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Relatório
N°
119/01
CASO
11.500 TOMÁS
EDUARDO CIRIO URUGUAI 16
de outubro de 2001
I.
RESUMO
1.
Em 12 de outubro de 1993 a Comissão Interamericana de Direitos
Humanos (doravante denominada “a Comissão” ou “a CIDH”), recebeu
uma denúncia datada de 20 de junho de 1993, do senhor Tomás Eduardo
Cirio (doravante denominado "o peticionário"), cidadão
uruguaio, militar retirado, sobre a alegada violação dos seguintes
direitos protegidos pela Declaração Americana dos Direitos e Deveres do
Homem (doravante denominada "a Declaração Americana") por
parte da República Oriental do Uruguai (doravante denominada “o Estado”
ou “Uruguai”): artigo II (direito de igualdade perante a lei), artigo
IV (direito de liberdade de opinião e de expressão e difusão do
pensamento por qualquer meio), artigo V (direito a proteção a honra, a
reputação pessoal e a vida privada e familiar), artigo XVI (direito a
previdência social), artigo XXVI (direito a processo regular).
Adicionalmente, a denúncia alega a violação dos seguintes
direitos inseridos na Convenção Americana sobre Direitos Humanos (doravante
denominada “a Convenção Americana”) por parte do Estado: artigo 5(1)
direito a integridade pessoal – no plano moral), artigo 8(1)(2)(b), (d),
(f) , (direito as garantias judiciais), artigo 9 (princípio de legalidade),
artigo 10 (direito a indenização em caso de erro judicial), artigo 11(1)
(direito a proteção da honra e da dignidade), artigo 13(1) e (3) (direito
a liberdade de pensamento e de expressão), artigo 24 (direito a igualdade)
e artigo 25(1) (direito a proteção judicial).
2.
A petição relata que, após a celebração da Assembléia do
Centro Militar realizada em 4 de julho 1972, o peticionário, major
retirado do Exército, renunciou ao Centro por meio de uma carta onde
fazia apreciações sobre o necessário respeito aos direitos humanos no
marco da luta anti-subversiva por parte das Forças Armadas no Uruguai.
Desde então, alega o peticionário, não deixou de sofrer sanções
em represália por ter emitido sua opinião livremente.
3.
O Centro Militar, uma organização privada, informou ao Comando
Geral do Exército de sua carta e eliminou seu registro social.
Posteriormente, o Comando Geral submeteu o Sr. Cirio à jurisdição de um
Tribunal de Honra. O peticionário
alega que foi julgado por um tribunal cuja jurisdição já não mais
pertencia, porque era um militar retirado, além ter sido julgado à
revelia, o que lhe acarretou o cerceamento ao direito de defesa.
Em novembro de 1972, o Tribunal de Honra
retirou o seu grau militar e o transferiu para a reserva.
Alega que, em consequência desta decisão, foram afetadas a sua
honra e reputação, seus direitos remuneratórios, seu direito a assistência
hospitalar, a possibilidade de conseguir créditos, direito a usar
uniforme, sofreu a proibição de ocupar cargos no Ministério de Defesa,
foi desqualificado e perdeu a sua qualificação de militar e o título de
sua patente, foi humilhado publicamente como uma pessoa sem honra, e
expulso da cooperativa das Forças Armadas.
4.
Em 1994, por resolução do Ministério de Defesa, seus direitos
foram parcialmente restituídos. Em dezembro de 1997, através de uma nova
resolução do Ministério, reconhecendo parcialmente a responsabilidade
do Estado, o peticionário foi aceito novamente na qualidade de militar
retirado, deixando sem efeito sua posição de reserva, mas sem direito a
retroatividade alguma, nem indenização pelos danos morais sofridos
durante 25 anos na reserva.
5.
A Comissão conclui neste relatório que a petição reúne os
requisitos de admissibilidade previstos nos artigos 46 e 47 da Convenção
Americana. Portanto, a Comissão
decide declarar o caso admissível, notificar as partes da decisão e
prosseguir com a análise de mérito relativa as supostas violações da
Declaração Americana e a Convenção Americana.
A Comissão decide também publicar o presente relatório.
II.
TrÂmite PERante a Comissão
6.
Em 12 de outubro de 1993 o peticionário apresentou a denúncia, a
qual foi recebida pela CIDH em 15 de março de 1994. A CIDH solicitou
informação ao Estado em março de 1994, agosto de 1994, janeiro de 1995,
e março de 1995, no entanto não recebeu nenhuma resposta. Em 13 de junho
de 1995 o Estado transmitiu sua primeira resposta. Em 8 de agosto de 1996
a Comissão comunicou ao Estado que, na hipótese de não receber as suas
observações em 30 dias, poderia aplicar o artigo 42 do Regulamento da
Comissão. Mencionado artigo autoriza a CIDH a presumir verdadeiros os
fatos relatados numa petição que hajam sido transmitidos ao Estado,
quando referido Estado não envia a informação correspondente no prazo
requerido pela Comissão. Em 26 de agosto de 1996, o Estado solicitou uma
prorrogação, que lhe foi concedida. Em 2 de setembro de 1996, o Estado
proporcionou sua resposta. O
trâmite continuou com a transmissão da informação e observações
entre as partes. III.
posiçÕES DAS Partes
A.
