RELATÓRIO Nº 92/03

PETIÇÃO 0453/01

INADMISSIBILIDADE

ELÍAS SANTANA E OUTROS

VENEZUELA

23 de outubro de 2003

 

 

I.        INTRODUÇÃO

 

1.       Em 1º de julho de 2001, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (doravante denominada “a Comissão Interamericana", "a Comissão" ou "a CIDH”) recebeu uma petição apresentada por Cecilia Sosa Gómez contra a República Bolivariana da Venezuela (doravante denominada “o Estado” ou “o Estado venezuelano”) na  qual alega que, em virtude da  sentença 1.013 proferida pela  Sala Constitucional do Tribunal Supremo venezuelano em  12 de junho de 2001, o Estado violou seus direitos à: liberdade de pensamento e expressão (artigo 13), retificação ou resposta (artigo 14); igualdade perante à lei (artigo 24); garantias judiciais (artigo 8); propriedade privada (artigo 21(1); alcance das restrições (artigo 30); normas de interpretação, (artigo 29 (a) e (b)), todos consagrados na  Convenção Americana sobre Direitos Humanos (doravante denominada “Convenção Americana” ou “a Convenção”), em conjunção com as obrigações que figuram no  artigo 1(1) sobre a obrigação de respeitar os direitos e o artigo 2 sobre o dever de adotar disposições de direito interno da  mesma e o artigo 19 do Pacto de Direitos Civis e Políticos.   A senhora Cecilia Sosa anexou à sua petição listas de pessoas com nome, nacionalidade e assinatura que manifestaram sua adesão à denúncia apresentada pela  peticionária à CIDH.

 

2.       Em 16 de julho de 2001, a Comissão recebeu uma petição apresentada por Elias Santana, atuando em nome próprio e em carácter de representante da  Associação Civil “Queremos Elegir” juntamente com a senhora Marieta Hernández, rádio-difusora e colunista do diário Tal Cual e membro fundador desta Associação, e o advogado Héctor Faúndez Ledesma, colunista do jornal El Nacional e Presidente do Centro pela  Democracia e o Estado de Direito, em que denunciavam o Estado da Venezuela por violação, em relação à sentença Nº 1.013, das garantias judiciais (artigo 8); direito à liberdade de pensamento e expressão (artigo 13), direito de retificação ou resposta (artigo 14); direitos políticos (artigo 23(1) (a) e (c)); igualdade perante à Lei (artigo 24); proteção judicial (artigo 25); alcance das restrições (artigo 30); normas de interpretação, (artigo 29) todos consagrados na  Convenção Americana sobre Direitos Humanos (doravante denominada “Convenção Americana” ou “a Convenção”), em conjunção das obrigações que figuram no  artigo 1(1) sobre a obrigação de respeitar os direitos e o artigo 2 sobre o dever de adotar disposições de direito interno da  mesma.  Em 20 de julho de 2001, a Comissão, de conformidade com o disposto no  artigo 29(d) de seu Regulamento, decidiu acumular o expediente P-0434/2001 Cecilia Sosa e o expediente P-0453/2001 Elías Santana e concordou  em tramitá-los num mesmo processo P-0453/2001.

 

3.       Em 20 de julho de 2001, a CIDH recebeu uma petição em nome da  Associação civil não governamental “Bloque de Prensa Venezuelano”,[1] representada pelos  membros de sua Junta Diretora, senhores David Natera Febres, Andrés Mata Osorio e Juan Manuel Carmona Perera, que também atuam em seu carácter pessoal como editores de meios de comunicação, e Asdrubal Aguiar-Aranguren como representante legal, que denunciam o  Estado da Venezuela por violação, em relação a mesma sentença Nº 1.013, ao direito à libertade de pensamento e expressão (artigo 13), direito de retificação ou resposta (artigo 14); igualdade perante à Lei (artigo 24);  alcance das restrições (artigo 30); normas de interpretação, (artigo 29(a), (b), (c) e (d)) todos consagrados na  Convenção Americana, em conjunção com as obrigações que figuram no  artigo 1(1) sobre a obrigação de respeitar os direitos, e o artigo 2 sobre o dever de adotar disposições de direito interno da  mesma.  Em virtude do anterior, em 6 de agosto, a Comissão decidiu acumular esta petição (P0474/2001) e tramitá-la no mesmo expediente de Cecilia Sosa e Elías Santana no mesmo processo P-0453/2001 (doravante denominados, coletivamente, "peticionários").

 

4.       Por sua vez, o Estado argumentou que as petições não reúnem os requerimentos exigidos pelo  artigo 46(1)(d) da  Convenção Americana, motivo pelo qual  conforme o prescrito pelo  artigo 47(a), a Comissão deve declarar a inadmissibilidade da  petição. O Estado objetou a violação ao artigo 14 da  Convenção, em virtude de que,  em 11 de setembro de 2000, a Diretora da Rádio Nacional de Venezuela concedeu o direito de retificação ou resposta a Elías Santana, a qual ia ser transmitida através de três emissoras que pertencem a Rádio Nacional de Venezuela. Ao responder as petições, o Estado impugnou a diferença  entre as informações de carácter fáticas daquelas de opinião, arguindo que, no  presente caso, o objeto da demanda constitui uma simples opinião do Presidente das declarações prestadas  pelo senhor Santana ao jornal El Nacional. Com base nesta distinção o Estado replicou que o direito de retificação ou resposta somente procede contra as informações inexatas ou agravantes e não opera frente à opiniões. Por último, o Estado afirmou que a parte dispositiva da  sentença não viola o artigo 13 da  Convenção Americana.

 

5.       Após analisar as posições das partes, a Comissão concluiu que era competente para conhecer as petições apresentadas por alguns dos  peticionários e que estas eram inadmissíveis, à luz dos  artigos 46 e 47 da  Convenção Americana.

 

II.       TRÂMITE PERANTE A COMISSÃO

 

6.       Em 1º de julho de 2001, a Comissão recebeu uma petição apresentada por Cecilia Sosa Gómez na  qual denunciava o Estado Venezuelano pela  violação dos  artigos 13,14, 24, 8, 21(1), 30, 29(a) e (b), 1 e 2 da  Convenção Americana, que tramitou sob o número de expediente P-0434/2001. Em 16 de julho de 2001, a Comissão recebeu uma denúncia apresentada por Elias Santana em nome próprio e em seu caráter de Coordenador Geral da  Associação Civil “Queremos Elegir”, Marieta Hernández e Héctor Faúndez Ledesma, contra o Estado da Venezuela, pela  violação dos  artigos 8, 13, 14, 25, 23(a)(c), 24, 29 e 30 da  Convenção, a qual recebeu o número de expediente P-0453/2001. Ambas petições denunciam que, em 12 de junho de 2001, a Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça da Venezuela prolatou a sentença Nº 1.013 que, segundo os peticionários, formula a violação de vários direitos humanos consagrados na  Convenção.

 

7.       Em 20 de julho de 2001, a Comissão recebeu uma petição apresentada pela  associação civil não governamental “Bloque de Prensa Venezuelano” representada pelos  membros de sua Junta Diretora, Juan Manuel Carmona Perera, David Natera Febres, Andrés Mata Osorio e Asdrubal Aguiar Aranguren em seu carácter de representante legal, a qual tramitou sob o número de expediente P-0474/2001. Esta petição denuncia os mesmos fatos contidos na  petição P-0453/2001. Em 6 de agosto de 2001, a Comissão decidiu acumular o expediente P-0474/2001 ao expediente P-0453/2001. Nessa mesma data, comunicou aos  peticionários sua decisão e remeteu ao Estado para que, dentro do prazo de dois meses, apresentasse uma resposta.

 

8.       Em 21 de agosto de 2001, a Comissão recebeu informação adicional por parte dos  peticionários, que foi enviada ao Estado em 30 de agosto de 2001, assinalando o prazo de 30 dias para que apresentasse sua resposta.

 

9.       Em 12 de setembro de 2001, o Estado solicitou, e a Comissão concedeu, uma prorrogação de 30 dias para entregar sua resposta.  Em 8 de novembro de 2001, o Estado apresentou sua resposta, a qual foi remetida aos peticionários em 16 de novembro de 2001 para que dentro do prazo de 30 dias apresentassem suas observações.

 

10.     Em 8 de março de 2002, durante o 114º período de sessões da  Comissão Interamericana foi realizada uma audiência na qual ambas partes solicitaram à CIDH que se pronunciasse sobre a admissibilidade ou inadmissibilidade da  petição.

 

III.      ANTECEDENTES

 

11.     Em 27 de agosto de 2000, o Presidente da  República Bolivariana da Venezuela, Hugo Chávez Frías, manifestou-se a respeito de Elías Santana. Estas manifestações ocorreram no programa radiofônico “Alô, Presidente” que conduz o senhor Presidente da  República, Hugo Chávez Frías, todos os domingos através da Rádio Nacional de Venezuela.  A seguir está transcrita parcialmente a transmissão deste programa:

 

...aquí tem um chamado: “Sociedade civil disposta a desobedecer” –diz alguém– ah, Elías Santana. Esse é outro representante de um setor ínfimo da  sociedade civil.... Não são vocês a sociedade civil senhores, não se equivoquem de perspectiva, porque seria nefasto que vocês  perdessem a perspectiva.  Que sociedade civil? A sociedade civil, em sua maioria, repito, é revolucionária, e estão impulsionando este processo.

 

...Bem.. segundo o jornal El Nacional de hoje, diz o senhor Elías Santana, em nome de “Queremos Elegir” um pequeno grupo, tem direito a participar e sempre participou, mas não creiam que agora estão esponjados e representam a sociedade civil... Não, um pequeno grupo, bem-vindo, com todo nosso respeito, os ouvimos, os escutamos, etc...

 

...”Sociedade civil disposta a desobedecer” –diz  o jornal El Nacional atribuindo a Elías Santana– “se é excluída da  designação de autoridades do Poder Cidadão”. Isto é como uma ameaça, soa assim como uma ameaça, vou a ler textualmente porque tenho que puntuar, isto é muito importante, isto é parte do processo revolucionário e de transição que estamos vivendo: “Se a Assembléia dá um passo –diz Elías Santana- para escolher a dedo o novo Procurador-Geral, o Defensor Público e os membros do Tribunal Supremo de Justiça, nós estaremos esperando para enfrentá-la e agora se sabe como se come a sociedade civil” ... Outra vez a expressão de “come”, Como se come a sociedade civil?.  Similar à expressão de cavalheiro que me referia.  É como uma ameaça Senhor Santana, agora além daquilo que você acredita, do que você diga, tem direito a dizê-lo, eu vou responder em nome da  outra parte da  sociedade civil que é a grande maioria. Resulta Senhor Santana, que a sociedade civil, já disse, pronunciou-se aqui em sete repetidas vezes: 8 de novembro, 6 de dezembro, 25 de abril, 25 de julho, 15 de dezembro, seis vezes e 30 de julho. Quem votou aqui? Qual sociedade votou? Não foi a sociedade civil? ...

