IX.      SITUAÇÃO DOS TRABALHADORES MIGRANTES HAITIANOS E SUAS FAMÍLIAS

          Status dos trabalhadores migrantes haitianos

74.             Em seu relatório de 1999, a CIDH observou que na República Dominicana residiam cerca de  500.000 trabalhadores haitianos sem documentação legal e, em  numerosos casos, tratavam-se de pessoas que estavam residindo no país por 20 ou 40 anos, e muitas delas haviam nascido no território dominicano.  A Comissão indicou também que a maioria enfrentava uma situação de ilegalidade permanente que transmitiam a seus filhos, quem não podiam obter a  nacionalidade dominicana porque, de acordo a interpretação restritiva que faziam as  autoridades dominicanas do artigo 11 da Constituição, estes eram filhos de “estrangeiros em trânsito”.  A Comissão entendeu que não era possível considerar “em trânsito” a pessoas que haviam residido por numerosos anos num país e onde haviam desenvolvido vínculos de toda índole.  Em consequência, numerosas crianças de origem haitiana viam negados direitos fundamentais, como a nacionalidade do país onde nasceram, acesso à saúde, e a educação.  A Comissão instou o Estado dominicano a adotar medidas tendentes a melhorar e regularizar a situação dos trabalhadores haitianos sem documentação mediante a entrega de cédulas de trabalho e de residência; e legalizar a situação de seus filhos, nos casos em que era aplicável o princípio jus soli conforme o artigo 11 da Constituição.[62] 

75.             Em sua resposta as recomendações da CIDH, o Estado dominicano informou o seguinte: “os Cartórios de Estado Civil exigem a todos os pais declarantes do nascimento de  crianças, independentemente de que sejam dominicanos ou não, os mesmos requisitos legais estabelecidos pela Lei 659 e pelas Resoluções da Junta Central Eleitoral.  Não se faz distinção de pessoas entre dominicanos e estrangeiros, nem se cria nenhum estatuto discriminatório mediante o qual viole os direitos dos filhos de estrangeiros nascidos na República Dominicana.  Além disso, existe um ordenamento jurídico e constitucional que estabelece a ordem mínima para residir legalmente no  país e ter a nacionalidade dominicana”.[63]

76.             Organismos de direitos humanos que trabalham com o tema dos trabalhadores migrantes alegam que os requisitos para regularizar o status dos trabalhadores migrantes são muito difíceis de obter devido à situação de pobreza em que se encontram.  O reconhecimento de sua condição de trabalhador migrante é possível de obter solicitando um cartão “temporário”, porém, na prática esse cartão tem uma duração de três meses e um custo entre $300.00 e $600.00 pesos dominicanos, o qual deve ser pago pelos trabalhadores, em vez do empregador.  Com respeito à legalização do status dos filhos de imigrantes, os grupos de direitos humanos argumentam que as autoridades estabeleceram resoluções que exigem mais requisitos aos pais de crianças, para documentá-los, de que as leis contemplam (ver Circular Nº 29/2001 da Junta Central Eleitoral de 13 de julho de 2001).  As organizações assinalam também que no passado era possível fazer as declarações tardias de nascimento com a apresentação do passaporte, cartão ou carnê do Conselho Estatal do Açúcar (CEA).  Atualmente, as autoridades exigem cédula de identidade dos pais, que somente os nacionais ou quem tem residência possuem.[64]

77.             A CIDH também foi informada que ainda quando existem centros de registro de nascimentos nos hospitais, quando se trata de mães que não tem documentação, os recém- nascidos não são registrados, apesar de que a Lei 659 sobre atos do Estado Civil, em seu artigo 56, estabelece que qualquer pessoa que tenha assistido ao parto, como médicos, parteiras, etc., pode realizar a declaração de nascimento.  No caso das declarações tardias de nascimento se exigem 12 requisitos, que impossibilitam os  pais de obter, devido custo e as limitações de documentação.  Normalmente, as solicitações são apresentadas aos oficiais de registro das províncias e transferidas a cidade de Santo Domingo, onde os solicitantes devem dirigir-se para uma entrevista a fim de obter a autorização.  Sobre este particular, o Centro Dominicano de Assessoria e Investigações Legais (CEDAIL) indica que conduziu casos em que foram esgotados todos os requisitos estabelecidos nas resoluções, e depois de obter a autorização para inscrever a criança, o Oficial de Estado Civil se nega a registrá-lo alegando que é haitiano, ainda que existam documentos que provem que a criança nasceu na República Dominicana.[65]

78.             O nível de crianças sem documentos nas áreas  pobres da República Dominicana é muito alto, particularmente nos bateyes.[66]   Não obstante, se observam avanços graças aos acordos entre a Junta Central Eleitoral e a Conferência do Episcopado Dominicano sobre a documentação de crianças, cuja execução conseguiu documentar 10.000 menores de 13 anos, entre os meses de abril e dezembro de 2001.   A CIDH considera que estes operativos realizados pelo Estado reduzem os custos das declarações tardias de nascimento e significam um grande avanço na proteção dos direitos das crianças.  Entretanto, nos casos de filhos de imigrantes, somente são admitidos os menores que possuam um certificado de ter nascido num hospital dominicano e que um dos pais seja dominicano e o outro tenha residência ou visto vigente.  Segundo informação recebida pela CIDH, somente 8% dos filhos de imigrantes haitianos foram beneficiados por estes operativos.[67]

79.             Dentro do contexto de crianças sem documentação a Comissão recebeu em 1999 uma denúncia sobre violações ao direito à nacionalidade das meninas Dilcia Yean e Violeta Bosica contra a República Dominicana.  Neste caso, os peticionários alegam violações ao artigo 20 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.  Em 22 de fevereiro de 2001, durante seu 110º período de sessões, a Comissão aprovou o Relatório de Admissibilidade Nº 28/01, relativo ao caso Nº 12.189 de Dilcia Yean e Violeta Bosica contra a República Dominicana.  Em 23 de agosto de 2001, o Dr. Juan Méndez, Primeiro Vice-Presidente da CIDH e a Dra. Bertha Santoscoy, advogada a cargo dos assuntos da República Dominicana reuniram-se em Santo Domingo com representantes da Chancelaria, membros da Junta Central Eleitoral e os representantes legais das meninas  Yean e Bosica, com a finalidade de buscar uma solução sobre o caso.  Em 25 de setembro de 2001, o Estado dominicano enviou a CIDH cópia das atas de nascimento outorgadas as meninas Dilcia Yean e Violeta Bosica.  A Comissão expressa sua satisfação e valoriza as gestões empreendidas pelo Estado da República Dominicana neste  caso.