Posição do peticionário 7.
O peticionário é um militar uruguaio de carreira que passou a
reserva em 1966. Até 1972 foi membro do Centro Militar de Uruguai, uma
entidade privada composta de militares retirados e ativos. Em 4 de julho
de 1972, a Assembléia Geral do Centro Militar emitiu uma declaração,
aprovada de forma unânime, em consideração ao que chamou “campanha de
desprestígio das Forças Armadas em todos os níveis”.[1]
O peticionário informa que referida comunicação foi originada em
resposta a uma declaração da Câmara de Representantes do Uruguai
durante a interpelação do Ministro de Defesa pela morte de Luís Carlos
Batalla, cidadão uruguaio que morreu enquanto detido pelas Forças
Armadas na unidade militar de Trinta e Três.
8.
Segundo o peticionário, a Câmara havia expressado sua confiança
em que as Forças Armadas "imporiam o cumprimento das normas
constitucionais e legais estabelecidas em respeito à dignidade humana.
Diante dos fatos que motivaram o chamado a Sala, dos quais surge a
comprovação da morte de um cidadão por tratamento desumano aplicado
durante sua detenção, reclama uma máxima celeridade nos procedimentos e
a demonstração pública dos culpáveis e das penas a serem aplicadas
”.
9.
Os participantes da Assembléia do Centro Militar, por sua parte,
aprovaram por aclamação a seguinte declaração de defesa: "Que
toda ação ou manifestação corporativa ou individual, que tenha por fim
menosprezar ou impedir maliciosamente os procedimentos dos integrantes das
Forças Armadas na luta contra a subversão, ou seja, a traição a pátria,
constitui uma cumplicidade dobrada dos inimigos do regime Republicano
Democrático que a cidadania elegeu e reafirmou”.
10.
A raiz da declaração unânime da Assembléia do Centro Militar,
que o peticionário encontrou perturbadora, este apresentou sua renúncia
ao Centro, primeiro por telefone e depois por carta, datada de 19 de julho
de 1972. Na referida carta, inter
alia, o peticionário manifestou:
Não
é preciso dizer que discordo total e radicalmente com a moção
apresentada e posteriormente aprovada na assembléia, e isto — devo dizê-lo
em tempos que, às vezes com finalidades pouco claras, se vêem bruxas em
todas as partes — não é porque eu represente um instrumento de nenhum
plano escondido dos inimigos da pátria
(…). Do
ponto de vista estritamente humano, é também possível que haja acordo
unânime perante expressões que, em algum momento puderam ser
qualificadas de monstruosas, como aquelas referentes à morte de uma
pessoa que originou a declaração da Câmara de Representantes, [pessoa]
a quem, com a ratificação do aplauso generalizado, primeiramente
pretendeu negar sua condição de cidadão, para logo ultrajá-lo e a sua
esposa, ainda que certas afirmações pudessem justificar o que, sem dúvida,
foram horríveis sofrimentos. Porém,
como se não fosse o bastante, as alegações foram finalizadas “dando fé”
de que a morte de um [indivíduo] sem dúvida torturado de forma selvagem
foi causada pela “caída sobre uma pedra”.
Dando por suficientemente esclarecido o episódio, e a prévias
invocações, como de costume, à dignidade e honra (que aqui, na
realidade, não percebe onde poderiam ser encontradas) passou-se a página. Entretanto,
este não é um caso dos poucos que saíram à luz, porque não houve
outra alternativa.
Faz meses que se acumulam, uma atrás da outra, graves denúncias
contra a atuação das forças armadas; seu número e sua entidade fazem
rejeitar toda possibilidade de “campanha insidiosa,” e atribui a calúnias
uma grande porcentagem delas, o resto dá para espantar
(…). Por
isto, devem ser castigados de forma exemplar quem – uma minoria pequena,
estou certo — mancharam o
uniforme do exército usando-o para encobrir seus exageros, seus atropelos
e seu sadismo. Seus nomes devem ser conhecidos pelo povo, como delinqüentes
que são, já que isto está fora da órbita disciplinar, regida, esta sim
com a reserva que devem proteger a disciplina e a subordinação
(…).
11.
Em 3 de agosto de 1972, em resposta a carta de renúncia do
peticionário, o Centro Militar rejeitou “terminantemente os conceitos
vertidos na mesma por considerá-los totalmente fora de lugar, lesivos
para os demais senhores associados e que afetam o prestígio das Forças
Armadas e da Instituição”.[2]
A Comissão Diretiva do Centro Militar decidiu não aceitar a renúncia
do peticionário, declará-lo em violação ao Estatuto do Centro, eliminá-lo
dos registros sociais da instituição, e remeter uma cópia ao Comando
Geral do Exército "para que estime o conveniente".
Adicionalmente, circulou um "Comunicado" em toda a
imprensa da capital fazendo público o assunto: “Fazemos constar que o
Major Retirado Tomás E. Cirio foi eliminado dos registros sociais desta
instituição em 26 de julho de 1972".
O Comandante-Chefe do Exército ordenou que ele fora levado ao
Tribunal de Honra.
12.