 

...a sociedade civil é a  imensa maioria dos  venezuelanos e está de acordo com este processo...”

 

...Se a Assembléia Nacional decidisse amanhã ou depois de amanhã que é necessário substituir o Procurador Geral da  República ou o Controlador Geral da  República ou o Conselho Nacional Eleitoral, pois a Assembléia Nacional tem faculdade herdada pelo processo Constituinte e a soberania popular para fazê-lo. Aquele que não está de acordo tem direito a expressar sua vontade, como o fizeram, mas nós que defendemos o processo, que o impulsionamos também estamos, não com o direito, com a obrigação de esclarecer a nosso povo como são as coisas e pôr as coisas em seu lugar. Assim que senhor Santana, também lhe respondo, o estou chamando para a batalha, senhor Santana. Gostaria de chamá-lo para a batalha, venha, venha, eu gosto. Isto desta ameaça de que você vai... será sabido e vai enfrentá-la com a sociedade civil, bem, senhor Santana vamos fazer uma coisa, você chama a sua sociedade civil para uma esquina e eu chamo a minha para a outra esquina. Esta não é a idéia, porque eu acredito que já basta de enfrentamentos, mas eu não estou disposto a abandonar o enfrentamento se vocês continuarem buscando o conflito e ameaçando com enfrentamento...”

 

12.     Com base nestas declarações, Elías Santana, locutor e condutor do programa radiofônico “Santana Total” e Coordenador Geral da  Associação Civil “Queremos Elegir” dirigiu-se em 29 de agosto de 2000 à Dra.Teresa Maniglia, em seu carácter de Diretora do Instituto Autônomo Rádio Nacional de Venezuela, para solicitar o direito de retificação ou resposta a fim de responder às palavras do Presidente em seu programa em relação à sua pessoa.

 

13.     Em 3 de setembro de 2000, o Presidente Hugo Chávez Frías, novamente mediante seu programa “Alô, Presidente”, efetuou manifestações que estão transcritas parcialmente a seguir:

 

...Aqui tenho recebido algumas cartas de alguns cidadãos que pedem um direito de réplica para mim, dirigindo-se a mim, ao programa Alô Presidente. Bem, não é essa a idéia.  Eu já pedi réplica, mas quando o fiz a alguns meios não o faço ao programa tal ou qual, e sim ao meio; se tenho uma queixa a um canal de televisão sobre o que foi dito, escrito ou projetado, como governo, como cidadão, tenho necessidade de fazer uma  réplica, bem, deve pedi-la ao meio de comunicação, não ao Programa Alô Presidente.  Não é aqui, porque imaginem vocês . Assim que os cidadãos que se sintam ofendidos, de todos modos eu vou repetir: a sociedade civil- a alguém que disse por aí- eu não vou cair em debates aqui, este não é um programa para abrir debates, em primeiro lugar eu tampouco vou continuar polemizando com ninguém. Não tenho nada contra ninguém em particular, somente defendo os pontos de vista da  revolução e alguém que disse  por aí, cujo nome não me lembro neste instante, que na  Casona se comia a sociedade civil com assado pois defendi a semana passada, o que era a La Casona  e a família Chávez Rodríguez e o que se faz aí quando vamos  trabalhar. Agora  se essa pessoa se sente afetada e quer um direito, eu não vou debater com ninguém em particular, venha aqui na Rádio Nacional e aqui está Teresa Maniglia e diga o que tem para dizer....

 

14.     Em  11 de setembro de 2000, Teresa Maniglia, Diretora do Instituto Autônomo Rádio Nacional de Venezuela, respondeu à solicitação de retificação ou resposta de Elías Santana outorgando este direito através de suas três emissoras Antena Informativa 1050 AM, Antena Popular 630 AM e Canal Clásico 91,1 FM. Santana controverteu esta concessão defendendo  que “1. o programa ‘Alô, Presidente’ é transmitido não somente pelas três estações de rádio referidas, mas por Venezolana de Televisión; eventualmente por Globovisión; e ademais, gera grande expectativa e concentra a atenção da maioria dos  meios de comunicação social em seus diferentes formatos. 2. O programa radiofônico “Alô, Presidente” goza de um altíssimo rating ou índice de audiência, tal e como assinalado pelo próprio condutor do programa em sua emissão em 3 de setembro de 2000, quando afirmou que o mesmo  escuta as pessoas que estão nas ruas no momento da  transmissão; a gente em Tacupido, estado Guárico, em Cumaná, e em San Cristóbal; e em definitiva, (...) as mulheres, donas de casa que estão escutando, milhares, milhões o programa esta hora”.(sic)

 

15.             Diante desta objeção e almejando reiterar sua solicitação de exercer seu direito de retificação ou resposta, Elías Santana interpôs em 9 de outubro de 2000 um amparo constitucional contra o Presidente e demais Magistrados da  Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça.

 

16.     Em 12 de junho de 2001, a Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça da  República Bolivariana da Venezuela resolveu, mediante a sentença 1.013, indeferir in limine litis o recurso de amparo constitucional interposto pelo  senhor Elías Santana atuando em nome próprio e em seu carácter de Coordenador Geral da  Associação Civil Queremos Elegir, ao invocar o direito de retificação ou resposta. A Sala Constitucional resolveu indeferir o recurso de amparo porque considerou que, de conformidade com o disposto  pela  lei venezuelana, já se havia outorgado ao senhor Santana seu direito de retificação ou resposta.[2]

 

17.     Como argumentos interpretativos que fundamentaram a sentença 1.013, a Sala Constitucional, e os quais os peticionários contravieram, entre outros aspectos, assinalam que “nasce a nível constitucional para as pessoas agravadas pela  informação, um direito de réplica (resposta) e de retificação; mas tal direito não o tem nem os meios, nem aqueles que os manifestaram, visto que, o direito à réplica e retificação foi concedido aquele que recebeu a  informação e não aquele que a forneceu”. [...] “De acordo com o artigo 9 da  Lei de Exercício do Jornalismo, são os jornalistas quem têm direito à réplica ou retificação, mas eles não o têm no sentido mencionado neste artigo”.[3] [...] “A razão para isto é que o meio de difusão, sempre pode contestar (replicar) ou retificar a notícia inexata ou agravante que seus  jornalistas ou colaboradores tenham difundido em outro meio”. [...] [C]onsidera a Sala, que o direito à réplica e à retificação não tem nem os meios, nem aqueles que habitualmente exercem o jornalismo, nem aqueles que mantêm as colunas ou programas, nem aqueles que remetem material que suscitam uma reação oposta. Se trata de um direito concedido aqueles que se vêem ofendidos pela  informação dos  meios, e que não têm canais públicos para contestar ou dar sua versão da  notícia”.

 

18.     A Sala Constitucional do Tribunal Supremo indicou que a sentença 1.013 “será doutrina vinculante na  interpretação dos  artigos 57 e 58 da  Carta Fundamental” da  República Bolivariana da Venezuela.[4] No fundamento da mencionada sentença, o Tribunal Supremo assinalou, em relação aos artigos 57 e 58 da  Constituição venezuelana, entre outras coisas, que “os meios de comunicação, ao permitir as pessoas estarem informadas, satisfazendo seu direito, quanto à essa informação ou notícia atuam em dois planos: um geral, onde devem emitir informação veraz, oportuna e imparcial, onde se evita a difusão da notícia falsa, ou manipulada com meias verdades; da desinformação que nega a oportunidade de conhecer a realidade da  notícia; ou da  conjectura ou informação parcializada para conseguir um fim  específico contra algo ou alguém. Este direito constitucional, a favor de toda pessoa, cria para os  meios a obrigação de informação veraz, oportuna e imparcial, que dá direito à réplica ou retificação, o qual pode ser exercido mediante um amparo, se a situação jurídica da  pessoa se vê afetada pela  informação inexata (se não está referido a ela), que lhe impeça receber e difundir informações ou idéias que lhe permitam exercer corretamente seu direito à liberdade de pensamento ou expressão”.

 

19.     Em relação ao conteúdo  da  informação, a Sala Constitucional considerou que “também é um atentado à informação veraz e imparcial ter um número majoritário de colunistas de uma só tendência ideológica, a menos que o meio em seus editoriais ou por seus porta-vozes, mantenha e se identifique com uma linha de opinião congruente com a dos  colunistas e colaboradores”.

 

IV.      POSIÇÃO DAS PARTES

 

A.      Os peticionários

 

1.       Cecilia Sosa P-0434/2001

 

20.     De acordo com a petição apresentada à CIDH em 5 de julho de 2001 por Cecília Sosa, a Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça proferiu, em 12 de junho de 2001,  a Sentença Nº 1.013, que restringe e limita os direitos consagrados nos  artigos 13, 14, 24, 8(1), 21(1), 30, 29(a)(b) em relação aos artigos 1 e 2 da  Convenção Americana.

 

21.     A peticionária assinalou que a denúncia foi apresentada na condição de vítima, como cidadã venezuelana e em seu caráter de colunista de um jornal de circulação nacional e em nome dos  venezuelanos e habitantes da  República Bolivariana da Venezuela afetados pela  sentença, “que podem ser individualizados e identificados e aderiram a esta denúncia”.[5] Afirmou que a Sentença Nº 1.013 restringe o direito de todos os habitantes do território venezuelano a receber qualquer informação, a ter acesso aos pensamentos expressados pelos  demais, a exercer o direito de retificação ou resposta, a não ser discriminados e a gozar de garantias judiciais apropriadas.

 

22.     A peticionária manifestou que a sentença 1.013, em vez de estar limitada a resolver a ação interposta pelo Sr. Santana, interpretou os artigos 57 e 58 da  Constituição da Venezuela, o que leva a consequências jurídicas de importancia para todos os tribunais e juízes da  República, pois o artigo 335 da  Constituição venezuelana assinala que as interpretações estabelecidas pela Sala Constitucional sobre o conteúdo ou alcance das normas e princípios constitucionais são vinculantes para as outras Salas do Tribunal Supremo de Justiça e demais tribunais. A peticionária alega que, embora a sentença seja uma decisão in abstracto, seus efeitos afetam todos os cidadãos submetidos à jurisdição venezuelana.

