RELATÓRIO Nº 79/01

CASO 12.101

MARCO ANTONIO MOLINA THEISSEN

GUATEMALA

10 de outubro de 2001[1]

 

 

I.                   RESUMO

 

1.          Em 8 de setembro de 1998 o Centro pela Justiça e o Direito Internacional (CEJIL) e o Grupo de Apoio Mútuo (GAM) (doravante denominado “os peticionários”) apresentaram uma petição perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (doravante denominada “a Comissão”, “a Comissão Interamericana” ou “CIDH”) na qual  denunciam o desaparecimento forçado de Marco Antonio Molina Theissen (doravante denominado “a suposta vítima”), uma criança de 14 anos de idade que havia sido sequestrada da casa de seus pais por membros do exército da República de Guatemala (doravante denominada “o Estado” ou “o Estado guatemalense”) em 6 de outubro de 1981.

 

2.          Os peticionários alegam a violação dos seguintes direitos consagrados na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (doravante denominada  “a Convenção” ou “a Convenção Americana”): a vida (artigo 4), a integridade pessoal (artigo 5), a liberdade pessoal (artigo 7), direitos da criança (artigo 19), as garantias judiciais (artigo 8) e a proteção judicial (artigo 25), em conjunção com o dever do Estado de respeitar e garantir tais direitos, consagrado no artigo 1(1). Alegam também a violação do direito ao reconhecimento da personalidade jurídica do tutelado previsto, de igual forma, pela Convenção Americana (artigo 3). Para efeitos de admissibilidade do presente assunto, os peticionários apontam que interpuseram cinco recursos de habeas corpus e dois procedimentos especiais de averiguação.

 

3.          O Estado aportou informação sobre o último procedimento de averiguação interposto, sem questionar expressamente o cumprimento do requisito de esgotamento dos  recursos internos.

 

4.          Após analisar os argumentos das partes e o cumprimento dos requisitos de admissibilidade previstos na Convenção, a Comissão decidiu declarar admissível a petição.


II.                   TRÂMITE PERANTE A COMISSÃO

 

5.          A denúncia foi apresentada perante a CIDH em 8 de setembro de 1998 e seus anexos em 14 de setembro do mesmo ano. As partes pertinentes de referidas comunicações foram transmitidas ao Estado em 2 de fevereiro de 1999.

 

6.          Em 26 de abril de 1999 o Estado remitiu informação preliminar e solicitou uma prorrogação de 60 dias para responder de forma mais completa. Em 6 de maio de 1999 a Comissão trasladou os peticionários o relatório do Estado e lhes outorgou 30 dias de prazo para formular suas observações.

 

7.          Em 17 de junho de 1999 os peticionários apresentaram suas observações a resposta do Estado, dentro do término de uma prorrogação concedida pela Comissão. Em 2 de julho o Estado remitiu informação. Em 16 de julho foram transmitidas as observações dos peticionários ao Estado. Em 19 de agosto o Estado enviou informação. Em 23 de agosto os peticionários enviaram observações finais. 

 

8.          Em 7 de setembro de 1999 as observações dos peticionários a resposta do  Estado de 19 de agosto foram remitidas a este último. Em 15 de outubro o Estado apresentou um novo escrito com informação, que a Comissão remitiu aos peticionários em 28 de outubro de 1999.

 

9.          Em 28 de julho de 2000 a CIDH se pôs à disposição das partes com a finalidade de chegar a uma solução amistosa. Em 2 de março de 2001 convocou uma reunião de trabalho na sede da Comissão, na qual participaram ambas as partes para discutir os términos de um eventual acordo da solução amistosa.

 

          10.          Em 13 de outubro de 2000, no marco do 108º período de sessões da Comissão, os peticionários firmaram um documento por meio do qual estabeleceram as bases do acordo da solução amistosa que se comprometeram a elaborar.

 

11.          Em 30 de abril de 2001, os peticionários comunicaram a  CIDH sua intenção de retirar-se do procedimento da solução amistosa iniciado com o Estado de Guatemala.