Em 7 de novembro de 1972, o peticionário recebeu um ofício do
Tribunal Geral de Honra comunicando-lhe que estava sendo submetido à
jurisdição de referido tribunal. O peticionário denuncia que o Estado
havia passado a considerar a questão formulada no seio do Centro Militar,
uma instituição privada alheia ao Estado e as Forças Armadas.
O peticionário alega que não estava sujeito à jurisdição do
Tribunal Militar devido a sua condição de militar retirado.[3]
13.
Os procedimentos perante o Tribunal de Honra começaram em 16 de
novembro de 1972. O peticionário
alega que os cargos impostos a ele resumiam-se ao fato de ter expressado
seu pensamento de modo livre.[4]
Em suma, o Estado, através de um Tribunal de Honra formado na órbita
do Ministério de Defesa Nacional, julgou-lhe pelos conceitos vertidos na
carta de renúncia como sócio do Centro Militar — sancionando-lhe por
haver defendido os direitos humanos no marco da luta anti-subversiva.
14.
O peticionário argumenta que, enquanto militar retirado, o
Tribunal de Honra não tinha jurisdição sobre ele; consequentemente, o
peticionário, em 20 de novembro de 1972, retirou-se da sala e o tribunal
continuou com o julgamento à revelia, conforme o artigo 165 do
Regulamento dos Tribunais de Honra das Forças Armadas.
O peticionário alega que desta forma não teve possibilidade de
articular sua defesa. Em 22
de novembro de 1972, o Tribunal de Honra decidiu desqualificar o peticionário
"por falta gravíssima", deixando constância que havia sido
julgado à revelia e que se tornara inabilitado para formar parte do
Quadro de Oficiais.[5] O
peticionário solicitou, por escrito, os fundamentos da decisão, mas o
tribunal não concedeu o pedido, informando-o: "Não conceder o
pedido em razão de que tendo negado a comparecer perante este tribunal
pelas causas que aduz, deixou de fazer credor dos direitos que estabelece
referido Regulamento a respeito". Em 2 de janeiro de 1973, o Poder Executivo aprovou a decisão
do tribunal, e o peticionário passou a condição
de reforma.[6] Em
dezembro de 1973, o Ministério de Defesa fixou os salários de reforma em
um terço para o peticionário, e dois terços “a quem justifique
direito a pensão”.[7]
15.
O peticionário manifesta que em 1973 esgotou a via administrativa
depois de recorrer das decisões do Poder Executivo e que em 2 de maio de
1974 interpôs perante o Ministério de Defesa um recurso de revogação
da resolução Nº 42.204 do Poder Executivo, a fim de conseguir sua
restituição ao cargo de Major do Exército na reserva.
Devido à ditadura que atravessava o Uruguai, e temeroso de sua
segurança e de sua família, optou por desistir de sua reclamação.
16.
Após o retorno a democracia ao Uruguai em março de 1985, e a
volta do estado de direito ao país, a legislação uruguaia não amparou
este tipo de reclamação, conforme sustenta o peticionário. Este retomou
o trâmite de sua reclamação logo depois da publicação em março de
1991 de uma nota jornalística do Tenente Gral. (R) Hugo Medina na revista
“Búsqueda,” na qual explica o alcance daquilo que definiu como "perda
dos pontos de referência" na atuação militar, reconhecendo mortes
na prisão, o desaparecimento de pessoas, e a tortura por parte das Forças
Armadas. Para o peticionário
era "a honra", "o que estava em jogo (…) e era imprescindível
provar através das afirmações dos próprios protagonistas militares o
que a 'Lei de Caducidade' na realidade havia tornado indiscutível, isto
é, quem, de uma maneira ou outra, participaram, ainda que indiretamente,
na decisão proferida pelo Tribunal de Honra e, como consequência desta,
a sua transferência para a reforma”.
17.
Em 30 de abril de 1991, o peticionário interpôs novamente perante
o Ministério de Defesa um recurso para revogar as resoluções Nº.
46.204 do Poder Executivo e 6.540 do próprio Ministério, que haviam
afetado seus direitos. Neste
recurso, o peticionário alegou a nulidade das resoluções devido (a)
falta de competência do Tribunal de Honra, já que o peticionário não
se encontrava sob sua jurisdição, (b) falta de direito a defesa, e (c)
violação do artigo 66 da Constituição do Uruguai,[8]
e de outras normas legais e regulamentares.
O Ministério de Defesa não se pronunciou a respeito do recurso
interposto pelo peticionário. 18.
Em 23 de outubro de 1991, o peticionário iniciou uma ação no
Tribunal do Contencioso Administrativo contra o Estado para anular as
mencionadas resoluções. Em
10 de março de 1993, o Tribunal decidiu desacolher a ação devido à
caducidade do direito da parte autora.
A decisão não fez referência ao preceito contido no artigo 66 da
Constituição. O peticionário
foi notificado da decisão em 26 de abril de 1993.
19.
Paralelamente, em 27 de maio de 1991, o peticionário apresentou
nota ao Centro Militar, afirmando que "a palavra 'honra', embora
usada para tapar desonras, aparece de vez em quando desgastada e vazia,
mas é imprescindível que honra com honra se pague". O peticionário
assinalou ao Centro sua responsabilidade na situação injusta e ilegal
que estava vivendo por mais de vinte anos e solicitou para repará-la os
seguintes passos: 1.