Condições de vida dos trabalhadores haitianos e suas famílias

80.             Igualmente, em seu Relatório de 1999, a Comissão reiterou sua preocupação pelas precárias e insalubres condições em que vivem os  trabalhadores haitianos e suas famílias, e recomendou ao Estado adotar medidas tendentes a garantir os direitos econômicos, sociais e culturais destes trabalhadores sem discriminação alguma.  Em particular, a Comissão assinalou a necessidade de melhorar as condições de vida nos bateyes[68] e que lhes providenciassem os serviços básicos como: água potável, eletricidade, serviços médicos e programas educacionais.[69]

81.             Com esse propósito, o Estado dominicano informou que estabeleceu novas diretivas que permitiriam a população haitiana sem documentos radicada na República Dominicana aceder a certos serviços educacionais, tal como ilustra a decisão tomada pela Secretaria de Estado de Educação de permitir a inscrição de crianças nas escolas sem ter que apresentar uma  ata de nascimento, requisito obrigatório até setembro de 2001.[70]

82.             Com respeito à situação precária em que vivem muitos dos imigrantes haitianos na República Dominicana, o Estado informou que era um país pobre com recursos insuficientes para prover a seus mesmos cidadãos muitos dos direitos fundamentais e era impossível para a República Dominicana suportar sozinha toda a carga social originada da migração de centenas de milhares de cidadãos haitianos.[71]  O Estado manifestou que havia solicitado em numerosas ocasiões a participação da comunidade internacional para encontrar uma solução baseada nos direitos humanos da crescente problemática da imigração haitiana.

83.             De acordo com a informação proporcionada a CIDH por organizações de direitos humanos, as condições de vida nos bateyes eram mais precárias que em 1999, por causa do processo de privatização.  Com efeito, devido à transferência dos engenhos açucareiros do  Estado para a empresa privada, os bateyes dos engenhos de Santa Fe, El Porvenir e Quisqueya se encontravam em situação de extrema pobreza.[72]  O Presidente Hipólito Mejía se pronunciou a este respeito, ressaltando que uma das situações mais críticas de pobreza eram as condições de vida nos bateyes.[73]

84.             Um estudo realizado em agosto de 2000 sobre o impacto da privatização  desses três bateyes revelou que uma terceira parte destes não tinham acesso a nenhum grau de educação escolar; a metade  da população de desses bateyes não contava com energia elétrica; e sete de cada dez casas não possuíam serviços sanitários, nem nenhuma forma de eliminação de excrementos.  O  relatório do Banco Mundial de 17 de dezembro de 2001, indicou que o resultado da capitalização de CEA havia trazido consequências dramáticas às famílias dos trabalhadores de cana-de-açúcar, que eram assustadoramente pobres. Este relatório conclui que o analfabetismo nos bateyes alcançava 35% das pessoas de 15 anos ou maiores. As organizações não governamentais informaram que atualmente, os bateyes se chamam comunidades e que se juntaram à organização municipal, atribuindo a esta a competência e obrigação de garantir os serviços básicos, e não mais ao CEA .  Contudo, estas obrigações não foram assumidas pelos municípios, os quais não contam com os recursos para alocar orçamento aos bateyes.[74]

Expulsões  massivas

85.             Em seu relatório especial de 1999, a Comissão relatou como as expulsões massivas de haitianos eram realizadas, sem um processo legal que permitisse aos afetados demonstrar sua situação legal no país ou seu status migratório, nem se comunicar com suas famílias.  A Comissão indicou que as deportações eram realizadas de maneira arbitrária, sumária e sem garantias.  Em conseqüência disto, a CIDH recomendou que nos casos individuais em que fosse procedida a deportação, esta deveria ser efetuada de acordo com procedimentos que oferecessem um meio de defesa conforme as regras mínimas de justiça e evitassem erros e abusos.[75]

86.             O Estado informou que as autoridades atuais haviam reduzido as repatriações, e ampliado os canais de comunicação com o Estado de Haiti, criando diferentes comissões e organismos que buscavam um ambiente de cooperação entre ambos povos.  Dessa maneira, os Governos da República Dominicana e Haiti comprometeram-se a iniciar no dia 4 de março de 2002 um processo para dotar a seus nacionais de documentos de identidade.  Na Declaração conjunta firmada em 16 de janeiro de 2002 pelos Presidentes Hipólito Mejía e Jean-Bertrand Aristide foi estabelecido que o processo para dotar aos estrangeiros de documentos de identidade é uma obrigação contraída mutuamente mediante o compromisso e a obrigação por intercâmbio de notas da Declaração sobre as condições de contratação de seus nacionais.[76] O Estado informou a CIDH que as atuais autoridades haviam elaborado um Anteprojeto de Lei de Migração que propunha uma nova concepção do processo migratório em função da qual, a intervenção estatal na dinâmica migratória não deveria ser assumida somente como mecanismo repressivo controlador de fluxos, mas como mecanismo eficiente regulador dos mesmos.  Nesse mesmo contexto, o Estado indicou que não existia sentimento anti-haitianos como política oficial.

87.             De acordo com a informação recebida pela Comissão, entre mediados de agosto e finais de setembro de 2000 foram deportados cerca de 800 haitianos.[77]  Ainda que esta cifra seja menor se comparada com os 2000 haitianos que estavam sendo deportados por mês a finais de 1999, ainda representa um grupo numeroso de pessoas cujos direitos devem ser respeitados.

