RELATÓRIO No 105/01*

CASO 11.443

WASHINGTON AYORA RODRÍGUEZ

EQUADOR

11 de outubro de 2001

 

 

I.          RESUMO

 

          1.          Em 8 de novembro de 1994, a Comissão Ecumênica de Direitos Humanos ("CEDHU”) (doravante denominada  “o peticionário”) apresentou uma petição perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (doravante denominada “a Comissão” ou a “CIDH”) contra a República do Equador (doravante denominado “o Estado”), na qual denunciava a violação dos seguintes direitos protegidos pela Convenção Americana sobre Direitos Humanos (doravante denominada “a Convenção” ou “a Convenção Americana”): direito à vida (artigo 4), direito à integridade pessoal (artigo 5), direito à liberdade pessoal  (artigo 7), garantias judiciais (artigo 8) e  direito à proteção judicial (artigo 25), em conjunção com as obrigações que figuram no artigo 1(1) em prejuízo do senhor Washington Ayora Rodríguez.

 

          2.          As partes chegaram a um Acordo de Solução Amistosa no presente caso em 15 de agosto de 2001.  O presente relatório consolida, em uma breve exposição, os fatos e os textos da solução amistosa alcançada, de conformidade com o artigo 49 da Convenção. 

 

          II.           FATOS

 

3.            Washington Ayora foi condenado em 1989, mediante sentença, pelo delito de furto.  O peticionário alega que, a partir desta data, Washington Ayora estava sendo assediado por polícias nacionais, quem em várias ocasiões o detiveram com o pretexto de “investigá-lo”, situação que fez com que vivesse em constante estado de insegurança e medo. Em 14 de fevereiro de 1994, as 16:30 horas, Washington Ayora encontrava-se na Ciudadela do Maestro na cidade de Loja, quando foi detido por elementos da polícia, quem manifestaram que tinham um mandado de captura [o qual nunca lhe mostraram] e o conduziram à delegacia da  polícia, onde permaneceu incomunicável até o dia 18 de fevereiro, data em que foi transferido ao Centro de Reabilitação Social de Loja para ser investigado. No porão do Quartel de Polícia o Sr. Ayora foi torturado, conforme demonstra a ata e o relatório de reconhecimento médico feito no detido.[1]   Em 21 de fevereiro de 1994, o Primeiro Delegado Nacional de Cantón Loja emitiu um mandado de liberação a favor de Washington Ayora, por considerar que não existiam méritos suficientes para mantê-lo detido.

 

4.          O  processo penal que tramitou no 4º Juízo Penal de Loja, referente à detenção e lesões produzidas durante a sua interrogação pelo agente do Escritório de Investigação Criminal (OID) não teve resultado nenhum, dado que o policial gozava de foro privilegiado policial de conformidade com o disposto no artigo 455 do Código Penal.  Por outro lado, o relatório da Direção Nacional de Investigações da Polícia Nacional indicou que os agentes que detiveram a Washington Ayora foram: Cabo 2º Medardo Vargas e Jesús Riofrìo, e os agentes responsáveis pela tortura foram, segundo a denúncia, Telmo Robles e José Rivera.

 

          III.          TRÂMITE PERANTE A COMISSÃO

 

          5.          Em 13 de março de 1995 a Comissão enviou as respectivas notas ao Estado e ao peticionário.  Em 3 de agosto de 1995, o Governo de Equador apresentou sua resposta à  denúncia. Seguiu-se o  trâmite regulamentar da petição. 

 

          6.          Em 9 de fevereiro de 1999,  a Comissão colocou-se à disposição das partes com o propósito de alcançar uma solução amistosa. O peticionário aceitou a possibilidade de chegar a um acordo de solução amistosa em 19 de outubro de 1999, o qual foi assinado em 15 de agosto de 2001, e contou com a presença da doutora Marta Altolaguirre, membro da CIDH e Relatora para Equador, quem havia viajado a Quito para facilitar o acordo.  As partes pediram a Comissão que ratificasse o  presente acordo de solução amistosa e supervisionasse o seu cumprimento.