Publicar, nos mesmos jornais em que foi afixado o comunicado de 5
de outubro de 1972 — em idêntico lugar e com as mesmas características
— um novo comunicado, mediante o qual reconhece claramente o erro
sofrido ao não aceitar a minha renúncia, e eliminar-me dos registros
sociais. 2.
Providenciar para que o Comandante-Chefe do Exército — refazendo
o caminho errado de antes — a correspondente anulação da decisão do
Tribunal Geral de Honra que me prejudicou, por falta de motivo e do
disposto pelo artigo 66 da Constituição.
3.
Aceitar minha renúncia a esse Centro Militar com data de 6 de
julho de 1972 — momento em que a apresentei por telefone ao Presidente
do Centro à época.
20.
Em 5 de junho de 1991, o Centro Militar devolveu-lhe a nota "por
não ser cabível de recibo". O peticionário, então, iniciou uma ação
por danos e prejuízos contra o Centro Militar, baseada no abuso de
direito, mas o tribunal entendeu que a ação era improcedente por
caducidade. 21.
Para o peticionário a transferência para a "reforma"
implicava praticamente a "morte civil," bem como um grave dano
moral para o militar sancionado posto que na época em que isto ocorreu,
as transferências para a "reforma" estavam reservadas a
pederastas e ladrões — esse era o conceito que reinava no Exército.
Segundo o peticionário, o centro da questão era a honra militar:
Honra
que me tirou o Centro Militar, o Tribunal Geral de Honra, o Ministério de
Defesa Nacional e o Poder Executivo, dignidade que se negam a devolver-me
porque isto implica reconhecer que eu tinha razão e eles não, bem como
admitir que as Forças Armadas cometeram violações tremendas de direitos
humanos, extremo que somente forçada e indiretamente, chegam a consentir.
22.
O peticionário alega na sua petição que a indenização pelos
danos e prejuízos sofridos durante mais de 20 anos chegam a um total de
US$ 300,000 (2/3 da despedida: US$ 116,000; assistência privada de saúde;
US$ 10,000; gratificações natalinas vencidas; e dano moral incluindo a
impossibilidade de obter créditos: US$ 160,000) sem cálculo de juros.
23.
Em 14 de junho de 1994, no marco da “Pacificação Nacional,”
as leis de anistia, e a convocatória do pessoal do Ministério de Defesa
que havia sido considerado destituído por motivos políticos ou ideológicos,
o Ministério de Defesa emitiu uma nova resolução que, além de outros
pontos mencionados no pedido do peticionário, modificou sua pensão de
reforma sem que isto significasse o direito à retroatividade, e não
modificou sua condição de reformado.[9]
24.
O peticionário declara que em 24 de dezembro de 1997, por Resolução
76.161 do Ministério de Defesa, recuperou sua qualidade de aposentado,
deixando sem efeito a sua condição de reforma, “sem que isto
implicasse em retroatividade”. Referida
resolução afirma: Resultando
[…] III. Que [a reforma] configurou um marco de conflito social
generalizado; Considerando […] III. Que a sua vez, a anterior Administração
[…] determinou que […] [se] estabelecera uma série de pautas de
reparação aplicáveis em via administrativa ao Pessoal Militar
desvinculado das Forças Armadas, por motivos políticos, ideológicos ou
por mera arbitrariedade, […] se estima pertinente recordar a qualidade
de reformado deixando sem efeito a
situação de reforma […]. O
Presidente da República, resolve: 1º - Outorgar a qualidade jurídica
aos Senhores Oficiais citados no Visto da presente resolução, sem
que isto signifique direito à retroatividade, deixando sem efeito a
reforma […].[10]
(ênfase agregada). 25.
O peticionário alega que esta resolução, pela disposição
“sem…direito a retroatividade”, em vez de “deixar sem efeito” a
reforma, o deixa na mesma situação, apesar de que o Estado reconheça
sua desvinculação das Forças Armadas resultou por motivos políticos,
ideológicos ou mera arbitrariedade, e portanto ratifica implicitamente
sua responsabilidade perante a violação e reverte a situação de
reforma.
26.
O peticionário manifestou que por esta resolução lhe foi
devolvida sua condição de militar, anterior a 1º de janeiro de 1973, e
que: entretanto,
eu não cometi delito algum, nem transgredi nenhuma norma de honra; pelo
contrário, me manifestei como opositor àqueles que o fizeram.
Consequentemente, somente posso aceitar que me outorguem “de graça” (ou
por um gesto de magnitude ”) o que por direito me corresponde […].[11] 27.
Por último, o peticionário observa que: é
errado afirmar que [meu] antigo pedido tenha sido sanado quando deixaram
sem efeito a situação de reforma […].
Ao finalizar tal situação, se interrompem os danos materiais que
suportei durante um quarto de século (junto com minha família): a
desqualificação e perda do status de militar, da patente, e do direito
de usar o uniforme, a humilhação que isto implica, a exposição pública
como uma pessoa sem honra, tudo isso não pode ser satisfeito com a devolução
pura, e simplesmente, do que a final sempre foi meu, e o provimento de
algumas concessões materiais e a volta da página, como se nada tivesse
acontecido, […]. Portanto, persiste a obrigação de reparar o injusto
mal causado e compensar os prejuízos morais e espirituais causados, para
os quais o dinheiro não basta […].