 

III.          POSIÇÃO DAS PARTES

 

A.          Posição dos Peticionários

 

12.          Os peticionários alegam que no dia 6 de outubro de 1981, cerca das 13:30 hs, três homens com pistolas automáticas entraram na casa da família Molina Theissen. Os  homens puseram algemas a Marco Antonio Molina Theissen, de 14 anos de idade quando sucederam os fatos, ataram seu braço a uma poltrona e o amordaçaram com uma fita adesiva. Permaneceram na casa por volta de 40 minutos e depois levaram a criança, algemada e amordaçada, num caminhonete tipo pick-up. Seus familiares anotaram o número de placa da caminhonete a qual, de acordo com as investigações realizadas pelos pais da suposta vítima junto a Direção Geral de Rendimentos Internos e a Direção Geral da Polícia Nacional, pertenceria a veículos do exército da Guatemala. Até a presente data, desconhece-se o paradeiro de Marco Antonio Molina Theissen.

 

13.          Os peticionários sugerem que o sequestro de Marco Antonio Molina Theissen havia sido efetuado como represália pela fuga de sua irmã Emma Guadalupe, uma ex-dirigente estudantil, que se encontrava sob custódia do exército . Dias antes dos ocorridos fatos denunciados, ela havia sido detida por nove dias, interrogada, torturada e violada, mas conseguiu escapar. No dia seguinte a sua fuga, seu irmão Marco Antonio foi sequestrado.

 

14.          Os peticionários alegam que os familiares da suposta vítima interpuseram vários recursos de exibição pessoal (habeas corpus), o primeiro deles havia sido interposto no dia 6 de outubro de 1981, e o segundo no dia 23 de junho de 1997[2] e o último em 12 de agosto de 1997.[3] Adicionalmente solicitaram dois procedimentos especiais de averiguação, mas nenhum deles teve resultado positivo; o primeiro, em 14 de janeiro[4] e, o segundo, em 5 de fevereiro de 1998. Os peticionários alegam que o fracasso destes recursos, bem como a falta de vontade do Estado para investigar o desaparecimento de Marco Antonio Molina Theissen, justificam a aplicação da exceção ao esgotamento dos recursos internos tendo em vista a  ineficácia dos mesmos.

 

15.          Com respeito aos direitos que os peticionários consideram violados, assinalam que dado que Marco Antonio Molina Theissen foi visto pela última vez em mãos de agentes do Estado, cabe presumir que foi privado de sua vida arbitrária e ilegalmente, infringindo o disposto no artigo 4 da Convenção. Alegam que o desaparecimento forçado constitui uma violação a integridade pessoal e que as circunstâncias em que o menor foi detido, algemado e  amordaçado, junto com a prática de tortura existente na Guatemala na mesma época, fazem  presumir que a suposta vítima também foi torturada. Agregam que o desaparecimento de Marco Antonio Molina Theissen vulnerou, de igual forma a integridade pessoal de seus pais e seus familiares, de acordo com o artigo 5 da Convenção. Ademais, assinalam que o desaparecimento, constitui uma privação arbitrária de liberdade, o que viola o artigo 7 da Convenção. O Estado, segundo os peticionários, violou também o artigo 19 da Convenção ao não outorgar as medidas especiais de proteção para crianças, tendo em conta que Marco Antonio Molina Theissen tinha 14 anos quando foi sequestrado. Assinalam também que o Estado violou os artigos 8 e 25 da Convenção perante a denegação de recursos efetivos a Marco Antonio Molina Theissen e a seus familiares, quem interpuseram recursos de exibição pessoal que não derivam de uma investigação devidamente conduzida. Alegam, por último, a violação do direito a verdade em quanto princípio emergente do direito internacional. Posteriormente, os peticionários argumentam a violação do artigo 3 da Convenção Americana que consagra o direito ao reconhecimento da personalidade jurídica, também com relação ao desaparecimento forçado Marco Antonio Molina Theissen. [5]

 

B.                   Posição do Estado

 

16.          O Estado de Guatemala proporcionou informação a Comissão somente acerca do Procedimento Especial de Averiguação 2-98, interposto perante a Câmara Penal da Corte Suprema de Guatemala em 5 de fevereiro de 1998.

 

17.          O Estado assinalou que no mencionado procedimento especial de averiguação, em 5 de abril de 1999, María de la Cruz Ortíz, Agente Fiscal do Ministério Público, informou a  Corte Suprema sobre os autos e que concluiu que não era possível estabelecer o paradeiro do menor.[6] Uma resolução emitida pela Câmara Penal da Corte Suprema fixou uma audiência para o dia 26 de abril de 1999.[7] Nesta audiência, indicou o Estado, “foi resolvido o  Procedimento Especial de Averiguação e encarregado o Procurador de Direitos Humanos para que iniciasse as averiguações. O controle jurisdicional do Procedimento Especial de Averiguação número 2-98 a cargo do Quinto Juízo de Primeira Instância Penal, Narcotráfico e  Delitos Contra o Ambiente”. Durante a audiência, o representante do Grupo de Apoio Mútuo -GAM-, solicitou uma nova audiência para incorporar elementos probatórios, a qual foi fixada  para 7 de maio de 1999. Nesta audiência, a Corte Suprema de Justiça solicitou ao Promotor que apresentara seu relatório no dia 25 de junho de 1999. Nesta data, o Procurador de Direitos Humanos pediu que lhe outorgasse um prazo de 3 meses.[8]