 

          23.     Quanto ao artigo 30 da  Convenção Americana, a peticionária alega que o Estado, ao interpretar o alcance dos  artigos 57 e 58 da  Constituição venezuelana, incorreu em violação ao ignorar a força obrigatória e vinculante das disposições contidas na  Convenção Americana em virtude do artigo 23 da  Constituição venezuelana.[6]        

         

24.     Com respeito ao artigo 13 da  Convenção Americana (liberdade de pensamento e expressão), a peticionária alega que ao regulamentar os artigos 57 e 58 da  Constituição venezuelana, a Sala do Tribunal Supremo incorreu na violação tanto do direito interno (artigo 23 supra) como do estipulado na  Convenção.  Assinala a peticionária que a exigibilidade da  informação oportuna, veraz e imparcial contemplada no  artigo 58 da  Constituição venezuelana e interpretada pela  Sala do Tribunal Superior, são violatórias dos padrões internacionais sobre liberdade de expressão do sistema interamericano. Afirma a peticionária que a interpretação do Tribunal Supremo estabelece controles particulares sobre os meios de comunicação social destinados a impedir a comunicação e circulação de idéias e opiniões, o que constitui uma censura prévia, em contravenção do disposto no  artigo 13 da  Convenção. A peticionária alega que a sentença “discrimina quando considera que é um atentado à informação veraz e imparcial ter um número majoritário de colunistas de uma só tendência ideológica, a menos que o meio em seus editoriais ou através dos seus porta-vozes, mantenha e se identifique com uma linha de opinião congruente com a dos  colunistas e colaboradores”.

 

25.     A respeito do artigo 14 da  Convenção Americana (direito de retificação ou resposta) em concordância com os artigos 1(1) e 2 da  Convenção Americana, a peticionária alega que o Estado incorreu em violação ao permitir que o Tribunal Superior decida que “não tem direito à réplica nem os meios, nem aqueles que habitualmente exercem o jornalismo, nem aqueles que mantêm as colunas ou programas, nem aqueles que enviam material que  suscitam uma reação oposta no meio distinto àquele que atuam”.

 

26.     A peticionária alega que, mediante a decisão do Tribunal Supremo, o Estado incorreu em violação ao direito protegido pelo  artigo 24 da  Convenção Americana (igualdade perante à lei) dado que a Sentença 1.013 discrimina e não proporciona igualdade de proteção perante à lei em relação ao exercício do direito de retificação ou resposta aos diretores e editores de meios de comunicação, nem aqueles que habitualmente exercem o jornalismo, nem aqueles que mantêm as colunas ou programas.

 

27.     Em referência às alegações por violação do artigo 8 (garantias judiciais) da  Convenção Americana, a peticionária indica que o Estado incorreu em violação das garantias judiciais do devido processo legal a ser ouvida.  A peticionária alega que, mediante a Sentença do Tribunal Supremo, foi regulamentado o direito à liberdade de pensamento e expressão e o  direito à retificação ou resposta, negando a ela e ao  resto dos  venezuelanos a oportunidade de ser ouvidos perante tribunais competentes.

 

28.     A peticionária manifestou que a Convenção, em seu artigo 21, assegura à toda pessoa o uso e gozo de seus bens. Contudo, alega a peticionária que a Sentença criou uma nova forma de subordinação ou limitação a este direito, que constitui uma discriminação contra os  proprietários de meios de comunicação social. Segundo a peticionária, esta discriminação se materializa na exigência que impõe a Sentença aos meios de comunicação de manter um equilíbrio ideológico entre seus colunistas, para que sua informação não seja considerada um atentado à informação veraz e imparcial. Sendo assim, a peticionária alega violação do artigo 21 da  Convenção Americana (direito à propriedade privada) e uma consagração da  censura prévia por parte do Estado. 

 

29.     A peticionária alega que o Estado venezuelano incorreu na violação do artigo 29 (normas de interpretação) da  Convenção Americana, dado que a sentença 1.013, decretada pelo  Tribunal Supremo de Justiça, limitou em maior medida o gozo e exercício dos  direitos e liberdades reconhecidos nos  artigos 13 e 14 da  Convenção Americana.

 

30.     Por último, quanto à admissibilidade, a peticionária argumenta que os recursos internos foram esgotados, pois não há outro recurso contra as decisões adotadas pela  Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça, motivo pelo qual a petição cumpre com todos os extremos exigidos pelo  artigo 46 da  Convenção Americana.

 

2.       Elías Santana P-0453/2001

 

31.     Em 16 de julho de 2001, a CIDH  recebeu uma petição apresentada po Elias Santana, atuando em nome próprio e em seu carácter de Coordenador Geral da  associação civil “Queremos Elegir”, juntamente com senhora Marieta Hernández, rádio-difusora, colunista do jornal Tal Cual e membra fundadora da  associação civil Queremos Elegir, e o senhor Héctor Faúndez Ledesma, advogado e colunista do jornal El Nacional. Nesta petição se alega que, através da  sentença 1.013 decretada em 12 de junho de 2001 pelo  Tribunal Supremo de Justiça, Sala Constitucional, o Estado restringiu e limitou seus direitos consagrados nos  artigos 13, 14, 23, 24, 8(1), 25, 30, 29(a)(b) em relação aos artigos 1 e 2 da  Convenção Americana.

 

32.     Conforme a denúncia em estudo, em 27 de agosto de 2000, na  emissão do programa “Alô, Presidente”, transmitido através das distintas frequências da Rádio Nacional de Venezuela e de Venezuelana de Televisión, ambos de propriedade do Estado, o Presidente da  República, Hugo Chávez Frías, supostamente referiu-se de modo ofensivo a Elías Santana e a Associação civil Queremos Elegir,[7] por declarações que este último havia feito no  jornal El Nacional publicadas em 27 de agosto de 2001.

 

33.     Segundo os peticionários, em 27 e 29 de agosto de 2000 e 3 de setembro de 2000, o senhor Santana solicitou, tanto ao condutor do programa, como à Diretora do Instituto Autônomo Rádio Nacional da Venezuela, que lhe permitisse exercer seu direito de retificação ou resposta, previsto no  artigo 58 da  Constituição da  República Bolivariana da Venezuela. Em 3 de setembro de 2000, o Presidente da  República, durante seu programa “Alô, Presidente”, não concedeu o direito de retificação ou resposta solicitado por Elias Santana, manifestando que não correspondia a esse espaço de rádio e televisão outorgar o direito de retificação ou resposta solicitado, já que essa decisão correspondia à Diretora do Instituto Autônomo Rádio Nacional da Venezuela. Os peticionários manifestaram que, em 11 de setembro de 2000, a Diretora do Instituto Autônomo Rádio Nacional da Venezuela informou a Elías Santana que sua retificação ou resposta seria transmitida no dia a ser determinado pela Rádio Nacional da Venezuela, em um espaço distinto do programa em que ocorreu a informação que originou a solicitação de retificação ou resposta. O senhor Santana objetou contra esta decisão, motivo pelo qual, em 9 de outubro de 2000, interpôs perante à Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça um recurso de amparo constitucional, invocando o direito de retificação ou resposta. Em 12 de junho de 2000, a Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça de Venezuela prolatou sua sentença Nº 1.013.

 

34.     Os peticionários alegam que a sentença Nº 1.013 exclui os comunicadores sociais, locutores e colunistas do direito de retificação ou de resposta. Também alegam que o recurso interposto por Elias Santana não foi conhecido por um tribunal independente e imparcial, pois o mesmo estava composto por vários magistrados cujas nomeações haviam sido objetadas pelo  senhor Santana e pela  Associação civil “Queremos Elegir”, por não cumprir com os requisitos assinalados pela  Constituição. Afirmam que o recurso de amparo não foi resolvido dentro de um prazo razoável, já que o mesmo teve que ser resolvido num prazo não maior de 96 horas, e segundo o artigo 27 da  Constituição teve que ser tramitado rapidamente “... preferencialmente sobre qualquer outro assunto”; porém, o recurso foi resolvido oito meses depois e sem ter celebrado audiência de parte. Os peticionários também afirmam que o recurso de amparo foi decidido in limine litis, sem audiência das partes e sem escutar as alegações.

 

3.       Asdrubal Aguiar Aranguren e outros, P-0474/2001

 

35.     Segundo a petição recebida pela  CIDH em 20 de julho de 2001, apresentada pelo  Bloque de Prensa Venezuelano, representado por Juan Manuel Carmona Perera, David Natera Febres, Andrés Mata Osorio e Asdrubal Aguiar-Aranguren em seu caráter de representante legal, a Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça da Venezuela prolatou, em 12 de junho de 2001, uma sentença de amparo em única instância e com efeito de coisa julgada, que viola, em sua parte interpretativa, a liberdade de expressão do pensamento, o direito à informação, o direito à propriedade privada e à igualdade, entre outras obrigações.

 

36.     Os peticionários alegam que a Sentença Nº 1.013 constitui uma violação flagrante e concorrente por parte da Venezuela e do Poder Judicial, dos  artigos 1(1), 2, 13, 14, 24, 29(a)(b)(c)(d) e 30 da  Convenção Americana, em detrimento direto e com efeito jurídico da  atividade de  comunicação- liberdade de expressão e direito à informação- e da  gestão empresarial livre- direito de uso e gozo livre dos  bens privados- dos  donos, editores e diretores dos  meios da  imprensa escrita que, a título pessoal e na qualidade de tais, fazem  parte do “Bloque de Imprensa Venezuelano” e de um modo específico de David Natera Febres, Andres Mata Osorio e Juan Manuel Carmona Perera. Os peticionários apresentam a mesma linha de argumento das petições antes mencionadas. Entre alguns dos  argumentos, os peticionários alegam que a decisão da Sala Constitucional do Tribunal Supremo viola os princípios consagrados nos  artigos 14(1) e 24 da  Convenção Americana, dado que interpreta o direito de retificação ou resposta de forma discriminatória.  A decisão, indicam os peticionários, é excludente de um grupo determinado da  sociedade civil por razão de sua profissão ou por razão de suas atividades em conexão com os meios de comunicação. 

 

37.     Os peticionários alegam que a Sentença Nº 1.013 restringe e limita o direito à liberdade de expressão e o direito de retificação ou resposta. Afirmam que a lei é a única via para regulamentar ou restringir os direitos e não a via interpretativa ou mediante exercício jurisprudencial como pretendeu fazer a Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça da Venezuela.

 

B.       O Estado

 

38.     Segundo o Estado, as petições não reúnem os  requerimentos exigidos pelo  artigo 46(1)(d) da  Convenção Americana, motivo pelo qual, conforme o prescrito pelo  artigo 47(a), a Comissão deve declarar a inadmissibilidade da  petição.

 

39.     O Estado nega a violação do artigo 14 da  Convenção, pois em 11 de setembro de 2000 a Diretora de Rádio Nacional de Venezuela concedeu o direito de retificação ou resposta a Elías Santana, a qual iria ser transmitida através de três emissoras que pertencem a Rádio Nacional de Venezuela. O Estado alega que foi o senhor Santana quem se negou que sua opinião fosse difundida em tais condições, por considerar que a resposta deveria ser difundida no  mesmo programa “Alô, Presidente”, no  mesmo horário e com a mesma cobertura, razão pela qual interpôs uma ação de amparo perante o Tribunal Supremo de Justiça.

