vida atual”.

63.  Em remate, com a desmistificação dos postulados do positivismo jurídico voluntarista, tornou-se evidente que somente se pode encontrar uma resposta ao problema dos fundamentos e da validade do direito internacional geral na consciência jurídica universal, a partir da afirmação da idéia de uma justiça objetiva.

64.  Acrescente-se, ainda, que em reunião realizada por representantes dos órgãos de supervisão internacionais baseados em tratados de direitos humanos (os chamados “human rigths treaty bodies”), assinalou-se que os procedimentos convencionais formam parte de um amplo sistema internacional de proteção dos direitos humanos, o qual tem como postulado básico a indivisibilidade dos direitos humanos (civis, políticos, econômicos, sociais e culturais). De modo a assegurar na prática a universalidade dos direitos humanos, a referida reunião recomendou a “ratificação universal”, até o ano 2000, dos seis tratados centrais de Direitos Humanos das Nações Unidas (os dois pactos de Direitos Humanos, as convenções sobre a eliminação de todas as formas de discriminação racial e de discriminação contra a mulher; a Convenção das Nações Unidas contra a Tortura; e a Convenção sobre os direitos da Criança), das três Convenções Regionais (a européia, a americana e a africana) sobre Direitos Humanos, e das convenções da OIT atinentes a direitos humanos básicos. A reunião advertiu, a seguir, que o não cumprimento pelos Estados Partes do dever de ratificar constituía uma violação das obrigações convencionais internacionais e a invocação da imunidade estatal neste particular equivaleria a um “doube-standard” que penalizaria os Estados que cumpriram devidamente tais obrigações (Cançado Trindade, Tratado de Direito Internacional dos Direitos Humanos, vol. 1, Fabris ed., 1997,os. 199/200).

65.  O artigo 27, da Convenção de Viena sobre o Direito dos Tratados impede que se invoquem normas de direito interno para justificar o não cumprimento de uma obrigação internacional. E mais, uma disposição convencional deve ser interpretada de boa-fé, conforme o sentido comum dos seus termos (artigo 31, da Convenção de Viena, de 23 de maio de 1969: “A treaty shall be interpreted in good faith in accordance with the ordinary meaning to be given to the terms of the treaty in their contest and in the light of its object and purpose”). Deve-se, pois, buscar valorizar a cada um dos termos que não podem ser interpretados como não tendo sido escritos (doutrinas do “efeito útil”).

66.  Aliás, a Corte interamericana, na opinião consultiva OC-14/94, já sustentou que: “segundo o direito internacional as obrigações que este impõe devem ser cumpridas de boa-fé e não pode invocar-se para seu não cumprimento i direito interno. Estas regras podem ser consideradas como princípios gerias de direito e têm sido aplicadas, ainda em se tratando de disposições de caráter constitucional, pela Corte Permanente de Justiça Internacional e pela Corte Internacional de Justiça (caso das comunidades gréco-búlgaras (1930); caso de nacionais poloneses de Dantzig (1931); caso das Zonas livres (1932); e aplicabilidade da obrigação de arbitrar segundo o Convênio da sede das Nações Unidas (caso da missão OLP, 1988).

67.  A vista do exposto, a norma do artigo 4°,  inciso 2°, da Convenção Interamericana, pode-se dizer, está superada pelas disposições contratuais citadas, segundo a melhor hermenêutica do direito internacional dos direitos humanos, sendo-lhe defesa a aplicação, mediante normas de direito interno, ainda que anteriores à Convenção Americana, de penas aflitivas, como a pena de morte.

68.  Isto, porque é princípio do Direito Internacional dos Direitos Humanos, que toda ação deve ter por objetivo primordial a proteção das vítimas.

69.  Nessa perspectiva, dispositivos como aqueles já mencionados (artigo 4°, parágrafo 2°) da Convenção Americana sobre os direitos humanos devem ser desconsiderados em favor de instrumentos jurídicos que melhor protejam os interesses das vítimas de violações de direitos humanos.


