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CAPÍTULO
IV DESENVOLVIMENTO
DOS DIREITOS HUMANOS NA REGIÃO
INTRODUÇÃO
1.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos continua com a sua
prática de incluir em seu Relatório Anual à Assembléia Geral da
Organização dos Estados Americanos u capítulo sobre a situação dos
direitos humanos nos países membros da Organização, com fundamento na
competência outorgada pela Carta da OEA, a Convenção Americana sobre
Direitos Humanos, o Estatuto e o Regulamento da Comissão. Esta prática
tem por objetivo proporcionar a OEA informação atualizada sobre a situação
dos direitos humanos nos países
que tinham sido objeto de especial atenção da Comissão; e em alguns
casos, informar sobre algum acontecimento que tivesse surgido ou estivesse
desenvolvimento na etapa de finalização do relatório. 2.
No presente
capítulo, a Comissão reitera seu interesse em receber a cooperação de
todos os Estados membros, para identificar as medidas tomadas por seus
governos que demonstrem um compromisso com o melhoramento e a observância
dos direitos humanos. Por outro lado, a CIDH reflete em distintos capítulos
do presente relatório os avances positivos conquistados por vários
Estados do hemisfério em matéria de direitos humanos. CRITÉRIOS
3.
No Relatório Anual da CIDH de 1997 foram expostos cinco critérios
pré-estabelecidos pela Comissão para identificar os Estados membros da
OEA cujas práticas em matéria de direitos humanos mereciam atenção
especial, e em consequência deveriam ser incluídos no capítulo IV do
mesmo. 1.
O primeiro critério corresponde aqueles casos de Estados regidos
por governos que não chegaram ao poder mediante eleições populares,
através do voto secreto, genuíno, periódico e livre, segundo as normas
e princípios internacionalmente aceitos. A Comissão insiste no caráter
essencial da democracia representativa e de seus mecanismos como meio para
alcançar o império da lei e o respeito aos direitos humanos. Quanto aos
Estados que não observam os direitos políticos consagrados na Declaração
Americana e a Convenção Americana, a Comissão cumpre com seu dever de
informar aos demais Estados membros da OEA da situação dos direitos
humanos de seus habitantes. 2.
O segundo critério está relacionado com os Estados onde o livre
exercício dos direitos consignados na Convenção Americana ou a Declaração
Americana teve seu efeito suspendido, em sua totalidade ou em parte, em
virtude da imposição de medidas excepcionais, tais como o estado de
emergência, o estado de sítio, suspensão de garantias, ou medidas
excepcionais de segurança, entre outras. 3. O
terceiro critério, que poderia justificar a inclusão de um Estado em
particular neste capítulo, tem aplicação quando existem provas inequívocas
de que um Estado comete violações massivas e graves de direitos humanos
garantidos na Convenção Americana, a Declaração Americana ou os demais
instrumentos de direitos humanos aplicáveis. Neste sentido, a Comissão
destaca os direitos fundamentais que não podem ser suspensos, motivo pelo
qual considera com especial
preocupação as violações tais como execuções extrajudiciais, a
tortura e o desaparecimento forçado. Portanto, quando a CIDH recebe
comunicações dignas de crédito que denunciam estes tipos de violações
por um Estado em particular, violações das que dão depoimento ou
corroboram com os relatórios ou conclusões de outros organismos inter-governamentais
e/ou organizações nacionais e internacionais de séria reputação
em matéria de direitos humanos, considera que tem o dever de levar tais
situações ao conhecimento da OEA e de seus Estados membros. 4.
O quarto critério refere-se aos Estados que se encontram em um processo de transição de qualquer das três situações
acima mencionadas. 5.
O quinto critério refere-se a situações conjunturais ou
estruturais, que estão presentes em Estados que por diversas razões
enfrentam situações que afetem séria e gravemente o gozo dos direitos
fundamentais, consagrados na Convenção Americana ou na Declaração
Americana. Este critério inclui, por exemplo: situações graves de violência
que dificultam o funcionamento adequado do Estado de Direito; graves
crises institucionais; processos de reforma institucional com graves incidências
negativas para os direitos humanos; ou omissões graves na adoção de
disposições necessárias para fazer efetivos os direitos fundamentais. ***** 4.
De conformidade com o segundo
critério acima mencionado, a Comissão, com fundamento na informação
recebida de distintas fontes, analisará as medidas excepcionais adotadas
em países como os Estados Unidos, Guatemala e Argentina. 5.
A Comissão Interamericana de Direitos Humanos foi informada que,
em 11 de setembro de 2001, os Estados Unidos foi objeto de um ataque
terrorista no qual dois aviões de passageiros foram seqüestrados e
dirigidos em direção aos World
Trade Center de Nova York, onde explodiram ocasionando a morte de
cerca de 3,000 pessoas. Simultaneamente, um terceiro avião chocou-se
contra o Pentágono, em Arlington, Virginia, e um quarto avião caiu próximo
a Pittsburgh, Pennsylvania, causando mais de 200 baixas. 6.