 

40.     O Estado argumenta que a interpretação dos  artigos 57 e 58 da  Constituição da  República Bolivariana de Venezuela feita pela Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça na  Sentença Nº 1.013 não viola as normas de interpretação da  Convenção Americana, pois o objeto de interpretação são as disposições previstas na  Constituição da Venezuela e não as disposições da  Convenção.

 

41.     O Estado alegou também que o condutor do programa “Alô Presidente”, ao  fazer um comentário crítico sobre o expressado por Elias Santana no  jornal El Nacional de 27 de agosto de 2000, limitou-se a exercer sua liberdade de expressão. O Estado explicou que foi um exercício mais de desacordo político em um ordenamento democrático.

 

42.     O Estado alegou que é necessário fazer a diferença entre o que são as informações das meras opiniões. Afirmou que, no  presente caso, se tratava de uma simples opinião do Presidente das declarações prestadas pelo  senhor Santana ao jornal El Nacional. O Estado mencionou ademais que a Sentença Nº 1.013 reitera uma das posições mais consolidadas na  doutrina e a jurisprudência internacionais, quanto ao direito de retificação ou resposta que somente  procede contra as informações inexatas ou ofensivas e não opera frente à opiniões.

 

43.     O Estado também mencionou que a Sala Constitucional, ao estabelecer uma doutrina vinculante da  interpretação dos  artigos 57 e 58 da  Constituição venezuelana, realizou um trabalho didático do alcance e interpretação dos  direitos consagrados nestes artigos, e fez uso do “direito judicial”, sem que tenha legislado, posto que utilizou  as faculdades conferidas pelo artigo 335 da  Constituição[8]. O Estado argumenta que tampouco foi violado o artigo 29 da  Convenção Americana, visto que este artigo se refere à interpretação das normas reguladas na  Convenção.

 

44.     O Estado alegou que a Sentença Nº 1.013, contrariamente ao manifestado pelos  distintos peticionários, não atenta contra a liberdade de pensamento e expressão, mas sim que se esmera em diferenciar detalhadamente o conteúdo e alcance dos dois artigos da  Constituição venezuelana que consagram os direitos enunciados.

 

45.     Com respeito ao tratamento discriminatório dos  jornalistas referente ao direito de retificação ou resposta, o Estado manifestou que a Sentença Nº 1.013 se referia especificamente à  condição de pessoa notória do jornalista Santana, que, no entender da   Sala, dispõe de uma ampla possibilidade de acesso a outros meios de comunicação para fazer efetivo seu direito de retificação ou resposta.

 

46.     Por último, o Estado concluiu que a Sentença Nº 1.013 prolatada pela  Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça não é contrária a nenhum dos  direitos protegidos pela  Convenção Americana, razão pela qual solicitou que a petição fosse declarada inadmissível.

 

V.      ANÁLISE

 

1.       Competência da  Comissão ratione pessoae, ratione materiae, ratione       temporis e ratione loci

 

a.                  Ratione loci

 

47.     A Comissão tem competência ratione loci porque a petição sob estudo assinala que as supostas vítimas estavam sujeitas à jurisdição do Estado venezuelano na época em que os fatos aduzidos ocorrem.  A Venezuela é um Estado membro da  Organização dos  Estados Americanos desde 1948, ano em que ratificou a Carta da  OEA, e está sujeita à competência da  Comissão em virtude do estipulado pela  Convenção Americana desde 9 de agosto de 1977, data em que foi depositado o  instrumento de ratificação respectivo.

 

b.                 Ratione temporis

 

48.     A informação que antecede também é pertinente com respeito à afirmação de que a Comissão possui competência ratione temporis, dado que os fatos apresentados sucederam depois da entrada em vigor da  Convenção Americana para a Venezuela.

 

c.                  Ratione pessoae

 

49.     Em relação a legitimidade processual, a Comissão alega que, em geral, sua competência no  trâmite de casos individuais se refere a fatos que entranham os direitos de uma pessoa ou pessoas específicas.  As diferentes petições mencionam como supostas vítimas a pessoas individuais, a respeito das quais a Venezuela se comprometeu a respeitar e garantir os direitos consagrados na  Convenção Americana.  Portanto, a Comissão tem competência ratione pessoae para examinar a petição a respeito dos senhores Elías Santana, Marieta Hernández, Héctor Faúndez Ledesma, Cecilia Sosa, Juan Manuel Carmona Perera, David Natera Febres, Andrés Mata Osorio e Asdrubal Aguiar- Aranguren.

 

50.     A Comissão carece de competência ratio pessoae para examinar as alegadas violações à pessoa jurídica Associação “Queremos Elegir” ou da  associação civil não-governamental “Bloque de Imprensa Venezuelana”, em virtude do disposto no  artigo 1(2) da Convenção Americana e de conformidade com o artigo 46 do mesmo instrumento.  A jurisprudência da  Comissão determina de forma constante que as petições apresentadas perante à mesma que tenham sido objeto de litígio perante os tribunais nacionais em nome de pessoas jurídicas, e não de vítimas individuais, não são admissíveis,[9] porque a Comissão carece de competência ratione pessoae para examinar denúncias referentes aos direitos destas.  A Comissão também entende que, em princípio, as associações jurídicas não podem ser consideradas vítimas de atos de interferência com os direitos dos  membros de cada uma destas entidades, a menos que provem que os direitos de cada um de seus membros, identificados em concordância com o artigo 46(1)(d) da  Convenção Americana, tenham sido afetados diretamente.[10] Isto não foi formulado  nos  recursos judiciais interpostos internamente para defender os interesses dos  membros de ambas entidades.[11]

 

51.     Com relação às pessoas que aderiram à petição apresentada pela  senhora Sosa, a CIDH conclui que estas não reúnem os requerimentos exigidos pelo  artigo 46 da  Convenção Americana.

 

52.     Também é inadmissível a denúncia quanto ao alcance de todos os venezuelanos e habitantes da  República Bolivariana de Venezuela em geral invocados na  petição apresentada pela  senhora Sosa. Esta petição deve ser declarada inadmissível, de conformidade com o artigo 47 da  Convenção Americana, considerando que a petição constitui uma actio popularis apresentada em nome de um grupo não determinado de pessoas.

 

53.     O artigo 44 da  Convenção Americana, que trata da  competência da  Comissão, estabelece que “qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou entidade não governamental legalmente reconhecida em um ou mais Estados membros da  Organização, pode presentar perante à Comissão petições que contenham denúncias ou queixas de violação desta Convenção por um Estado parte”.

 

54.     Diferentemente de outros sistemas de proteção de direitos humanos, o Sistema Interamericano permite a diversos tipos de peticionários apresentar petições em nome de vítimas. Com efeito, a terminologia do artigo 44 é muito aberta, permitindo a qualquer pessoa ou grupo de pessoas, ou entidade não-governamental legalmente reconhecida em um ou mais Estados membros da  Organização, apresentar à Comissão petições que contenham  denúncias ou queixas de violação desta Convenção por um Estado parte, sem exigir, como o requer a prática do sistema europeu ou do Comitê sobre Direitos Humanos das Nações Unidas, que sejam vítimas como tal, ou seja, ter um interesse pessoal, direto ou indireto na  adjudicação de uma petição. Tampouco exige a autorização da  vítima ou que os peticionários apresentem  poderes de representação legal das supostas vítimas.[12]

 

55.     Entretanto, não se deve entender que a liberalidade do sistema interamericano neste aspecto possa admitir a interposição de uma ação in abstracto perante à Comissão.[13] A jurisprudência desta Comissão sempre seguiu o critério de interpretação do artigo 44 da  Convenção Americana requerendo que, para que uma petição seja admissível, devem existir vítimas concretas, individualizadas e determinadas[14], não sendo admissíveis petições realizadas “actio popularis”,[15] isto é, em nome de todo o povo de um país, critério que resulta aplicável ao presente caso.

 

56.     Analisando a jurisprudência existente na  Comissão sobre a aplicação do artigo 44 da  Convenção, pode-se verificar que a norma foi interpretada no  sentido de que a competência ratio pessoae, no  trâmite de petições individuais, refere-se a fatos que estão relacionados aos direitos de uma pessoa ou pessoas específicas. A Comissão considera a  petição 12.404 (Peru) uma denúncia na qual a Defensoria Pública alegava atuar em representação em abstrato, em nome do coletivo de mulheres votantes em potencial, na forma de actio popularis. Cabe destacar que esta petição foi admitida por esta Comissão somente porque aquelas vítimas estavam devidamente individualizadas, identificadas e determinadas conforme a jurisprudência do sistema interamericano.[16]

 

57.     No  relatório Nº 48/96, sobre um caso de Costa Rica antes citado, a Comissão considerou que:

 

(...) Um indivíduo não pode instituir uma actio popularis e impugnar uma lei sem estabelecer certa legitimidade ativa que justifique seu recurso à Comissão. A peticionária deve apresentar-se como vítima de uma violação da  Convenção ou deve comparecer perante à Comissão como representante de uma vítima putativa de uma violação da  Convenção por um Estado parte.[17]

 

58.     No  mesmo sentido, a Comissão pronunciou-se no  relatório do caso de  María Eugenia Morais de Sierra, da Guatemala,  observando que:

 

          (...) para iniciar os procedimentos estabelecidos nos  artigos 48 e 50 da  Convenção Americana, a Comissão requer uma petição que contenha uma denúncia de uma violação concreta a respeito de uma pessoa determinada.[18]

 

59.     O fato de que sejam inadmissíveis as petições apresentadas como actiones populares não implica que o peticionário deva sempre identificar cada vítima em nome da  qual apresenta uma petição. Com efeito, deve-se notar que a Comissão admitiu petições em nome de grupos de vítimas quando o grupo era especifico e definido e os indivíduos que o compunham eram determinados, como por exemplo,  no  caso de membros de uma comunidade definida.[19]

 

60.     Da análise da  petição apresentada pela  senhora Sosa se observa que esta  foi apresentada, em parte, em nome dos cidadãos venezuelanos, alegando que foi violado o direito de liberdade de expressão de todos  os venezuelanos e habitantes da  República Bolivariana da Venezuela. Portanto, a CIDH deve declarar inadmissível nesta parte a denúncia relativa a todos os cidadãos e habitantes da  República Bolivariana da Venezuela, pois se trata de uma representação em abstrato, ou similar a uma actio popularis, sendo que não  individualizaram as vítimas concretas e determinadas. Tendo em vista a  natureza dos  fatos descritos na  petição, tampouco é possível identificar um grupo definido de vítimas, pois a peticionária se referiu a todos os cidadãos e habitantes da Venezuela.