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65 Reglas Mínimas da s Nações Unidas para el Tratamiento de Reclusos, aprobadas el 30 de agosto de 1945 pelo  Primer Congreso da s Nações Unidas sobre Prevenção del Delito y Tratamiento del Delincuente, ONU Docontra A/CONF/611, anexo I, E.S.CONTRA res. 663C, 24 ONU ESCOR Supp. (N°1), 11, ONU Docontra E/3048 (1957), enmendada E.S.CONTRA res. 2076, 62 ONU ESCOR Supp. (N°1), 35, ONU Docontra E/5988 (1977).

66 Ver análogamente Comissão Européia para la Prevenção da  tortura o un Tratamiento o Castigo Inhumano o Degradante (CPT), Segundo Relatório General sobre las Actividades del CPT que abarcan el período del 1º de janeiro al 31 de dezembro de 1991, Ref. CPPT/Inf. (92) 3 (13 de abril de 1992), párrs. 44-50 (donde se critican las condições carcelarias por hacinamiento, ausencia de por lo menos una hora de exercício al aire libre todos los dias para los reclusos, y la práctica de que los reclusos hagan sus necesidades en un balde, y donde se declara que el Comitê está particularmente preocupado al comprobar una combinação de hacinamiento, actividades insuficientes y acceso inadecuado a servicios higiénicos no  mismo establecimiento.  El efecto acumulativo de estas condições puede ser sumamente perjudicial para los reclusos.

[43] O artigo 28 estabelece que “As petições dirigidas à Comissão deverão  conter a seguinte informação: f. a indicação do Estado que o peticionário considera responsável, por ação ou por omissão, da  violação de algum dos  direitos humanos consagrados na  Convenção Americana sobre Direitos Humanos e outros instrumentos aplicáveis, ainda que não se faça uma referência específica ao artigo supostamente violado.

[44] Relatório N° 38/00, Caso 11.743, CIDH, 721, 767-769.

[45] Relatório N° 47/01, Caso 12.028, CIDH, Relatório Anual 2000, 841, 886-888.

[46] Ver, Corte Interamericana de Direitos Humanos, Exceções ao  Esgotamento dos  Recursos Internos (artigos 46(1), 46(2)(a) e 46(2)(b) da  Convenção Americana sobre Direitos Humanos), Opinão Consultiva OC-11/90 de 10 de agosto de 1990, Relatório Anual 1991, par. 28 (que interpreta o artigo 8(1) da  Convenção nos  seguintes termos):

Nos  casos que fazem  referência á determinação dos  direitos e obrigações de uma pessoa, de natureza civil, trabalhista , fiscal ou de outra índole, o artigo 8 não especifica nenhuma garantia mínima similar aquelas dispuestas no  artigo 8(2) para o processo penal. Contudo, prevê as devidas garantias; logo, o indivíduo aqui também tem  direito ao julgamento  imparcial previsto para os casos penais.

Ver também CIDH Lorna roye Ribe Star e outros contra  México, Relatório N° 49/99 (13 de abril de 1999) Relatório Anual 1998, par. 70 (que interpreta o artigo 8(1) no  contexto do processo administrativo que dá lugar à expulsão de estrangeirsos no  sentido de que exige certas garantias processuais mínimas, incluindo a oportunidad ede ser assistido por um advogado ou outro representante, tempo suficiente para considerar e refutar os cargos impostos de deduzir as provas correspondentes).

[47] Ver, por analogia, Currie contra  Jamaica, Comunicação N° 377/1989, ONU Doc. N° CCPR/C/50/D/377/1989 (1994), pr. 13.4 (que conclui que quando um condenado que busca a revisão constitucional de irregularidades no processo penal não tem recursos financeiros para custear este procedimento e quando os interesses da justiça assim o determinarem, o artigo 14(1) do Pacto Interancional de Direitos Civis e Políticos requer que o Estado providencie assistência jurídica.

[48] Ver Caso de Perú, supra, págs. 190 e 191.

71 Corte Interamericana de Direitos Humanos, Exceções ao Esgotamento dos  Recursos Internos, supra, par. 30.

72 Ver, por analogia, Comitê de Direitos Humanos da  ONU, William Collins contra Jamaica, Comunicação  N° 240/1987, ONU Doc N° CCPR/C/43/D/240/1987 (1991), par. 7.6 (que conclui que, nos  casos de pena capital, não somente se deve oferecer assistência jurídica, mas também permitir que o advogado prepare a defesa de seu cliente em circunstâncias que garantam   justiça)

[49] Transcrição do julgamento, páginas 70-73 e 82-83.