 

          IV.          SOLUÇÃO AMISTOSA ALCANÇADA         

 

          7.          O Acordo de Solução Amistosa firmado pelas partes assinala:  

I.            ANTECEDENTES

 

O Estado Equatoriano, através da Procuradoria Geral do Estado, no seu afã de  promover e proteger os direitos humanos e, em vista da grande importância que reviste na atualidade para a imagem internacional de nosso país, o respeito irrestrito aos direitos humanos, como base de uma sociedade justa, digna, democrática e representativa, resolveu começar um novo processo dentro da evolução dos direitos humanos no Equador.

A Procuradoria Geral do Estado iniciou, com todas as pessoas que foram  vítimas de violações de direitos humanos, negociações tendentes a chegar a soluções amistosas que busquem a reparação dos danos causados.

O Estado Equatoriano, em estrito cumprimento de suas obrigações adquiridas com a assinatura da Convenção Americana sobre Direitos Humanos e de outros instrumentos de direito internacional de direitos humanos, e consciente de que toda violação a uma obrigação internacional que tenha produzido um dano comporta no dever de repará-lo adequadamente, constituindo a indenização pecuniária  e a sanção penal dos responsáveis às formas mais justas e eqüitativas de fazê-lo, de modo que a Procuradoria Geral do Estado conjuntamente com a senhora Merci Rosalía Vasquez Trujillo, viúva do senhor Washington Ayora Rodriguez e Eusebia Imelda Rodriguez Bosa, mãe do senhor Washington Ayora Rodriguez (falecido), resolveram chegar a uma solução amistosa de conformidade com o disposto nos artigos 48.1 lit (f), 49, da Convenção Americana sobre Direitos Humanos e 45 do Regulamento da Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

 

II. PARTICIPANTES

Comparecem à celebração do presente acordo amistoso:

 

a) Por uma parte, o Dr. Ramón Jiménez Carbo, Procurador-Geral do Estado, segundo a sua nomeação e ata de posse, que se anexa a  presente como documentos de habilitação;

b) Por outra parte comparece a senhora Eusebia Imelda Rodriguez Bosa, com cédula de identidade número 1100133923, mãe do senhor Washington Ayora Rodriguez e em representação da senhora Merci Rosalia Vasquez Trijullo, viúva do senhor Washington Ayora Rodriguez, mediante poder especial outorgado perante  o Consulado Geral do Equador em Espanha, que são anexados a presente como documentos de habilitação .

 

          III.            RESPONSABILIDADE DO ESTADO

 

O Estado Equatoriano reconhece sua responsabilidade internacional por ter violado os direitos humanos do Sr. Washington Ayora Rodriguez reconhecidos nos Artigos 4 (Direito a Vida), Artigo 8 (Garantias Judiciais), Artigo 5 (Direito à Integridade Pessoal) Artigo 7 (Direito à liberdade pessoal)  e Artigo 25 (Proteção Judicial),  em conjunção com a obrigação geral contida no artigo 1.1 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos e outros instrumentos internacionais, sendo mencionadas violações cometidas por agentes do Estado, fato que não pôde ser controvertido pelo  Estado e gerou a responsabilidade deste frente à sociedade.

 

Tendo em vista estes antecedentes o Estado Equatoriano reconhece os fatos constitutivos do Caso Nº 11.443, que se encontra em trâmite perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, e se obriga a assumir  medidas reparadoras necessárias a fim de ressarcir os prejuízos ocasionados as vítimas de tais violações ou a seus familiares.