 

d.       Ratione materiae

 

61.     A Comissão é competente ratione materiae para examinar as reclamações que estão excluidos ratione pessoae, porque as supostas reclamações apresentadas em relação às demandas dos  senhores Santana, Marieta Hernández, Héctor Faúndez Ledesma, Cecilia Sosa, Juan Manuel Carmona Perera, David Natera Febres, Andrés Mata Osorio e Asdrubal Aguiar-Aranguren implicam em denúncias por violações a direitos protegidos na  Convenção Americana.

 

 

2.      A questão relacionada com a admissibilidade neste caso

 

62.     O artigo 47 da Convenção Americana dispõe que a Comissão deverá considerar inadmissível uma petição quando:

 

a)   não preencher algum dos requisitos estabelecidos no artigo 46;

b)   não expuser fatos que caracterizem violação dos direitos garantidos por esta Convenção;

c)   pela exposição do próprio peticionário ou do Estado, for manifestamente infundada a petição ou comunicação ou for evidente sua total improcedência; ou

d)   for substancialmente reprodução de petição ou comunicação anterior, já examinada pela Comissão ou por outro organismo internacional.

 

 

63.     A letra “b” do citado artigo refere-se aos casos em que não expõe fatos que tendam a caracterizar uma violação dos  direitos garantidos na  Convenção Americana, ainda que estejam reunidos os requisitos do artigo 46.   Em virtude do artigo 47(b), a CIDH deve realizar uma avaliação  prima facie ao decidir se a petição aqui analisada expõe  fatos que tendam a caracterizar uma violação aos direitos garantidos pela  Convenção Americana. Tal exame é uma análise sumária que não implica um prejuízo ou um avanço de opinião sobre o mérito. A Comissão passa a analisar a caracterização das violações denunciadas. Para uma melhor compreensão, separamos o caso de Elías Santana dos  demais peticionários.

 

Elías Santana

 

64.     A seguir, a CIDH analisará se as alegações do peticionário caracterizam uma violação aos direitos garantidos pela  Convenção Americana à luz de dois argumentos apresentados pelo  Estado: o primeiro, vinculado ao fato de que o direito de retificação ou resposta foi concedido ao peticionário na  jurisdição interna; o segundo, que o direito de retificação ou resposta invocado era improcedente, pois o senhor Santana tentou replicar opiniões e  não afirmações fáticas.

 

65.     A CIDH entende que seria desnecessário analisar as duas questões: se o direito de retificação ou resposta foi concedido na  jurisdição interna conforme os parâmetros convencionais, e se tal direito procedia ou não em função das manifestações contra as quais tentou-se replicar. Sem prejuízo disto, a CIDH manifesta-se sobre ambas questões que foram debatidas pelas partes durante o trâmite perante à Comissão.

 

66.     A Comissão não pode deixar de notar a controvérsia que suscita o alcance do direito de retificação ou resposta em relação ao direito à liberdade de expressão. Entre os argumentos enfrentados, por um lado estão aqueles que opinam que o direito de retificação ou resposta limita a liberdade de expressão ao impor aos meios de comunicação difundir informação de forma gratuita que não necessariamente está conforme a linha editorial do meio, em contraposição estão aqueles que consideram que o direito de retificação ou resposta reforça a liberdade de expressão ao permitir e propiciar um maior intercâmbio de informação. Em consequência, o alcance do direito de retificação ou resposta deve ser analisado detalhadamente a fim de que não se vulnere o direito à  liberdade de expressão.

 

67.     O artigo 14 da  Convenção Americana dispõe que:

 

1.   Toda pessoa atingida por informações inexatas ou ofensivas emitidas em seu prejuízo por meios de difusão legalmente regulamentados e que se dirijam ao público em geral, tem direito a fazer, pelo mesmo órgão de difusão, sua retificação ou resposta, nas condições que estabeleça a lei.

2.   Em nenhum caso a retificação ou a resposta eximirão das outras responsabilidades legais em que se houver incorrido.

3.   Para a efetiva proteção da honra e da reputação, toda publicação ou empresa jornalística, cinematográfica, de rádio ou televisão, deve ter uma pessoa responsável que não seja protegida por imunidades nem goze de foro especial.

 

68.     A Comissão entende que o artigo 14(1) da  Convenção Americana garante o direito de retificação ou resposta pelo  mesmo órgão de difusão nas condições estabelecidas pela lei. A Corte Interamericana avançou sua análise a respeito em sua Opinião Consultiva sobre a Exigibilidade do Direito de Retificação ou Resposta, OC-7/86, interpretando que o artigo 14(1) não indica se os ofendidos têm direito a responder em espaço igual ou maior, quando deve ser publicada a resposta depois de recebida, qual o prazo em que se pode exercer o direito, qual a terminologia admissível, etc.  De acordo com o artigo 14(1) estas condições serão aquelas estabelecidas pela lei.[20]  O conceito “nas condições que sejam estabelecidas pela lei” refere-se a diversas condições relacionadas com o exercício desse direito.  Essa frase relaciona-se à efetividade desse direito na ordem interna, e não em sua criação, existência ou exigibilidade internacional. Sendo assim, a Corte assinalou que:

 

O fato de que os Estados Partes possam fixar as condições do exercício do direito de retificação ou resposta, não impede a exigibilidade, conforme o direito internacional,  das obrigações que aqueles contraíram segundo o artigo 1.1, que estabelece o compromisso dos  própios Estados parte de respeitar os direitos e liberdades reconhecidos na  Convenção e de garantir seu livre e pleno exercício a toda pessoa que esteja sujeita à sua jurisdição.  Em consequência, se por qualquer circunstância, o direito de retificação ou resposta não pudesse ser exercido por toda pessoa sujeita à jurisdição de um Estado Parte, isto constituiria uma violação da  Convenção, suscetível de ser denunciada perante os órgãos de proteção nela previstos.[21]

69.     No  presente caso, a CIDH ressalta que o artigo 58 da  Constituição Bolivariana da Venezuela prevê que “toda pessoa tem direito […] à réplica e a retificação quando seja afetada diretamente por informações inexatas e ofensivas”.  O artigo 9 do Capítulo I da  Lei de Exercício do Jornalismo da  República Bolivariana da Venezuela dispõe a obrigatoriedade de retificar oportuna e eficientemente toda tergiversação ou ausência de veracidade na  informação; a sua vez prevê a obrigação da  empresa de conceder a retificação ou o esclarecimento  formulado pelo ofendido. Quanto à petição do senhor Elías Santana, de acordo com o exposto pelas partes, em 11 de setembro de 2000, a Diretora de Rádio Nacional da Venezuela, em virtude da  legislação interna, concedeu o direito de retificação ou resposta à Elías Santana através de três emissoras que pertencem à Rádio Nacional da Venezuela,[22] meio de difusão no qual foram divulgados os supostos comentários ofensivos pronunciados pelo  Presidente Hugo Chávez Frías contra o senhor Santana. Entretanto, o senhor Santana recusou-se a ter sua opinião difundida em tais condições, por considerar que deveria ser no mesmo programa “Alô, Presidente”, no  mesmo horário e com a mesma cobertura. Por esta razão, o senhor Santana iniciou uma ação de amparo perante à Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça contra o Presidente da  Republica e a Diretora de Rádio Nacional da Venezuela, na qual solicitou que se declarasse a presente ação de amparo PROCEDENTE, e em consequência, ordenasse aos ofendidos a concessão de um tempo de 10 minutos de duração no  programa radiofônico  “Alo Presidente” imediatamente após a sentença, a fim de exercer nele o direito de réplica sobre as informações que a mim e a associação civil “Queremos Elegir” concerne.[23]  Cabe recordar, como assinalado supra nota de página 6, a Sala Constitucional  do Tribunal Supremo de Justiça, em nome  da  República e por autoridade da  Lei, declarou improcedente in limine litis o amparo interposto por Elias Santana, atuando em seu nome e em representação da  Associação Queremos Elegir.

 

70.     Em vista de uma avaliação prima facie, a Comissão entende que as alegações do peticionário Elías Santana por violação ao artigo 14 da  Convenção Americana não tendem a caracterizar violação deste artigo da  Convenção Americana, posto que o Estado, de conformidade com a lei venezuelana e os termos convencionais, outorgou o direito de retificação ou resposta ao senhor Santana. 

 

71.     No  presente caso, o Estado venezuelano manifestou que o condutor do programa “Alô Presidente”, ao fazer um comentário crítico sobre o expressado por Elias  Santana no  jornal El Nacional de  27 de agosto de 2000, limitou –se a  exercer sua liberdade de expressão. O Estado explicou que foi um exercício mais de desacordo político em um  ordenamento democrático, afirmando que “quando o que se imputa é uma opinião sem fatos que a sustentem, não há informação a ser desvirtuada, exceto através da via da  ação ordinária existente ou que venha a ser criada pela lei”. A CIDH concorda com os argumentos expostos pelo  Estado quanto às manifestações do Presidente Chávez sobre as que o peticionário Santana requereu exercer seu direito de retificação ou resposta são  manifestações de opinião.[24]

 

72.     A Comissão observa que, em concordância com o artigo 14 da  Convenção, um suposto ofendido pode recorrer ao direito de retificação ou resposta para obter uma correção imediata, publicando ou emitindo no  mesmo meio a verdade provada dos  fatos certos que foram desvirtuados pelo  jornalista que divulgou a informação.  Esta ação é exercida somente em relação à informação de caráter fático  e não em relação à comentários de opinião. Cabe mencionar que, quanto às manifestações de opinião, a Corte Européia de Direitos Humanos entende que há algumas circunstâncias em que uma comunicação de um juízo de valor tem  que estar respaldada por uma base de fatos suficientemente fáticos para chegar a este juízo. Esta posição, portanto, poderia permitir a retificação de informação fática em asseverações de opinião que se baseiam sobre fatos provados.  Nestas circunstâncias seria necessário demonstrar uma ligação entre um juízo de valor e os fatos que o respaldam no  estudo de caso a caso.[25]

 

73.     No  sistema interamericano, quanto à questão vinculada ao tipo de expressões (afirmação de fatos ou opiniões) sobre os que se pode solicitar a retificação ou resposta, a CIDH deseja declarar que existe uma discrepância substancial entre a letra do artigo 14(1) em sua versão em inglês por um lado e as versões em espanhol, português e francês pelo  outro.

 

O artigo 14(1) em versão espanhola, estabelece:

 

1.         Toda persona afectada por informaciones inexactas o agraviantes emitidas en su perjuicio a través de medios de difusión legalmente reglamentados y que se dirijan al público en general, tiene derecho a efectuar por el mismo órgano de difusión su rectificación o respuesta en las condiciones que establezca la ley.

O artigo 14(1) em versão inglesa, assinala:

1.         Anyone injured by inaccurate or offensive statements or ideas disseminated to the public in general by a legally regulated medium of communication has the right to reply or to make a correction using the same communications outlet, under such conditions as the law may establish.