88.             A Comissão observa com preocupação que o Estado dominicano continua com sua prática de deportações massivas. Em 24 de janeiro de 2001 o Diretor Geral de Migração, Trajano Moreta Cuevas, declarou que somente no ano 2000 foram repatriados 14,000 haitianos e se calculava que atualmente residia no território dominicano um milhão de haitianos sem documentação.[78]  Diversas fontes assinalaram a Comissão que cerca de 9,000 haitianos haviam sido deportados durante o ano 2001.  Igualmente, a CIDH expressa sua inquietude perante o fato de que as expulsões sejam realizadas de forma violenta, antes que os trabalhadores haitianos possam receber seus salários e contatar a suas famílias. As expulsões são realizadas em franca contravenção as pautas estabelecidas no Acordo Bi-Nacional sobre as condições das deportações, adotado em dezembro de 1999.[79]

89.             No mês de janeiro de 2001, a Comissão foi informada sobre diversos incidentes relacionados com os imigrantes haitianos que entram na República Dominicana. Um deles refere-se a disparos contra um ônibus que transportava haitianos, por uma patrulha do Exército dominicano, resultando dois mortos e diversos feridos.[80]  A Comissão observa que não se trata do primeiro incidente deste tipo, já que no mês de junho de 2000 também foi atingido por disparos outro ônibus que resultou na morte de sete pessoas, dentre eles 6 haitianos e um  dominicano. Este fato ocorreu em Guayabin, Província de Monte Cristi.[81]

90.             Dentro do contexto de expulsões massivas ocorridas durante o período que cobre este relatório, a Comissão solicitou a Corte Interamericana de Direitos Humanos, em 30 de maio de 2000, que adotasse medidas provisórias no caso Nº 12.271, para que o Estado da República Dominicana suspendesse as expulsões massivas de haitianos e de dominicanos de origem haitiano, toda vez que, de acordo com a informação contida na denúncia, estas punham em risco a vida e a integridade física dos deportados e ademais, em muitas ocasiões, as famílias eram separadas e os menores ficavam abandonados. Como parte das medidas provisórias solicitadas, a Comissão pediu ao Estado dominicano que cessara as expulsões massivas de: a) haitianos sem documentação que se encontravam no território dominicano; b) haitianos documentados que se encontravam legalmente no território dominicano; c) dominicanos de origem haitiana nascidos no território dominicano que não possuem documentação; e d) dominicanos de origem haitiana nascidos no território dominicano devidamente documentados.

91.             A Comissão solicitou que a suspensão deveria durar até que fosse estabelecido um procedimento que permitisse verificar os casos em que procedia ou não a deportação. Nesse caso de proceder à deportação, as pessoas deveriam gozar de todos os direitos de um devido processo. Igualmente, a Comissão solicitou que as deportações fossem realizadas de maneira individual e não massiva.

92.             No pedido de medidas provisórias, a Comissão descreveu as circunstâncias específicas dos senhores Benito Tide Méndez, Rafaelito Pérez Charles, Antonio Sension, Janty Fils-Aime, Berson Gelim, William Medina Ferreras e da senhora Andrea Alezy, bem como as de seus familiares. Igualmente, a Comissão solicitou a Corte que tomara as medidas necessárias para que fosse permitido o retorno imediato de Janty Fils-Aime e de William Medina Ferreras.

93.             Como resultado da audiência de 18 de agosto de 2000, onde se ouviu as partes, a Corte outorgou as medidas provisórias em favor das pessoas assinaladas pela Comissão. Nesta decisão a Corte resolveu, entre outros:

1.         solicitar ao Estado da República Dominicana que tomara quantas medidas fossem necessárias para proteger a vida e integridade pessoal de Benito Tide Méndez, Antonio Sension, Andrea Alezy, Janty Fils-Aime, William Medina Ferreras e também as testemunhas Padre Pedro Ruquoy e a senhora Solange Pierre, que compareceram à audiência pública de 8 de agosto de 2000;

2.         requerer ao Estado dominicano se abstivera de deportar ou expulsar de seu território a Benito Tide Méndez e Antonio Sension;

3.         que permitisse o retorno imediato a seu território de Janty Fils-Aime e William Medina Ferreras;

4.         requerer ao Estado dominicano que permitisse, a reunificação familiar de Antonio Sension e Andrea Alezy com seus filhos menores na República Dominicana;

5.         requerer ao Estado dominicano que, no marco dos convênios de cooperação pertinentes entre a República Dominicana e Haiti, investigara a situação de Janty Fils-Aime e William Medina Ferreras sob a supervisão da CIDH;

6.         requerer ao Estado dominicano que continuara com as investigações em relação a Benito Tide Méndez, Rafaelito Pérez Charles, Antonio Sension, Andrea Alezy e Berson Gelim.

94.             A Comissão reiterou seu pedido a Corte para que se protegera a vida e integridade do Padre Ruquoy e da senhora Pierre e em termos gerais  para que fossem cumpridas as medidas provisórias adotadas pela Corte.

95.             Em 1º de março de 2001, a pedido dos peticionários, se levou a cabo uma reunião de trabalho durante o 110º período de sessões da CIDH.  Nesta reunião, os peticionários solicitaram ações concretas por parte do Estado dominicano, a saber: a) uma declaração pública de respeito às testemunhas que participaram na audiência perante a Corte em 18 de agosto de 2000; b) respeitar e garantir os direitos das vítimas dominicanas que residem na República Dominicana; c) realizar uma diretiva governamental para que estas pessoas não sejam expulsas; d) outorgar a estas pessoas um documento especial para que não fossem expulsas; e e) outorgar garantias para poder repatriar os familiares das pessoas que haviam sido injustamente expulsas.  Por sua vez,  o Estado dominicano assinalou que estava na melhor disposição de cooperar com a Comissão e que nesse sentido convidava a CIDH a levar a cabo uma visita in loco, a qual poderia realizar-se em novembro de 2001.   Em princípio, o convite foi aceito pela CIDH; porém, devido à mudança da data da reunião ordinária da CIDH (ver supra, par. 2), a visita não pode ser realizada.

96.             Mediante comunicação de 4 de dezembro de 2001, a Corte Interamericana instou ao Estado da República Dominicana e a Comissão Interamericana tomar todas as ações e providências necessárias para a criação de um mecanismo apropriado para coordenar e supervisionar as medidas no presente caso, bem como para o cumprimento de todas as disposições estabelecidas pela Corte Interamericana nas resoluções anteriores.

97.             A fim de cumprir com a comunicação da Corte Interamericana de 4 de dezembro, a Comissão patrocinou uma reunião de trabalho entre as partes em 6 de dezembro de 2001.  Nela foi acordada, entre outros, a realização de uma reunião de seguimento no início do mês de fevereiro de 2002, com o propósito de fixar as bases sobre o mecanismo para dar cumprimento as disposições da Corte.