Trata-se de uma reivindicação de valores da (verdadeira) honra
[…].[12] B.
Posição do Estado 28. O Estado, em sua resposta de 13 de junho de 1995 solicitou:
"Que se declare inadmissível a petição apresentada por estar fora
do prazo, por não terem sido esgotados os recursos de jurisdição
interna do Estado Uruguaio, por não expor fatos que caracterizem uma
violação de direitos garantidos e por ser infundada e improcedente, de
acordo com o previsto no artigo 47 da Convenção Americana (...)”. 29.
O Estado manifesta que são improcedentes as alegações de
cerceamento de defesa e falta de garantia na ação disciplinar interna
perante o Tribunal de Honra, formado pelo Comando Geral do Exército
contra o peticionário em 1972, já que o peticionário "renunciou a
ela voluntariamente, em sede administrativa e jurisdicional”. Outrossim,
o Estado não reconhece que o peticionário tenha esgotado as vias
administrativas e judiciais internas, e afirma que o peticionário não
esgotou as vias internas em tempo e forma, "o que invalida totalmente
a sua petição”. Alega que o peticionário teve conhecimento das resoluções
de 1973 e 1974 e que o peticionário não esgotou os recursos internos
nesse momento, como poderia ter feito perante o Tribunal do Contencioso
Administrativo, mediante ação de nulidade. Posteriormente, em 23 de
outubro de 1990, quase 20 anos depois da sua transferência para a reforma
e cinco anos da restituição da democracia no Uruguai, o peticionário
interpôs a ação de nulidade, a qual foi considerada intempestiva,
porque caducado o seu direito. 30.
O Estado
alega que o peticionário não define com clareza as disposições da
Convenção Americana que, na sua, opinião foram violadas, nem os fatos
que fundamentam sua denúncia.[13]
Assinala que a Convenção entrou em vigor para o Uruguai em 19 de
abril de 1985, data de sua adesão, e consequentemente não pode ser
julgado por atos ocorridos antes desta data. 31.
O Estado alega que a situação de reforma não tem o alcance que
menciona o peticionário, sendo que mencionada situação está definida
na Lei Orgânica Militar Nº 10.050.[14]
Também alega que os oficiais retirados são reformados nas mesmas
condições que os oficiais na ativa[15],
e por isso, o Tribunal de Honra tinha competência para julgar o peticionário.
Desta forma, o Estado alega que a transferência para a reserva deu-se
em total legitimidade, e por causa de “falta grave” conforme decidiu o
tribunal. 32.
O Estado argumenta que, embora a situação do peticionário não
se enquadra nos critérios utilizados nas reparações acordadas entre o
Poder Executivo e a Comissão de Defesa Nacional do Senado do Uruguai, foi
efetuada uma revisão do caso do peticionário em 1994 e foram unificados
os salários de pensão correspondente a situação de reforma, conforme
determinado pela resolução do Ministério de Defesa de junho de 1994. O
Estado afirma que esta resolução foi editada para “diminuir a eventual
severidade com que o ex-Oficial poderia ter sido julgado, dentro da
discricionariedade existente num momento histórico crítico da Nação,
mas que isto não significava em absoluto em reconhecer uma situação
ilegítima ou anti-jurídica que se deveria retroverter (sic)”. O Estado também
afirma que se houvesse existido uma desigualdade no tratamento do peticionário,
esta resultou em seu benefício, já que sua desvinculação das Forças
Armadas foi realizada fora do prazo estabelecido nas pautas de reparação.
33.
O Estado alega que o peticionário passou à reserva em total
conformidade com as leis vigentes na época, sem que ele exercesse ações
pertinentes para impugnar o procedimento que o levou para a reforma.
Recorda que foi o peticionário quem renunciou por vontade própria
o exercício de sua defesa perante o Tribunal de Honra, motivo pelo qual o
julgamento continuou a revelia, ou seja, sem a sua presença. Referido
conceito jurídico permite a normal persecução dos procedimentos no caso
de que o acusado nega a comparecer perante o tribunal. 34.
Por último, o Estado expressa que o benefício de gratificação
natalina que o peticionário reclama é concedido aos militares
aposentados das Forças Armadas e não aqueles em situação de reforma.
Da mesma maneira, se extingue o direito a assistência no Serviço
Hospitalar das Forças Armadas. O Estado afirma que a perda dos benefícios
é uma consequência legítima da transferência para a reforma. IV.
AnálisE de AdmisSibilidadE A.
Competência
ratione personae, ratione
loci, ratione temporis e ratione
materiae da Comissão 1.
Ratione personae
35.
O peticionário encontra-se facultado pelo artigo 44 da Convenção
Americana para apresentar denúncias perante a CIDH. A petição assinala
como supostas vítimas a pessoas individuais, as quais o Uruguai
comprometeu-se a respeitar e garantir os direitos consagrados na Convenção
Americana. No
que concerne ao Estado, a Comissão assinala que o Uruguai é um Estado
parte na Convenção Americana desde 19
de abril de 1985,
data em que depositou o instrumento de ratificação respectivo. Portanto,
a Comissão tem competência ratione
personae para examinar a petição.
2.
Ratione loci
36.