O artigo 14(1) em versão francesa, institui:

1.         Toute personne offensée par des données inexactes ou des imputations diffamatoires émises à son égard dans un organe de diffusion légalement réglementé et qui s'adresse au public en général, a le droit de faire publier sa rectification ou sa réponse, par le même organe, dans les conditions prévues par la loi.

O artigo 14(1) em versão portuguesa, dispõe:

1.         Toda pessoa atingida por informações inexatas ou ofensivas emitidas em seu prejuízo por meios de difusão legalmente regulamentados e que se dirijam ao público em geral, tem direito a fazer, pelo mesmo órgão de difusão, sua retificação ou resposta, nas condições que estabeleça a lei.

 

74.     Em sua Opinião Consultiva sobre a Exigibilidade do Direito de Retificação ou Resposta, a Corte Interamericana notou a diferença entre os textos originais, certificados como igualmente autênticos, sem pronunciar-se a respeito do alcance do direito protegido pelo  artigo 14(1) em consideração da  mencionada diferença. 

 

75.     O artigo 13 da  Convenção Americana protege a manifestação, tanto de informação, como de idéias.  O conceito amplo de proteção estabelecido no  artigo 13 da  Convenção segue a linguagem emanada do texto do artigo 14 da  Convenção Americana, versões em espanhol, português e francês. Esta versão expressamente exclui de sua letra as referências a idéias, protegendo o direito de retificação ou resposta somente no que se refere à  informação inexata ou ofensiva. A omissão do texto de tratamento amplo outorgada aos distintos tipos de expressão no  artigo 13 da  Convenção leva a concluir que a Convenção expresamente exclui manifestações de opinião como possíveis pressupostos que podem ser replicados.[26]

 

76.     A CIDH assinala que, de acordo com a jurisprudência do sistema interamericano, a falsidade de uma idéia é indubitavelmente impossível de verificar.[27]  No  mesmo sentido, dentro do sistema europeu, uma decisão da  Corte Européia entendeu que: “Embora se possa comprovar a existência de fatos, a veracidade dos  juízos de valor não são suscetíveis à prova.  O requisito de comprovar a veracidade é impossível e invade a própria liberdade de opinião, parte fundamental do direito garantido pelo  artigo 10”.[28] A exigência de “veracidade” nos casos de juízos de valor pode implicar a censura quase automática de toda  informação que não possa ser submetida à prova, o que anularia, por exemplo, praticamente todo o debate político baseado principalmente em idéias e opiniões de caráter notadamente subjetivo. A possibilidade de retificação ou resposta à opinião trairia consigo o risco de uma interminável quantidade de intervenções que anulariam a própria expressão do meio, gerando uma possível autocensura. Seria interminável a cadeia de retificação ou resposta que se poderia gerar se se admitisse a possibilidade de responder uma opinião da  que difere ou que considere atentatória contra o direito à honra ou reputação.[29] Sendo assim, se o objeto do direito de retificação ou resposta é corrigir a informação falsa ou imprecisa, então a opinião que não pode ser sujeita a esta verificação estaria excluída.

 

77.     Quanto à diferença idiomática nos  textos do artigo 14 da  Convenção, a CIDH considera que a questão deve ser resolvida pelos  distintos métodos de interpretação que oferece o direito internacional.  Para a interpretação da  Convenção, a Corte utilizou os métodos tradicionais de direito internacional, tanto no que se refere às regras gerais de interpretação como aos meios complementares, nos  termos incluídos nos  artigos 31 e 32 da  Convenção de Viena sobre o Direito dos  Tratados.[30]

 

78.     O artigo 32 da  Convenção de Viena estabelece que “poder-se-á utilizar os meios de interpretação complementares, em particular os trabalhos preparatórios do tratado e as circunstâncias de sua celebração, para confirmar o sentido resultante da  aplicação do artigo 31, ou para determinar o sentido quando a interpretação dada de conformidade com o artigo 31: a) deixe ambíguo ou escuro o sentido; ou b) conduza a um resultado manifestamente absurdo ou irrazoável”.  O artigo 33(4) da  Convenção de Viena sobre o Direito dos  Tratados especifica “[…] quando a comparação dos  textos autênticos revele uma diferença de sentido que não se possa resolver com a aplicação dos  artigos 31 e 39, será adotado o sentido que melhor concilie esses textos, tendo em conta o objeto e fim do tratado”.[31]

 

79.     Para isto a CIDH considera que deve utilizar um meio de interpretação complementar ao analisar o direito garantido pelo  artigo 14 quanto ao direito de retificação ou resposta de idéias, utilizando os trabalhos preliminares do tratado de San José.

 

80.     Vale destacar que a distinção sobre os alcances do direito de retificação ou resposta é de particular relevância no  presente caso, dado que tanto o Estado como os peticionários apresentam seus argumentos a fim de estabelecer se uma opinião pode ser objeto de retificação ou resposta de acordo com o artigo 14 da  Convenção.[32]

 

81.     Nos  documentos preliminares e atas da  Conferência Especializada Interamericana sobre Direitos Humanos, o sentido e linguagem do artigo 14 da  Convenção foi objeto de extensa discussão e transformação.

 

82.     Em sua versão inicial em espanhol, este artigo estipulava que “toda pessoa afetada por informações ou conceitos inexactos e ofensivos emitidos em seu detrimento ou através de meios de difusão que se dirijam ao público em geral, tem direito a efetuar pelo  mesmo órgão de difusão, na mesma maneira e de forma gratuita, sua retificação ou sua resposta”.  O termo “conceitos” nos  documentos originais em espanhol poderia ser interpretado como o existente na presente linguagem do artigo 14(1), “idéias”, versão em inglês. 

 

83.     Dado o polêmico debate durante a conferência pelo  conteúdo deste artigo, durante o transcurso das discussões foi constituído um grupo de trabalho que foi composto por delegados da Argentina, Nicarágua, Panamá, México, Equador, Colômbia e Estados Unidos, o professor Justino Jiménez de Aréchaga, então membro da  CIDH, foi convidado para assessorar o grupo de trabalho. O Grupo de Trabalho, encarregado de redigir o texto do artigo, submeteu à debate e votação o novo texto acordado que contém a forma atual do artigo 14(1) versão em espanhol.  Entretanto, sua versão no  idioma inglês manteve em seu texto a terminología “idéias”, introduzindo as demais modificações acordadas pelo  Grupo de Trabalho. 

 

84.     Por último, a CIDH entende que se fosse permitido aceder aos meios de comunicação para expor uma retificação ou resposta as distintas idéias ou opiniões expressadas por jornalistas, entrevistados e demais expositores, se criaria o efeito dissuasivo de evitar transmissões ou publicações de assuntos polêmicos.  Ademais, os meios perderiam o  controle editorial de seus espaços e optariam pela  programação de assuntos superficiais.[33]

 

85.     A Comissão entende que as alegações do peticionário Elías Santana referentes à violação ao artigo 14 da  Convenção Americana não constituem  violação à Convenção, visto que as expressões em disputa, na opinião da  CIDH, constituem mera opinião, expressões que não estão protegidas pelo  artigo 14 da  Convenção Americana. Com relação aos outros direitos convencionais que o peticionário Santana alega violados, a Comissão entende que não foram apresentadas evidências suficientes para acreditar a maneira especial em que sua situação pessoal foi afetada pela  parte resolutiva da  sentença, além da suposta violação ao artigo 14 do Pacto.

 

Outros peticionários

 

86.     Os peticionários Marieta Hernández, Héctor Faúndez Ledesma, David Natera Febres, Andrés Mata Osorio e Juan Manuel Carmona Perera e Cecilia Sosa, todos colunistas, jornalistas ou diretores de meios de comunicação, alegam terem sido afetados pelo  Estado venezuelano ao aceitar a sentença 1.013 prolatada pelo  Tribunal Supremo de Justiça como doutrina vinculante para efeitos interpretativos dos  artigos 57 e 58 da  Constituição venezuelana. Os peticionários fundamentam que o Tribunal Supremo “em vez de limitar-se a resolver a ação pessoal interposta pelo  Sr. Santana, interpretou os artigos 57 e 58 da  Constituição da Venezuela, o que leva  a consequências jurídicas de importancia  para todos os tribunais e juízes da  República, já que o artigo 335 da  Constituição venezuelana assinala que as interpretações a serem estabelecidas pela Sala Constitucional sobre o conteúdo ou alcance das normas e princípios constitucionais são vinculantes para as outras Salas do Tribunal Supremo de Justiça e demais tribunais”.[34] De acordo com os peticionários, a sentença os afeta diretamente ao ter estabelecido que “não tem direito a réplica os meios, nem aqueles que habitualmente exercem o jornalismo, nem aqueles que mantêm as colunas ou programas” o que os afeta em seu carácter de vítimas por serem eles colunistas, diretores de meios e/ou jornalistas.

 

87.     Em resposta ao carácter vinculante da  sentença do Tribunal Supremo, o Estado venezuelano respondeu que “os efeitos jurídicos do mandato em que consiste a decisão são os que podem causar prejuízo  a seus destinatários”[…] afirmou o Estado que “os peticionários não denunciaram expressamente perante à Comissão a Parte Dispositiva da  sentença, ou seja, não impugnaram seu conteúdo decisório. O objeto principal de suas denúncias foi somente um grupo de parágrafos que formam parte da  argumentação que integra o argumento  interpretativo da  Parte De Fundamentação desta sentença, como se tais parágrafos tivessem vida própria e independente” […] No  presente caso, o fato constitutivo da  suposta lesão dos  direitos que alegadamente foram violados não pode ser outro que o conteúdo decisório da  sentença, o ato imperativo do Estado, o mandato de autoridade de coisa julgada, isto é, a Parte Dispositiva da  sentença. [...] a eficácia da  sentença se concentra em sua decisão e não se extende a seus motivos.  E uma vez alcançada a autoridade da  coisa julgada, esta tampouco se extende aos motivos da  sentença, ou seja, ao argumento interpretativo que conduziu o Tribunal a denegar a tutela jurisdicional solicitada na  ação de amparo”.[35]

 

        88.   Tendo analisado as provas aportadas nas petições P-0453/2001, P-0434/2001 e P-0474/2001, a respeito de Marieta Hernández, Héctor Faúndez Ledesma, David Natera Febres, Andrés Mata Osorio e Juan Manuel Carmona Perera e Cecilia Sosa, a Comissão entende que os peticionários não apresentaram evidências suficientes para acreditar de maneira especial que sua situação pessoal foi afetada pela  parte resolutiva da  sentença, tampouco os peticionários apresentaram a informação necessária indicando o cumprimento do artigo 46(1)(a) da  Convenção Americana em seus casos particulares.  Na  medida que a denúncia interposta por Marieta Hernández, Héctor Faúndez Ledesma, David Natera Febres, Andrés Mata Osorio e Juan Manuel Carmona Perera e Cecilia Sosa perante à Comissão não foi interposta perante os tribunais internos, não se pode dizer que o Estado tenha tido a possibilidade de resolver as disputas individuais referentes aos direitos individuais destas pessoas em particular. Neste sentido, os peticionários devem apresentar-se como vítimas de uma violação da  Convenção ou devem comparecer perante à Comissão como representantes de uma vítima putativa de uma violação da  Convenção por um Estado Parte.  A Comissão em uma situação análoga entendeu que  “não basta que um peticionário alegue que a mera existência de uma lei viola os direitos outorgados pela Convenção Americana, mas que é necessário que esta lei tenha sido aplicada em seu detrimento”.[36]

 

89.     Em virtude de uma avaliação prima facie, a Comissão entende que as alegações dos  peticionários antes mencionadas por violação dos artigos 13, 14, 24, 8(1), 21(1), 30, 29(a)(b) em relação aos artigos 1 e 2 da  Convenção Americana devem ser rejeitado por não preencherem os  requisitos exigidos pelos  artigos 46 e 47 da  Convenção Americana. 