 

18.          Em 12 de outubro de 1999, o Estado informou que em 25 de setembro de 1999 o Procurador apresentou a documentação respectiva, a qual estava sendo analisada pelo juiz, e assinalou que os resultados da diligência seriam transmitidos a Comissão após serem finalizados pelo juízo correspondente; entretanto, o Estado não enviou mencionados documentos até a presente data.

 

19.          Nas  comunicações remitidas pelo Estado, este se absteve de proporcionar informação a CIDH sobre o estado do trâmite do primeiro Procedimento Especial de Averiguação apresentado perante a Corte Suprema de Justiça em 14 de janeiro de 1998, bem  como sobre o trâmite e resultado dos cinco recursos de exibição pessoal formulados em  favor de Marco Antonio Molina Theissen. Com respeito a estes últimos, o Estado não nega que os mesmos foram interpostos em favor da suposta vítima, nem discute a exceção de esgotamento dos recursos internos.

 

IV.                   ANÁLISE SOBRE ADMISSIBILIDADE

 

A.          Competência da Comissão

 

20.          O peticionário encontra-se facultado pelo artigo 44 da Convenção Americana para apresentar denúncias perante a CIDH.  A petição assinala como suposta vítima um indivíduo, a quem a Guatemala comprometeu-se a respeitar e garantir os direitos consagrados na Convenção Americana.  No que concerne ao Estado, a Comissão assinala que a Guatemala é um Estado parte na Convenção Americana desde 25 de maio de 1978, data em que depositou o instrumento de ratificação respectivo.  Portanto, a Comissão tem competência ratione personae para examinar a petição.

21.          A Comissão tem competência ratione loci para conhecer a petição, devido a que nela se alegam violações de direitos protegidos na Convenção Americana, que tiveram lugar dentro do território de um Estado parte no mencionado tratado.

 

22.          A CIDH tem competência ratione temporis porque a obrigação de respeitar e garantir os direitos protegidos na Convenção Americana já se encontrava em vigor para o Estado na data em que ocorreram os fatos alegados na petição.

 

          23.          Por último, a Comissão é competente ratione materiae, já que a petição denúncia violações de direitos humanos protegidos pela Convenção Americana.

 

B.          Requisitos de admissibilidade do caso

 

1.          Esgotamento dos Recursos Internos

 

24.          O artigo 46(1)(a) da Convenção Americana estabelece que para que uma petição possa ser admitida, é preciso que “se tenham interpostos e esgotados os recursos de jurisdição interna, conforme os princípios do Direito Internacional geralmente reconhecidos”. Estes princípios não se referem a existência formal de tais recursos, mas  também que estes recursos sejam adequados e efetivos. Ser adequado significa que a função destes recursos, dentro do sistema de direito interno, é idônea para proteger a situação jurídica infringida. Um recurso eficaz é aquele  que permite produzir o resultado para o qual havia sido estabelecido.[9]

 

25.          Os familiares da suposta vítima alegam que interpuseram, no total, cinco recursos de exibição pessoal, mas na petição somente trouxeram informação de três deles e documentaram apenas dois.  O primeiro foi apresentado na mesma tarde que ocorreu a detenção, o segundo em 23 de junho de 1997 e o terceiro em 12 de agosto desse mesmo ano. O último foi desprovido e a CIDH desconhece resultado dos outros dois. Os peticionários também iniciaram um Procedimento Especial de Averiguação[10] perante a Corte Suprema de Justiça em 14 de janeiro de 1998 e outro perante a Câmara Penal da Corte Suprema de Justiça em 5 de fevereiro de 1998. Este último foi acolhido pela Câmara Penal da Corte Suprema em 7 de maio de 1999.[11]  Nele, o Procurador de Direitos Humanos encarregou-se que fossem iniciadas as averiguações e autorizou o controle jurisdicional sobre o processo ao Quinto Juízo de Primeira Instância Penal, Narcotráfico e Delitos contra o Ambiente. Por outro lado, ainda que houvesse indícios de desaparecimento, o Estado não ordenou a realização de uma pesquisa para determinar o paradeiro de Marco Antonio Molina Theissen, de conformidade com o artigo 109 da Lei de Amparo, Exibição Pessoal e Constitucionalidade.[12]