Como consequência destes trágicos acontecimentos, em 14 de
setembro de 2001 o Presidente dos Estados Unidos, invocando a Constituição
e outras leis norte-americanas, declarou estado de emergência que vem
vigorando desde de 11 de setembro de 2001. O Presidente declarou
igualmente sua intenção de exercer as faculdades que foram conferidas
pela Lei de Emergências Nacionais para recorrer as forças armadas e a
guarda costeira em situações de emergência. Em 18 de setembro do mesmo
ano, o Congresso aprovou uma resolução adjunta a Resolução sobre
Poderes de Guerra, a qual autoriza ao Presidente a “utilizar todos os
meios de força necessários e apropriados contra aquelas nações,
organizações, ou pessoas que ele considera terem planejado, autorizado,
cometido ou assistido os ataques ocorridos em 11 de setembro de 2001, o
que tenham acolhido esta organizações ou pessoas, com o objetivo de
prevenir qualquer futuro ato de terrorismo internacional contra os Estados
Unidos por estas nações, organizações ou pessoas”. 7.
Posteriormente,
os Estados Unidos identificaram o grupo terrorista internacional conhecido
como Al Qaeda e seu líder, Osama bin Laden, como principais suspeitos do
ataque de 11 de setembro. Outrossim, os Estados Unidos concluíram que o
regime do governo do Afeganistão, conhecido como Talibã, propiciou condições
seguras para que Osama bin Laden operasse e estabelecesse campos de
treinamento terrorista no Afeganistão. Em consequência, em 7 de outubro de
2001, os Estados Unidos, com o apoio de vários Estados ao redor do mundo,
começaram a proceder a ataques militares contra os campos de treinamento
terrorista de Al Qaeda e as instalações militares do régime Talibã no
Afeganistão. Estas operações prolongaram-se
até 2002. Muitos dos indivíduos capturados no conflito foram detidos e posteriormente transferidos a baía de Guantánamo em Cuba. 8.
Adicionalmente, como consequência dos ataques de 11 de setembro de
2001, em 26 de outubro de 2001 o Presidente emitiu um “Decreto de
Unificação e Fortalecimento Mediante a Implementação dos Meios
Apropriados Requeridos para Interceptar e Obstruir o Terrorismo”, melhor
conhecida como “US Patriot Act”
de 2001. Esta lei reformou e ampliou as leis existentes quanto a supervisão
de comunicações telefônicas, orais e eletrônicas, lavagem de dinheiro,
patrulhas fronteiriças, imigração,
e procedimentos de investigação, julgamento e condenação criminal
relativos a indivíduos ou organizações suspeitas de terrorismo. 9.
Seguidamente, o Presidente emitiu, em 13 de novembro de 2001, uma
“Ordem Militar de Detenção, Tratamento e Julgamento de Certos Não-Cidadãos
na Guerra Contra o Terrorismo”. Esta ordem, que foi amplamente discutida
nos Estados Unidos e no estrangeiro, autorizava a detenção e julgamento
de não-cidadãos norte-americanos por parte de uma Comissão Militar, nos
casos em que o Presidente considere que estes sejam, ou tenham sido membros
da organização Al Qaeda ou tenham cometido, ajudando, consentindo ou
conspirando no cometimento de atos de terrorismo internacional que tenham
causado ou tido como objetivo causar ou ameaçar causar lesões ou efeitos
adversos aos Estados Unidos ou seus cidadãos, ou hajam acolhido
conscientemente referidos indivíduos. De acordo com estes termos, aqueles
indivíduos julgados sob a jurisdição desta Ordem poderiam ser
condenados e sentenciados mediante aquiescência de dois terços dos
membros da Comissão presentes ao momento da votação, e estariam
sujeitos a imposição de sanções penais, incluindo a cadeia perpétua e
sentença de morte, sem direito a recurso perante as cortes
norte-americanas, estrangeiras ou qualquer tribunal
internacional. Até momento de elaboração deste relatório, as regras
para a implementação da mencionada Ordem não haviam sido promulgadas, e
nenhuma pessoa havia sido julgada de acordo com estas disposições. 10.
Informação disponível também indica que centenas de pessoas
foram detidas por períodos
prolongados pelo Governo dos Estados Unidos como parte da investigação
dos fatos de 11 de setembro de 2001, e que o Governo recusou-se
publicamente a identificar a estas pessoas.
11.
A Comissão
observa que os Estados Unidos são um Estado parte do Pacto Internacional
de Direitos Civis e Políticos e, de acordo com o Alto Comissariado para
Direitos Humanos das Nações Unidas, os Estados Unidos não notificaram o
Secretário Geral das Nações Unidas sobre as medidas de emergência que
possam justificar a derrogação das obrigações dos Estados Unidos
conforme o disposto no artigo 4 do Pacto.