IV. INDENIZAÇÃO

O Estado Equatoriano, por intermédio do Procurador-Geral do Estado, como único representante judicial do Estado Equatoriano de acordo com o Art. 215 da Constituição Política da República do Equador, promulgada no Registro Oficial Nº 1, vigente desde 11 de Agosto de 1998, entrega a senhora Eusebia Imelda Rodriguez Bosa, com cédula de identidade número 1100133923, mãe do senhor Washington Ayora Rodriguez, falecido, e representante da senhora Merci Rosalía Vasquez Trujillo, viúva do senhor Washington Ayora Rodriguez, uma indenização compensatória em uma parcela, de trinta mil dólares dos Estados Unidos da América (US$ 30,000.00), com cargo ao Orçamento Geral do Estado.

 

Esta indenização envolve o dano emergente, o lucro cessante e o dano moral sofridos pelo senhor Washington Ayora Rodríguez bem como qualquer outra reclamação que pudessem ter as senhoras Merci Rosalía Vasquez Trujillo e Eusebia Imelda Rodriguez Bosa, viúva e mãe do senhor  Washington Ayora Rodriguez ou seus familiares, pelo conceito mencionado neste acordo, observando a legislação interna e internacional, com cargo ao Orçamento Geral do Estado, e para cujo efeito a Procuradoria Geral do Estado notificará ao Ministério de Economia e Finanças, a fim de dar cumprimento a esta obrigação.

V. SANÇÃO DOS RESPONSÁVEIS

O Estado Equatoriano compromete-se a proceder ao julgamento civil e penal além da buscar as sanções administrativas das pessoas que, em cumprimento de funções estatais ou imbuídos do poder público, presume-se,  tiveram participação na violação alegada.

A Procuradoria Geral do Estado compromete-se a instar a Ministra Promotora Geral do Estado, órgãos competentes da Função Judicial, bem como os órgãos públicos ou privados competentes para que aportem informação legalmente respaldada que permita estabelecer a responsabilidade de referidas pessoas.  Havendo o julgamento, este será realizado em obediência ao ordenamento constitucional e legal do Estado Equatoriano.

VI. DIREITO DE REGRESSO

O Estado Equatoriano se reserva o Direito de Regresso conforme o Art. 22 da Constituição Política da República do Equador, contra aquelas pessoas que forem declaradas responsáveis pela violação aos direitos humanos mediante sentença definitiva, proferida pelos tribunais do país, ou após a determinação das responsabilidades administrativas, de conformidade com o artigo 8 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.

VII. PAGAMENTO ISENTO DE IMPOSTO 

 

O pagamento que o Estado Equatoriano realizará para a pessoa objeto deste acordo amistoso não está sujeito a impostos atualmente existentes ou que possam ser decretados no futuro.

VIII. INFORMAÇÃO

O Estado Equatoriano, através da Procuradoria Geral do Estado compromete-se a informar, a  cada três meses, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos sobre o cumprimento das obrigações assumidas pelo Estado em virtude deste acordo amistoso. 

De conformidade com sua prática e as obrigações impostas pela  Convenção Americana, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos supervisionará o cumprimento deste acordo.

 

IX. BASE JURÍDICA

 

A indenização compensatória que concede o Estado Equatoriano ao senhor Washington Ayora Rodriguez encontra-se prevista nos artigos 22 e 24 da Constituição Política da República do Equador, por violação a normas constitucionais, e demais normas do ordenamento jurídico nacional, bem como as normas da Convenção Americana sobre Direitos Humanos e outros instrumentos internacionais de direitos humanos.

Este acordo amistoso está baseado no respeito aos direitos humanos reconhecidos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos e outros instrumentos internacionais de direitos humanos e na política do Governo Nacional da República do Equador, de respeito e proteção aos direitos humanos.

X. NOTIFICAÇÃO E HOMOLOGAÇÃO

 

As senhoras Eusebia Imelda Rodríguez Bosa e Merci Rosalía Vasquez Trujillo, mãe e viúva do senhor Washington Ayora Rodríguez, (falecido), autorizam expressamente ao Procurador-Geral do Estado, para que este informe a Comissão Interamericana de Direitos Humanos, sobre o presente acordo amistoso, a fim de que esse órgão o homologue e o ratifique em todas suas partes.