[50] Em alguns casos da Jamaica, Relatório N° 41/00, Caso 12.023, Desmond McKenzie, Caso 12.044, Andrew Downer e Alphonso Tracey, Caso 12.107, Dwight Fletcher, 12.146, Anthony Rose, Relatório Anual da  Comissão Interamericana de Direitos Humanos 1999, Volumen II, OEA/Ser.L/V/II.106, Doc. 3 rev. 13 de abril de 2000, 996.

[51] CIDH, Jorge Luis Bernstein e outros, Relatório Anual 1997, pág. 244, par. 12.  A Comissão observa que a Constituição de Jamaica contem uma cláusula  que declara que toda pessoa que detida ... "será levada sem demora perante um tribunal".  Constituição de Jamaica, 1962, Seção 15(2) " Toda pessoa que é detida será informada tão pronto seja razoável, no idioma que entenda, sobre as razõeos de sua detenção”. (ênfase dol autor)  artigo 15(3) "Toda pessoa que seja  detida (a) para ser levada a um tribunal em execução de uma ordem judicial; ou (b) por suspeita razoável de ter cometido ou estar a ponto de cometer um delito, e que não seja liberada, será levada sem demora perante um tribunal; e se  alguma pessoa detida por suspeitta razoável de ter cometido ou estar por cometer um delito penal não e´ julgada dentro de um prazo razoávele, sem prejuízo de todo outro processo que se possa ser iniciado contra ela, será liberado incondicionalmente ou sob condições razoáveis, incluindo as condições razoavelmente necessárias para garantir que compareça em juízo ou na fase preliminar do juízo" (ênfase do autor) numa data posterior.

[52] Ibid, citando CIDH, Segundo Relatório sobre a Situação dos  Direitos Humanos no Suriname. OEA Ser.L/V/II.66, doc. 21/Rev. 1, 1985, págs. 23 e 24..

[53] Ibid, par. 24.

[54] Ibid, par. 247 y 248.

[55] Peter Grant contra  Jamaica, Comunicação N° 597/1994, ONU Doc. N° CCPR/C/56/D/597/1994 (1996).

[56] Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, 19 de dezembro de 1996, 999 U.N.T.S. 171, artigo 9(3) "Toda pessoa detida ou presa devido  a uma infração penal será levada sem  demora perante um juiz ou outro funcionário autorizado pela  lei para exercer funções judiciais, e terá direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta en liberdade.  A prisão preventiva das pessoas a serem julgadas não deve ser a regra geral, mas sua liberdade poderá estar subordinada a garantias que asseguram  comparecimento do acusado no ato do juízo, ou em qualquer outro momento das diligências processuais e, em seu caso, para a execução da sentença”.

[57] Comitê de Direitos Humanos da  ONU, Paul Kelly contra Jamaica, Comunicação N° 253/1987.

[58] Convenção para a Proteção dos  Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais, E.T.S. N°5 (4 de novembro de 1950), artigo 5(3) (que dispõe que "toda pessoa detida conforme as disposições do parágrafo 1.c do presente artigo será levada sem demora perante um juiz ou outro funcionário autorizado pela  lei para exercer o poder judicial e terá direito a um juízo dentro de um prazo razoável ou a ser posto em liberdade até que seja realizado o julgamento.  A liberação pode estar condicionada a garantias de que compareça em juízo”.

[59] Corte Européia de Direitos Humanos, Caso Brogan e Outros, Ser. A. vol.145, 29 de novembro de 1988, par. 58

[60] Ibid, par. 62.

[61] Corte Européia de Direitos Humanos, Caso Koster contra  Países Bajos, Ser. A. Vol. 221, 28 de novembro de 1991, pars. 24 e 25.

[62] Jorge Luis Bronstein e outros, supra.

[63] Transcrição do julgamento, páginas 70-73 e 82-83.

[64] Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, artigo 9(3), supra.

[65] Convenção Européia para a Proteção dos  Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais, artigo 5(3) supra.