 

VI.              INSTRUÇÃO À RELATORIA PARA A LIBERDADE DE EXPRESSÃO

 

90.     Além dos  argumentos antes apresentados pela CIDH a respeito da inadmissibilidade do caso, a Comissão manifesta preocupação sobre as observações dos  peticionários em referência ao desenvolvimento interpretativo dos  artigos 57 e 58 da  Constituição venezuelana feitas pelo Tribunal Supremo na  sentença 1.013. Por esta razão, a Comissão instrui a Relatoria para a Liberdade de Expressão da  CIDH elaborar um Relatório Especial sobre a sentença 1.013 e os padrões de proteção aos direitos humanos em matéria de liberdade de expressão do sistema interamericano de direitos humanos à luz da  Convenção Americana e a Declaração de Princípios sobre Liberdade de Expressão.

 

91.     O artigo 41 da  Convenção Americana faculta à Comissão a preparar estudos e relatórios que esta considere convenientes, assim como formular recomendações aos Estados membros da  OEA em relação à adoção de medidas destinadas a fomentar o respeito aos direitos humanos no  marco de suas leis internas e seus preceitos constitucionais.

 

92.     A presente instrução baseia-se, em parte, na relevância do debate desencadeado pelo  conteúdo desta sentença e do legítimo interesse demonstrado pela  sociedade em seu conjunto e a comunidade internacional sobre os efeitos que pudesse acarretar para a liberdade de expressão a aplicação das formulações interpretativas do Tribunal Supremo por parte de outros tribunais.

 

VII.     CONCLUSÃO

 

93.     Com base nas análise de fato e de direito expostas anteriormente, a Comissão conclui que o presente caso não satisfaz os requisitos de admissibilidade enunciados nos  artigos 46 e 47 da  Convenção Americana.

 

A COMISSÃO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS,

 

DECIDE:

 

1.        Declarar inadmissível o presente caso.

 

2.        Enviar o presente relatório às partes.

 

3.       Instruir a Relatoria para a Liberdade de Expressão da CIDH para elaborar um relatório especial sobre a sentença 1.013 à luz das obrigações internacionais do Estado venezuelano com relação ao artigo 13 da  Convenção Americana sobre Direitos Humanos

 

4.       Publicar esta decisão e incluí-la em seu relatório anual à Assembléia Geral da  OEA.

 

 

Dado e assinado na  sede da  Comissão Interamericana de Direitos Humanos, na  cidade de Washington, D.C., no dia 23 de outubro de 2003. (Assinado): José Zalaquett, Primeiro Presidente; Clare K. Robert, Segundo Vice-Presidente; Susana Villarán, Segunda Vice-Presidenta, Robert K. Goldman e Julio Prado Vallejo, Comissionados.

 

         


 


[1] O Bloque de Prensa Venezuelano é uma associação civil não governamental constituída em 23 de setembro de 1958, a qual agrupa a maioria dos  proprietários editores e diretores dos  jornais e revistas nacionais e regionais de circulação permanente dentro da Venezuela.

[2] Ver Tribunal Supremo de Justiça, Sala Constitucional, Magistrado-Ponente: Jesús Eduardo Cabrera Romero, Decisão de 12 de junho de 2001:

Decisão

 

Pelas  razões antes expostos, a Sala Constitucional deste Tribunal Supremo de Justiça, , em nome da  República e por autoridade da  Lei, declara IMPROCEDENTE in limine litis o amparo incoado por Elias Santana, atuando em seu nome e em representação da  Associação Queremos Elegir “[…] frente à negativa dos  cidadãos  Presidente da  República, Hugo Chávez Frías e Teresa Maniglia, Diretora do Instituto Autônomo Rádio Nacional de Venezuela, de permitir o exercício do direito de réplica em relação ao pedido feito  pelo  condutor do programa radiofônico Alò, Presidente em suas emissões de domingo 27 de agosto e de domingo 3 de setembro de 2000, cuja origem de transmissão foi a Rádio Nacional de Venezuela, e retransmitida por diferentes meios de comunicação radiofônica e televisivo”.

Publique-se e registre-se.  Arquive-se o expediente.

 

[3] O artigo 9 da  Lei de Exercício do Jornalismo dispõe: “Toda tergiversação ou ausência de veracidade na  informação deve ser ratificada oportuna e eficientemente.O jornalista  está obrigado a retificar e a empresa a aceitar tal retificação ou ao esclarecimento formulado pelo ofendido”.

 

[4] Os artigos 57 e 58 da  Constituição da  República Bolivariana de Venezuela estabelecem:

Artigo 57. Toda pessoa tem o direito a expressar livremente seus pensamentos, suas idéias ou opiniões de viva voz, por escrito ou mediante qualquer outra forma de expressão e de fazer uso para isto de qualquer meio de comunicação e difusão, sem que se possa estabelecer censura. Aquele que fizer uso deste direito assume plena responsabilidade por todo o expressado. Não se permite o anonimato, nem a propaganda de guerra, nem as mensagens discriminatórias, nem os(cancelar)  aquelas que promovam a intolerância religiosa.

Está proibida a censura aos funcionarios públicos ou funcionárias públicas para dar conta dos  assuntos sob suas responsabilidades.

Artigo 58. A comunicação é livre e plural e comporta os deveres e responsabilidades indicados pela lei. Toda pessoa tem o direito à informação oportuna, veraz e imparcial, sem  censura, de acordo com os princípios desta Constituição, bem como a réplica e retificação quando forem afetados diretamente por informações inexatas ou ofensivas. As crianças e adolescentes têm direito a receber informação adequada para seu desenvolvimento integral.

 

[5] A senhora Cecilia Sosa anexou à sua petição listas com o nome, nacionalidade e assinatura de pessoas que manifestaram que aderiam à denúncia apresentada perante à Comissão Interamericana de Direitos Humanos.

[6] O artigo 23 da  Constitução venezuelana estabelece: “os tratados, pactos e convenções relativos a direitos humanos, subscritos e ratificados pela Venezuela, têm hierarquia  constitucional e prevalecem na ordem interna, na  medida que contenham  normas sobre o gozo e exercício mais favorável àquelas estabelecidas nesta Constituição e à lei da  República e são de aplicação imediata e direta pelos  tribunais e demais órgãos do Poder Público”.

 

[7] Veja-se a Parte III do presente relatório que contém os parágrafos emitidos pelo  Presidente Chávez Frías a respeito dos quais o senhor Elías Santana solicitou exercer sua réplica.

 

[8] O artigo 335 da  Constituição da  República Bolivariana da Venezuela dispõe:

Artigo 335: O Tribunal Supremo de Justiça garantirá a supremacia e efetividade das normas e princípios constitucionais: será o máximo e último intérprete desta Constituição e velará por sua uniforme interpretação e aplicação. As interpretações a serem determinadas pela Sala Constitucional sobre o conteúdo ou o alcance das normas e princípios constitucionais são vinculantes para as outras Salas do Tribunal Supremo de Justiça e demais tribunais da  República.

[9] Ver Relatório Nº 67/01, Caso 11.859 Tomás Enrique Carvallo Quintana, Argentina, CIDH, Relatório Anual de 2001 que cita o Relatório Nº 103/99, Bernard Merens e Familia, Argentina, 27 de setembro de 1999, Relatório Anual 1999; Relatório Nº 10/91, Caso 10.169, Peru, Banco de Lima. CIDH, Relatório Anual 1990-1991, p. 452; Relatório Nº 47/97, Paraguai, Tabacalera Boquerón. CIDH, Relatório Anual 1997, p. 229; Relatório Nº 39/99, Argentina, Mevopal, S.A., pendente de publicação.

 

[10] A Convenção Americana em seus artigos 46(1)(a) e 47, estabelece o caráter subsidiário do sistema interamericano, e portanto, a necessidade de ter-se esgotado e interposto os recurso da  jurisdição interna.  È o Estado que, em princípio, e conforme seus procedimentos internos, deve solucionar suas violações e, em caso negativo, se dará passo à jurisdição do sistema interamericano.  Quanto à caracterização de vítima, o artigo 44 da  Convenção Americana dispõe que "qualquer  pessoa ou grupo de pessoas, ou entidade não governamental legalmente reconhecida em um ou mais Estados membros da  Organização, pode apresentar à Comissão petições que contenham denúncias ou queixas de violação desta Convenção por um Estado Parte”: Diferentemetne das disposições da  Convenção Européia e do Pacto de Direitos Civis e Políticos das Nações Unidas, os peticionários não necessitam alegar que foram vítimas de uma violação da  Convenção no  sistema interamericano.

[11] Ver CIDH, Caso 10.169, Relatório Nº 10/91, Relatório Anual da  CIDH 1990-1991, parágrafo 2.

[12] Ver geralmente Tom Zwart, The Admissibility of Human Rights Petitions: The Case Law of the European Commission of Human Rights and the Human Rights Committee (Dordrecht, Boston: M. Nijhoff, 1994), pág. 50 e ss. Ver também CIDH Caso 1954, Relatório Nº 59/81,  Relatório Anual da  CIDH 1981-1982  e CIDH Caso 2141, Resolução 23/81, Relatório Anual da  CIDH 1980-1981, citados em Mónica Pinto, La denuncia ante la Comissão Interamericana de Direitos Humanos (Editores del Puerto, 1993), pág. 35.

 

[13] Ver, CIDH, Caso 11.553, Relatório Nº 48/96 (Costa Rica), Relatório Anual da  CIDH, 16 de outubro de 1996, par. 28

[14] Ver CIDH, Caso 12.404, Relatório Nº 51/02 (Peru), Relatório Anual da  CIDH 2002.