 

26.          Com relação a este aspecto da admissibilidade, a Comissão observa que o Estado não alegou em nenhum momento do trâmite do presente caso a exceção relativa ao não esgotamento dos recursos internos e referente ao habeas corpus e procedimentos especiais de averiguação. O Estado de Guatemala somente limitou-se a informar, de maneira inconclusa, sobre as diligências efetuadas e aquelas a serem efetuadas no marco do Procedimento Especial de Averiguação 2-98.

 

27.          Cabe a CIDH determinar se o Estado renunciou tacitamente a mencionada exceção. A Corte Interamericana assinalou no caso da Comunidade Mayagna (Sumo) Awas Tingni que “para opor-se validamente a admissibilidade da denúncia… o Estado deveria ter  invocado de maneira expressa e oportuna a regra de não esgotamento dos recursos internos”.[13] De igual forma, a Corte assinalou que “[a] exceção de não esgotamento dos  recursos internos, para ser oportuna, deve ser formulada nas primeiras etapas do procedimento, a falta do qual presumir-se-á a renúncia tácita por parte do Estado interessado”[14]. Consequentemente, a CIDH estabelece que, no presente caso, o Estado guatemalense não interpôs a exceção de não esgotamento dos recursos internos, havendo  renunciado tacitamente a mesma ao não invocá-la expressa e oportunamente em nenhuma das comunicações dirigidas à Comissão.

 

2.          Prazo de Apresentação da Petição

 

28.          Conforme o artigo 46(1)(b) da Convenção Americana, a regra geral é que uma petição deve ser apresentada no prazo de seis meses “a partir da data em que a suposta vítima haja sido notificada da decisão definitiva”. Conforme o artigo 32(2) do Regulamento da Comissão, este prazo não pode ser aplicado quando há exceções a regra do prévio esgotamento dos recursos. A este respeito, o Regulamento prevê que a petição deve ser apresentada dentro de um prazo razoável tomando em conta a data da suposta violação e as circunstâncias especiais do caso.

 

29.          A Comissão observa que nem os familiares de Marco Antonio Molina Theissen nem os peticionários foram notificados da decisão definitiva, ou dos recursos interpostos na  jurisdição interna, posto que nenhum dos casos foi objeto da mesma.

 

30.          Com relação a data em que ocorreram as supostas violações aos direitos de Marco Antonio Molina Theissen, os peticionários assinalam que o desaparecimento forçado aconteceu no dia 6 de outubro de 1981. O Estado, por sua vez, não questionou referida data perante a CIDH. De acordo com o artigo III da Convenção Interamericana sobre Desaparecimento Forçado de Pessoas,[15] instrumento que codifica a jurisprudência e prática do sistema interamericano de direitos humanos nesta matéria, o desaparecimento forçado é um  delito que “será considerado como continuado e permanente enquanto não se estabeleça o destino ou paradeiro da vítima”.[16] “Ademais, na legislação interna de Guatemala, o artigo 201 do Código Penal - reformado pelo Decreto Nº 33-96 do Congresso da República aprovado em  22 de maio de 1996 – dispõe que o delito de desaparecimento forçado é considerado  continuado enquanto vítima não é encontrada’”.[17]

 

31.          Desta forma, considera-se o dia 6 de outubro de 1981, para efeito de determinação da data em que “haja ocorrido a suposta violação”, como o momento em que se iniciou o cometimento da suposta violação e todo o período posterior a esta data, pois os efeitos da violação “podem prolongar-se de maneira continua ou permanente até o momento em que se estabeleça o paradeiro da vítima”.[18]

 

32.          A Comissão observa que desde a data do desaparecimento de Marco Antonio Molina, seus familiares dirigiram-se em diferentes momentos à administração da justiça guatemalense a fim de estabelecer seu paradeiro. Com efeito, não somente apresentaram um  recurso de habeas corpus no mesmo dia em que se deu início a uma violação de caráter continuado, mas também reiteraram duas vezes em 1997 seu requerimento de exibição pessoal. Adicionalmente, em 1998 os familiares da suposta vítima solicitaram dois procedimentos especiais de averiguação, sendo que o último de referidos recursos foi acolhido pela Câmara Penal da Corte Suprema em 7 de maio de 1999.  Nota-se que os familiares da suposta vítima dirigiram-se, em primeiro lugar, as instâncias internas em busca de justiça e, posteriormente, perante a falta de resposta adequada, ao sistema interamericano de proteção de direitos humanos.