66 Ver análogamente Comissão Européia para la Prevenção da  tortura o un Tratamiento o Castigo Inhumano o Degradante (CPT), Segundo Relatório General sobre las Actividades del CPT que abarcan el período del 1º de janeiro al 31 de dezembro de 1991, Ref. CPPT/Inf. (92) 3 (13 de abril de 1992), párrs. 44-50 (donde se critican las condições carcelarias por hacinamiento, ausencia de por lo menos una hora de exercício al aire libre todos los dias para los reclusos, y la práctica de que los reclusos hagan sus necesidades en un balde, y donde se declara que el Comitê está particularmente preocupado al comprobar una combinação de hacinamiento, actividades insuficientes y acceso inadecuado a servicios higiénicos no  mismo establecimiento.  El efecto acumulativo de estas condições puede ser sumamente perjudicial para los reclusos.

[43] O artigo 28 estabelece que “As petições dirigidas à Comissão deverão  conter a seguinte informação: f. a indicação do Estado que o peticionário considera responsável, por ação ou por omissão, da  violação de algum dos  direitos humanos consagrados na  Convenção Americana sobre Direitos Humanos e outros instrumentos aplicáveis, ainda que não se faça uma referência específica ao artigo supostamente violado.

[44] Relatório N° 38/00, Caso 11.743, CIDH, 721, 767-769.

[45] Relatório N° 47/01, Caso 12.028, CIDH, Relatório Anual 2000, 841, 886-888.

[46] Ver, Corte Interamericana de Direitos Humanos, Exceções ao  Esgotamento dos  Recursos Internos (artigos 46(1), 46(2)(a) e 46(2)(b) da  Convenção Americana sobre Direitos Humanos), Opinão Consultiva OC-11/90 de 10 de agosto de 1990, Relatório Anual 1991, par. 28 (que interpreta o artigo 8(1) da  Convenção nos  seguintes termos):

Nos  casos que fazem  referência á determinação dos  direitos e obrigações de uma pessoa, de natureza civil, trabalhista , fiscal ou de outra índole, o artigo 8 não especifica nenhuma garantia mínima similar aquelas dispuestas no  artigo 8(2) para o processo penal. Contudo, prevê as devidas garantias; logo, o indivíduo aqui também tem  direito ao julgamento  imparcial previsto para os casos penais.

Ver também CIDH Lorna roye Ribe Star e outros contra  México, Relatório N° 49/99 (13 de abril de 1999) Relatório Anual 1998, par. 70 (que interpreta o artigo 8(1) no  contexto do processo administrativo que dá lugar à expulsão de estrangeirsos no  sentido de que exige certas garantias processuais mínimas, incluindo a oportunidad ede ser assistido por um advogado ou outro representante, tempo suficiente para considerar e refutar os cargos impostos de deduzir as provas correspondentes).

[47] Ver, por analogia, Currie contra  Jamaica, Comunicação N° 377/1989, ONU Doc. N° CCPR/C/50/D/377/1989 (1994), pr. 13.4 (que conclui que quando um condenado que busca a revisão constitucional de irregularidades no processo penal não tem recursos financeiros para custear este procedimento e quando os interesses da justiça assim o determinarem, o artigo 14(1) do Pacto Interancional de Direitos Civis e Políticos requer que o Estado providencie assistência jurídica.

[48] Ver Caso de Perú, supra, págs. 190 e 191.

71 Corte Interamericana de Direitos Humanos, Exceções ao Esgotamento dos  Recursos Internos, supra, par. 30.

72 Ver, por analogia, Comitê de Direitos Humanos da  ONU, William Collins contra Jamaica, Comunicação  N° 240/1987, ONU Doc N° CCPR/C/43/D/240/1987 (1991), par. 7.6 (que conclui que, nos  casos de pena capital, não somente se deve oferecer assistência jurídica, mas também permitir que o advogado prepare a defesa de seu cliente em circunstâncias que garantam   justiça)

[49] Transcrição do julgamento, páginas 70-73 e 82-83.

[50] Em alguns casos da Jamaica, Relatório N° 41/00, Caso 12.023, Desmond McKenzie, Caso 12.044, Andrew Downer e Alphonso Tracey, Caso 12.107, Dwight Fletcher, 12.146, Anthony Rose, Relatório Anual da  Comissão Interamericana de Direitos Humanos 1999, Volumen II, OEA/Ser.L/V/II.106, Doc. 3 rev. 13 de abril de 2000, 996.