A Comissão
tem competência ratione loci
para conhecer a petição, devido a que nela se alegam violações de
direitos protegidos na Convenção Americana, que tiveram lugar dentro do
território de um Estado parte no mencionado tratado. 3.
Ratione
temporis 37.
A CIDH
tem competência ratione temporis,
porque a obrigação de respeitar e garantir os direitos protegidos já se
encontrava em vigor para o Estado uruguaio na data em que ocorreram os
fatos alegados na petição, seja na Declaração
Americana ou na Convenção Americana. A Comissão esclarece que alguns
dos fatos alegados violatórios de direitos humanos do Sr. Cirio tiveram
início antes de 19 de abril de 1985, data em que o Uruguai ratificou a
Convenção Americana, motivo pelo qual uma das fontes de direito aplicável
neste período é a Declaração Americana. Tanto a Corte como a Comissão
entendem que a Declaração Americana é uma fonte de obrigações
internacionais para os Estados membros da OEA.[16]
38.
Os fatos ocorridos posteriormente a 19 de abril de 1985, data da
ratificação da Convenção Americana por parte do Uruguai, e os fatos
ocorridos antes desta data, mas cujos efeitos continuam a produzir-se,
devem ser ambos analisados no contexto da Convenção Americana. A CIDH
reiterou recentemente "sua prática de estender o âmbito de aplicação
da Convenção Americana a fatos violatórios dos direitos humanos de
natureza continuada anteriores a sua ratificação, mas cujos efeitos se
mantém depois de sua entrada em vigor".[17]
A Comissão estabeleceu no mesmo sentido que "uma vez que a
Convenção entrou em vigor (…) esta, e não a Declaração, converteu-se
na fonte de direito aplicável pela Comissão, sempre que a petição
refira-se a suposta violação de direitos substancialmente idênticos e não
se trate de uma situação de violação contínua".[18]
Outrossim, a Comissão assinala que o artigo 29 da Convenção
Americana sustenta a jurisprudência da Comissão no sentido de que
referido órgão é competente para aplicar tanto a Declaração Americana
como a Convenção Americana ao mesmo caso.[19]
4.
Ratione materiae
39.
Por último, a
Comissão tem competência ratione
materiae, já que a petição denuncia violações de direitos humanos
protegidos pela Declaração Americana de Direitos e Deveres do Homem e a
Convenção Americana. B.
Outros requisitos de admissibilidade da petição 1.
Esgotamento dos recursos internos 40.
Em 10 de março de 1993, o Tribunal do Contencioso Administrativo
resolveu que a ação interposta pelo peticionário havia caducado. Com
isto pôs término a possibilidade do peticionário de buscar vias
internas para a reparação das violações alegadas.
O Estado reconhece que o peticionário não tem mais recursos
internos que possa esgotar.[20]
2.
Prazo de apresentação 41.
O artigo 46(1)(b) da Convenção assinala que a petição deve ser
apresentada dentro do prazo de seis meses a partir da data em que o
peticionário seja notificado da decisão definitiva que esgotou os
recursos internos. O peticionário enviou sua denúncia a Comissão em 12
de outubro de 1993, isto é, aos 5 meses e 17 dias depois de ter recebido
a notificação da decisão do Tribunal do Contencioso Administrativo, em
26 de abril de 1993. Tendo em vista que a apresentação da presente petição
foi feita dentro do prazo de 6 meses, a Comissão considera preenchido o
requisito do artigo 46(1)(b) da Convenção Americana. 3.
Duplicidade de procedimentos e coisa julgada
42.
A Comissão entende que a matéria da petição não está pendente
de outro procedimento de acordo internacional, nem reproduz uma petição
já examinada por este ou outro organismo internacional. Portanto, os
requisitos estabelecidos nos artigos 46(1)(c) e 47(d) da Convenção
encontram-se satisfeitos. 4.
Características dos fatos alegados
43.
A
Comissão considera que a exposição da peticionária refere-se a fatos
que, se provados verdadeiros, poderiam caracterizar uma violação aos
direitos garantidos pelos seguintes artigos da Declaração Americana:
artigos II, IV, V, XVI e XXVI, e os artigos 5, 8, 9, 10, 11, 13, 24 e 25
da Convenção Americana, motivo pelo foram satisfeitos os requisitos do
artigo 47(b) da Convenção. V.
ConclusÃO
44.
Com fundamento nas considerações de fato e de direito expostas, a
Comissão conclui que o presente caso satisfaz os requisitos de
admissibilidade enunciados nos artigos 46 e 47 da Convenção Americana e
sem prejudicar o fundo da questão, a
Comissão Interamericana de Direitos Humanos, Decide: 1.
Declarar
admissível o presente caso quanto as supostas violações de direitos
protegidos nos artigos II,
IV, V, XVI e XXVI da Declaração Americana, e os artigos 5, 8, 9, 10, 11,
13, 24 e 25 da Convenção Americana.
2.
Transmitir o presente relatório ao peticionário e ao Estado. 3.
Colocar-se
à disposição das partes com o objetivo de alcançar um acordo baseado
no respeito aos direitos protegidos na Convenção Americana e convidar as
partes a pronunciarem-se num prazo de 30 dias sobre a possibilidade de
solucionar o caso amistosamente. 3.