[15] Ver supra nota 13, par. 28.

[16] Ver supra nota 14, par. 35.

[17] Ver supra nota 13, par. 28.

[18] Ver CIDH, Caso 11,625, Relatório Nº 28/98 (Guatemala), Relatório Anual da  CIDH 1997, pars. 30-32. Ver também  Corte IDH, Opinião Consultiva OC-14/94, "Responsabilidade internacional por expedição e aplicação de leis violatórias da  Convenção (Arts. 1 e 2 da  Convenção Americana)", de 9 de dezembro de 1994, pars. 45-49.

[19] Ver por exemplo. CIDH, Caso 12.250, Relatório N° 34/01, Massacre de Mapiripán (Colômbia), Relatório Anual da  CIDH 2000, par. 27. Ver também CIDH, Caso 12.053, Relatório Nº 78/00, Comunidades Indígenas Maya e seus Membros (Belize), Relatório Anual da  CIDH 2000, par. 45-46.

[20] Corte IDH, Exigibilidade do Direito de Retificação ou Resposta (Arts. 14.1, 1.1 e 2 Convenção Americana sobre Direitos Humanos) Opinião Consultiva OC-7/86 de 29 de agosto de 1987. Série  A No. 8,  par 27.

[21] Ibidem, par 28.

 

[22] O Estado informa que Teresa Maniglia, Diretora da Rádio Nacional da  Venezuela, comunicou ao senhor Santana que “sua opinião seria transmitida através das três emissoras que pertencem à  Radio Nacional da  Venezuela (Antena Informativa 1050 AM, Antena Popular 630 AM e Canal Clássico 91.1 FM)”.  Comunicação do Ministério de Relações Exteriores da  Republica Bolivariana da Venezuela recebida em 8 de novembro de 2001, par. 6.4.

 

[23] Documento que consta do expediente da  CIDH.

 

[24] Ver par. 11 do presente relatório que transcreve segmentos do programa em questão.

 

[25] Ver Eur. Court H. R., Feldek v. Slovakia, Judgment of 12 July 2001, par. 75.

[26] Asim foi interpretado por alguns tribunais dos  Estados membros.  Por exemplo, Ver decisão da  Corte Suprema de Argentina que decidiu: “A retificação somente é procedente quando seu exercício é requerido para rebater a afirmação de fatos.  Com referência ao art. 14 da  Convenção Americana sobre Direitos Humanos entende-se  que a clara terminologia do preceito limita o direito ao âmbito fático, ou relativo a fatos cuja existência ou inexistência pode ser objeto de prova judicial.  Fica assim  excluído o amplo setor no qual o decisivo não é atinente aos fatos, mas sim a sua interpretação: é o campo das idéias ou crenças, as conjecturas, as opiniões, e os juízos de valor. Neste último campo também existem elementos de fato, mas o essencial é a aceitação ou rejeição que a base fática provoca no  autor da  manifestação. Isto vale tanto para as informações inexatas como para as ofensivas. Também nestas últimas o caráter de agravante deve vir dos fatos em si mesmos que são a notícia, que o ofendido  pretenderá eventualmente responder, e não da  formulação de juízos de valor desqualificantes... Excluir da  retificação ou resposta o que genericamente pode ser denominado como opiniões não é uma peculiaridade exclusiva do Pacto”.  Caso Petric v. Diario Página 12 del 22/6/99 (LL, 1996-A-689) em Gregori Badeni, Tratado de Libertad de Expresión, LexisNexis, Editorial Abeledo-Perrot, Bs.As.2002, p. 332. Também na  Sentença 1.013, o Tribunal Supremo de Justiça da  Sala Constitucional da  República Bolivariana da Venezuela afirmou: “Quando o que se imputa, é uma opinião sem base em fatos que a sustentem, a opinião desta Sala é no sentido de que não há informação que desvirtuar, mas sim pela via das ações ordinárias existentes ou forem criadas pela lei”.  Sala Constitucional do Tribunal Supremo de Justiça, 12 de junho de 2001.

 

[27] CIDH, Relatório Anual 1994, Relatório sobre a compatibilidade entre as leies de desacato e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, OEA/Ser.l/V/II.88, Doc. 9 rev. (1995), Secção IV. B. par. 5, que assinalou:

 

Inclusive as leis que permitem esgrimir a verdade como defesa inibem inevitavelmente o livre fluxo de idéias e opiniões ao transferir a carga da  prova a que expressa suas opiniões.  Este é especialmente o caso da  arena política em que a crítica política é feita frequentemente mediante juízo de valor e não mediante declarações exclusivamente baseadas em fatos.  Pode ser impossível demonstrar a veracidade das declarações dado que os juízos de valor não admitem prova.

 

Ver também Corte IDH, La colegiação obligatoria de periodistas (arts. 13 y 29 Convenção Americana sobre Direitos Humanos). Opinião Consultiva OC-5/85 de 13 de novembro de 1985. Série A No.5, par. 77:

 

... Um sistema de controle ao direito de expressão em nome de uma suposta garantia da  correção e veracidade da  informação que a sociedade recebe pode ser fonte de grandes abusos e, no  mérito, viola o direito à informação que tem essa mesma sociedade

 

[28] Eur. Court H. R., Feldek v. Slovakia, Judgment of 12 July 2001, par. 75, tradução não oficial.

 

[29]  Ver Gregori Badeni , Tratado de Libertade de Expressão, LexisNexis, Editorial Abeledo-Perrot, Bs.As.2002, pág. 301.

 

[30] Corte IDH, “Outros tratados” objeto da  função consultiva da  Corte (Art. 64 Convenção Americana sobre Direitos Humanos), Opinião Consultiva OC-1/82 de 24 de setembro de 1982 Série A Nº 1, par. 33.

 

            O artigo 31 da  Convenção de Viena estabelece:

31. Regra geral de interpretação. I. Um tratado deverá ser interpretado de boa-fé conforme o sentido corrente que tenha de ser atribuído aos termos do tratado no  contexto destes e tendo em conta seu objeto e fim.

2. Para os efeitos da  interpretação de um tratado. o contexto compreenderá, ademais do texto, incluindo seu preâmbulo e anexos:

a) todo acordo que se refira ao tratado e tenha sido acordado entre todas as partes durante a  celebração do tratado:

b) todo instrumento formulado por uma ou mais partes durante a celebração do tratado e aceito pelas demais como instrumento referente ao tratado;

3. Juntamente com o contexto, deve-se ter em consideração:

a) todo acordo posterior entre as partes acerca da  interpretação do tratado ou da  aplicação de suas disposições:

b) toda prática posteriormente seguida na  aplicação do tratado pela qual conste o acordo das partes acerca da  interpretação do tratado:

c) toda forma pertinente de direito internacional aplicável nas relações entre as partes.

4. Será dado ao termo um sentido especial se constar que tal foi a intenção das partes.

O artigo 39 da  Convenção de Viena dispõe:

 

39. Norma geral concernente à emenda dos  tratados. Um tratado poderá ser emendado por acordo entre as partes. Serão aplicados a este acordo as normas enunciadas na  Parte II, exceto se o tratado disponha outra coisa.

 

[31] Convenção de Viena sobre o direito dos  tratados. U.N. Doc A/Conf. 39/27 (1969), 1155 U.N.T.S. 331, 23 de maio de 1969, Parte III: Observância, aplicação e interpretação dos  tratados, Seção Terceira, Artigos 31 al 33. Também Ver Corte IDH, Opinião Consultiva OC-3/83 de 8 de setembro de 1983, Restrições à Pena de Morte (Arts. 4.2 e 4.4 Convenção Americana sobre Direitos Humanos), pars. 49-50 em que a Corte utiliza os critérios de interpretação da  Convenção de Viena resumindo-os e interpretando:

 

49.        Segundo aquelas regras, os tratados devem ser interpretados  “de boa-fé conforme o sentido que tenha de ser atribuido aos termos do tratado no  contexto destes e tendo em conta seu objeto e fim” (artigo 31.1 da  Convenção de Viena).  Os meios complementares de interpretação, em especial os trabalhos preparatórios do tratado, são utilizados para confirmar o sentido resultante daquela interpretação ou quando esta deixe ambíguo ou escuro o sentido ou conduza a um resultado manifestamente absurdo ou irrazoável (Ibíd., artigo 32). 

 

50.        Este método de interpretação está relacionado ao princípio da  primazia do texto, isto é, aplicar critérios objetivos de interpretação,  Ademais em matéria de tratados relativos à proteção dos  direitos humanos, é ainda mais marcada a idoneidade dos  critérios objetivos de interpretação, vinculados aos próprios textos, frente aos subjetivos, relativos à intenção das partes, já que tais tratados, como afirma a Corte, “não são tratados multilaterais do tipo tradicional, concluidos em função de um intercâmbio recíproco de direitos, para o benefício mútuo dos  Estados contratantes”, mas sim que “seu objeto e fim são a proteção dos  direitos fundamentais dos  seres humanos”[...].

 

[32] Com base no artigo 14(1) da  Convenção, o Estado venezuelano argumenta que este artigo garante o direito de retificação ou reposta a toda pessoa afetada somente por informações inexatas ou ofensivas de fatos e não pela  emissão de opiniões adversas ou artigos coom os quais  se está em desacordo ou que se considerasse não equilibrados.  Sendo assim, o Estado manifesta que o comentário crítico feito pelo  Presidente Hugo Chávez Frías no  programa “Alô Presidente” em referência ao senhor Elías Santana caracteriza um desentendimento político de opiniões que está dentro de um ordenamento democrático.

 

[33] Rafael Chavero Gazdik, “Un buen Comienzo, la Sentença 1.013 da  Sala Constitucional y el Direito de Réplica y Rectificação”, pág. 197, em Allan R. Brewer-Carías, e outros “La Libertad de Expresión amenazada (La sentença 1013)”, Instituto Interamericano de Direitos Humanos, Editorial Jurídica Venezuelana, 2001.

 

[34] O artigo 335 estabelece:

 

Artigo 335. O Tribunal Supremo de Justiça garantirá a supremacia e efetividade das normas e princípios constitucionais; será o máximo e último intérprete desta Constituição e velará por sua uniforme interpretação e aplicação. As interpretações a serem estabelecidas pela Sala Constitucional sobre o conteúdo e alcance das normas e princípios constitucionais são vinculantes para as outras Salas do Tribunal Supremo de Justiça e demais tribunais da  República.

[35] Comunicação do Ministério de Relações Exteriores da  Republica Bolivariana da Venezuela recebida em 8 de novembro de 2001, par. 7, pág. 20 e 21.

 

[36] Ver, CIDH, Caso 11.553, Relatório Nº 48/96 (Costa Rica), Relatório Anual da  CIDH, 16 de outubro de 1996.