[51] CIDH, Jorge Luis Bernstein e outros, Relatório Anual 1997, pág. 244, par. 12.  A Comissão observa que a Constituição de Jamaica contem uma cláusula  que declara que toda pessoa que detida ... "será levada sem demora perante um tribunal".  Constituição de Jamaica, 1962, Seção 15(2) " Toda pessoa que é detida será informada tão pronto seja razoável, no idioma que entenda, sobre as razõeos de sua detenção”. (ênfase dol autor)  artigo 15(3) "Toda pessoa que seja  detida (a) para ser levada a um tribunal em execução de uma ordem judicial; ou (b) por suspeita razoável de ter cometido ou estar a ponto de cometer um delito, e que não seja liberada, será levada sem demora perante um tribunal; e se  alguma pessoa detida por suspeitta razoável de ter cometido ou estar por cometer um delito penal não e´ julgada dentro de um prazo razoávele, sem prejuízo de todo outro processo que se possa ser iniciado contra ela, será liberado incondicionalmente ou sob condições razoáveis, incluindo as condições razoavelmente necessárias para garantir que compareça em juízo ou na fase preliminar do juízo" (ênfase do autor) numa data posterior.

[52] Ibid, citando CIDH, Segundo Relatório sobre a Situação dos  Direitos Humanos no Suriname. OEA Ser.L/V/II.66, doc. 21/Rev. 1, 1985, págs. 23 e 24..

[53] Ibid, par. 24.

[54] Ibid, par. 247 y 248.

[55] Peter Grant contra  Jamaica, Comunicação N° 597/1994, ONU Doc. N° CCPR/C/56/D/597/1994 (1996).

[56] Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, 19 de dezembro de 1996, 999 U.N.T.S. 171, artigo 9(3) "Toda pessoa detida ou presa devido  a uma infração penal será levada sem  demora perante um juiz ou outro funcionário autorizado pela  lei para exercer funções judiciais, e terá direito a ser julgada dentro de um prazo razoável ou a ser posta en liberdade.  A prisão preventiva das pessoas a serem julgadas não deve ser a regra geral, mas sua liberdade poderá estar subordinada a garantias que asseguram  comparecimento do acusado no ato do juízo, ou em qualquer outro momento das diligências processuais e, em seu caso, para a execução da sentença”.

[57] Comitê de Direitos Humanos da  ONU, Paul Kelly contra Jamaica, Comunicação N° 253/1987.

[58] Convenção para a Proteção dos  Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais, E.T.S. N°5 (4 de novembro de 1950), artigo 5(3) (que dispõe que "toda pessoa detida conforme as disposições do parágrafo 1.c do presente artigo será levada sem demora perante um juiz ou outro funcionário autorizado pela  lei para exercer o poder judicial e terá direito a um juízo dentro de um prazo razoável ou a ser posto em liberdade até que seja realizado o julgamento.  A liberação pode estar condicionada a garantias de que compareça em juízo”.

[59] Corte Européia de Direitos Humanos, Caso Brogan e Outros, Ser. A. vol.145, 29 de novembro de 1988, par. 58

[60] Ibid, par. 62.

[61] Corte Européia de Direitos Humanos, Caso Koster contra  Países Bajos, Ser. A. Vol. 221, 28 de novembro de 1991, pars. 24 e 25.

[62] Jorge Luis Bronstein e outros, supra.

[63] Transcrição do julgamento, páginas 70-73 e 82-83.

[64] Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos, artigo 9(3), supra.

[65] Convenção Européia para a Proteção dos  Direitos Humanos e Liberdades Fundamentais, artigo 5(3) supra.

[66] Quando o relatório preliminar sobre o mérito foi aprovado conforme o artigo 50 da  Convenção, a composição da  CIDH incluía o Professor Hélio Bicudo, quem nesse momento apresentou sua opinião separada.  Portanto, a opinão separada do Professor Bicudo foi incluida no  relatório final deste caso, aprovado de acordo com o artigo 51 da  Convenção, apesar do fato de que o mandato do Professor Bicudo como membro da  CIDH tenha expirado em 31 de dezembro de 2001.