X.      SITUAÇÃO DA MULHER

98.             Em seu Relatório sobre a Situação dos Direitos Humanos na República Dominicana de 1999, a Comissão tomou conhecimento das medidas adotadas pelo Estado dominicano para melhorar a situação da mulher, em especial a Lei 24/97 contra a violência doméstica e aquelas que as permitem possuir bens e a beneficiar-se da distribuição da terra no marco da Reforma Agrária.  A Comissão observou que a Direção Geral de Promoção da Mulher vinha trabalhando no fortalecimento de vínculos com as demais instituições dedicadas a trabalhar na área da mulher, recebendo assessoria e apoio de organismos internacionais.  Dentro desse contexto, a Comissão manifestou a necessidade de que esta Direção recebesse apoio expressivo por parte do Estado, para que os programas que realizam fossem amplamente difundidos e executados, de maneira que realmente contribuíssem ao fortalecimento e a  proteção dos direitos da mulher na República Dominicana.[82]

99.             Em sua resposta as recomendações da CIDH, o Estado dominicano assinalou que tendo em vista o Relatório da CIDH de 1999 e o marco da legislação interna, foi criado a Secretaria de Estado da Mulher, através da Lei 86/99.  Igualmente foram promulgadas duas leis importantes, destinadas à ampliação e proteção dos direitos da mulher: a) A Lei 12-2001 que estabelece uma quota de participação nos postos eletivos de 33% para as mulheres, e b) A Lei 974-01, de 26 de setembro de 2001, que dispõe a criação em cada Secretaria do Estado de um Departamento de Equidade de Gênero e Desenvolvimento supervisionadas pela Secretaria do Estado da Mulher.[83]

100.        O Estado menciona que nos últimos dois anos as mulheres conseguiram avanços significativos, particularmente em relação a sua presença nos três Poderes do Estado.  Por exemplo, no Poder Executivo, uma mulher está a cargo da Vice-presidência da República.  No  Poder Legislativo, as mulheres ocupam 26 vagas, e a Presidência da Câmara de Deputados está a cargo de uma mulher.  No Poder Judicial, as mulheres têm uma participação de 33.3% na  Suprema Corte de Justiça; de 33.6% nas Cortes de Apelação; e de 33.6% nos Julgados de Primeira Instância e Paz.[84]

101.        Como parte de suas recomendações contidas no Relatório de 1999, a Comissão requereu ao Estado da República Dominicana adotar medidas tendentes a proteger as mulheres que eram vítimas da violência associada com a prostituição e o tráfico ilegal de mulheres.  Igualmente, a Comissão referiu-se a falta de proteção das trabalhadoras que eram vítimas de discriminação no emprego, despedidas arbitrárias e a desigualdade de remuneração entre homem e mulher.

102.        O  Estado informou que apesar dos avanços realizados, a mulher dominicana continuava sendo afetada com frequência pela miséria e pela falta de proteção social, o que a  convertia em vítima da violência associada com a prostituição e o tráfico ilegal de mulheres. O Estado indicou que era dentro desse contexto que havia desenhado um Programa de Luta contra a Pobreza que buscava promover e motivar ações que melhorassem significativamente os níveis de vida das casas dominicanas, especialmente naquelas onde a mulher era a cabeça da família.  Como parte do trabalho empreendido pelo Estado, foram mencionadas as seguintes ações: a) alocação de recursos financeiros mensais para garantir a escolaridade das crianças; b) concessão de empréstimos às mulheres comerciantes a juros baixos; e c) aumento da cobertura e qualidade dos empregos das mulheres.[85]

103.        Também como parte dos programas dirigidos a proteger a mulher, o Estado dominicano informou que, através  da Secretaria de Estado da Mulher, havia criado e posto em funcionamento diferentes meios para ajudar a mulher na defesa de seus direitos, entre os que se encontravam:  a) Destacamentos de Proteção a Mulher da Polícia Nacional (Villa Juana, San Francisco, Santiago); b) Clínica Jurídica e Psicológica da Secretaria da Mulher; c) Centros de Atenção a Vítimas de Abuso Sexual; d) Centros de Atenção a Mulher Maltratada; e e) Redes de Apoio a Mulher Vítima da Violência.  Por outra parte, o Estado indicou que a Escola Nacional da Magistratura realizava, em coordenação com a Secretaria da Mulher e UNICEF, o programa "Para uma sobrevivência de igualdade, com o objetivo de oferecer capacitação em matéria de violência intra-familiar aos juízes de todo o país.

104.        O Estado manifestou que o conjunto de medidas dirigidas a promover o desenvolvimento da mulher havia tido resultados positivos, entre os quais: a) a mulher dominicana é proprietária de 46.8% das micro-empresas do país; b) a proporção das mulheres meeiras passou de 7% a 10% em somente três anos devido a aplicação da Lei 55-97 sobre Reforma Agrária; e c) a tendência crescente de incorporação das mulheres a todas as esferas da educação, notadamente na educação superior, com uma população feminina que supera  60% da matrícula total.[86]

105.        A Comissão valoriza profundamente a adoção de novas leis tendentes à  proteção da mulher na República Dominicana e observa que as medidas empreendidas pelo Governo dominicano buscam impulsionar o desenvolvimento da mulher através de programas e subsídios financeiros que permitam elevar seu nível de vida como cabeça de família dentro de casa, e seu nível de participação na vida pública.

106.         Sem menosprezar o louvável esforço realizado pelo Governo e o avanço nas  medidas legislativas, a Comissão manifesta sua preocupação em relação às mulheres que, na prática, continuam sendo vítimas da violência intra-famíliar.  A CIDH também observa que continua a falta de proteção das trabalhadoras que são vítimas de discriminação no emprego, despedidas arbitrárias e a desigualdade de remuneração entre homem e mulher.  Diversas fontes informaram que o orçamento mais baixo de todas as Secretarias era o da Secretaria do Estado da Mulher. Embora a CIDH tenha sido informada que a Secretaria do Estado da Mulher criou recentemente, junto a outros setores da sociedade civil, o Plano Nacional de Igualdade de Gênero, cabe assinalar que este programa não pode ser aplicado por falta de fundos.[87]

107.        Organizações de direitos humanos afirmaram que a Lei 24/97 representa um grande êxito do movimento social das mulheres no país.  Não obstante, ainda faltam elementos de sensibilização e capacitação dos encarregados de administrar justiça.   Por exemplo, em muitos casos, contrariamente a Lei 24/97 se opta pela “conciliação matrimonial”, impondo que a mulher retorne a viver com o agressor. Por outra parte, as organizações de direitos humanos indicam que ainda que existam os destacamentos “Amigos da Mulher” para proteger a mulher, estes resultam insuficientes, e somente se encontram na capital e algumas cidades principais do país.[88]