 

33.          Consequentemente, considerando a data que deu início ao cometimento dos fatos e as circunstâncias especiais que caracterizam a presente petição, em especial o caráter continuado das violações denunciadas e a falta de resultado dos distintos recursos interpostos  na jurisdição interna, a Comissão considera que a denúncia foi apresentada em um prazo razoável.

 

3.          Duplicação de procedimento

 

34.          Comissão entende que a matéria da petição não se encontra pendente de outro procedimento de acordo internacional, nem reproduz uma petição já examinada por este ou outro organismo internacional.  Portanto, os requisitos estabelecidos nos artigos 46(1)(c) e 47(d) encontram-se satisfeitos.

 

4.          Caracterização dos fatos alegados

 

35.          O artigo 47(b) da Convenção dispõe que uma petição deverá declarar-se inadmissível quando “não exponha fatos que caracterizem uma violação dos direitos garantidos por esta Convenção”. Os peticionários alegam que o desaparecimento forçado de Marco Antonio Molina Theissen por agentes do Estado de Guatemala configura uma violação do direito ao reconhecimento da personalidade jurídica (artigo 3), a vida (artigo 4), a integridade pessoal (artigo 5), a liberdade pessoal (artigo 7), aos direitos da criança (artigo 19), as garantias judiciais (artigo 8), a proteção judicial (artigo 25) e ao direito a verdade; tudo em conjunção com o dever do Estado de respeitar e garantir mencionados direitos, consagrados no  artigo 1(1) da Convenção. A Comissão estima que os fatos expostos pelos peticionários, se provados verdadeiros, poderiam configurar violações dos direitos consagrados na Convenção Americana. A Comissão considera que os fatos denunciados tendem a caracterizar uma violação aos compromissos assumidos pelo Estado guatemalense no artigo 1 da Convenção Interamericana sobre Desaparecimento Forçado de Pessoas mediante a ratificação de referido  instrumento. Portanto, a CIDH considera que este requisito foi cumprido.

 

V.          CONCLUSÕES

 

36.          A Comissão conclui que é competente para examinar a denúncia e que esta é admissível, conforme os requisitos estabelecidos nos artigos 46 e 47 da Convenção Americana.

 

37.          Com base nos argumentos de fato e de direito antes expostos e sem prejudicar o fundo da questão,
 
A COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS,
 
DECIDE:

 

1.           Declarar admissível o presente caso quanto às supostas violações de direitos protegidos nos artigos 3, 4, 5, 7, 8, 19, 25 e 1(1) da Convenção Americana e do artigo 1 da Convenção Interamericana sobre Desaparecimento Forçado de Pessoas. 

 

2.           Notificar as partes desta decisão.

 

3.           Continuar com a análise de fundo da questão.

 

4.           Publicar esta decisão e incluí-la em seu Relatório Anual à Assembléia Geral da OEA.

 

Dado e firmado na sede da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, na cidade de Washington, D.C., aos 10 dias do mês de outubro 2001.  (Assinado): Claudio Grossman, Presidente; Juan E. Méndez, Primeiro Vice-presidente;  Robert K. Goldman, Peter Laurie, Julio Prado Vallejo, Hélio Bicudo, Membros da Comissão.


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[1] A Membra da Comissão Marta Altolaguirre, nacional da Guatemala não participou da discussão e votação do presente relatório,  em conformidade com o artigo 17(2)(a) do no  Regulamento da Comissão, que entrou em vigor em 1º de maio de 2001.

[2] Acompanhado como anexo a petição, em 14 de setembro de 1998. Consta como recebido na Secretaria da Corte Suprema em 9 de junho de 1997.

[3] Acompanhado como anexo a petição, em 14 de setembro de 1998. Consta como recebido na Secretaria da Corte Suprema em 11 de agosto de 1997.       

[4] Acompanhado como anexo a petição, em 14 de setembro de 1998. Consta como recebido na Secretaria da Corte Suprema em 20 de janeiro de 1998.

[5] Comunicação de 17 de junho de 1999, pág. 3.

[6] Relatório do Governo da República de Guatemala de 1º de julho de 1999, pág. 2.

[7] Nota de 26 de abril de 1999.