[67] COMUNICADO DE IMPRENSA

N° 9100

A Comissão Interamericana de Direitos Humanos deplora a execução de Shaka Sankofa anteriormente conhecido como Gary Graham, no Estado de Texas, em 22 de junho de 2000. O Sr. Sankofa foi executado apesar das solicitações formalmente  apresentadas pela Comissão ao governo dos Estados Unidos com o fim de que fosse suspendida dua execução, até que a CIDH tivesse decidido sobre uma denúncia apresentada em seu nome.

Em 1993, a Comissão recebeu uma denúncia em nome do Sr. Sankofa, conforme a qual os Estados Unidos, como Estado Membro da Organização dos Estados Americanos, tinha violado os direitos do Sr. Sankofa consagrados na Declaração Americana dos Direitos e Deveres do Homem incluindo seu direito à vida, previsto no artigo 4 desse instrumento. O peticionário aelgou que o Sr. Sankofa foi sentenciado à morte por um crime que, segundo alegações, foi cometido quando tinha 17 anos,  que era inocente e que tinha sido sujeito a procedimentos em que não deram cumprimento aos padrões internacionais sobre devido processo legal.

Em 11 de agosto de 1993, a Comissão abriu o Caso n° 11.193 com base na denúncia do Sr. Sankofa depois de uma audiência celebrada em 4 de outubro de 1993. A Comissão transmitiu aos  Estados Unidos, em 27 de outubro  de 1993, uma solicitação formal para a adoção de medidas cautelares de acordo com o artigo  29 (2) do Regulamento da Comissão, solicitando que os Estados Unidos garantisse a suspensão da execução do Sr. Sankofa, tendo em conta que seu caso se encontrava pendente perante a Comissão. Nessa oportunidade, se propôs a execução do Sr. Sankofa, cuja data havia sido fixada previamente para 17 de agosto de 1993, até que fossem concluídos certos processos judiciais internos.

Em fevereiro de 2000 a Comissão foi informada sobre a conclusão dos procedimentos internos e a iminente expedição de uma nova ordem de execução. Em resposta, em 4 de fevereiro  de 2000 a Comissão reiterou aos Estados Unidos sua solicitação de medidas cautelares de outubro de 1993. Subsequentemente, em maio de 2000, a Comissão recebeu informação de que a petição do Sr. Sankofa perante a corte Suprema dos Estados Unidos havia sido denegada e sua execução programada para o dia 22 de junho de 2000. Em resposta, em 15 de junho de 2000, durante seu 107 período de sessões, a Comissão adotou o Relatório n°51/00 mediante o qual  declarou admissível a queixa do Sr. Sankofa e decidiu proceder a examinar o mérito do seu caso. Nesse mesmo informe, a Comissão voltou a reiterar aos Estados Unidos sua solicitação de suspensão da execução do Sr. Sankofa enquanto seu caso se encontrasse pendente de decisão final.

Numa comunicação de 21 de junho de 2000, os Estados Unidos acusou o recebimento da nota da Comissão de 4 de fevereiro de 2000 e indicou que a tinha enviado ao Governador e ao Procurador-Geral do Texas. Em 22 de junho, porém, a Comissão tomou conhecimento de que a Junta de Indultos e Liberdade Condicional de Texas havia recusado recomendar o Sr. Sankofa para uma suspensão, comutação ou indulto, e que sua execução teria lugar em 22 de junho de 2000 pela tarde. Em consequência, mediante uma comunicação da mesma data, a Comissão solicitou aos Estados Unidos uma resposta urgente a seu pedido prévio de medidas cautelares. Infelizmente, os  Estados Unidos não responderam à solicitação apresentada pela Comissão em 22 de junho  de 2000, e a execução do Sr. Sankofa foi efetuada conforme o programado.

A Comissão está  preocupada pelo fato de que, apesar de ter admitido o  caso do Sr. Sankofa para sua consideração por um órgão internacional de direitos humanos com competência, os Estados Unidos não respeitou eficazmente no contexto de suas obrigações internacionais em matéria de direitos humanos. Tendo em vista o dano irreparável provocado por essas circunstâncias, a Comissão exorta os Estados Unidos e outros Estados Membros da OEA a cumprir com as solicitações de medidas cautelares da Comissão, particularmente naqueles casos que envolvem o direito mais fundamental, o direito à vida.

Washington D.C., 28 de junho de 2000.