108.        A Comissão foi  informada que durante o ano 2001 ocorreram 94 homicídios contra a mulher na República Dominicana.[89]  Um estudo realizado pelo Departamento de Proteção a Mulher de Villa Juana, localizado em Santo Domingo, revelou que desde a data de abertura do Destacamento, 9 de outubro de 1997 à setembro de 2000, se havia recebido um total de 7.019 queixas, isto é, uma média de 2.339 queixas por ano.  Um grande número de mulheres recorre aos Destacamentos da Mulher para apresentar suas queixas, mas infelizmente não contam com os recursos adequados que permitam realizar um trabalho que verdadeiramente garanta as mulheres o gozo de seus direitos fundamentais. Entre os obstáculos está o reduzido número de pessoal.  Por exemplo, na cidade de Santiago foram recebidos  500 casos por mês e somente contam com duas advogadas assistentes do promotor.  Outros obstáculos assinalados são a falta de recursos da Polícia Nacional; os poucos agentes da polícia que enviados aos Destacamentos não contam com unidades móveis, e em numerosas ocasiões, as mulheres tem  que pagar pelo transporte dos agentes da Polícia ou um táxi para a busca do agressor.[90]

XI.      SITUAÇÃO DOS MENORES

109.        No seu Relatório sobre a Situação dos Direitos Humanos na República Dominicana de 1999, a Comissão referiu-se a grave situação que enfrentavam os menores, em particular, o trabalho infantil, a prostituição, o tráfico ilegal de menores, a violência intra-familiar e os abusos cometidos dentro dos centros de detenção.  A Comissão recomendou ao Estado dominicano tomar medidas encaminhadas a proteção dos menores com respeito às situações mencionadas.[91]

110.        Em sua resposta as recomendações da Comissão, o Estado dominicano expressou que vem realizando um importante processo de coordenação entre as instituições governamentais correspondentes e numerosos atores da sociedade civil, a fim de analisar a problemática das crianças e adolescentes na República Dominicana.  A respeito disto, o Estado manifestou que a primeira fase do Grande Plano Nacional para a Infância e a Adolescência havia sido concluída recentemente e ela estabeleceu uma série de objetivos imediatos em matéria de nome e nacionalidade, de abuso infantil e de adolescentes e conflito com a lei.  Dentro deste contexto, o Estado referiu-se ao Projeto de Erradicação do Trabalho Infantil na República Dominicana, destacando que no final do ano 2000, havia registro de avanços significativos nesse projeto.[92]

111.        O Estado argumentou que os projetos em execução estavam dirigidos a estabelecer uma campanha de sensibilização a nível nacional, a que incluiria, workshops regionais, identificação das piores formas de trabalho infantil, publicações e seminários sobre o tema. Estes projetos buscavam sensibilizar também o setor patronal e capacitar os inspetores da Secretaria de Trabalho.  Igualmente, o Estado informou que a Secretaria de Trabalho estava ajudando as famílias a renunciar o trabalho de seus filhos menores, outorgando-lhes créditos que lhes possibilitavam iniciar qualquer tipo de negócio pequeno que substituísse o ingresso que aportava o menor, com a condição de que a criança atendesse regularmente a escola.[93] 

112.        O Estado dominicano mencionou que conseguiu implementar cinco projetos de erradicação e prevenção do trabalho infantil, sob a supervisão e assistência técnica da Secretaria de Trabalho.  Estes projetos são desenvolvidos por diferentes organismos não governamentais, a saber:

Constanza:  O projeto de erradicação e prevenção do trabalho infantil em trabalhos agrícolas de alto risco desenvolvido pela Organização Pró-Jovem Dominicana, em coordenação com a Secretaria de Trabalho, e está dirigido a menores trabalhadores que habitam as 17 comunidades rurais do Município de Constanza.  Este projeto foi reconhecido internacionalmente como Projeto Modelo.

Província Duarte:  Pró-Jovem Dominicana dirige também projetos de arroz nas  comunidades de Villa Rivas e Arenoso; seu objetivo é resgatar crianças que trabalham no setor arrozeiro.

San José de Ocoa "A la Rueda Rueda":  Projeto no setor do café, executado em coordenação com a Fundação do Serviço Exterior para a Paz e o Desenvolvimento (FUNPADEM e CEPAE).

San José de Ocoa:  O projeto da Associação de Desenvolvimento de San José de Ocoa, (ADESJO) que dirige o Padre Luis Quin, pretende abarcar a 2.000 crianças em atenção direta e 4.000 em prevenção.

Azua:  Destinado a resgatar as crianças que trabalham no cultivo de tomate.[94]

113.        Com respeito à prostituição de menores, o Estado informou que atualmente estava implementando o Projeto de Erradicação da Exploração Sexual Comercial Infantil, na  comunidade de Boca Chica, e na cidade de Puerto Plata, dada a incidência do turismo nessas  zonas do país.  Infelizmente o Estado não proporcionou maior informação que permitisse a CIDH apreciar os avanços e resultados deste Projeto.

114.          Em relação as crianças de rua, o Estado informou que tendo como base os Decretos No. 476-00 e No. 477-00, O Organismo Reitor do Menor havia continuado apoiando economicamente os programas de crianças de rua que executam a Pastoral Juvenil, Canillitas com Don Bosco, Projeto Caminante e o Projeto Renascer, por um valor de $1,700.000.00 pesos dominicanos.  O Estado informou que estava por apresentar o programa de Albergues e Residências para reeducação cidadã de Crianças e Adolescentes, o qual estaria sob a execução da Secretaria de Estado das Forças Armadas, com o apoio técnico e assessoria do Organismo Reitor do Sistema de Proteção de Crianças e Adolescentes e outras instituições governamentais e não governamentais.[95]  A Comissão manifesta sua inquietude pelo fato de que a Secretaria das Forças Armadas esteja a cargo do plano do Governo para a reeducação cidadã dos menores, motivo pelo qual deseja ter mais informação a respeito. 