XI. ACEITAÇÃO

As partes, que intervierem na subscrição deste acordo, expressam livre e voluntariamente sua conformidade e aceitação com o conteúdo das cláusulas precedentes, deixando constância que desta maneira terminam com a controvérsia sobre a responsabilidade internacional do Estado quanto aos direitos que afetaram o senhor Washington Ayora Rodriguez, que tramita perante a Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

 

 

V.          DETERMINAÇÃO DE COMPATIBILIDADE E CUMPRIMENTO

 

          8.          A Comissão determina que os  acordos de solução transcritos são compatíveis com o que estabelece o artigo 48(1)(f) da Convenção Americana.

 

         

          VI.          CONCLUSÕES

          9.          A Comissão valoriza a celebração de um acordo de solução amistosa nos termos da Convenção Americana em que concorreram o Estado e os peticionários.

 

          10.          A CIDH seguirá acompanhando o cumprimento dos compromissos assumidos por Equador relativo ao julgamento das pessoas implicadas nos fatos alegados.

 

          11.          A CIDH ratifica que a modalidade de solução amistosa contemplada na  Convenção Americana permite o encerramento de casos individuais de forma não contenciosa, e demonstra ser um procedimento importante de solução de supostas violações de direitos humanos em casos relativos a diversos países, e que pode ser utilizado por ambas partes (Peticionário e Estado).

 

 

A COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS,

 

DECIDE:

 

          1.          Certificar o cumprimento pelo Estado do pagamento de US$ 30,000 ao peticionário neste caso por conceito de indenização.

 

          2.          Recordar ao Estado que deve dar pleno cumprimento ao acordo de solução amistosa iniciando os processos judiciais contra as pessoas implicadas nas violações alegadas.

 

          3.          Continuar com o  seguimento e a supervisão do cumprimento de cada um dos pontos dos acordos amistosos, e neste contexto, recordar ao Estado, através da Procuradoria- Geral do Estado, de seu compromisso de informar a CIDH, a cada três meses, do cumprimento das obrigações assumidas pelo Estado em virtude destes acordos amistosos.

 

4.          Publicar esta decisão e incluí-la em seu Relatório Anual à Assembléia Geral da OEA.

 

Dado e firmado na sede da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, na cidade de Washington, D.C., aos 11 dias do mês de outubro 2001.  (Assinado): Claudio Grossman, Presidente, Juan E. Méndez, Primeiro Vice-presidente; Marta Altolaguirre, Segunda Vice-presidenta; Hélio Bicudo, Robert K. Goldman, e Peter Laurie,  Membros da Comissão.

 

                  

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* O doutor Julio Prado Vallejo, de nacionalidade equatoriana, não participou da discussão e decisão neste caso, em cumprimento ao artigo 17 do Regulamento da Comissão.

 

[1]  O reconhecimento médico indicou: “… em 21 de fevereiro de 1994, por determinação do 4º Juízo Penal de Loja. Resultados:  Washington Ayora, apresentou hematoma parental esquerdo de 8 cm de diâmetro doloroso ao tato; equimose hemitorácica posterior esquerda de 6 cm de diâmetro cor violeta; equimose  ventral de 10 cm dolorosa ao tato; quatro escoriações no ombro esquerdo que tem entre 2 e 9 cm de diâmetro; equimose violeta no glúteo direita de 7 cm de diâmetro; hematoma na  cara ventral terço médio do músculo direito de 12 cm de diâmetro doloroso ao tato; cinco escoriações no joelho e terço  superior da perna esquerda que tem entre 3 e 7 cm de diâmetro.  Conclusões dos médicos: pelo aspecto, forma e cor das lesões presume-se que foram produzidas de um a três dias antes, pela ação traumática de um objeto duro e contundente; hematomas e equimoses; e por  sobre a pele de uma superfície dura e áspera as escoriações.  Provavelmente a pessoa encontrava-se em boas condições gerais de saúde antes de lhe serem infringidas as lesões …".