Continuar com a análise de fundo da questão. 4.
Publicar esta decisão e incluí-la em seu Relatório Anual à
Assembléia Geral da OEA. Dado
e firmado na sede da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, na
cidade de Washington, D.C., aos 16 dias do mês de outubro 2001. (Assinado): Claudio
Grossman, Presidente,
Juan E. Méndez, Primeiro Vice-presidente; Marta Altolaguirre, Segunda
Vice-presidenta; Robert K. Goldman, Peter Laurie, Julio Prado Vallejo, Hélio
Bicudo, Membros da Comissão.
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]
[1]
Declaração da Assembléia do Centro Militar, 4 de julho de 1972:
"(1) Que toda ação ou manifestação corporativa ou
individual, que tenha por fim menosprezar ou impedir maliciosamente os
procedimentos dos integrantes das Forças Armadas na luta contra a
subversão, ou seja, a traição a Pátria, constitui uma
cumplicidade dobrada dos inimigos do regime Republicano Democrático
que a cidadania elegeu e reafirmou
(2), que repudia a demonstração pública das penas a serem
aplicadas a qualquer dos seus integrantes, quando corresponda serem
sancionados, e (3) que os princípios morais que regem os integrantes
das Forças Armadas, asseguram o êxito final na luta empenhada. “
(o grifo é nosso). [2]
Resposta do Centro Militar, 3 de agosto de 1972. [3]
Lei Orgânica Militar Nº 10.050, artigo 344: “A reserva produz os
seguintes efeitos: […] c) Mantém o reservado sob jurisdição
militar durante todo o tempo em que desempenhe cargos dentro do Exército,
e nos demais casos, durante quatro anos a contar da data da
transferência para a reserva ”. (o grifo é nosso).
O peticionário passou a reserva em 16 de novembro de 1966. [4]
Em 17 de novembro de 1972, o Tribunal Geral de Honra linformou-o
das alegadas violações cometidas contra o
Regulamento Geral dos Tribunais de Honra das Forças Armadas.
Entre outras coisas , lhe acusam de ter violado o artigo 4,
inciso IV: "Dando
por certas supostas torturas denunciadas e negando que tais torturas
sejam parte de uma campanha insidiosa sobre as Forças Armadas,
campanha que foi comprovada através da publicação oficial das
provas correspondentes"; "Qualificando-se o assassinato coletivo de pessoas
indefesas' a morte de cidadãos como consequência de um enfrentamento
no Paso del Molina, devendo constar ao depoente que previamente havia
sido ferido gravemente um Oficial do Exército"; "Insinuando
que as Forças Armadas não jogam limpo e que atuam por vingança e de
forma 'indigna', que ademais seu poder é usado para 'infelicidade do
povo'"; "Afirmando que se deve castigar 'aqueles que
mancharam o uniforme do Exército para encobrir seus exageros, seus
atropelos e seu sadismo'; dando por sentado sem aportar prova de tais
fatos cometidos e preconizando o vilipêndio público dos
supostos autores”. [5]
Segundo o peticionário, o Tribunal de Honra processou seu caso
"com ilegalidade, erro de motivo, falta de causa e desvio de
poder". [6]
Resolução Nº 46.202, 2 de janeiro de 1973, do Poder Executivo,
aprovando a decisão do Tribunal Geral de Honra.
Resolução Nº 46.204, 2 de janeiro de 1973, transferência
para a reforma. Ambas
resoluções foram publicadas no Boletim do Ministério de Defesa
Nacional correspondente a 4 de janeiro de 1973, que leva o Nº 1594. Implicações
da condição de reforma
segundo o exposto pelo peticionário: (1) Divisão da remuneração de
reserva entre os parentes (a nível hereditário) e o peticionário,
na proporção de 2/3 para o primeiro, e 1/3 para o último, (2) fim
da cobrança de gratificação natalina anual, percebida por todos os
oficiais retirados, (3) perda do direito a assistência no Hospital
Militar, (4) expulsão da Cooperativa das Forças Armadas, (5) proibição
de ocupar empregos dependentes do Ministério de Defesa, (6)
impossibilidade de obter créditos bancários, e (7) desqualificação
e perda do status de militar, patente e o direito a usar o uniforme.
[7]
A Resolução Nº 6.540 do Ministério de Defesa, 20 de dezembro de
1973, fixou os salários da reforma. Esta resolução não foi notificada ao peticionário. [8]
O artigo 66 da Constituição Nacional do Uruguai estabelece:
“Nenhuma investigação parlamentária ou administrativa sobre
irregularidades, omissões ou delitos, será considerada concluída
enquanto o funcionário acusado não possa apresentar suas alegações
e articular sua defesa”. [9]
O peticionário alega que a Resolução Nº 72-732 reconhece
que foi destituido por motivos de ordem política e ideológica mas não
lhe devolve: 1) o status de militar; 2) a patente; 3) o direito a usar
o uniforme, 4) a possibilidade de ocupar cargos em dependências do
Ministério de Defesa Nacional, nem na Reserva; 5) o direito de assistência
em Hosptial Militar; 6) os direitos como associado na Cooperativa das
Forças Armadas; 7) a titularidade única de seus salários; 8) o
direito a cobrar gratificação natalina como todos os outros
aposentados da Administração Pública; e 9) o crédito frente a
terceiros. [10]
Resolução Nº 76.161, Ministério de Defesa Nacional, 24 de dezembro
de 1997. [11]
Carta do peticionário a Comissão, 14 de abril de 1998. [12]
Carta do peticionário a Comissão, 29 de maio de 2001. [13]
O Estado não faz referência as alegadas violações da
Declaração Americana. [14]
Artigo 362: “Se entenderá como reforma a situação especial em que
se encontra um Oficial que perde definitivamente o direito de ocupar
emprego dependente do Ministério de Defesa Nacional, nem mesmo na
reserva, e que tampouco pode usar mais o título nem o uniforme
militar correspondente à sua patente ao momento que passou a reserva.”.