Os Estados Unidos não ratificaram a Convenção Americana sobre
Direitos Humanos, portanto, não
estão obrigados, de acordo com o artigo 27 da Convenção, a notificar
aos Estados Partes, por via do Secretário Geral da Organização dos
Estados Americanos, das disposições cuja aplicação haja suspendido,
dos motivos que tenham suscitado a suspensão das garantias
constitucionais e da data em que tenha dado por terminada tal suspensão.
Entretanto, como Estado
membro da OEA, os Estados Unidos devem respeitar os direitos fundamentais
dos indivíduos consagrados na Carta da OEA e na Declaração Americana
dos Direitos e Deveres do Homem. Portanto, a Comissão, de conformidade
com os artigos 18 e 20 de seu Regulamento, continuará supervisionando a
situação de direitos humanos nos Estados Unidos com relação a
observância e proteção dos direitos humanos contidos na Carta da
OEA e da Declaração Americana. 12.
Em 18 de julho de 2001, perante a fuga massiva de presos
considerados de alta periculosidade, o presidente da República de
Guatemala emitiu o Decreto Governamental 1-2001, publicado no Diário Oficial de 20 de junho do mesmo mês
e ano, por meio do qual declarou Estado de Alarme durante 30 dias em todo
o território guatemalteco e ordenou o fim da vigência dos direitos
fundamentais consagrados nos artigos 5 (direito a liberdade de ação), 6
(direito a detenção legal), 9 (direito ao interrogatório aos detidos ou
presos) e 26 (direito a liberdade de locomoção) da Constituição Política
guatemalteca. Este Estado de Alerta foi prorrogado por 30 dias, mediante o
Decreto Governamental 2-2001 emitido pelo Presidente da República de
Guatemala em 17 de julho de 2001. 13.
Em 2 de agosto de 2001, o Presidente da República de Guatemala
emitiu o Decreto Governamental 3-2001, por meio do qual declarou Estado de
Sítio durante trinta dias no Departamento de Totonicapán. Como consequência
deste decreto, e durante o tempo de seu vigor, foram suspendidos os
direitos consagrados nos artigos 5, 6, 9, 33, 38(2) e 116(2) da Constituição
Política guatemalteca. O decreto de Estado de Sitio obedeceu as manifestações
públicas levadas a cabo no Departamento de Totonicapán, em protesto pelo
aumento do Imposto ao Valor Agregado (IVA), que degeneraram em fatos
atentatórios da segurança desse departamento. 14.
O Estado de Guatemala, em cumprimento do disposto no artigo 27 da
Convenção Americana sobre Direitos Humanos, informou ao Secretário
Geral da OEA tanto do decreto e da posterior prorrogação do Estado de
Alarme emitida através dos decretos Governamentais número 1-2001 e
2-2001, como o decreto de Estado de Sítio no Departamento
de Totonicapán, emitida mediante o Decreto Governamental número 3-2001. 15.
Em 19 de dezembro de 2001 a República de Argentina, mediante
decreto 1678/2001, declarou Estado de Sítio no território argentino por
trinta dias. Nessa ocasião, o Estado
argentino expressou que os graves atos de violência coletiva que
aconteceram no país provocaram danos e puseram em perigo a vida e bens da
população da Argentina, com uma magnitude que implica um estado de comoção
interna. Conforme o artigo 23 da Constituição Nacional “em caso de
comoção interior ou de ataque exterior que ponha em perigo o exercício
desta Constituição e das autoridades criadas por ela, declarar-se-á
estado de sítio na província ou território onde exista a perturbação
da ordem ficando suspensas as garantias constitucionais. Mas durante esta suspensão o Presidente da
República não poderá condenar nem apenar. Seu poder será limitado na
detenção das pessoas, o na transferência delas de um ponto a outro do
país, se elas não preferirem sair fora do território argentino”. 16.
No dia 21 de dezembro de 2001, por decreto 1678/2001, o Governo da
República Argentina decidiu levantar o Estado de Sitio, e na mesma data,
por meio dos decretos números 16/2001, 18/2001 e 20/2001, a petição das
autoridades das províncias de Buenos Aires, Entre Ríos e San Juan, o
Estado declarou Estado de Sítio nessas províncias por um prazo de 10
dias. O Estado assinalou que a declaração de Estado de Sitio deveu-se a
que atos de violência coletiva continuavam a ocorrer, como tumultos e
saques promovidos por grupos de pessoas de forma organizada nos diferentes
comércios, provocando danos e pondo em perigo as pessoas e bens, com uma magnitude
que implicou um estado de comoção interior. Esta situação de emergência
foi suspensa em 31 de dezembro de 2001.
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