[8] Relatório do Governo da República de Guatemala datado de  1º de julho de 1999, págs. 2 e 3, e Relatório de 16 de agosto de 1999 em que o  Estado assinala que : “ terá capacidade de ampliar informação sobre o presente caso até que o Procurador de  Direitos Humanos apresente seu relatório relacionado com o procedimento especial de averiguação ”.

[9] Corte IDH, Caso Velásquez Rodríguez, Sentença de 29 de julho de 1988. Série C Nº 4, pars. 63-64; Caso Godínez Cruz, Sentença de 20 de janeiro de 1989. Série C No. 5, pars. 66-67; Caso Fairén Garbi e Solís Corrales, Sentença de 15 de março de 1989. Série C No. 6, pars. 87-88.

[10]  O artigo 476 do Código Processual Penal estabelece que se o  recurso de exibição pessoal tivesse sido interposto sem encontrar a pessoa a cujo favor se solicitou e existissem motivos de suspeita suficientes para afirmar que ela havia sido detida ou mantida ilegalmente em detenção por um funcionário público, por membros das forças de segurança do Estado, ou por agentes regulares o irregulares sem se saber o seu paradeiro, a Corte Suprema de Justiça, mediante solicitação de qualquer pessoa, pode: 1) Intimar o Ministério Público para que no prazo máximo de cinco dias envie relatório ao tribunal sobre o progresso e resultado da investigação, sobre as medidas praticadas e requeridas, e sobre as que ainda estão pendentes de realização. A Corte Suprema de Justiça poderá abreviar o prazo quando seja necessário. 2) Encarregar a averiguação (procedimento preparatório) em ordem  excludente: a) Ao Procurador de Direitos Humanos. b) A uma entidade ou associação juridicamente estabelecida no país. c) Ao cônjuge ou parentes da vítima.

[11]  Resolução de 7 de maio de 1999 da Câmara Penal da Corte Suprema de Justiça, anexada a  nota dos peticionários de 17 de junho de 1999.

[12] Decreto Número 1-86 da Assembléia Nacional Constituinte, artigo 109. Investigação de casos de pessoas desaparecidas. No caso que as diligências resultarem em indícios de que a pessoa beneficiada pela interposição do recurso de exibição tivesse desaparecido, o tribunal ordenará imediatamente a investigação do caso.

As autoridades de polícia são obrigadas a informar ao tribunal, ao Procurador de Direitos Humanos e aos interessados, acerca das investigações realizadas, as quais devem ser feitas de maneira constante até que se tenha notícia certa do paradeiro da pessoa desaparecida; a sua vez o Tribunal de Exibição Pessoal remitirá relatório das diligências e de toda novidade que sobrevenha, a Corte Suprema de Justiça.

[13]  Corte IDH, Caso da Comunidade Mayagna (Sumo) Awas Tingni, Exceções Preliminares, Sentença de 1º de fevereiro de 2000, Série C No. 67 pars. 54 e 55.  A Corte assinala que  “Embora seja verdade que os escritos apresentados por Nicarágua perante a Comissão durante a tramitação do assunto assinalou, entre outros dados, o desenvolvimento dos processos seguidos perante os tribunais internos… resulta evidente que este não interpôs a exceção de não esgotamento dos recursos internos de maneira clara nas primeiras etapas do procedimento perante a Comissão. Não consta do expediente que mencionada exceção foi inovada de maneira expressa   até finais do ano 1997,…” (o sublinhado é nosso).

[14] Corte IDH, Caso Velásquez Rodríguez, Exceções Preliminares, Sentença de 26 de junho de 1987. Série C Nº 1, par. 88; Caso Godínez Cruz, Exceções Preliminares, Sentença de 26 de junho de 1987. Série C Nº 3, par. 90; Caso Fairén Garbi e Solís Corrales, Exceções Preliminares, Sentença de 26 de junho de 1987. Série C Nº 2, pars. 87; Caso Loayza Tamayo, Exceções Preliminares, Sentença de 31 de janeiro de 1996. Série C Nº 25, par. 40.

[15] Adotada em Belém do Pará, Brasil, em 9 de julho de 1994, no vigésimo período ordinário de sessões da Assembléia Geral da OEA. Vigente desde  28 de março de 1996. Guatemala a ratificou em  25 de fevereiro de 2000.

[16] Ibidem.

[17] Corte IDH, Caso Blake, Exceções  Preliminares, Sentença de 2 de julho de 1996. Série C Nº 27, par. 38.

[18] Ibidem, par. 39.