Nota
da Comissão:
O Estado cita o artigo 371, mas no texto da lei 10.050 vigente
em 1972/74 à disposição da Comissão,
a definição corresponde ao artigo 362.
Em posteriores correspondências com a Comissão, o Estado
reconheceu e emendou este erro. [15]
Artigo 364, lei 10.050 (o Estado cita o artigo 373). [16]
Ver Corte I.D.H., Interpretação
da Declaração Americana dos Direitos e Deberes do Homem no marco do
artigo 64 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos.
Opinião Consultiva OC-10/89 de 14 de julho de 1989. Série A e
B Nº 10, pars. 35-45; CIDH, James
Terry Roach e Jay Pinkerton v. Estados Unidos, Res. 3/87, Caso
9647, 22 de setembro de
1987, RELATÓRIO ANUAL 1986-87, pars. 46-49, Rafael
Ferrer-Mazorra e Outros v. Estados Unidos, Relatório Nº 51/01,
Caso 9903, 4 de abril de 2001. Ver
Estatuto da CIDH em seu artigo 20. [17]
CIDH, Relatório Nº 95/98 (Chile), 9 de dezembro de 1998,
RELATÓRIO ANUAL 1998, par. 27. [18]
CIDH, Relatório Nº 38/99 (Argentina), 11 de março de 1999,
CIDH RELATÓRIO ANUAL 1998, par. 13. [19]
O artigo 29 da Convenção Americana estabelece: "Nenhuma
disposição da presente Convenção pode ser interpretada no sentido
de: d) excluir ou limitar o efeito que possam ter a Declaração
Americana de Direitos e Deveres do Homem e outros atos internacionais
da mesma natureza". [20]
O Governo do Uruguai sugeriu em sua resposta que o
peticionário não atuou de maneira oportuna.
Em sua resposta o Governo assinalou que a decisão do Tribunal
de Honra é recorrível com os recursos administrativos de revogação
e hierárquico em subsídio, interpostos perante o Ministério de
Defesa Nacional e o Poder Executivo, respectivamente.
O peticionário indicou em sua comunicação datada de
2 de maio de 1974 que "interpôs perante o Ministério de
Defesa Nacional um recurso de revogação contra a resolução No.
42.204 do Poder Executivo, solicitando que se lhe restituisse a condição
de Major do Exército aposentado,
prévia anulação da decisão do Tribunal de Honra ".
Informa que sua família convenceu-o do perigo que corria
ventilando estas questões, dado que estava instalada a ditadura em
Uruguai, e deixou de seguir o trâmite do recurso. O Governo afirma
que depois de esgotada a via administrativa, aquela decisão é recorrível
perante o Tribunal do Contencioso Administrativo, mediante ação de
nulidade, por ser contrário a uma regra de direito ou proferida com
desvio de poder. O Governo sustenta que o peticionário esperou
demasiado tempo para apresentar seu recurso ao Tribunal do Contencioso
Administrativo. O
peticionário indicou que o Uruguai retornou ao regime democrático de
governo em março de 1985 e que esperou até 1991 para apresentar seu
recurso ao Ministério de Defesa porque recuperou a confiança somente
depois das declarações feitas pelo Tte. Gral.® Hugo Medina (supra
par.16), mas o Ministério nunca respondeu a seu pedido. Por esta razão
interpôs um recurso perante o Tribunal do Contencioso-Administrativo
que decidiu que havia operado a caducidade da ação. Tendo em vista
que o peticionário foi julgado e condenado pelos militares em 1972,
antes da tomada do poder em 1973, a Comissão considera que a abstenção
do peticionário de apresentar recurso até que observasse um sinal de
mudança de atitude dos militares, como as declarações feitas pelo
General Medina, eram necessárias antes do peticionário tentar
esgotar os recursos internos.Cabe recordar que os militares uruguaios
não foram depostos do governo, mas entregaram o poder ao governo
civil em 1985. O peticionário, mediante uma carta escrita em 1995
assinala que "dez anos depois da restauração da democracia,
alguns morreram sem a satisfação de constatar que se lhes fizeram
justiça. Lamentável é que o atual governo do Uruguai, continue
defendendo os atropelos de uma ditadura infame, quando bastaria um
decreto para deixar sem efeito - no caso dos oficiais - aqueles
emitidos pelo ditador Bordaberry homologando as decisões dos pseudo
tribunais de honra". Neste caso a Comissão conclui que o retorno
formal a um governo democrático não é uma garantia suficiente para
garantir a existência de um recurso interno efetivo.
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