115.        O Estado dominicano indicou que no caso de menores vítimas do maltrato infantil, devido ao abandono por parte de seus familiares, o Organismo Reitor do Menor havia procedido a localizar as crianças em Centros de Proteção Integral os quais, depois de terminado o processo legal correspondente, seriam designados a famílias adotantes, para garantir o interesse superior dessas crianças.  Com respeito aos adolescentes infratores da lei, o Estado assinalou que para favorecer aos adolescentes em conflito com a lei penal, diversas instituições haviam colaborado para estabelecer um Centro de Atenção Integral para Adolescentes em Conflito com a Lei, o qual estava localizado na cidade de San Cristóbal, em um pavilhão separado das instalações da Penitenciária Najayo.  Também informou que este centro contava com pessoal especializado para trabalhar e reabilitar os adolescentes infratores.[96]

116.        De acordo com a informação recebida, a Comissão observa os avanços alcançados pelo Estado dominicano na implementação de projetos tendentes a erradicar e prevenir o trabalho infantil, bem como a integração com organismos não governamentais que participam na realização destes projetos.  Não obstante, a CIDH observa  que o trabalho infantil continua existindo em diferentes zonas do país.  A princípio o trabalho infantil está condicionado à situação econômica do lar e, em numerosos casos, esta situação está seguida pelo abandono da residência e da escola.  Diversas fontes mencionaram que apesar dos esforços do Estado através de campanhas de sensibilização neste tema, programas e centros de atenção e apoio aos menores e a suas famílias, estes apresentaram resultado insuficientes, isolados e de impacto mínimo.[97]

117.        A Comissão nota com inquietude que o trabalho infantil não somente priva as crianças carentes de irem a escola, mas também leva a prostituição do menor com idade cada vez mais baixa (12 anos), de acordo com as zonas turísticas onde a prostituição infantil está presente. No que se refere aos projetos dedicados a ajudar as crianças de rua, a Comissão nota que apesar do apoio econômico que o Organismo Reitor do Menor tenha dado aos programas desenvolvidos por organizações não governamentais, a situação dos menores continua sendo grave, dado que estes enfrentam diversos perigos, como o consumo de drogas, o risco de contrair AIDS e outras doenças venéreas.[98]

118.        A Comissão destaca o esforço empreendido pelo Estado dominicano na criação de um novo pavilhão para menores, com o objetivo de separá-los dos adultos.  Entretanto, continuam os abusos por parte de agentes da Polícia, quem, em muitos casos, se negam a enviar os menores as centros de detenção respectivos,[99] e aplicam severas medidas de correção que vão desde o maltrato até a tortura.[100]

XII.     CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

119.        A Comissão reconhece e valoriza as medidas adotadas pelo Estado dominicano em seu esforço por fortalecer a administração da justiça e o devido processo legal.  Contudo, a Comissão observa que não foi implementado o plano de Estado de descongestionar o cúmulo de casos perante os tribunais.  Ainda que a CIDH tenha sido informada sobre a criação de um maior número de tribunais, a porcentagem de presos preventivos vem aumentando.  O atraso excessivo nos procedimentos judiciais é uma das causas da alta porcentagem de detidos em prisão preventiva.  A Comissão observa que a prisão preventiva sem  julgamento constitui uma violação flagrante da Convenção Americana sobre Direitos Humanos, sobre a presunção de inocência e as normas do devido processo legal.

120.        A Comissão reitera sua recomendação para que as autoridades adotem medidas urgentes destinadas a corrigir os atrasos que existem na administração da justiça, as que devem  incluir que todo detido que não seja sentenciado dentro de um prazo razoável deve ser posto em  liberdade, sem prejuízo da continuidade do processo.  A CIDH também recomenda que o Estado tome as medidas tendentes a garantir que a detenção preventiva seja aplicada como uma medida excepcional dentro dos parâmetros legais, evitando que se transforme na maneira  usual de administrar justiça, sem o devido processo, juiz e sentença.

121.        A Comissão expressa sua preocupação que as execuções extrajudiciais efetuadas por agentes das forças de segurança aumentaram no período que cobre este relatório.  A maioria das mortes violentas que ocorrem no país está relacionada com abusos cometidos por membros da Polícia, a Direção Nacional para o Controle de Drogas e as Forças Armadas, os quais abusam do seu poder e utilizam força excessiva em ações que terminam com a morte das vítimas.  Igualmente, a Comissão observa com inquietude as denúncias de execuções sumárias de prisioneiros ocorridas dentro dos centros penitenciários, sob a custódia de agentes do Estado, bem como a falta de investigação e sanção destes atos por parte do Estado. A Comissão deplora a existência de um tribunal policial encarregado de julgar as faltas e delitos de seus membros, o qual atenta contra o direito de igualdade perante a lei consagrado na Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

122.        A Comissão reitera sua recomendação ao Estado dominicano para que adote medidas urgentes tendentes a investigar de forma exaustiva as violações ao direito à vida, a fim de que os responsáveis sejam  julgados e punidos pela justiça civil ordinária e seus familiares indenizados.  A Comissão destaca que todo ato de violação de direitos humanos perpetrado por agentes do Estado não deve ficar impune e que a falta de investigação, reparação e punição  dos responsáveis engendra a responsabilidade internacional do Estado.  A Comissão insta o Estado dominicano a tomar medidas tendentes a garantir que a jurisdição dos tribunais da polícia  seja limitada a medidas disciplinárias de seus membros e que os delitos comuns sejam julgados pelos tribunais ordinários.

123.        A Comissão reconhece o esforço realizado pelo Estado dominicano relativo à criação do Instituto Militar de Direitos Humanos, encarregado de ministrar cursos de capacitação sobre direitos humanos aos agentes das Forças Armadas.  Não obstante, a Comissão observa com inquietude que continua o uso excessivo da força por parte dos agentes das forças de segurança, tanto no momento da detenção como dentro dos centros carcerários.  A Comissão reitera ao Estado dominicano a necessidade de que tome medidas urgentes que ponham fim a prática generalizada de tortura, maltrato e castigo corporais contra os detidos.  A Comissão reitera também ao Estado dominicano sua obrigação de investigar as denúncias sobre estes atos, a fim de que os responsáveis sejam apresentados perante a justiça ordinária e as vítimas sejam indenizadas.

124.        A Comissão observa com bastante preocupação que continua a prática das forças de  segurança de realizar batidas policiais de forma indiscriminada e violenta.  Esta prática ilegal de deter de forma arbitrária a todos aqueles que parecem suspeitos de algum delito e de mantê-los na prisão até que a polícia decida quem merece ser posto em liberdade, atenta contra o direito a integridade física e a liberdade pessoal dos cidadãos dominicanos.  A Comissão insta o  Estado dominicano que tome medidas urgentes para que,  de acordo a lei, com exceção do flagrante delito, somente sejam autorizadas detenções com prévia ordem judicial.  As batidas policiais devem suspensas.  Igualmente, a intervenção da ordem pública no caso de manifestações ou protestos deve ser efetuada sem o uso indiscriminado da força.

125.        A Comissão reconhece o esforço realizado pelo Estado dominicano na  construção de obras novas e a remodelação das celas existentes,  a fim de melhorar as condições dos centros penitenciários no país.  A criação de um novo pavilhão para menores, bem como o estabelecimento de programas de reabilitação dos reclusos, constituem um significativo avanço.  Sem desprezar a importância que este esforço significa, a Comissão adverte que o superlotação nas prisões ainda persiste e este se vê agravado pelas difíceis condições de higiene e alimentação em que vivem os prisioneiros dominicanos.                    A Comissão urge o Estado dominicano a tomar as medidas necessárias para garantir que as condições físicas carcerárias, a alimentação, e a atenção médica sejam adequadas.  Deve evitar-se a violência contra os reclusos e separar os indiciados dos sentenciados.

126.        A Comissão adverte com preocupação que na prática as penitenciárias do país continuam sob controle da polícia e dos militares.  Por isto, a Comissão recomenda ao Estado dominicano que apóie a figura do Prefeito Civil que, em princípio, está a cargo dos centros penitenciários e que lhe ofereça os recursos necessários para que possa cumprir adequadamente sua função.  Ainda que a Comissão conheça a existência de um Anteprojeto de Regulamento para criar a Escola de Administração Penitenciária, a CIDH recomenda ao Estado dominicano tomar as medidas necessárias para que a criação desse corpo civil treinado em administrar e supervisionar os recintos carcerários seja finalizada num futuro  breve.

127.        A Comissão considera importante destacar as ações empreendidas pelo Estado dominicano que permitem a população haitiana sem documentos radicada na República Dominicana aceder a certos serviços educacionais.  A CIDH valoriza a recente decisão da Secretaria do Estado de Educação que permite a inscrição escolar de todos as crianças sem ter  que apresentar atas de nascimento.  Igualmente, a Comissão reconhece os avanços conquistados pelo Estado através dos operativos realizados para documentar as crianças menores de 13 anos.  Estes operativos reduzem os custos das declarações tardias de nascimento e  significam um avanço na proteção dos direitos das crianças.  Contudo, nos casos de filhos de imigrantes haitianos somente uma pequena porcentagem foi beneficiada por estes operativos.  A Comissão expressa sua satisfação com as gestões realizadas pelo Estado dominicano no  caso Nº 12.189 das menores Dilcia Yean e Violeta Bosica, mediante as quais  foram providenciadas as atas de nascimento das menores.

128.        A Comissão estima como um avanço significativo o compromisso dos Estados de Haiti e da República Dominicana de dotar de documentos de identidade a seus nacionais, mediante a “Declaração sobre as Condições de Contratação de seus Nacionais”.  A Comissão espera que os passos dados nesta direção permitam melhorar a situação dos imigrantes haitianos. A Comissão reitera ao Estado dominicano sua recomendação de adotar as medidas tendentes a melhorar e regularizar a situação dos trabalhadores haitianos sem documentação,  mediante a entrega de cédulas de trabalho e de residência e a legalizar a situação de seus filhos  nos casos que proceda de acordo com o princípio jus soli conforme o artigo 11 da Constituição.

129.        A Comissão deplora as precárias e insalubres condições em que vivem os trabalhadores haitianos e suas famílias, e recomenda ao Estado dominicano adotar as medidas tendentes a garantir os direitos econômicos, sociais e culturais destes trabalhadores sem  discriminação alguma.  Em particular, a Comissão reitera a necessidade de melhorar as condições de vida nos bateyes e que lhes sejam providenciado serviços básicos como água potável, eletricidade, serviços médicos e programas educacionais.

130.        A Comissão manifesta sua preocupação pelas expulsões massivas de haitianos e de dominicanos de origem haitiana, as que continuam ocorrendo de forma violenta e arbitrária.  A Comissão recomenda ao Estado dominicano que tome medidas urgentes para que os procedimentos de deportação sejam realizados com base nas regras mínimas de justiça e do devido processo legal, a fim de evitar erros e abusos.  O Estado deve garantir a todo cidadão  dominicano o direito de não ser expulso de seu país.  Igualmente, deve proporcionar aos imigrantes haitianos as garantias sujeitas a um processo de deportação, a fim de provar a legalidade de sua saída do país.

131.        A Comissão observou que a política atual do Estado dirigida a impulsionar o desenvolvimento da mulher.  Com a promulgação da Lei 24-97 o Estado dominicano deu um primeiro passo ao reconhecimento de suas obrigações contraídas ao ratificar a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Contra a Mulher, de Belém do Pará.  A Comissão valoriza e reconhece a importância das novas Leis 12-01 e 974-01 adotadas pelo Estado recentemente, as quais permitem um maior nível de participação da mulher na vida pública, bem como os passos dados na criação de mecanismos destinados a proteção da mulher contra a violência, através de cursos de capacitação e o fortalecimento de vínculos com as  instituições dedicadas a trabalhar na área da mulher.  Entretanto, a Comissão manifesta sua preocupação porque, na prática, as mulheres continuam sendo vítimas da violência física, de discriminação no âmbito do trabalho e  desigualdade de remuneração entre homem e mulher.

132.        A Comissão urge ao Estado dominicano adotar medidas tendentes a proteger as mulheres, a fim de que não sejam vítimas da violência intra-familiar, ou da violência associada com a prostituição e o tráfico ilegal de mulheres.  A CIDH enfatiza também a necessidade de que o Estado tome medidas tendentes a estimular a capacitação dos administradores da justiça com respeito ao direito da mulher.  Da mesma maneira, a Comissão solicita ao Estado que tome as medidas pertinentes a fim de que os Destacamentos de Proteção da Mulher possam contar com um maior número de pessoal capacitado, para exercer uma proteção eficaz dos direitos da mulher.  Igualmente, recomenda ao Estado adotar as medidas adequadas, com o objetivo de realizar um estrito controle das condições e relações de trabalho das mulheres.  Por último, a Comissão incentiva o Estado dominicano a que continue fortalecendo e aplicando sua política destinada a conseguir a plena igualdade entre o homem e a mulher nos diferentes setores da vida em sociedade.

133.        A Comissão deseja destacar o trabalho realizado pelo Estado dominicano na implementação de projetos tendentes a erradicar e prevenir o trabalho infantil, bem como a interação alcançada com organismos não governamentais que participam na realização de destes projetos.  No obstante, a CIDH observa  que ainda existe trabalho infantil na República Dominicana e que apesar dos esforços do Estado através de campanhas de sensibilização neste tema e a criação de centros de atenção aos menores e a suas famílias, estes foram insuficientes e de impacto mínimo.

134.        A Comissão nota com inquietude que o trabalho infantil não somente priva as crianças carentes de irem a escola, mas também leva a prostituição do menor com idade cada vez mais baixa (12 anos), de acordo com as zonas turísticas onde a prostituição infantil está presente. No que se refere aos projetos dedicados a ajudar as crianças de rua, a Comissão nota que apesar do apoio econômico que o Organismo Reitor do Menor tenha dado aos programas desenvolvidos por organizações não governamentais, a situação dos menores continua sendo grave, dado que estes enfrentam diversos perigos, como o consumo de drogas, o risco de contrair AIDS e outras doenças venéreas.

135.        A Comissão valoriza o esforço empreendido pelo Estado dominicano na criação de um novo pavilhão para menores, com o objetivo de separá-los dos adultos.  Entretanto, continuam os abusos por parte de agentes da Polícia, quem, em muitos casos, se negam a enviar os menores aos centros de detenção respectivos,[101] e aplicam severas medidas de correção que vão desde o maltrato até a tortura.  

136.        A Comissão urge o Estado dominicano que adote programas de vigilância estrita sobre a situação das crianças a fim de erradicar o trabalho infantil, e tome todas as medidas necessárias para garantir os direitos dos menores, especialmente aquelas vítimas da violência doméstica, ou da violência associada com a prostituição e o tráfico ilegal de menores.  Igualmente, a Comissão insta o Estado efetuar um controle maior dos centros de detenção para menores, a fim de evitar que estes sejam vítimas de tratos cruéis e desumanos que atentam contra sua integridade física.

 

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[62] Relatório da CIDH de 1999, pág. 82.

[63] O  Governo passa a dar alguns exemplos “para compreender o conceito de estrangeiro transeunte das categorias estabelecidas pela Lei de Migração referentes aos não imigrantes, isto é, os visitantes em viagens de negócios, estudos, férias ou curiosidade, jornalistas temporários e suas famílias, os que estejam de viagem ao estrangeiro, os que estejam servindo em algum  emprego de navios, etc.; e o disposto no Código Civil para considerar transeunte ao estrangeiro que não tem imóveis na República Dominicana.  A própria distinção de ser imigrante, e portanto residir legalmente no  país, ou ser não imigrante”.  (Contribuição do doutor Luis Arias, Juiz da Junta Central Eleitoral). Resposta do Governo dominicano as recomendações da CIDH, de 14 de novembro de 2001, pág. 13.

[64] Apresentado por Entidades da Sociedade Civil da República Dominicana, pág. 6 e 7.

[65] Ibid., pág. 8.

[66] O estudo de FLACSO “A identidade das crianças de bateyes”, de julho de 2000 indicou que 30% das crianças, em uma pesquisa de 1.770 crianças em bateyes não tinham atas de nascimento.  O estudo “Vizinhos e Estranhos”, realizado num bairro  popular de Santo Domingo, com uma alta porcentagem de imigrantes, demonstrou que 43.3% dos filhos de imigrantes não tinham nenhuma documentação.  Ver supra, nota 65.

[67] Ibid., pág. 9.

[68] Bateyes é o nome dado as barracas onde vivem os trabalhadores de corte da cana de açúcar.

[69] Relatório da CIDH 1999, pág. 83.

[70] Resposta do Governo dominicano às recomendações da CIDH, de 14 de nov. 2001, pág. 14.

[71] Ibid, pág. 13.

[72] Resumo de notícias do Serviço Jesuíta a Refugiados, 22.01.01.

[73] Resposta do Governo dominicano sobre as recomendações da CIDH, de 14 de novembro de 2001, pág. 15.  O Presidente Hipólito Mejía assinalou o seguinte: “bem como apostamos no futuro, não podemos ficar de braços cruzados perante as situações mais críticas de pobreza que ofendem nossa consciência humanitária, se nos perguntamos qual é o caso que  melhor simboliza este tipo de situações, acredito que todos mencionaríamos as condições  de vida nos bateyes”.

[74] Relatório Apresentado por Entidades da Sociedade Civil da República Dominicana, pág. 12 e 13.

[75] Relatório da CIDH de 1999, pág. 83.

[76] Artigos de imprensa do jornal Hoy, de 17 de janeiro de 2002, remitidos pela Missão Permanente da República Dominicana.

[77] “Novas autoridades repatriam  800 haitianos”. Jornal El Siglo. Seção Nacionais. 28 de setembro de 2000.

[78] Agência EFE, 25.01.01. Calcula-se que a população da República Dominicana chega a  8.5 millones de habitantes. Fundo de População das Nações Unidas. Em http://www.unfpa.org/swp/2000/english/indicators/indicators2.html de 7.02.01.

[79] Relatório Apresentado por Entidades da Sociedade Civil da República Dominicana, pág. 16.

[80] Agência EFE, 17.01.01.

[81] Op.Cit., nota 80, pág. 17 e 18.

[82] Relatório sobre a Situação dos Direitos Humanos na República Dominicana 1999, pág.92.

[83] Resposta do Governo dominicano, de 14 de novembro de 2001, pág. 15.

[84] Ibid., pág. 16.

[85] Idem.

[86] Ibid., pág. 17.

[87] Relatório Apresentado por Entidades da Sociedade Civil da República Dominicana, pág. 23.

[88] Ibid, pág. 24 e 25.

[89] Listín Diario, 23 de novembro de 2001.     

[90]  Núcleo de Apoio a Mulher, relatório apresentado a CIDH no mês de dezembro de 2001,  pág. 12-14.

[91] Relatório da CIDH 1999, op. cit., pág. 101.

[92] Resposta do Governo dominicano, de 14 de novembro de 2001, pág. 18.

[93] Ibid., pág. 18 e 19.

[94] Resposta do Governo dominicano, de 14 de novembro de 2001, pág. 20.

[95] Ibid., pág. 20.

[96] Ibid., pág. 21.

[97] Relatório Apresentado por Entidades da Sociedade Civil da República Dominicana, págs. 30 e 31.

[98] Ibid., págs. 31-33.

[99] Ibid., pág. 34.

[100] Organização Mundial contra a Tortura, Caso Dom 140102.CC.

[101] Ibid., pág. 34.